Capitulo XV
Gina inclinou a cabeça e olhou o fundo do prato. Harry visitara a América do Sul há um ano, pensou Gina, e semanas antes comentara que dificilmente tornaria a viajar para lá. Contava com diretores e gerentes de confiança que poderia enviar em seu lugar para cuidar de seus melhores interesses.
Contudo, Harry agora dava aquela notícia inesperada e Gina sentia que tinha alguma coisa a ver com a decisão. Assim como ela, Harry queria ausentar-se dali; também como ela, sentia a necessidade de solidão para refletir... Havia a possibilidade de ele concluir que tudo havia chegado ao limite máximo, e isso a preocupava... Apesar de ter sido severamente humilhada, Gina sabia o quanto seria difícil viver sem o tio...Quando tomavam café na sala de estar, o telefone tocou, dessa vez para Cho. Imediatamente Gina constatou que aquela era a grande e única oportunidade de ficar a sós com Harry e tentar reparar a situação difícil em que estava o relacionamento deles. Sua tentativa, entretanto, foi abafada pela voz poderosa de Harry, que se adiantou.
- Acho que devo me desculpar - começou, obrigando-a a permanecer quieta. - Se esse vestido é um exemplo do gosto de Cho, então sou o primeiro a concordar com você por tê-lo rejeitado. Fez uma pausa para retomar o fôlego. - Mais uma vez abusei da autoridade. É ridículo que eu continue a tratá-la como uma menina.
Gina não soube o que dizer e submeteu-se ao olhar insistente dele.
- Você mereceu a surra - prosseguiu. - Foi justificada... como não me considero um bárbaro peço-lhe desculpas também por isso.
Gina passou a língua pelos lábios secos.
- É por isso que está saindo de viagem? Perguntou impulsivamente.
- De onde tirou essa idéia? Vou a Montevidéu por razões puramente profissionais. Como relaciona isso com o que aconteceu ontem à noite?
- Pareceu uma decisão repentina...
- Às vezes isso acontece.
- Acontece? Há algumas semanas você disse que não ia mais voltar lá. Disse que poderia transferir essa responsabilidade a...
- Isso é outra coisa. Se quer saber, o senhor Garcia insistiu que assinemos o contrato com a minha presença... Além disso, a filha mais velha dele vai casar na próxima semana e fui convidado para a cerimônia. Desse modo, tenho dois compromissos pessoais, certo?
- O senhor Garcia tem mais filhas? Gina indagou, engolindo em seco.
- Três, acho eu - ele informou, enquanto enchia o copo de conhaque. - Satisfeita agora? Sou obrigado a fazer essa viagem.
- Leve-me com você! As palavras escaparam quase sem querer, mas Gina não podia voltar atrás.
- Não - respondeu Harry, seca e asperamente.
- Por que não?
Harry tomou um gole do conhaque, pôs o copo sobre a mesa e respondeu no mesmo tom:
- Não a convidaram.
- Duvido que não. O senhor Garcia sabe da minha existência, não sabe? De vez em quando até me mandava presentes, lembra? A boneca fantasiada de...
- Você não vai comigo - ele insistiu. - Se foi ou não convidada não tem a menor importância. Ficará aqui com Cho.
- Seu tratante! Bradou arfando.
- Repita o que disse! Harry levantou rapidamente, mas antes que a alcançasse, Cho retomou a sala.
- Desculpe a interrupção - ela disse, sentando-se no sofá e pegando a xícara de café. - Era um amigo de papai. Quis certificar-se de que eu estava me dando bem aqui... Fez uma pausa e acrescentou: Como é natural, respondi que sim.
Gina estava quase dormindo quando Harry entrou no quarto. Havia rolado na cama horas a fio e só agora tinha conseguido relaxar. Mas, ao ouvir a porta fechar-se, tomou imediatamente consciência da presença dele. A luz entrava através da janela, denunciando que já amanhecera.
- Oh... está acordada.
Gina sentou na cama e se encostou na cabeceira.
- Vim me despedir. Estou de partida...
- Cedo assim?
- São sete e meia. Meu avião sai de Heathow as quinze para o meio-dia. Diggory me levará até Manchester, onde pegarei o trem para Londres.
- Quanto tempo ficará fora?
- Já disse... uma semana, mais ou menos.
- Vou sentir sua falta...
- Eu também. Mas pelo menos nos daremos um descanso. E fora isso, será uma oportunidade de você e Cho aprenderam a conviver.
Gina baixou a cabeça.
- Se pensa assim...
- Ora, Gina...
Harry se aproximou e sentou na beirada da cama.
- O que quer que eu diga? Tomou-lhe a mão e colocou-a entre as suas. Na noite de ontem... Bom, é melhor não tocarmos nesse assunto, certo? Não gosto que me chame de tratante...
- Harry, tenho a impressão de que você sente prazer em me magoar - murmurou sem querer.
- Prazer em magoar você! Exclamou, pressionando-lhe a mão. - Gina, adoro você, como poderia magoá-la?
- Está sendo sincero?
- Mas é claro. Concordo que ontem perdi a paciência, assim como no sábado... mas com razão. Você precisa aprender a não se aproveitar do nosso relacionamento.
- Foi a primeira vez que recusou meu beijo.
- Um beijo diferente, concorda? Soltou-lhe a mão abruptamente. - Gina, você está crescendo e... o que fez... Se fosse outro já imaginou a complicação que teria arranjado?
- Mas eu beijei você e sabia que era você. Estava certa de que não haveria nenhum problema. - Gina sentiu a tensão tomar conta dele.
- Não, comigo não haveria problema - concordou. - E pare de olhar desse jeito! Não quero ir viajar com raiva de você!
Gina desviou o olhar.
- Então está bem. Vá embora. Boa viagem. Lembranças ao Sr. Garcia.
- Gina!
- Até logo - murmurou, os olhos cheios de lágrimas.
- Até logo - disse ele,inclinando a cabeça.
Instintivamente, Gina entreabriu os lábios, e com um gemido passou-lhe os braços pelo pescoço e o beijou.
- Oh, Gina - sussurrou, não resistindo ao convite doce dos lábios dela. Enlaçou-a pela cintura e atraiu-a para si.
Beijaram-se outra vez.
O lençol que protegia a nudez do busto de Gina escorregou e então ela desabotoou a camisa dele e comprimiu o peito contra o corpo quente de Harry. Quando se separaram, não se preocupou em ocultar os seios expostos. Ao contrário, olhou-o com um olhar desafiador e com orgulho. Harry estendeu a mão e tocou-lhe o ombro, como que resistindo ao desafio.
- Não, Gina - ele disse, a voz grave e vacilante.
- Por que não? Replicou, baixando o rosto.
Com a respiração difícil, Harry recuou e pôs-se de pé.
- Gina, o que devo fazer com você, responda? Quem pensa que sou?
- Acho que você é um homem... e eu, uma mulher - respondeu com a voz suave e baixa. - Você me quer, assim como eu te quero.
- Querer, querer! O que sabe sobre querer? Quantos homens você quis?
- Um só: você.
- Você enlouqueceu! Não sabe nada sobre o relacionamento entre um homem e uma mulher!
- Sei o que acontece!
- Claro, andou lendo umas revistas sobre sexo.. Gina, por Deus, você imagina o que seja ser amada por um homem! No entanto, fala como se fosse a mulher mais experiente do mundo! Só que não é! É uma adolescente, uma adolescente maluquinha que não sabe o básico sobre sexo entre homem e mulher!
- Você sabe, Harry.
- E não me fale desse jeito.
- Preferiria que eu fosse mais experiente?
- Não confunda as coisas, Gina! Exclamou, passando as mãos tremulas pelo cabelo. - Não quero você experiente ou inexperiente! Escute: sou responsável por você, e isso é tudo o que há entre nós.
- Não acredito nisso!
- Falo o que penso e sinto! Nós nos conhecemos há muitos anos. Somos... intimamente ligados, mas jamais me passou pela cabeça tê-la dessa forma.
Gina puxou o lençol e cobriu o peito.
- Quando... quando me beijou... começou, mas foi interrompida por Harry.
- Sinto muito. Fui grosseiro e me desculpo. Não era para acontecer. Não ia acontecer, se eu não me sentisse culpado.
- Mas então por que ainda está aqui comigo? Por que ainda não foi para Manchester, Montevidéu, ou sei lá eu para onde está indo? Já não conquistou essa sua pequena vitória? Vá embora e me deixe sozinha.
- Gina, por favor.
- Vá embora! Gritou, virando-se e escondendo o rosto no travesseiro.
Harry saiu do quarto contrariado e bateu a porta com violência.
Continua...
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