Trabalho Conjunto
- Severus, onde me estás a levar?
Ele continuava de mão dada com ela, levando-a por entre as ruas estreitas do vilarejo. Estava com um sorrisinho curioso na cara, como uma criança que esconde um segredo engraçado.
- Vamos almoçar!
Tonks estava cheia de curiosidade em saber qual o sítio onde Severus se decidira a levá-la.
Não pôde pensar muito nisso, pois rapidamente chegaram ao destino. Estavam em frente a um restaurante acolhedor, limpo, e com uns empregados de ar muito simpático. Rapidamente arranjaram lugar no andar de cima, onde não havia ninguém, e com vista para o Parque. Tonks sentiu-se logo feliz com as recordações que aquela imagem lhe trazia. Pelos vistos, Severus achava o mesmo, pois perguntou:
- Escolhi bem o sítio não?
Tonks deu um sorrisinho a olhar para ele – Perfeito.
Foram muito bem servidos e falaram de tudo e de nada. Tonks reparou que ele tentava fazê-la lembrar-se de tudo o que a fazia feliz, sem tocar no assunto ‘proibido’.
Subitamente, vêem um pássaro a voar na direcção da janela onde eles estavam, mas um pouco aos ziguezagues. Tonks ainda pensou que fosse a coruja desastrada de Ron, ‘Pig’, mas rapidamente concluiu que esse pássaro era um pouco maior do que aquela ‘amostra de coruja’… era um pombo! Já estava tão perto que se notava um bilhete atado a uma das suas patas. Não tiveram muito tempo para pensar no assunto já que logo de seguida o pássaro estúpido bateu contra o vidro, escorregando até ao parapeito, inanimado. Enquanto Tonks fazia um simples Enervate, Severus tirou o bilhete da pata do animal e leu-o em silêncio.
Tonks olhava para ele apreensiva. – O que é que se passa?
Severus fez uma careta. – Dumbledore pergunta como estão a correr as coisas com a missão e se está tudo bem connosco… parece que estamos a demorar um pouco mais do que o costume…
Tonks ficou levemente afogueada. Severus não estava muito diferente. – Bem, ele sabe que temos de ganhar a confiança dele primeiro, não é? Só depois podemos agir! – e acrescentou lembrando-se de outra coisa – Severus, era suposto ele nos contactar? Nas missões não se deve fazer tal coisa, pois pode pôr tudo em risco!
Ele parecia pensar no mesmo. – Parece que quem teve esta brilhante ideia foi o Arthur Weasley… ele e a sua mania das coisas muggles… - resmungou ele para si mesmo – Albus diz também que o pombo foi enfeitiçado, pois eles não têm a capacidade de encontrar as pessoas como as corujas. São bem lerdos!
Tonks estava espantadíssima, de boca escancarada. Lerdos??? Não teve como se segurar: desatou às gargalhadas. Severus olhava para ela com uma mistura de espanto, choque, preocupação e desentendimento, tudo ao mesmo tempo, ao vê-la assim. Tonks riu mais ainda (se é que isso era possível) ao ver a cara dele. Muito lentamente, foi-se acalmando.
- O que… - começou Severus.
- Lerdos??? Severus, nunca pensei que conhecesses e muito menos usasses esse tipo de linguagem! – e recomeçou a rir, embora mais controlada.
Ele riu um pouco também, mais relaxado. – Sabes, eu também já fui mais novo…
- A sério? Bem, se os teus alunos descobrem que falas o mesmo tipo de linguagem que eles, vão todos parar a St. Mungus de urgência, em estado de choque!
Ele riu outra vez. – Agradecia que não espalhasses o boato, o respeito é das poucas coisas que ainda consigo fazer com que eles o tenham sem ter que fazer um mínimo de esforço…
- Eu diria antes medo!
- Não importa, desde que não me importunem demasiado… sinceramente eu divirto-me muito com isso. Posso ter uma cara-de-pau à frente deles, mas estou a morrer de riso por dentro…
Tonks achou aquilo muito engraçado e curioso. Outra coisa que tinha descoberto acerca dele que nem toda a gente sabia e que apenas o tornava um homem muito mais agradável, embora ele se recusasse terminantemente a ‘deixar-se levar’.
oOo
Ao acabarem de almoçar, decidiram ir falar com Kurt na hora. Procuraram-no por todo o lado, mas não o encontravam. Chegaram mesmo a ir ao Parque de Diversões, mas ele não estava lá. Onde raio se tinham esquecido de procurar? Um sítio que ele adore e onde se sinta feliz… Severus e Tonks lembraram-se do único sítio onde não tinham procurado pois estava fechado: o salão de baile do hotel.
Ao chegarem lá, quando iam a bater à porta, o próprio Kurt apareceu pelo lado de dentro. – Ah, já pensava que não se iriam ‘despedir’ do vosso sítio preferido!
Eles ficaram atónitos. – Nosso sítio preferido?
- Sim, sim, sim, - continuou Kurt todo animado - não foi aqui que passaram uma noite muito magicatásticanimadélicamente? Hem?
Eles continuavam com um ar de que tivessem recebido a notícia de que a Terra era quadrada. Uma noite muito magicatdásti-o-quê?
Kurt chamou-os logo para dentro, rindo com vontade da sua atrapalhação. – Magicatásticanimadélicamente! Uma mistura que eu ouvi há uns tempos numa música e achei mágica, fantástica e animada! Hahahahaha!
Os outros dois olharam um para o outro com uma certa preocupação, pensando que Kurt não estava bom da cabeça, ou seja, ainda estava pior do que o normal.
- Não se preocupem, eu só bebi uma garrafa de vodka de melão… - mas olhando melhor reconsiderou – Ou… bem… pois, talvez um pouco mais…
Se a situação não fosse grave, Severus e Tonks iriam desatar a rir às gargalhadas. Mas o que tinha dado na cabeça do homem para ficar assim? E como é que ele sabia que estavam quase de partida? Sim, ele sabia disso senão não tinha dito que eles se iriam ‘despedir’ do salão de baile… mas enfrascar-se na bebida??? Qual o propósito disso?
- Kurt, - começou Tonks preocupada – o que se passa consigo?
- Por favor, trata-me por ‘tu’ rapariga! – pediu ele triste.
Fazendo um esforço para o agradar, ela continuou – O que se passa contigo? Sempre estiveste bem-disposto todos estes dias, porque é que agora estás triste?
Kurt agora parecia um bebé a fazer beicinho. – Vocês estão a planear ir embora não é? – Não obteve resposta. – Pois, eu sabia.
- Como é que você sabia? – insistiu Severus que não estava nem aí de o tratar por ‘tu’.
Kurt encolheu os ombros – Não faço ideia. Sou assim desde sempre! Sempre consegui perceber o que as pessoas pensam a respeito de qualquer coisa, consigo mesmo decifrar os seus sentimentos. – e ao dizer isto sorriu para eles e piscou o olho.
Ficaram logo afogueados. – Claro que foi muito mais difícil mas… adorei fazer isso convosco. Gostei mesmo de vocês! Nem sei explicar, é como se me conseguissem compreender a um nível que eu nem sei ao certo… já uma outra vez senti isso… mas já foi há um tempo…
Tonks não se conseguiu controlar – Era um senhor idoso? Com uma barba grande?
Kurt deu uma pequena risada e olhou para ela de uma maneira que a fez ficar corada de novo e desejando não ter aberto a boca.
– Sim, era. Era um homem poderoso, à sua maneira. Muito gentil, simpático… creio que não encontrou o que veio à procura… ele não estava preparado como vocês estão para conseguirem o mesmo…
Severus estava quase em choque. – Mas você sabe o que viemos cá fazer? Como…?
Kurt interrompeu-o. – Senhor Snape, sei mas ao mesmo tempo não sei; é complicado de explicar. – ele ficou com um ar mais grave, confuso e mais sabedor ao mesmo tempo – Acho que ao ver as pessoas correctas me lembro um pouco do que parece que eu já esqueci… sim, o tal senhor explicou-me por alto o que se passava comigo, mas isso agora não interessa muito. – e voltou-se a dirigir a eles– Mas então, força! Façam o que têm a fazer. Ah, só não me façam recordar o que tenho na cabeça de novo. Se guardei por alguma razão foi, e acho que não é nada boa. – e ficou a olhar para eles como uma certa ansiedade.
Nem eles sabiam por onde haviam de começar exactamente; a situação era tão estranha! Severus e Tonks, mesmo assim, tentaram fazer como o combinado: enquanto ela falava com Kurt acerca dos seus gostos e paixões, Severus tentava penetrar a barreira intransponível que era a mente dele.
- É verdade! Tinha-me esquecido – começou Tonks com um ar animado – não me chegou a dizer do que mais gosta para além do parque de diversões…
Muitos minutos passaram. Muitas tentativas fez Severus para ultrapassar a barreira, procurar uma pequena fenda, um pequenino espacinho bastava… embora a conversa lhe agradasse, Kurt parecia não estar plenamente satisfeito.
Mas do que raio é que ele precisa mais? Não se está a lembrar de nada feliz? Claro que está, mas porque é que não funciona? O que é que falta? Severus já estava a ficar exasperado. Tonks pelo contrário! Estava cada vez mais animada a falar dos gostos de Kurt, surpreendendo-se que eram muitíssimos parecidos aos dela. Parecia também que ele estava mais animado, pois as suas ‘camadas protectoras’ estavam ligeiramente mais flácidas, embora isso de nada servisse a Severus, que continuava sem ver uma brecha. Estava muitíssimo concentrado quando uma resposta a uma pergunta de Tonks o fez despertar com um sentimento estranho.
- Então, mas porque é que está sozinho? Não se apaixonou por ninguém? Uma pessoa como você, não sei como está sozinho!
- Oh sim, eu apaixonei-me… mas ela morreu passado pouco tempo. Infelizmente parece-me que me esqueci de muitos pormenores acerca desse tempo, nem sei bem como isso foi possível, e lembro-me que ela tinha umas roupas diferentes, mas que eu na altura não achava nada de mais. –
Tonks percebeu que esse episódio se teria passado antes do poderosíssimo Obliviate, e ela seria feiticeira.
- Tu fazes-me lembrar muito ela, mas no melhor sentido. És muito bonita, tanto de personalidade como fisicamente. Sinceramente, se eu fosse mais novo muito provavelmente iria fazer-te a corte – disse com um piscar de olhos.
Os sentidos de Severus dispararam. O QUÊ?????
Tonks ruborizou um pouco. Kurt continuou como se não tivesse reparado na mudança de expressão dos dois – A relação que vocês têm é aquela que eu mais desejaria para mim e para a minha amada… mas retirando as hesitações que pelos vistos continuam a ter um com o outro – disse ele agora divertido.
Tonks e Severus olharam-se e desviaram o olhar rapidamente.
- Por amor de deus! – disse Kurt – Vocês não percebem que esse tempo que perdem com hesitações me deixa de rastos? Eu não me declarei a tempo e horas, e o resultado está à vista! Perdi tempo a tentar ser ‘demasiado aos poucos’ um amigo especial… tal como ela. Passaram-se anos. Anos! Quando finalmente conseguimos superar os nossos medos, foi tarde de mais… vocês de certeza que não queriam que algo semelhante se passasse convosco!
Eles ficaram a ponderar nas palavras de Kurt. Morreriam se o outro morresse também, já não conseguiriam viver um sem o outro; a dor seria demais.
Kurt percebeu o que eles estavam a pensar. – Não, não morreriam… - eles ficaram surpreendidíssimos – E isso é que é o pior. Eu também pensei que morreria, fiquei tão mal que nem queiram saber; nem conseguem imaginar. – agora Kurt estava com uma expressão de dor no rosto.
– Fiquei vivo, se é que se chama viver à morte pessoal que sentia… por favor, peço-vos, vejo-vos como meus filhos, não aguentaria ver-vos sofrer como eu sofri. – e acrescentou olhando para eles – Façam um favor a si próprios e acabem com esse teatro. Vocês amam-se, eu já notei há muito tempo, mesmo antes de vocês saberem o que sentiam a respeito. Também assisti à evolução desse amor, desse desabrochar magnífico. Apenas isso me faria o mais feliz dos homens, ver-vos como vocês próprios querem estar. É a última coisa que vos peço antes de se irem embora.
Tonks e Severus perceberam logo o que ele queria dizer com aquilo. Tonks então dirigiu-se a Severus decidida. Só aí é que ele reparou que ela estava a ponto de chorar. Mais uma vez, ele viu algo mais por detrás daquela triste expressão… viu o mesmo fogo que vira nela na noite do baile a passar através dos olhos dela na sua direcção, deixando-o preso, sem reacção, apenas ansiando por ela. Embora ela viesse rápido, a ele pareceu-lhe que estava a demorar uma eternidade a chegar a ele, logo, ele também foi na sua direcção sem despregarem os olhos um do outro. Apenas eles aparentavam estar no salão.
O beijo que se seguiu foi mais apaixonado do que o último. Foi libertador, de certa forma. Ambos estavam num mundo só deles, sem que nada os pudesse preocupar. Afinal, tudo estava como deveria estar! Kurt tinha razão… sempre tivera… mas Tonks ainda não estava 100% convencida. Havia ainda uma questão a preocupá-la, mas que agora ela momentaneamente esquecera. Severus era agora o seu mundo, nada mais importava no momento.
Subitamente, ambos se aperceberam que estavam na mente um do outro, sem qualquer barreira natural, e que entre eles essa barreira sempre estaria aberta. Era como se Tonks se tivesse lembrado de tudo o que esquecera de Legilimância aquando da morte de Remus. Agora que as suas mentes estavam unidas, tiveram a mesma ideia: porque não tentarem os dois em conjunto? Suavemente, o beijo terminou e ambos olharam para Kurt. Este estava emocionadíssimo, e mais feliz do que nunca. Não demorou muito até se encontrarem com a barreira mental dele, que por sinal apenas parecia uma folha fluida de papel. Severus queria atravessar à força, mas Tonks acalmou-o. A consciência dela aproximou-se mais da barreira até a tocar. A cada toque, a barreira voltava a firmar-se mais um pouco. Foi então que ela teve uma simples ideia: começou a acariciar a barreira como se fizesse festinhas a um animal fofucho. A reacção foi instantânea: a mente abriu uma pequena fresta – era o que Severus precisava.
Com a força dos dois em conjunto, conseguiram entrar na mente de Kurt. Nunca pensaram que houvesse tanta confusão de mistura de recordações escondidas. Levaram bastante tempo a reorganizar a informação, retendo-a em si mesmos, e evitando ao mesmo tempo que essa informação escapasse do ‘cofre-forte’ e fizesse lembrar Kurt de tudo o que tentara apagar da sua memória.
Quando a ‘sessão’ acabou, Tonks e Severus estavam completamente arrasados. Ele tinha sido realmente um excelente oclumens e um grande auror. O esforço que haviam feito tinha sido tremendo.
Quando abriram os olhos, repararam que Kurt estava inconsciente. É normal, não está habituado a que lhe invadam a mente, mesmo não tendo más intenções…
Só aí eles repararam como estavam: ambos ajoelhados, de frente um para o outro e de mãos dadas… aliás, mais concretamente agarradas! Faziam tanta força a agarrar o outro para conseguir energia que as mãos estavam brancas. Ao ficarem calmos, tentaram separar-se um do outro, sem sucesso.
- Nunca tive tanto trabalho a entrar na mente de alguém… nem fiquei tão estafado!
Tonks quase se riu, se tivesse forças para isso. – Então ainda bem que eu vim… assim foi mais fácil, não? Parecia que não lhe estavas a apanhar o jeito…
- Eu tinha a situação sob controlo… - disse Severus a olhar para o pouco chão que havia entre eles. O cabelo negro tapava-lhe os olhos.
- Pois, sim, claro… - retorquiu ela sarcástica, ficando de seguida a encará-lo com doçura. – Severus, o que se passa?
Ele não respondeu, largando uma mão dela e levando-a aos olhos. Parecia que estava a pensar em algo que o entristecia, e muito, pois começara a tremer.
- Severus… - começou Tonks preocupada.
- Eu nunca perdi o controlo e não vou começar agora!
- Mas…? Do que é que estás a falar?
- Eu… preciso de descansar – disse ele apercebendo-se da sua situação – Desculpa, apenas preciso de…
Tonks deu um pulo quando ele caiu para o lado. – SEVERUS!!!!
(continua...)
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