Primeira Impressão [100%]
Annya deslocou-se pelo dormitório observando as quatro camas- que se encontravam do seu lado direito- todas com quatro colunas cada e um dossel a envolvê-las. Annya deslocou o olhar, focando o olhar nos armários de madeira, velhos, que encontravam-se do seu lado esquerdo, cada um de frente para uma cama.
Os olhos da morena pararam por fim na última cama, encostada à parede feita por várias pedras de granito, e sem qualquer hesitação aproximou-se lentamente desta.
Colocou as suas malas na cama e observou o quarto em seu redor. O quarto era escuro, iluminado apenas por uns castiçais que pairavam alguns metros acima de Annya, havia apenas uma pequena janela, situada no topo da parede de frente para a porta.
Os passos da garota pareciam ecoar pelo quarto. Annya observou o tecto com atenção. Os seus dedos tocaram a parede e esta tacteou-a lentamente, enquanto que uma das suas mãos deslizavam até à sua blusa.
A parede era muito húmida e fria e só mesmo a magia impedia o crescimento de musgo no interior desta.
Trazer-lhe-iam aquelas paredes alguma informação sobre as suas fontes?
Annya fechou os olhos.
Uns olhos verdes apareceram na sua mente, carregados de ódio.
Não a assustavam, apesar de ela saber que pertenciam ao homem mais temido do Mundo Bruxo, pelo menos do Mundo Bruxo Europeu, ou Mundo Bruxo Inglês. A ela nada assustava. Inconsciente? Não. Talvez apenas já tivesse presenciado coisas demasiado horrendas para poder ter um medo tão humano. Annya não se lembrava qual fora a última vez que sentira o medo a apoderar-se do seu corpo, talvez nunca o tivesse tido ou então era apenas demasiado pequena para ainda conseguir lembrar-se de tal.
Aqueles olhos não a assustavam, apenas a intrigavam. Algo neles era-lhe bastante familiar, familiares o bastante para incomodá-la. Talvez pelo ódio que estes lhe transmitiam… sentimento com o qual Annya já se havia familiarizado.
Annya olhou confusa para o resto do quarto. Era ódio puro. Porque a odiaria ele?
Talvez por ser mestiça… mas mesmo assim isso não era uma razão. Mas por outro lado, loucos não agem pela razão. Hitler matara milhões de judeus por ódio, sem ter qualquer motivo para odiá-los, apenas por…ser louco.
O chiar que a porta causou ao ser aberta despertou Annya dos seus próprios pensamentos. Esta observou a porta curiosa.
Quatro garotas, tinham quase todas a mesma altura e que deveriam ter a mesma idade que Annya, entraram. Uma delas, que tinha cabelos castanhos e olhos de igual cor, reparou em Annya e apressou-se a fazer um ar de esgar, depois voltou-se para as outras e murmurou algo, estas depressa olharam para Annya, que retribuiu-lhes um olhar desagradável.
Uma delas aproximou-se com um ar de nojo.
- Que pensas que estás a fazer mestiça?- Perguntou com uma voz irritante e estridente.
Annya olhou com desdém para a garota, que tal como a outra tinha cabelos castanhos alisados e um ar enjoado, depois fez um sorriso trocista.
- Acho que é bem claro.- Respondeu.- Não é preciso ser-se muito esperto para perceber-se.
A garota que falara primeiro urrou de raiva, mas não teve tempo de dizer nada.
- Essa é a minha cama.- Disse uma outra com o mesmo tom irritante, mas menos estridente.
Annya olhou da cama para a garota e depois fez um pequeno sorriso, este continuava trocista.
- Assério? Não vejo aqui o teu nome.- Respondeu com sarcasmo.
- Estás a exceder-se, Mattson.- A quarta garota falou. Esta, ao contrário das outras, tinha uma voz grave. Era mais alta que as outras, com praticamente a mesma altura que Annya. Os cabelos desta também a diferenciavam das outras, eram negros e curtos, cobrindo-lhe apenas as orelhas, e com uma franja lateral que lhe cobria parte do olho direito. Era magra, mas mesmo assim o seu corpo era constituído por belas curvas, e coberto por uma pele alva. Era bonita, com os traços não vulgares, que diferenciavam-na ainda mais das outras três garotas que entraram no quarto, mas parecia não dar grande importância a esse facto. Mas em todas as suas características, o mais impressionante eram os seus olhos. Um cinza claro e triste, profundo, que tentava a todo o custo ocultar os seus sentimentos. Olhava para Annya com um olhar feroz, enquanto a outra retribuía-lhe com um olhar zombeteiro.
A primeira miúda que falara deu alguns passos na direcção de Annya. Esta sentou-se na cama, inclinando o seu corpo para trás e apoiando-o as suas mãos e braços esticados, depois observou todas as suas companheiras de quarto com um desdém.
- Vais matar-me?- Perguntou com ironia.
A que falara em último lugar aproximou-se com passadas ferozes.
- Vou acabar com a tua mania!- Ameaçou-a.
Annya sorriu.
- Pensam que têm hipóteses?- Perguntou gargalhando silenciosamente.
A que falara em segundo lugar, que observara Annya com atenção, olhou-a admirada e incrédula, soltando de seguida uma pequena exclamação de admiração, aproximou-se também.
- Não sabes contar?- Perguntou.- Somos quatro e tu és só uma, quem está em desvantagem?
Annya não apagou o sorriso que permanecera no seu rosto até então.
- Mas nem com a junção de todo o vosso poder vocês conseguem valer por uma pessoa normal, e eu valho, no mínimo, por dez.- Respondeu num tom indignado.- Creio que isso me põe em grande vantagem.
A garota, que ainda não se havia pronunciado, deu um passo em frente, erguendo a varinha, abrindo de seguida os lábios prontos para murmurara um feitiço. Mas surpreendentemente, Annya foi mais rápida, e com um gesto igual, porém mais rápido e eficiente, a garota fez aparecer um raio de luz vermelha, que deslocou-se bravamente na direcção da garota que tentara amaldiçoar Annya atingindo-a no peito e fazendo-a pairar uns centímetros acima do chão e depois arremessando-a contra a parede. Esta, espantosamente, ficou suspensa no ar, com o corpo encostado à parede. As mãos da garota correram à sua garganta, enquanto emitia ruídos praticamente abafados. Parecia estar a sufocar.
As amigas olhavam para esta num misto de espanto e terror. Uma delas olhou para Annya- que mantinha um olhar imparcial e a varinha erguida e apontada à jovem que se contorcia no ar- com um olhar suplicante.
O cenário permaneceu assim durante alguns segundos, até que Annya baixou a varinha fazendo a garota cair no chão e gemer de dor.
- Acho que temos que estabelecer umas regras.- Disse com frieza olhando para todas as outras com alguma crueldade. As outras anuíram com a cabeça.- Primeira: Esta cama é minha.- Disse apontando para a cama.- Segunda: Respeito é algo que me agrada, portanto é bom que acabem com as tentativas de me ofenderem chamando-me mestiça, senão ainda acabam como a vossa amiguinha, com falta de ar.- A jovem que ainda encontrava-se no chão, arregalou os olhos, desviando-os de seguida.- Terceira: Não quero ser incomodada. Quarta: Nada de contar o que se passou aqui hoje, nem nenhuma destas regras.
Deu alguns passos em frente e olhou com fúria para as colegas.
- Se quebrarem alguma das minhas regras, podem crer que não vou ter tanta misericórdia. Entendido?- As que tiveram coragem anuíram com a cabeça. Annya fez um sorriso doce e deu uns passos em frente, fazendo as suas colegas recuarem alguns também.- Bom! Agora se me dão licença, tenho uns assuntos a tratar.
Não esperando pela resposta das outras, que muito possivelmente também não lha iriam dar, Annya saiu do quarto.
Observou a sala em seu redor.
À primeira vista, ninguém, para além de Annya, se encontrava lá presente. A sala parecia estar completamente vazia. A escuridão pairava sobre esta. Não havia janelas que poderiam iluminar o salão comunal com a luz do luar, a única luz que poderia existir era proveniente da lareira, e esta encontrava-se apagada. A morena reparou nas candeias que pairavam alguns metros acima de si, próximas ao tecto. Estas estavam igualmente apagadas.
Annya não sabia o que estava ali a fazer, calculava que quem procurava não encontrava-se ali.
Desceu lentamente as escadas que levariam ao seu dormitório, sempre apoiada pelo corrimão.
A sala comunal dos slytherins era, apesar de escuro, muito grande. Várias poltronas preenchiam a sala, sendo que a maioria delas rodeava a lareira, onde poder-se-ia ver uma faixa verde com o emblema de Slytherin. Uma grande mesa encontrava-se no meio do salão, mesa que normalmente deveria encontrar-se cheia de estudantes e dos seus livros. Umas estantes baixas encontravam-se encostadas às paredes forradas com papel com desenhos de vários brasões verdes e prateados. Algumas palavras em latim- escritas em igual cor- rodeavam esses brasões, enquanto que desenhos de serpentes deslizavam lentamente no papel que cobria o tecto. As serpentes pareciam por vezes sair do papel do tecto e esvoaçarem ligeiros centímetros, próximas a este, para depois retornarem ao mesmo. No chão havia um tapete com a mesma decoração. O tapete era preto, com desenhos imperceptíveis decorados a verde-escuro e prateado. Nas estantes poderiam encontrar-se alguns livros de capas escuras, que eram certamente de Magia Negra.
Annya retirou a varinha do seu manto e deslocou-se lentamente até uma das poltronas que encontravam-se de frente para a lareira.
As suas mãos deslizaram lentamente pela poltrona. Esta para além de confortável era macia e fresca.
Annya ergueu a sua varinha apontando para cima da poltrona.
- O que fazes aqui a estas horas, Casanova?- Sussurrou.
Conner permaneceu parado, não parecendo surpreendido com o aparecimento repentino de Annya. Os seus olhos continuaram fixos nas pequenas fagulhas acesas que encontravam-se no meio das cinzas. Não parecia minimamente preocupado com a varinha que estava-lhe apontada à cabeça. Parecia ponderar em algo, o que fez com que permanecesse calado durante alguns segundos.
- A pergunta também se aplica a ti, Mattson.- Respondeu-lhe sem voltar o rosto para observá-la.- O que fazes aqui a estas horas?
Annya deu uns passos em torno da poltrona antes de responder a Conner, a sua varinha encontrava-se sempre apontada à cabeça do rapaz, que permanecia com os olhos fixos nas cinzas da lareira.
- Não conseguia dormir.- Mentiu-lhe. Conner moveu ligeiramente a cabeça e observou Annya por uns segundos, parecendo avaliar esta.
Os olhos do rapaz retornaram às cinzas.
- Eu também não.
A garota deu alguns passos em torno da poltrona onde Conner encontrava-se sentado. Os dedos deste, que até então agarravam firmemente os apoios de braços da poltrona, bateram com as suas cabeças nestes freneticamente. Os seus olhos, apesar de fixos na lareira, pareciam não observar esta. O seu braço esquerdo que até então estivera deitado sobre o apoio de braços, ergueu-se e, apoiando-se apenas pelo cotovelo. A sua cabeça apoiou-se na sua mão esquerda, enquanto que os dedos da sua mão direita continuavam a fazer pequenos e rápidos batuques no apoio de braço.
A varinha de Annya tocou na nuca de Conner, mas este mesmo assim não pareceu ficar minimamente assustado.
- Porque fizeste aquilo?- Sibilou-lhe a garota aos ouvidos, sempre com a sua varinha apontada à nuca deste.
Conner ficou imóvel durante alguns segundos, parecendo por momentos não respirar, mas depois virou ligeiramente o rosto para o lado e tentou encarar Annya.
- O quê?- Perguntou com a voz rouca.
Annya deu mais uma volta em torno de Conner, parando desta vez em frente deste, depois baixou-se ligeiramente e apontou a sua varinha à garganta do rapaz. Conner observou Annya com algum desdém, e sem qualquer espécimen de temor nos seus olhos, deixou-se relaxar na poltrona, irritando involuntariamente Annya.
O negro dos olhos do rapaz era igualmente frio, assim como os da maioria dos slytherins, mas a frieza que presidia nos olhos deste não tinha qualquer comparação com a frieza que a garota transmitia quando irritava-se.
- Porque puxaste-me para dentro do castelo?- Na sua voz não havia uma ponta de agradecimento, em vez disso, Conner pôde notar irritação.
Conner observou Annya por mais uns segundos antes de responder. Os seus dedos tornaram a dar pequenos batuques no apoio de braços.
- Não foi para te salvar se é isso que estás a insinuar.- Respondeu num tom gélido. Os seus olhos brilharam intensamente.
Annya ergueu-se, erguendo também a sua varinha, apontando-a então à cabeça de Conner.
- Assério?- Perguntou sarcástica.- Não foi o que pareceu, Casanova.
Conner ergueu-se, obrigando Annya a dar uns passos atrás, mas mesmo assim esta ergueu a varinha apontando-a ao peito de Conner. O rapaz fez um pequeno sorriso.
- Nunca ouviste dizer que as aparências iludem, Mattson?- Respondeu secamente.
Conner deu alguns passos em frente fazendo Annya apontar-lhe a varinha com mais firmeza.
- Vais amaldiçoar-me?- Perguntou sarcástico, lançando uma gargalhada.
- Não.- Respondeu Annya com um sorriso cínico.- Estava antes a pensar em matar-te.
Conner deu um passo em frente lançando uma fraca gargalhada.
Falavam relativamente baixo, o que impedia que os ouvidos curiosos ouvissem a sua conversa.
- Porque será que duvido da tua capacidade em matar?- Perguntou com uma voz trocista. Era mais alto que Annya, esta deveria dar-lhe pelo ombro, mas tal facto não intimidava a morena que encarava-o com um olhar bravo e com a varinha sempre apontada ao peito deste.
Conner sabia perfeitamente que Annya tinha capacidades suficientes para matar alguém, não só o imenso poder que esta demonstrava ter, como também a falta de remorsos presente no seu olhar frio.
Sem grandes esforços ela seria a máquina de matar perfeita. Uma peça fundamental num jogo apocalíptico, sem precedentes, em que ambos os lados dariam tudo para tê-la.
Conner cerrou os punhos e colocou as suas mãos dentro dos bolsos das calças. O sorriso trocista permaneceu nos lábios do rapaz apesar de uma breve reflexão ter feito os pêlos da nuca deste erguerem-se.
- Não tentes pôr-me à prova, Casanova.- Respondeu a jovem num tom de grande sinceridade.- No final não acharias muito agradável.
Conner examinou-a por uns segundos antes de tornar a alargar o seu sorriso.
Annya deu um passo na direcção do rapaz, e quando encontrava-se próximo deste começou a rondá-lo a passos lentos e provocadores.
Deu uma volta em torno do rapaz e então parou atrás deste, deixando-o de costas para si. Conner permanecia imóvel, não sendo minimamente afectado pelas reacções provocantes e frias da garota, o que acabava sempre por irritá~la esta ainda mais.
- Agora voltando à minha pergunta: porque puxaste-me para dentro do castelo?- Perguntou Annya próxima dos ouvidos de Conner, com a sua varinha encostada à lombar deste. Pôde sentir o corpo do rapaz enrijecer, o que causou um pequeno sorriso nos lábios da garota.
Este virou ligeiramente a cabeça para tentar observar o rosto de Annya.
- Porque interessa-te tanto?- Perguntou com um tom igualmente rouco.
Annya deu mais uma volta em torno de Conner, parando desta vez de frente para ele. A sua varinha tornou a encostar-se ao pescoço do rapaz, que desta vez permaneceu com os seus olhos fixos nos de Annya, parecendo tentar penetrar-lhe na mente.
Se Annya não fosse tão segura quanto às suas capacidades de Oclumência possivelmente teria desviado os seus olhos dos negros do rapaz, mas como tal não era o caso, a garota fitava os olhos de Conner, parecendo ela mesma querer entrar naquele pequeno jogo.
Em alguns pontos os dois assemelhavam-se: na sua frieza e ocultação de qualquer tipo de sentimentos e emoções. Características que eram visíveis em quase todos os slytherins, mas que eles haviam aperfeiçoado bastante, Annya em relação à sua frieza, Conner em relação ao encobrimento de tudo o que sentia. Duas tácticas semelhantes que lhes traria grande vantagem contra os seus inimigos, mas, quando aplicadas um contra o outro, o efeito seria o contrário ao pretendido.
Tanto Annya como Conner sabiam interpretar tudo o que o seu oponente sentisse, sem necessitarem de ler-lhe a mente. Capacidade que mais uma vez os punha em grande vantagem, e que mais uma vez não funcionava quando era usada um contra o outro.
Annya fez um sorriso cínico e aproximando-se ainda mais de Conner, deixando o seu corpo a poucos centímetros do corpo do rapaz, sussurrou-lhe aos ouvidos:
- Porque eu não necessitava da tua ajuda, Casanova. Tinha capacidades suficientes para sair de lá sã e salva.- O corpo de Conner enrijeceu-se novamente, o que alargou um sorriso presunçoso nos lábios da morena.- Porque, se não fizeste para salvar-me, puxaste-me até ao portão?
Conner inclinou a cabeça para trás e soltou uma pequena gargalhada praticamente abafada. Depois tornou a dirigir o olhar a Annya, negando com a cabeça enquanto percorria este caminho com esta. Encarou os olhos de Annya com os seus de carvão. Um pequeno sorriso apareceu nos seus lábios e os seus olhos ganharam um pequeno brilho, sinistro e ao mesmo tempo ávido.
Annya baixou a sua varinha lentamente, observando os olhos do rapaz com curiosidade. Mas estes continuaram impenetráveis.
- Tinhas?- Perguntou num tom sarcástico.- Não sabes contar, Mattson? Achas que vencerias uma centena de dementors?
Desta vez foi Conner quem aproximou-se da morena, que havia recuado um passo inconscientemente.
A garota encarou o rapaz à sua frente com alguma fúria. Os seus olhos permaneciam no entanto presos nos negros de Conner. Aquela quase frieza, falta de sentimentos, era até um tanto entusiasmante.
Annya tentou transmitir o seu ódio através de um simples olhar, mas mais uma vez, Conner não pareceu ser muito afectado por este.
Conner quebrou a ligação ao fim de alguns centésimos de segundo em silêncio, e afastando-se de Annya dirigiu-se novamente até à poltrona onde estivera sentado e retornou a tomar o seu lugar nesta. Retirou a varinha das calças, ergueu-a e num sussurro fez aparecer pequenas labaredas na lareira, que iluminaram parte do rosto da morena que as observou surpresa.
Annya permaneceu com os seus olhos fixos nestas até se voltar novamente para Conner. Os seus olhos haviam-se tornado mais escuros que o normal. O rapaz retomou à posição em que se encontrava no inicio de toda aquela conversa. Os seus dedos deram ligeiros batuques no apoio de braço, enquanto que a sua mão livre brincava com a varinha, remexendo-a por entre os seus dedos. Os seus olhos fixaram-se nas labaredas por uns segundos retomando depois aos olhos de Annya.
Annya observava-o com uma enorme fúria. Sabia que não poderia fazer nada ali, qualquer maldição lançada naquele momento poderia acabar por trazer-lhe problemas. Sabia também que Conner tinha a noção disso, e que era provavelmente por esse facto que ele não tinha o mínimo temor por ela. Ou era isso ou então ele não sabia avaliar muito bem os seus adversários. Uma coisa era certa, ele sabia como irritá-la, aquele olhar furtivo e aquela despreocupação consoante as suas ameaças eram suficientes para provocá-la e tirá-la do sério.
- Porque fizeste aquilo?- Repetiu a mesma pergunta mais uma vez, num silvo, já cansada das tentativas de fuga de Conner à pergunta que a tinha levado até ali.
Conner parou de dedilhar tanto na varinha como no apoio de braço e observou Annya durante uns segundos antes de responder-lhe.
- Não foi por nenhum instinto de herói. Eu não tenho isso.- Disse com desprezo. Os seus olhos bailaram entre os de Annya e as labaredas e os olhos da garota.- Não foi para salvar-te a pele. Pouco me interessa que estejas viva ou morta.
Annya observou-o desconfiada.
- Era estúpido e cobarde ter-te deixado para trás.- Disse secamente, encarando Annya calmamente.- Ao terceiro dementor estarias acabada. Talvez nem tanto.- Disse a última frase com um pequeno sorriso no rosto.
- Eu não necessitava do teu apoio, Conner!- Bradou Annya furiosa.- Safava-me bem sem tu puxares-me.
O rapaz gargalhou baixinho.
- És mesmo muito estúpida, então.- Disse com desdém, ignorando o olhar fulminante que a garota lhe lançava.
Esta ao ouvir isto agarrou a varinha firmemente e dirigiu-se até ao rapaz a passos rápidos e ferozes. Conner sem dar atenção à reacção da jovem, fez um pequeno movimento com a varinha para apagar as chamas que crepitavam silenciosamente, olhando depois para Annya com desprezo. Não fez nenhum movimento com a varinha ao ver que esta apontava-lhe a dela ao peito.
Annya aproximou-se o suficiente para tocar com a ponta da sua varinha no peito do rapaz. Este olhou para a varinha e depois para a garota com algum menosprezo.
- Não abuses da sorte, Casanova.- Disse num tom ríspido. Os seus olhos faiscavam devido à cólera que sentia. O seu rosto aproximou-se automaticamente do rosto de Conner, deixando os seus longos cabelos cobrirem um pouco da sua face.
Ao contrário do que Annya esperava, Conner- que até então tinha a varinha ligeiramente erguida- baixou-a e guardou-a num dos bolsos, fitando sempre os olhos de Annya em constante desprezo.
- Senão tu matas-me?- Perguntou irónico.
Annya abriu a boca para responder, mas depois parecendo ponderar um pouco encarou-o com ódio e sussurrou:
- Eu não gosto de ti.
O rapaz não pareceu ficar minimamente afectado com o que Annya disse.
- O teu desgosto é correspondido, Mattson.- Respondeu-lhe calmamente. Annya afastou-se lentamente, baixando então ela mesma a sua varinha.
Ao encontrar-se a uma distância favorável do rapaz, a garota voltou-lhe as costas e dirigiu-se até ao dormitório.
- Devias ter cuidado, Casanova.- Disse voltando-se para o rapaz, que a encarou curioso. Annya encontrava-se já nos primeiros degraus da escada que a levaria ao seu dormitório.- Não queiras que eu nutra ódio por ti. Irias acabar por dar-te muito mal.
Conner acompanhou com os olhos a garota até esta entrar no dormitório. Depois voltou-se de novo para as cinzas e tornou a reflectir sobre o que meditava antes de Annya ter aparecido.
Iria ser mais difícil do que pensara que seria.- Um pequeno sorriso apareceu nos lábios de Conner.- Mas também qual seria a piada de fazer um jogo sem grandes desafios?
-.-
Acordou estendida sobre uma superfície rígida, rodeado por uma grande escuridão sem fim. A escuridão era uma característica daquela masmorra que era o dormitório das alunas do sexto ano dos slytherins. A escuridão provinha ainda do inicio da madrugada que deveria estar a decorrer naquele momento, algo normal- pelo menos Annya acreditava que sim. Estava tudo escuro como quando ela adormecera.
Annya esticou um dos braços.
O dossel que a escondia do resto do quarto deveria estar ali perto. Annya foi apalpando lentamente o ar, procurando desesperada pelo tecido. Nada.
Sentindo-se abalada, Annya ergueu-se abruptamente, ficando sentada, a encarar então a escuridão total que a rodeava. Esta estava nas quatro paredes que a cercavam, no tecto e no chão daquela espécie de sala.
Não demorou muito a perceber que já não encontrava-se na cama onde deitara-se anteriormente. A rigidez do solo só comprovava essa hipótese. Então onde estaria?
Annya levantou-se rapidamente. Não era pessoa de ficar à espera de respostas, preferia ser ela mesma a procurá-las.
Deu alguns passos em frente - sem saber bem por onde ia, pois a única coisa que conseguia ver era a escuridão da sala – e procurou por alguma pista.
Talvez tivesse acordado no chão do seu quarto, por alguma razão desconhecida, mas ainda encontrava-se neste.
Annya caminhou cautelosamente, procurando não bater em nada, e logo apercebeu-se de que a sala estava vazia, o que significava que aquele não era o seu dormitório.
Começando a ficar um pouco nervosa, a garota andou até às paredes, procurando uma saída nestas.
As suas mãos tentaram ir ao encontro de algo sólido, duro, algo que pudesse considerar uma pedra de uma parede, mas nada, nada para além de ar.
A garota apercebeu-se então que o escuro não tinha fim, continuava continuamente e infinitamente escuro. O que, segundos antes, lhe parecera sólido e finito era agora um caminho escuro sem fim.
Olhou em seu redor e viu então, com terror, todas as paredes escuras que a rodeavam desapareceram e deram lugar a um caminho infinito.
Quando olhava para os vários caminhos sem fim, via o chão e o tecto daquela espécie de sala juntarem-se em vários pontos. Girando sobre o seu próprio corpo, parecia que os pontos se uniam em uma linha curva, algo como uma circunferência.
Olhou para o tecto e só depois constatou que este também havia desaparecido, tornando-se ele também em um trilho infinito.
Apesar do medo que começava a dominar a sua mente, o seu corpo não teve qualquer reacção.
Annya sentiu medo que o chão fugisse literalmente dos seus pés fazendo-a cair num posso sem fim. Mas ao contrário do que esperava o chão continuou debaixo dos seus pés.
- Onde estou?- Gritou.
Para sua surpresa o som foi emitido e miraculosamente houve eco.
Como era isso possível? Necessitava de paredes para emitir eco, pois só assim as ondas sonoras poderiam voltar para trás e serem captadas pelo ouvido. E como era isso possível se não houvesse qualquer obstáculo.
A garota tentou caminhar, mas para sua surpresa o corpo não reagiu às ordens emitidas pelo seu cérebro. Em vez disso, os joelhos da jovem dobraram-se contra as suas ordens mentais fazendo-a cair.
A jovem tentou erguer-se, mas os seus esforços foram em vão.
O seu corpo estava petrificado. A única coisa que conseguia mover era os olhos que observam desesperados toda a área que conseguissem captar. Annya fez todos os esforços mentais para conseguir-se movimentar, recorrendo por vezes a tentativas físicas, mas estas haviam-lhe sido retiradas.
Começou a desesperar quando um grito agudo e cristalino feriu-lhe os ouvidos. Esse grito permaneceu no ar perpetuamente. Um grito de dor e agonia que trouxe igual dor e agonia a Annya.
O grito espalhara-se por todo o infinito ferindo ainda mais os ouvidos de Annya e fazendo a cabeça desta latejar.
Annya fechou os olhos e mordeu os lábios. Se pudesse teria coberto os ouvidos com as suas mãos, mas estas encontravam-se colados ao seu corpo por algo invisível.
Passaram-se vários segundos e o grito continuou no ar, torturando a garota, que só não gritou por não acreditar ter forças para isso.
Sentiu que a sua cabeça não tardaria a rebentar.
- Parem! Por favor parem!- Gritou então, num acto de desespero, surpreendeu-se por ter conseguido falar.
O grito logo parou, deixando a sua cabeça a pulsar.
Ao fim de alguns segundos, em que Annya recuperava as suas forças mentais e físicas, tornou a tentar mexer os músculos das suas pernas para poder-se movimentar.
O esforço que fazia com a mente requeria uma grande concentração, uma concentração muito difícil de se arranjar naquele tipo de situação, em que o desespero tendia a dominar a mente, obrigando-a a não pensar. E por mais que Annya fosse boa a conseguir pensar em soluções rápidas e realizáveis para praticamente todo o tipo de problemas. Mas naquele momento sentia o seu cérebro bloqueado a qualquer ideia que pudesse salvar e até mesmo ao controle dos seus músculos.
Os olhos de Annya retomaram a encarar o que encontrava-se à sua frente, e esta observou espantada a linha curva que era formada pelos diversos pontos no infinito.
A morena olhou para cima e viu que o tecto daquela “sala” ganhara novamente um fim.
Mas ao retornar a olhar em frente viu algo mais espantoso. O chão que outrora era todo negro, ganhava agora um novo tom quando mais adiante ganhava um novo tom, um tom que passaria despercebido no inicio, mas que mais à frente tornar-se-ia notório, tornando-se no fim, quando o chão e o tecto juntavam-se, um tom bastante realçado, que tingia a circunferência de tom escarlate, cor de sangue.
Apesar de não sentir o resto do corpo, Annya sentiu os pêlos da sua nuca arrepiarem-se.
Tentou de novo sair dali, desta vez com mais insistência, procurando todo o tipo de medidas que a ajudassem a recuperar o contacto com os seus membros.
Um novo grito estridente, mais forte e juvenil ecoou por toda a sala.
A ferida nos seus ouvidos feita pelo grito anterior abriu-se, e Annya suplicou mentalmente para que aquilo parasse.
Demorou algum tempo até que Annya percebesse que o grito provinha das suas próprias cordas vocais. A resposta ao porquê de estar a gritar só veio segundos depois, quando os seus músculos contraíram-se em resposta a uma dor inexplicável que começava a atingir-lhe.
A garota deixou-se cair no chão, não podendo mexer nada para além dos seus olhos e lábios.
Que seria aquilo? Seria uma cruciatus?
O grito foi aumentando consoante a dor. A cabeça da garota começou a latejar o suficiente para parecer que iria rebentar.
Annya fez o máximo para conter a sua dor. Gritava com todo o ar que tinha nos seus pulmões. Mas isso não lhe chegava, nem isso nem as lágrimas que lhe escorriam pelos olhos. O seu corpo contorcia-se interiormente ao sentir os seus órgãos espremerem-se interiormente.
A poucos segundos do começo a garota começou a sufocar com o sangue que subia-lhe pelo esófago.
Tossiu e cuspiu o sangue que começavam-lhe a banhar os pulmões.
Que estaria a acontecer?
Estaria a morrer?
Porque não morria logo? Porquê tão lentamente?
Ao lado do seu corpo fios escarlates começavam a fazer pequenos desenhos, palavras e signos estranhos para a morena.
Esta já não gritava nem ouvia o grito, em vez disso ouvia vozes sussurrarem-lhe aos ouvidos palavras e frases desconexas e indecifráveis. Palavras e frases que feriram-lhe ainda mais a cabeça e rachavam-lhe a mente.
Vultos encapuzados aproximavam-se do seu corpo, todos pareciam observarem-na obcecados pode debaixo dos seus capuzes.
Annya viu fios de sangue escorrerem por debaixo do seu corpo formando depois mais desenhos no chão, e então percebeu que tudo o que via escarlate era o seu próprio sangue.
Um dos homens encapuzados que a circundavam aproximou-se. Annya olhou-o com súplica para que ele parasse com todo aquele tormento, mas ele apenas a observou.
Os olhos azuis-claros do homem, que Annya pode ver por debaixo do capuz, despertaram-lhe a atenção. Não lhe eram estranhos.
A dor havia atingido um nível em que o seu corpo parecia estar a ser estilhaçado em vários pedaços.
O grito que Annya lançou foi suficientemente alto para que a cabeça desta começasse a latejar de modo a parecer que iria explodir.
Annya abriu os olhos. Uma das suas mãos foi à sua cabeça que pulsava furiosamente. Viu tudo à sua volta andar à roda. O seu coração palpitava bruscamente, acabando por trazer-lhe algum desconforto.
A garota ergueu-se e aí pôde ver os lençóis enrodilhados uns nos outros, deixando o seu corpo transpirado descoberto. O dossel que a tapava do resto do quarto estava coberto e Annya agradeceu isso. Teria gritado?
Que horas seriam?
Sentiu o seu estômago dar uma enorme volta e então inclinando a cabeça para a frente vomitou.
Annya observou assustada o sangue que estava no lugar do vomitado.
- Merda.- Sussurrou enquanto encostava-se à cabeceira da cama. Inspirou fundo e colocou uma mão na testa. Estava quente.
Deixando a mão cair de novo sobre a cama, Annya fechou os olhos, inspirou e expirou lentamente tentando controlar tanto o seu ritmo cardíaco como a dor que lhe cobria todo o corpo. Estava encharcada devido à transpiração, teria que tomar um duche.
Os olhos da garota abriram-se bruscamente. Tinha que saber as horas.
Sem esperar nem que mais um segundo passasse a garota ergueu-se e abriu o dossel e dirigiu-se até à mesinha ao lado da sua cama. De lá retirou a varinha e apontando à mancha de sangue murmurou um feitiço:
- Limpar.- A mancha de sangue desapareceu em segundos.
Os olhos da garota ficaram uns segundos no local onde estivera a mancha.
Há meses que nada assim havia-lhe acontecido. Aliás ela nunca lembrava-se dos seus sonhos, por isso nunca nada igual tinha-lhe acontecido.
Annya lançou um pequeno suspiro. Sabia o que teria que fazer. Os seus olhos percorreram o dormitório. Por sorte não estava lá ninguém…quase ninguém, corrigiu ao ver a garota de cabelos negros e curtos a calçar-se. Esta olhou para Annya curiosa. Teria ouvido algo?
Annya deu de ombros e dirigiu-se até à sua mala, de lá retirou um pedaço de papel e uma pena de tinta permanente. Observou à sua volta e ao constatar que a outra já havia saído começou a escrever de uma forma apressada.
Caro Professor Sloane,
Voltei a sonhar. Há meses que não acordava transpirada, com febre e coberta com sangue, mas esta noite isso aconteceu-me novamente. Sei que não me pode ajudar muito a essa distância mas tive algumas esperanças que me pudesse dar algum tipo de instruções.
Acho que não tenho a poção para um sono sem sonhos… O maior problema é que desta vez não foi como as outras, eu lembro-me perfeitamente do que sonhei, e digo que não é nada que queira repetir. Preciso da sua ajuda. Algo mudou… não sei o quê, mas algo mudou.
Tenho a sensação que isto não é nada do que nós estávamos a pensar, acho que é algo muito maior. Tenho a impressão que os sonhos se referem a algo “Grande”.
Responda-me depressa,
Annya
<hr>
A jovem dobrou a carta em dois e depois guardou dentro de um livro. Iria ter que arranjar uma forma de a enviar sem ser interceptada, tinha a certeza que todas as cartas eram lidas.
Guardando o livro debaixo da colcha da cama, Annya ergueu-se e dirigiu-se até à casa de banho. Na sua cabeça apenas uma pergunta se formava: O que queria dizer aquilo tudo?
Rachel encostou a sua cabeça à parede. Sentia-a andar à roda. Fechou os olhos e abriu-os diversas vezes até conseguir sentir capacidades de mantê-los completamente abertos. Pressionou a sua cabeça cada vez com mais força, mas as imagens que os seu cérebro lhe transmitia continuavam desfocadas e por vezes pareciam andar à roda.
Tornou a abrir e a fechar os olhos, até que se cansou e fechou-os completamente. Soltou um gemido ao sentir uma dor aguda atingir a parte de trás da sua cabeça. Os seus miolos pareciam estar prestes a estoirar tamanha era a rapidez com que a dor aumentava.
Rachel abanou lentamente a cabeça, deixando os seus olhos completamente fechados.
O seu estômago roncava com fome, o seu corpo protestava com sono. A mulher deixou-se continuar encostada à parede. Não poderia fazer muito mais. Não tinha comida para alimentar-se- há dois dias que não comia- e dormir iria ser a última coisa que faria depois daquele maldito pesadelo.
Observou as serpentes que serpenteavam por ali perto. Nunca se aproximavam mais do que a cinco metros de distância dela, o que era bastante aliviador para Rachel que tinha um enorme pavor por estas.
De inicio, ver uma serpente descer da cama era o suficiente para fazer Rachel contorcer-se ligeiramente, mas ao fim de algumas horas já se havia habituado o suficiente para poder ver uma cobra a cinco metros sem ter que contrair todos os seus músculos involuntariamente. Obviamente que se as visse a atravessarem a linha dos cinco metros que ela havia estipulado, o seu organismo começava a entrar em pânico.
No fundo sabia que nenhuma daquelas cobras se iria atrever a mordê-la, Voldemort não era tão generoso ao ponto de acabar com ela tão rapidamente, sabia que estava em segurança, mas o pavor que tinha por cobras não seguia as regras lógicas, estando sempre alerta para qualquer reacção que considera-se suspeita. Por mais que soubesse que estas eram controladas pelas vontades de Voldemort, não acreditava que estas conseguissem controlar sempre os seus instintos animalescos.
Só havia uma única serpente que não deixava Rachel tão apavorada. Uma cobra que era ironicamente a maior de todas. Esta por algum motivo, que Rachel suspeitava saber qual era, andava sempre sobre a linha dos cinco metros, deslizando de um lado para o outro, observando Rachel cautelosamente.
A cobra era impressionantemente bonita, até Rachel, que detestava cobras, não o podia negar. Para além de grande era larga, com o corpo réptil de um tom verde-escuro, que lembrava o verde dos slytherins, e com a cabeça preta. Não parecia pertencer a nenhuma espécie de cobra conhecida, talvez fosse algum tipo mágico. Mas o mais impressionante da cobra eram os seus olhos, não só pelo tom verde da íris, ou pela pupila dilatada numa forma feroz, mas sim pelo brilho diferente que predominava no seu olhar, um brilho longe de ser animal, um brilho quase humano. O seu olhar parecia ser superior ao dos outros animais e até de alguns humanos. Era um animal que parecia ter uma inteligência racional, a cima à de muitos humanos.
Rachel podia perceber porque Voldemort confiava tanto naquele animal, talvez por saber perfeitamente que esta nunca o trairia.
Nagini, Rachel acreditava que a cobra chamava-se assim.
Os olhos da mulher observaram os da serpente por uns segundos, mas logo desviou-os arrepiando-se.
Independentemente da semelhança que Nagini tivesse com um humano, esta não deixava de ser uma cobra, e Rachel detestava cobras.
Os seus pés começaram a tamborilar na alcatifa negra, tentando fazer o tempo passar mais depressa. Não sabia que horas eram, não sabia nada de nada para além de saber que ainda era de manhã e que o tempo não parecia estar muito agradável.
Os seus olhos fixaram-se nos pedaços da jarra no chão. Uma tentativa falhada e louca que tivera- mais para divertir-se do que para fugir- em que lançara uma jarra a um dos vidros. Este evidentemente não se quebrou, deixando apenas a jarra em estilhaços.
Rachel lançou um pequeno sorriso de satisfação, recebendo em resposta um sibilo ameaçador de Nagini.
- Maldita cobra.- Pensou.- Pior que o dono.
Rachel deslocou os olhos até à porta. Se houvesse alguma maneira de sair dali e ir ter com Annya…
Talvez mandar-lhe uma mensagem…
Lançou um suspiro resignado. Tinha que parar com as tentativas suicidas, Voldemort provavelmente matá-la-ia só com a última.
Fez um pequeno sorriso. Sabia que ele nunca lhe faria isso, para sua grande miséria.
A ideia de morrer não era mal vinda, aliás, na presente situação a sua morte até seria um grande alívio. Como poderia um ser humano suportar tudo que ela já havia suportado sem desejar um pouco a morte? Se não fosse Annya e a preocupação que tinha com o que pudesse acontecer a esta depois de morrer, com toda a certeza que tinha pegado num dos pedaços da jarra para sair dali de uma outra maneira.
Rachel encostou a cabeça à parede e fechou os olhos, tentando suportar as dores que as cruciatus haviam-lhe deixado nos músculos.
A dor na sua cabeça parecia estar a aumentar a cada segundo que passava. A falta de descanso poderia provocar-lhe dores assim tão fortes?
Por algum motivo Rachel não acreditava que fosse só isso.
O seu estômago tornou a roncar.
- Maldito Voldemort.- Sussurrou. Em resposta ouviu um sibilo furioso de Nagini, que serpenteava ali perto.
Rachel tornou a baquetear a alcatifa com os seus pés.
Passaram-se mais minutos monótonos em que os únicos sons que Rachel podia ouvir eram os dos seus próprios pés e o rastejar da cobra à sua frente.
Seria uma cela pior que aquilo? Não. Pelo menos na cela sempre poder-se-ia contactar com os outros prisioneiros, talvez fosse por isso que Voldemort não a quisera numa. Seria demasiado divertido para o gosto dele.
Cansada da falta de entretenimento a mulher levantou-se e dirigiu-se até a uma mesa distante de si, onde encontrava-se uma jarra com água e um copo vazio.
Era o único alimento que Voldemort lhe deixara, no entanto a jarra já encontrava-se quase vazia e Rachel sabia que se Voldemort demorasse ainda mais alguns dias possivelmente encontrá-la-ia morta ou perto disso, completamente desidratada.
Ao ver Rachel deslocar-se, Nagini começou a segui-la paralelamente a esta.
- O que foi?- Perguntou a mulher irritada, mas encontrando-se o mais afastada possível. - Eu não te fujo.
A cobra lançou-lhe um silvo, que aparentemente parecia ter o mesmo tom de rispidez que a frase de Rachel.
Ao chegar perto da jarra a mulher encheu-a. Os seus olhos pararam na janela. Era um dia nublado mas mesmo assim ainda podia ver o sol, possivelmente mais tarde iria chover.
Uma dor no peito distraiu-a da janela, fazendo-a olhar para a mão que se deslocara rapidamente para este.
A mulher soltou um gemido de dor ao sentir uma forte pontada de ar no seu peito.
O copo escorregou-lhe das mãos, estilhaçando-se junto com a jarra. Alguns pedaços espetaram-se nos pés da mulher. Mas esta não ligou, os seus olhos arregalados estavam fixos no céu. Em segundos o sol ficou coberto por algo que ela não pudera ver, deixando os jardins e a Mansão Riddle nas sombras, na total escuridão.
O coração da mulher palpitava furioso, tornando-se o único som que esta podia ouvir e acabando por prender a respiração desta.
A pontada que sentira segundos antes no peito não passara, apenas aumentara.
Rachel tentou inspirar, mas os seus pulmões pareciam perder todo o ar que neles entrava. A sua cabeça pulsava furiosamente.
Tal como desaparecera o sol retornou a aparecer, em segundos.
Uma alucinação causada pelo sono?
Não. Rachel sabia que era outra coisa, algo mais. Talvez uma nuvem. Mas que nuvem deixaria a Mansão numa escuridão tão densa?
Rachel deu um passo para trás. Ela sabia o que havia visto e tinha quase a certeza de que sabia o seu significado.
Querendo ou não ela teria que falar com Joseph, e teria que ser o mais rápido possível.
Viu Nagini aproximar-se, e para sua surpresa não a temeu. Um forte relâmpago vindo de uma nuvem que também aparecera em segundos, iluminou o rosto sério da morena.
- Também sentiste?- Perguntou.- Algo mudou. Algo está prestes a mudar de rumo.
Observou a janela por mais alguns segundos até que uma mão a assustou.
- Mattson.- Uma voz que era-lhe bastante conhecida sussurrou ao seu ouvido, enquanto um braço a agarrava-lhe a cintura e prendia-a contra a mesa.- O que diabos pensas que estás a fazer?
Um arrepio atravessou a sua espinha ao sentir o corpo dele encostar-se ao seu.
Fechou os olhos. Aquela iria ser uma longa manhã.
<hr>
Desculpem pela demora. Crise de criatividade. Espero que tenham gostado.
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