Capitulo 4



Capítulo 4


Mione olhou de relance para o relógio de Harry. Os números pareciam saltar acu­sadoramente do mostrador. Quatro e quarenta e cinco.
— Estou atrasada para meu casamento. Acha que alguém vai reparar na minha ausência? — brincou ela, com um sorriso sofrido.
Ele procurou parecer consternado enquanto loca­lizava a resposta certa na cabeça. Como se sentia calhorda! A mulher devia estar casada àquela hora, e ele e Carolyn deviam estar participando seu ca­samento aos filhos. Aquilo tornava os dois indese­jáveis um para o outro.
Ainda assim, para uma mulher que devia estar se casando, ela não parecia tão desolada com a de­mora. E por estranho que parecesse, ele não estava chateado com o próprio atraso para o churrasco com Carolyn. Para ser honesto consigo mesmo, ambos pareciam mais aliviados do que preocupados com a falta de energia.
— Acho que a falta de energia também deve ter desorganizado as coisas por lá.
Mione voltou-se para ele.
— Mas como já disseram, o único empecilho real seria se o pastor fosse eletrônico.
Ele sentiu algo estranho.
— Mione, você queria casar hoje?
— Toda mulher quer casar — respondeu ela. — Acho que estou deprimida porque além do meu ca­samento, é feriado e meu aniversário.
— Você ia se casar no dia do seu aniversário?
Ela assentiu.
— Foi idéia de Kevin. Ele disse que casar nesse dia ia tornar o fato de completar trinta anos menos doloroso.
Harry franziu a testa. Recordou o trigésimo ani­versário de Marie, quando ela chorou o dia inteiro, lamentando-se que sua vida terminara. Sorrira e dissera as coisas apropriadas durante a festinha, mas depois brigara com ele por ter ousado mencionar a idade aos amigos. Ele respondera que os amigos deviam ter descoberto sozinhos a idade dela, e por causa disso passou a noite no sofá da sala. Depois do divórcio recordara-se do fato, rotulando-o como o início do final do casamento.
Carolyn também lhe dissera que não gostara nem um pouco de completar trinta anos. Só que o motivo fora diferente: não atingira o objetivo que impusera a si mesma.
— Regra número um: ter cuidado para não acabar escolhendo a mesma pessoa em outra pele — res­mungou ele, absorto.
— Pensei que a regra número um fosse usar sem­pre roupa de baixo limpa para o caso de sofrer algum acidente — disse uma voz, em tom divertido.
Harry olhou para cima, vermelho como um pimen­tão. Esquecera que não se encontrava sozinho.
— Desculpe...
— Devo admitir que você não estava fazendo muita coisa para melhorar a opinião de uma jovem noiva sobre o casamento.
— Então vamos nos esquecer do casamento por um instante e nos concentrar no seu aniversário — disse ele, tomando-lhe uma das mãos.
— Por quê?
— Acho que a única coisa que posso oferecer no momento — começou Harry, encarando-a. — É um belo aperto de mão de aniversário.
Ainda surpresa, Mione constatou que ninguém ja­mais apertara sua mão daquele jeito. Uma corrente elétrica pareceu irradiar-se de uma palma para ou­tra. Incapaz de manter a sensação por mais tempo, retirou a mão usando a desculpa de ajeitar a tiara de pérolas no cabelo.
Ele observou as curvas dos seios elevando-se gra­ciosamente com o movimento. Engoliu em seco. Não tivera muitas mulheres durante sua vida. Nem fora especialmente bem-sucedido no casamento, e sabia que representava a maior parte dos opostos em relação a Carolyn, que era lógica enquanto ele era criativo. Porém ambos podiam imergir no trabalho por dias a fio e nunca ficavam sem assunto. Ainda assim havia dúvidas, que ele creditava ao receio de repetir o fra­casso do primeiro casamento. Por algum motivo, não gostaria que Mione passasse por tudo aquilo.
— No casamento existem compromissos. Vamos ver quais deles você está disposta a fazer? — per­guntou Harry.
— Vamos ver... estou disposta a assistir futebol com ele, que pode escutar rock comigo.
— Que ele não deve gostar.
Mione franziu o nariz, num gesto gracioso.
— Ele prefere country, mas eu já disse que não é crime escutar mais de um tipo de música, ainda que os amigos dele acreditem nisso.
Harry imaginou o noivo dela do tipo machão, que só enxergava uma forma de fazer as coisas: a sua.
— Aposto que ele enche os ovos de ketchup — arriscou ele.
— Como sabe disso? — indagou ela, surpresa. De fato, era um dos hábitos alimentares que ela não apreciava.
— Foi só um palpite. Vou arriscar outro: aposto que a idéia de diversão dele é uma noite de dança e muitas cervejas.
A testa franzida de Mione era um indício de que daquela vez ele fora longe demais. Talvez tivesse exa­gerado, mas ela ficava tão bonita quando se irritava...
— Você não devia ficar dissecando a personalidade dele quando nem o conhece.
Ele deu um tapa no joelho.
— Meu Deus! Acertei, não acertei?
Começou a rir quando viu a expressão no rosto dela.
— Você é uma pessoa irritante — declarou ela, virando o rosto para outro lado.
— É um dom natural — admitiu ele, com certo orgulho.
Ele percebeu a ponta de sorriso que ela tentava ocultar.
— É mais como uma maldição. Ou talvez uma doença desagradável. Estou surpresa que o centro de controle de doenças não tenha emitido um boletim sobre você.
Ele colocou as mãos atrás da nuca e cruzou as pernas à altura dos tornozelos.
— O que mais ele gosta? Luta livre e boxe na televisão? Espere! já sei: corrida de carros. Daquelas de demolição, em que eles destroem uns aos outros.
— Existe algum motivo em especial para você re­solver me irritar? Talvez eu tenha feito algo em al­guma vida anterior? — disse ela, olhando para o alto.
— Você preferiu parar aqui por causa de sua meia-calça, porque achou a aparência mais importante do que o casamento. Se não tivesse feito isso, já estaria casada, a caminho da lua-de-mel — disse ele. Depois franziu a testa. — Na verdade, acho que não. Com a falta de energia provavelmente ainda estariam no aeroporto. Se bem que lá o gerador de emergência deve funcionar.
Mione mudou de posição na cadeira. Ele não perdoou.
— O que foi? Vocês iam de trem?
— Não, a gente não ia de trem — respondeu ela, de má vontade.
— Naturalmente ele não espera que sua noiva viaje de ônibus, claro.
Os olhos cor-de-mel fuzilaram.
— Kevin tem uma cabana nas montanhas.
— Deixe eu adivinhar: é perfeita para pescar, certo?
— Se já sabia, por que perguntou? — gritou ela, baixando a voz no final.
Harry executou a mímica de quem tinha ficado surdo.
— Meu bem, você tem um belo par de pulmões, sabia? Podia ganhar algum dinheiro como sirene de nevoeiro no inverno. Nenhum navio chegaria perto de você.
— É impressionante o fato de alguém com a ima­ginação tão limitada como a sua projetar jogos de computadores — admirou-se Mione, escolhendo outra tática. — Ou você só desenha as figuras bonitinhas e deixa o trabalho de pensar para os outros?
— Assim você fere meu orgulho profissional — declarou Harry, levando as mãos ao peito como se um tiro o tivesse atingido.
— Bem que podia ser verdade — disse ela, levantando-se.
Ele não pensou duas vezes em seguir-lhe o exem­plo e caminhar atrás dela. Seguiu-a até o corredor escuro. Ali segurou-a pelo cotovelo.
— Por que age de forma defensiva quando se trata do seu noivo? — perguntou ele, avançando enquanto ela recuava. Em pouco tempo as costas dela estavam contra a parede. — É estranho também que você não pareça uma noiva apaixonada. Se alguém ouvir você, vai pensar que esse casamento não é algo que você tenha muita vontade de realizar.
— Claro que é — respondeu ela, hesitando alguns segundos a mais. — Agora pode me soltar?
— Acho esquisito também o fato de você se preocupar mais com as meias do que com o horário do casamento.
— Sou supersticiosa! Queria que tudo estivesse em ordem. Minha idéia de ordem não incluía uma meia desfiada.
Ele rapidamente se deu conta da proximidade, do calor e do cheiro agradável que emanava da pele dela. Quanto mais olhava para ela naquela luz re­duzida, mais consciente se tornava da feminilidade ao alcance do seu toque.
— Ainda tem um coisa que eu não entendo. Porque você não parece a noiva quase histérica com medo de perder o casamento. Por que não está andando de um lado para outro e roendo as unhas? Não estou vendo também a pressa de sair daqui.
— Não sou do tipo histérico — declarou Mione, empinando o nariz. — Além do mais, o que adian­taria ficar preocupada com alguma coisa que está fora do meu controle? Prefiro ficar calma até descobrirmos o que realmente aconteceu. E você? Por que não está subindo nas paredes por causa dela?
Por um instante Harry ficou tão entretido nas curvas móveis dos lábios de Mione enquanto ela falava que o significado das palavras demorou a penetrar em sua cabeça. A melhor parte da situação era poder observá-la na penumbra. Até entender a menção a Carolyn.
— Pensei que estivéssemos falando de você.
— E eu pensei que estivéssemos falando sobre nossos sentimentos em relação a essa situação, que aliás está deixando todo mundo alterado demais.
Harry estava ocupado observando-a.
— Sabe... não acho que você seja do tipo calmo. Acho que parece alguém mais temperamental. Mais do que as pequenas explosões de gênio que deixou escapar. E que, diga-se de passagem, foram muito interessantes.
Com rapidez, Mione controlou a explosão que se prenunciava. Não daria a ele o prazer de vê-la perder o controle. Para esse homem seria a própria expres­são da serenidade. Não levantaria a voz nem cor­taria a garganta dele em pensamento. Nem o man­daria para outra era, uma era na qual não existis­sem automóveis, encanamento, eletricidade e muito menos computadores. Elaborou sua imagem, a des­peito da resolução e o pensamento a fez sorrir.
— Está tentando jogar comigo? Jogos mentais? Meu bem, sou o mestre dos jogos mentais.
Mione arqueou uma sobrancelha. Ainda parecia calma como um lago na montanha. Porém por dentro parecia mais um rodamoinho incessante.
Não era Kevin em frente a ela; seu noivo tinha idéias bem definidas sobre como dirigir o mundo e tinha plena convicção de que todos deveriam acre­ditar nas mesmas coisas. Coisas com as quais a maioria da raça humana não concordaria. Sua idéia de diversão quando não estava tentando vender um caminhão para algum possível cliente era assistir futebol na televisão. Agora decidira abrir uma filial e ingressar na política local. Não chegara a men­cionar, mas ela suspeitava que alguém graúdo es­tava por trás daquilo. Sentiu que jamais conseguiria convencer Kevin de que existiam coisas mais inte­ressantes para um casal fazer no final de semana.
"Eu não conseguia me imaginar casada com mais ninguém. Ao longo dos anos, ele me deu muito mais do que coisas materiais. Ele doou a si mesmo".
As palavras ditas pela senhora na seção de sa­patos cruzaram a mente de Mione. Ela fechou os olhos, sentindo cada palavra. Passou a língua pelos lábios. Até então não tinha percebido quão seco es­tava o ar no interior da loja.
— Foi um dia inquietante — afirmou ela.
— Inquietante para todos nós — lembrou ele.
— Hoje é meu aniversário e dia do meu casamen­to, e eu aqui trancada numa loja enorme dessas. Parece o roteiro de um filme B — disse ela, termi­nando com um suspiro profundo. — Agora, se me dá licença, vou continuar meu caminho.
Em vez de afastar-se, Harry aproximou-se.
— Por que está tão ansiosa para ir? Talvez a gente tenha um motivo para comemorar.
Ela percebeu o tom de sedução na voz dele.
— Vou comemorar quando sair daqui e encontrar meu noivo.
— Está vendo? Você não parece convincente. — Harry ergueu a mão e brincou com os cachos escuros. — Talvez essa falta de energia seja a mão do destino, avisando que esse casamento pode não ser uma boa idéia. Ficou muito mais fácil do que deixar ele es­perando em frente ao altar.
— Eu jamais faria uma coisa dessas!
— Está dizendo que casaria com um homem mes­mo que no último minuto percebesse que não era o que queria?
Mione estava a ponto de perder a calma.
— Quem está pensando que é? Você não me co­nhece, nem meu noivo. Por que não volta para o lado de seus filhos e me deixa em paz?
Se mais tarde alguém perguntasse, Harry respon­deria que foi a tentação do diabo, à qual ele não soube resistir. Ela ia dizer mais alguma coisa, porém os lábios ficaram entreabertos. Harry não a tocou em nenhum lugar que não fosse a boca quando incli­nou-se e beijou-a. Chegou a sentir o gosto fraco de hortelã quando a língua dela tocou a sua. Em um instante estavam ambos perdidos. Ele queria mais e Mione dava a mesma impressão. Repentinamente Harry sentiu um empurrão tão forte que ele teve de lutar para manter o equilíbrio.
— Seu cafajeste! Você tinha de tirar vantagem, não? Precisava pressionar em relação a Kevin, di­zendo coisas horríveis quando você nem conhece ele. Mas não bastava! Tinha de roubar um beijo. Você devia ser fervido em óleo. Não, algo pior... gostaria de pensar em algo pior.
— Tenho certeza de que você vai pensar em algo se tiver tempo suficiente — disse Harry.
Mione respirou profundamente várias vezes. Pa­recia a ponto de dizer algo mais, depois mudou de idéia. Mantendo o nariz empinado, ela começou a retirar-se. Depois parou e voltou-se.
— Só para sua informação, se estava procurando minhas amídalas, foram extraídas quando eu tinha seis anos — afirmou ela, com voz fria.
Os olhos brilhavam e as bochechas apresentavam uma tonalidade rubra. Ela voltou-se e afastou-se com rapidez.
Harry não conseguiu evitar um sorriso enquanto assobiava. Ela tinha o direito de usar todos os nomes que conhecia para qualificá-lo, mas não podia negar que correspondera o beijo.
Mione precisava escapar. Bastou uma olhada para certificar-se de que as portas não estavam abertas por virtude de algum milagre nos últimos dez minutos. Pensou em arranjar algo pesado para quebrá-las, mas achou que qualquer coisa mais fraca que uma banana de dinamite não conseguiria resultado algum. Tudo o que via no estacionamento eram os carros das pes­soas que estavam presas ali, como ela.
— Não importa o que você faça, as portas não abrem.
Ela voltou-se para encontrar Lisa atrás de si. Sua atitude ainda parecia alheia, mas o que aparecia mais era a sombra da tristeza nos olhos dela.
— Acho que o dia de hoje não saiu muito parecido com o que você esperava — comentou Mione.
— Acho que foi bem melhor do que passar o dia com a namorada nova do meu pai. Ela nos convidou para um churrasco e depois íamos assistir aos fogos de artifício. Provavelmente ela ia querer mostrar que pode ser uma ótima madrasta. Como se o fato de ter uma madrasta já não fosse o suficiente.
— Como alguém especialista em madrastas e pa­drastos, posso garantir que o primeiro encontro é sempre o pior — disse Mione, apoiando-se na porta de vidro, que parecia morna ao toque, aquecida pelo sol da tarde. — Os adultos sempre exageram para agradar e as crianças não querem saber de nada com ninguém. Isso significa que as crianças acabam detestando os adultos, e vice-versa. Nenhuma das partes quer encontrar um território em comum. Co­nheci de vários tipos.
Lisa deu a impressão de relaxar um pouco.
— Que tipos você teve?
— Bem, para começar eu não gostava da idéia de meus pais se divorciarem, portanto antes de qualquer coisa já tinha resolvido transformar a vida deles num inferno — confessou Mione, com ar cândido. — E foi exatamente o que fiz até os dezesseis anos de idade.
— Foi minha mãe que quis o divórcio — disse a menina. — Ela disse que papai gostava mais de seu trabalho do que dela. Mas também sei que foi porque ela estava tendo um caso com o moço que cuidava da piscina. Ninguém sabe que eu sei disso.
O rosto de Lisa enrubesceu em virtude da reve­lação de um segredo de família.
— Aposto que você não esperava passar o feriado na loja, mas essa idéia deve ser o sonho de toda ado­lescente — comentou Mione, ignorando as confidências.
— Só se deixassem a gente experimentar roupas, mas não acho que aprovem essa idéia — respondeu Lisa, orgulhosa por não ser tratada como criança.
— É, com certeza não aprovam. Mas em compen­sação acho que tem um salão de chá na loja. Talvez esteja aberto. Não sei quanto a você, mas eu estou morrendo de fome.
A menina deu de ombros.
— É melhor do que não fazer nada.
Tentou não demonstrar interesse demasiado, mas via-se que estava animada com a idéia.
— Talvez tenham algo gostoso para nos oferecer. Chocolate por exemplo... — provocou Mione.
— Duvido que tenham sorvetes com cobertura quente. Além do mais, minha mãe disse que choco­late faz mal para a pele.
Mione aproximou-se.
— Então vamos fazer um trato. Eu não digo nada se você não disser.
Os olhos da adolescente estreitaram-se, exprimin­do desconfiança.
— Por que você está sendo tão boazinha?
— Porque detesto comer chocolate sozinha. Acabo comendo demais.
As duas encontraram o salão de chá aberto, ocu­pado por alguns clientes.
— Hoje não cobramos nada — anunciou a garço­nete, com um sorriso cansado.
— O sorvete já descongelou inteiro?
— Ainda não, mas não vai durar muito — disse a moça. — Temos baunilha, chocolate, morango, cho­colate com menta e laranja.
As duas escolheram sundaes com cobertura quente.
— Acho que a cobertura não está quente, mas também não é o fim do mundo.
— Tem razão — concordou Lisa, enquanto as duas se acomodavam numa mesa próxima ao pátio.
Havia uma porta ali, e a adolescente olhou cheia de esperança para ela.
— Parece que essa porta não foi aberta hoje — observou Mione.
A menina pensou um pouco e acabou dando de ombros.
— Não sei. Se a gente sair agora vai ter de ir até a casa da namorada do meu pai — justificou ela. — Eu imagino que ela decorou a casa toda em branco, e no minuto em que conhecer Davis e Bran­don vai pensar que foi um castigo dos céus. Davis vai fazer alguma coisa bem nojenta para provocá-la, e papai vai ficar resmungando algo sobre trancar crianças em armários até os vinte anos, ou que deve mandar Davis para a academia militar.
Mione sorriu.
— Parece que Davis só quer se divertir.
— Claro, e para isso transforma a minha vida num inferno e tenta virar o mundo de Brandon de cabeça para baixo todos os dias. Se Brandon não tomar cuidado é capaz de acordar qualquer noite dormindo no sótão.
Lisa parou de falar quando o garçom colocou o prato com a taça de sorvete à sua frente. Embora o sorvete não estivesse completamente duro, a quan­tidade de cobertura de chocolate compensava am­plamente essa falha. Maravilhada, enfiou a colher e preparou o primeiro bocado.
Reparou no olhar de Mione, que a observava com certa ternura.
— Para mim chocolate é um grupo alimentar — declarou Mione. — Não importa como o dia tenha sido, comer um pouco de chocolate sempre torna as coisas melhores.
— Você tem toda a razão — riu a menina, enfiando a colher cheia na boca com ar de gulosa.
— Uau, sundaes de chocolate! Vocês não comeram tudo, comeram?
Lisa fez uma careta ao voltar-se para o irmão, ao mesmo tempo que Mione enxergava Harry e Brandon.
— Desculpem, cavalheiros, mas esta é uma mesa só para mulheres — avisou ela, percebendo o brilho divertido nos olhos de Harry.
— Isso quer dizer que comeram todo o chocolate ou não? — berrou Davis, desconfiado.
— Está vendo o que eu tenho de agüentar? — bradou Lisa, sem olhar para os homens. — Ele é tão educado como um búfalo africano.
— Muuuu! — fez Davis, na direção da irmã.
— Não me enche!
— Pelo menos eu não fico preocupada com espi­nhas no rosto e nem choro porque acho que os meus seios nunca vão crescer.
Lisa abriu a boca, tomando fôlego para dar uma resposta à altura para o irmão, quando um som agudo e terrível fendeu o ar. As três crianças olha­ram para o pai, cujo polegar apontava Mione. Esta retirava os dedos da boca, depois de assobiar.
— Meus parabéns — disse ela aos dois briguentos. — Vocês criaram uma cena que será lembrada por tanto tempo quanto os fogos de artifício. Um espetáculo de primeira para sua audiência.
O rosto da menina avermelhou-se e até Davis, que geralmente não ligava para nada, parecia sem graça.
Harry ficou ali, impressionado com a habilidade de Mione para transformar uma briga iminente numa situação controlada.
Aquele vaqueiro frustrado do Kevin não merecia essa mulher! Ela era alguém capaz de colocar seus filhos no lugar sem muito trabalho. Sentiu-se cul­pado por admirá-la mais do que a Carolyn.
O problema se resumia a saber se ele teria tempo de convencê-la a repensar a decisão de casar-se.
Olhou ao redor. Pela primeira vez em muito tempo, re­zou, pedindo para que a energia não voltasse tão cedo.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.