Conversa sinistra no vestiário

Conversa sinistra no vestiário




Indiferente a fome que começava a apertar o estômago, Harry corria, ofegante, até a biblioteca da escola. Havia gravado mentalmente o nome do livro que a garota oriental da Corvinal havia mencionado. Harry tinha certeza que, nas páginas daquele livro, encontraria as respostas que queria e descobriria, finalmente, quem era o “M.E.”.
Os corredores estavam vazios, graças à hora do almoço, e Harry pôde se esgueirar facilmente por eles. Quando chegou na biblioteca, a respiração saía com dificuldade.
Olhou para Madame Pince, que manejava alguns pergaminhos sobre uma mesa.
-Por favor, Madame Pince – começou a pedir ele, forçando a voz para que esta saísse entre suas exageradas tomadas de ar. – Eu estou precisando do livro... “Lendas do Mundo Mágico”.
Madame Pince olhou para o rosto do garoto à sua frente, com certa desconfiança no olhar. Franziu levemente as finas sobrancelhas e respondeu.
-Desculpe, mas esse livro não está disponível.
Harry passou a mão pela testa suada, inquieto. “Só faltava ele estar na Seção Reservada”, pensou ele, amargamente. “Se estiver, vai dar um trabalhão para eu conseguir uma autorização de algum professor”.
-Ele não está... Na Seção Reservada, está? – perguntou Harry, esperançoso.
Madame Pince soltou um longo suspiro.
-Não, ele não está, Potter.
-Então... Por que ele não está disponível? – indagou Harry, sacudindo os ombros. – Alguém pegou-o para ler, é isso?
-Não, Harry, ninguém o pegou. Mas eu tenho ordens expressas de Dumbledore para não liberar o livro para nenhum aluno.
Harry sentiu-se atordoado.
-Mas... Por que?
-Os motivos são confidenciais, Potter. Assunto que só tem a ver com a direção da escola e os professores. Recebi ordens de esconder o livro e é o que eu farei. Agora, com licença que tenho algumas coisas para fazer.
Harry saiu da biblioteca, um pouco chateado. Enquanto andava, ficou pensando... Por que a direção haveria de esconder o livro? Será que era por causa da vida do tal “M.E.”, que estava escondida entre as páginas? Mas, se fosse isso, então o “M.E.” não seria apenas uma lenda. Mas como algo que existiu pode ser considerado lenda? Afinal, qual era a grande importância dele e por que esse “M.E.” estava matando?
No caminho, com as engrenagens do cérebro a mil, Harry encontrou Úrsula.
A menina, com o rosto angelical e a bondade de sempre, aproximou-se de Harry.
-Olá, Harry! – cumprimentou ela, eufórica. – Por que não almoçou com o Rony e a Hermione?
-Ah, eu precisava fazer uma pesquisa na biblioteca.
-A Mione estava muito chateada, você sabia? – perguntou ela, o encarando docemente. – Você... brigou com ela?
-Não diria que foi uma briga. Foi apenas um... Como eu poderia chamar? Talvez... Um desentendimento.
-Ela parecia chateada e preocupada na mesa do almoço – disse Úrsula, olhando para Harry. – Sabia que eu acho que vocês poderiam formar um belo casal?
Harry riu.
-Ah, que isso, Úrsula... Mione é minha amiga. Só isso.
-Mas poderia ser outra coisa – falou a garota, decidida.
-Não, não daria certo... – disse Harry, pensativo. – Mas posso te garantir que ela e o Rony poderiam sim fazer um belo casal.
-Eu não acho – falou Úrsula, logo em seguida, aumentando ligeiramente a voz. Depois, num tom mais ameno, completou: – Você e ela nasceram um para o outro.
Harry apenas sorriu para a garota. Úrsula era realmente um anjo. Sempre queria o bem das pessoas.
-Bom, estou indo agora – disse a garota, afoita, balançando os longos cabelos dourados. – Ah, eu acho melhor você ir atrás da Hermione. Ela está precisando de carinho.
Úrsula se afastou, dando antes uma piscadela para o garoto. Harry continuou a caminhar. Quando se aproximou da escadaria de mármore, Harry encontrou Cho Chang que, ao vê-lo,virou o rosto. Desde o início daquele ano, não conseguira trocar uma palavra com a garota.
Ainda faltavam alguns minutos para a próxima aula, e Harry resolveu caminhar um pouco pelo castelo, para esfriar a cabeça. Ia seguir o conselho de Úrsula. Pediria desculpas a Hermione, embora soubesse que ela relutou em deixa-lo ir a biblioteca porque estava omitindo alguma coisa sobre o “M.E.”.
Harry abandonou as paredes frias do castelo e saiu para os jardins. O sol tinha pouco brilho e não conseguiu melhorar o tempo frio. Nos gramados da escola viam-se diversas folhas de árvores de todas as cores. O outono se mostrava presente nos terrenos de Hogwarts.
Harry chegou até o campo de quadribol. Começou a caminhar ao redor do campo vazio. O gramado estava bem aparado e conservado. Passeando ao lado das arquibancadas, Harry teve vontade de começar a praticar seu esporte preferido ali mesmo. Afinal, fora privado de praticá-lo no ano anterior. Sentia muita falta de sentir o vento indo de encontro ao seu rosto, os gritos alvoroçados da torcida ao vê-lo capturar o pomo. Logo depois de poucos minutos, escutou o sinal para a próxima aula.
Parou subitamente, soltando um longo suspiro, e virou-se para ir ao castelo. Teria ido, se não tivesse ouvido um barulho estranho vindo do vestiário do campo.
O rapaz congelou. Seu coração disparou. Alerta, puxou a varinha de dentro das vestes.
Apurou os ouvidos. Eram duas vozes. Duas pessoas pareciam estar conversando.
Em posição de ataque, Harry resolveu espiar quem discorria dentro do vestiário. Com passos suaves e soturnos, caminhou devagar. Seus passos faziam um pequeno ruído ante a grama aparada. Harry chegou bem próximo a entrada do vestiário. Quando viu que não podia mais avançar, estancou firmemente. Ainda com a varinha nas mãos, começou a escutar a conversa, agora nítida, entre as duas pessoas.
-Você... Não pode fazer isso comigo! – exclamou uma das vozes, em um tom amedrontado.
Harry teve a impressão de que conhecia o dono daquela voz...
-Claro que posso! – disse o outro, ameaçador. – Você poderia arruinar todos os meus planos. Você já me atrapalhou uma vez na vida, e não vou deixar que faça isso de novo!
A voz deste era jovem, de algum rapaz. Tinha um tom gélido que se assemelhava com a voz de Voldemort. Harry tinha absoluta certeza de nunca tê-la ouvido. De quem seria, então?
-O que você quer que eu faça? Eu... Faço qualquer coisa! Por favor, tenha piedade... Não me mate!
O outro riu. O diálogo era estarrecedor para Harry. Era como ouvir um pai tendo medo de um filho adolescente. Por que aquele bruxo adulto temia tanto o outro, que a voz indicava ser tão jovem?
-Você acha que tem alguma chance de eu te deixar vivo? – perguntou o outro, rindo novamente, fazendo com que cada poro do corpo de Harry estremecesse. – Eu voltei para acabar com todos vocês. Dois já morreram, infelizmente, pois perderei o prazer de mata-los com minhas próprias mãos.
-Mas eu nem era do grupo deles! – exclamou o outro.
-Porém os ajudou, que eu sei! Não tente me fazer de idiota pois você sabe que eu não sou. Por sua culpa eu quase fui parar em Azkaban. Por sua culpa eu tive que ficar preso naquele amuleto por tantos anos!
Harry estava atordoado. Aquele bruxo não valia nada. Se quase foi condenado a Azkaban... E que amuleto era esse? Como alguém pode ficar aprisionado num amuleto?
-Por que precisa me matar? Por que não vai atrás dos outros? Eles que tramaram contra você!
-Eu sei disso... Eu sei disso... – sibilou o outro, calmamente. – Preciso matar você porque tu serás a indicação do meu retorno. Sua morte chamará a atenção de cada um deles.
Houve alguns segundos de silêncio. Harry podia ouvir a respiração ofegante do bruxo. Tentou recordar de quem era aquela voz.
Na sua distração, Harry esqueceu-se por completo do local delicado onde se encontrava. Despertou do devaneio ao ouvir o baque de algo batendo com força no chão do vestiário. Harry empalideceu. Lembrou quem era o dono de uma voz. Parecia que a adrenalina do momento fizera seu raciocínio ficar lento. Ouviu passos vindo em direção à saída do vestiário.
Um dos bruxos estava saindo! Dessa vez, Harry teve que forçar para que seu raciocínio corresse. Olhou rapidamente ao redor, procurando algum local em que pudesse se esconder com segurança. Resfolegando, correu até o vão sob uma das arquibancadas. Mal tinha se abaixado no canto escuro quando ouviu os passos ecoarem pelo gramado do campo.
Harry controlou o máximo que pôde a respiração. Depois que o barulho dos passos tornou-se inaudível, Harry aguardou mais alguns segundos. Quando teve a impressão de que o bruxo realmente tinha se afastado, saiu de seu improvisado esconderijo. Limpou as vestes e suspirou. Com cautela, olhou se o bruxo já tinha se afastado. Quando avistou o campo deserto, caminhou até a entrada do vestiário. Precisava espionar o outro bruxo.
Harry espichou o pescoço para dentro. Ainda tinha o corpo trêmulo. Afinal, aquele que estava lá dentro não ia muito com a sua cara.
Foi neste momento que seu coração disparou, amedrontado. A poça vermelha de sangue quase alcançava a porta. Mais à frente, o corpo estava esparramado no chão. Os olhos estavam esbugalhados. Havia gotículas de sangue na parede. No centro do corpo estava a origem de todo aquele sangue.
Um enorme buraco se formava na altura do coração. Aquela região estava completamente aberta. O pobre professor havia sido assassinado de forma brutal...
Harry ficou tenso. Ele tinha realmente reconhecido a voz do professor Snape. Talvez, se tivesse se intrometido na discussão, o professor não estaria ali, jogado no chão, todo ensangüentado... Mas será que ele poderia ter feito alguma coisa diante do outro bruxo que estava lá dentro, que parecia ser tão cruel?
Quando olhou novamente para o corpo, Harry reparou algo na testa de Snape.O garoto aproximou-se mais para enxergar melhor. Havia duas letras maiúsculas escritas com sangue.
Eram elas. O mesmo “M.E.” que Harry tinha visto, naquela manhã, perto do corpo de Pansy Parkinson.
Inquieto, Harry virou-se e saiu do vestiário, rápido como um relâmpago. Atravessou o vasto gramado, ofegante. Primeiramente, pensou em ir até a sala e avisar da morte do professor Snape. Mas, pensou, será que isso era certo? Harry se lembrava bem de que tudo que acontecia de estranho na escola, a culpa geralmente caía para o lado dele. Foi assim quando abriram a câmara secreta. Harry havia guardado na memória a sensação que sentia com a desconfiança dos outros, que acreditavam piamente que ele era o herdeiro de Slitheryn.
-Não, não posso avisar na frente dos outros alunos – disse para si mesmo, quando se aproximava do castelo. – Só se eu... É, isso... Vou avisar pessoalmente ao Professor Dumbledore.
Com passos largos, rapidamente ele se aproximou do castelo. Tinha a mente concentrada no que diria ao diretor. Quando se deu conta, Harry notou o grupo de alunos do terceiro ano, que estavam ao redor de um unicórnio albino. Hagrid estava ao lado do bicho, mas tinha o olhar fixo na turma de estudantes.
Harry apressou ainda mais os passos e abaixou a cabeça, tentando ao máximo passar despercebido pelos alunos. Tinha quase certeza que conseguiria, até que...
-Vejam! A roupa daquele garoto está suja de sangue! – comentou uma garota, assustada.
Harry empalideceu na hora. Olhou discretamente para os alunos. Os olhos de cada um, antes voltados para o belo unicórnio, agora se mantinham fixos nele e nas suas vestes, que tinham uma mancha de sangue bem na lateral. A poça de sangue tinha manchado sua roupa, e Harry nem tinha percebido.
-Esse menino é o Harry Potter! – exclamou um garoto de voz rouca.
Todos soltaram exclamações de surpresa. Hagrid virou-se devido a menção do nome de Harry e olhou para o garoto. Seus olhos se arregalaram ao ver a mancha de sangue na roupa do garoto.
-Oh, minha nossa! – disse o gigante.
Hagrid levantou-se do tronco de árvore em que estava descansando seu corpanzil enorme, passou pelo unicórnio e correu em direção a Harry.
-Harry! – murmurou ele. – Por que sua roupa está manchada de sangue?
Harry olhou do amigo para os alunos que o olhavam espantados. Como ele esperava, tudo iria recair pro lado dele.
-Hagrid...
Foi a única coisa que o garoto conseguiu mencionar. Harry pensava o que explicar. Se dissesse a verdade, muitos iriam imaginar que quem havia matado o professor Snape era ele. Se escondesse o fato, quando descobrissem iriam incrimina-lo ainda mais, já que teria omitido o crime.
Decidiu-se por contar. “De todos os jeitos eu vou me ferrar”, pensou ele.
-Bom, é que... o professor Snape...
-O que tem ele, Harry? – perguntou Hagrid, agoniado.
-Ele foi assassinado dentro do vestiário! – disse ele, de uma vez.
Os alunos se apavoraram. Harry podia compreender bem esse medo. Era a segunda morte no mesmo dia. Um ar sinistro e ameaçador tomava conta de cada um daqueles alunos.
Hagrid começou a caminhar em direção ao campo de quadribol. Os alunos, sem saberem o que fazer, seguiram o professor. Harry foi junto de Hagrid, que durante o caminho fez algumas perguntas para o rapaz.
-O que você estava fazendo no campo de quadribol á essa hora, Harry? – perguntou o gigante.
-Eu estava passeando... Precisava tomar um ar fresco. Enquanto caminhava, ouvi um barulho no vestiário e resolvi verificar. Depois entrei lá, e encontrei o corpo do professor.
Harry tinha omitido alguns detalhes. Tinha resolvido que só Rony e Hermione saberiam deles.
-Espero que todos acreditem no que você está dizendo, Harry – disse Hagrid, afavelmente, colocando a mão no ombro do garoto.
-Eu também espero, Hagrid... Eu também.
Chegaram logo aos vestiários. Hagrid parou firmemente perto da porta e olhou para os alunos, que estavam afoitos e ao mesmo tempo nervosos.
-Por favor, esperem aqui.
Hagrid entrou no vestiário. Harry não pôde deixar de observar que a poça de sangue parecia ter aumentado.
-Oh, minha nossa! – exclamou o guarda-caça, ao ver o corpo ensangüentado de Snape.
Harry deu uma rápida espiada. O “M.E.” continuava lá, na testa pálida do pobre professor. Nem um homem tão rude como Snape merecia uma morte terrível como aquela.
Alguns alunos espicharam os pescoços para olharem o corpo.
-Deve ter sido o Potter – disse a voz de uma menina, que Harry logo reconheceu.
-Não é não, Laurie – cochichou o garoto.
“E o tal Chris”, pensou Harry, apurando os ouvidos para ouvir a conversa, que transcorria aos cochichos.
-Você não vê! – continuou Chris. – Olhe lá, o “M.E.”. Eu disse que é ele quem está matando. Ele não é simplesmente uma lenda. Alguém encontrou o amuleto!
Harry, decidido, virou-se para o garoto e o pegou pelo braço.
-Mas... o que é isso? – perguntou Chris, atônito.
-Preciso perguntar uma coisa para você – respondeu Harry, passando pela aglomeração dos alunos do terceiro ano.
Quando se distanciaram dos alunos, Harry parou e largou o menino. Chris o encarava, com raiva.
-Para que isso? – indagou ele, nervosamente. – Acha que só porque é o famoso Harry Potter pode ir puxando os outros do jeito que quiser?
-Desculpe... Mas é que eu preciso muito da sua ajuda.
-Pra que? O famoso Harry Potter precisando da minha ajuda? Ah, não posso acreditar...
-Por favor, me escute! – pediu Harry. – Eu estou muito cismado com aquele “M.E.” que o assassino está deixando marcado nas pessoas que ele mata. Você sabe de quem são essas iniciais, não sabe?
Chris olhou-o com desconfiança.
-Como sabe que eu sei?
-Eu ouvi uma conversa entre você e seus amigos, e...
-Ah, quer dizer que o famoso Harry Potter tem o desagradável hobby de ficar ouvindo a conversa dos outros? Que coisa feia!
-Quer fazer o favor de me ouvir? – perguntou Harry. – Preciso saber quem é esse “M.E.”. Você pode me explicar?
Christian franziu as sobrancelhas.
-Por que deveria? – disse, num tom irônico.
Harry sorriu e respondeu ainda mais ironicamente:
-Porque eu sou o único que acredita que esse “M.E.” é esse tal bruxo que é considerado uma lenda. Alem disso, tenho informações sobre uma conversa entre esse “M.E.” e o professor Snape.
Harry notou a excitação que Chris sentiu ao ouvir que poderia ter novas informações. No entanto, ele fingiu pensar. Depois da falsa hesitação, respondeu:
-Tudo bem. Eu te explico quem é o “M.E.”.
Harry sorriu.
-Mas com uma condição: você deve me dar detalhes sobre essa tal conversa que você escutou.
-Tudo bem, eu conto tudo, nos mínimos detalhes – disse Harry. – Pode explicar!
-Prefiro explicar em outro lugar – falou Chris. – Vamos até meu dormitório. Tenho diversos materiais sobre o “M.E.”.
-Que bom! – exclamou Harry. – Vamos?
-Vamos. Não terei mais aula mesmo. Vou te explicar tudo sobre ele.
Começaram a caminhada. Permaneceram sem trocar palavras durante o trajeto. Quando se aproximavam do castelo, Harry perguntou:
-Qual o nome desse tal “M.E.”?
Chris o encarou e disse.
-Michael Evans. Nem o nome você sabia?
-Não.
-Pois se prepare. Você vai saber tudo sobre ele. Vai ficar muito informado sobre Michael Evans. “A lenda viva”.
Afobados, os dois entraram no castelo.

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