Capitulo XIII





- Iria gostar dela – ouviu-o murmurar. – se chegasse a conhecê-la, quero dizer. Ou será que ficou tão cética depois de sua própria experiência com o casamento, que não pode aceitar o fato de que certos casais se dão bem?

Ela sentiu seus lábios tremerem. Se ele apenas soubesse, pensou, com amargura. Não eram suas experiências conjugais que a tinham deixado cínica, pensava, mas sabia que não podia dizer-lhe a verdade, mesmo que estivesse morrendo de vontade de tirar aquela expressão de vitória do rosto de Harry. Não, não diria nada, porque jamais dissera nada a ninguém. E Harry seria a última pessoa na face da terra em quem poderia confiar.

- Sinto muito – murmurou, não querendo levar o assunto adiante. No entanto, suas desculpas não soavam sinceras. Tentou, então, dar um tom menos duro à observação que fizera antes: - Mas é a velha história do fotografo com sua modelo, entende? É algo muito comum. Quase um clichê.

- Não fotografo modelos. – Ele se afastou para deixar a caneca na pia. Depois, ainda de costas, continuou: - Eu e você precisamos conversar, Gina. Acho que ainda está carregando coisas demais do passado...

Gina esticou as pernas, tirando-as de debaixo de si. Como ele ousava dizer tal coisa? Como poderia imaginar que resolveria a história de ambos com apenas algumas palavras? Se desse valor aos sentimentos dela, jamais teria dito aquilo. Afinal, o que Harry estava tentando dizer? Que ela atrapalhara sua vida de alguma forma?

- Acho que nada temos a conversar – rebateu, muito séria. Afinal, ali, naquela casa, ele não tinha o direito de lhe falar naquele tom. Não, com o passado rondando tão perto.

Harry voltou-se.

- Vê? Está agindo como se eu fosse um inimigo novamente. Pelo amos de Deus, Gina, não consegue ver o quanto sofri durante anos?

- Você sofreu? – Por um momento, lento e terrível, ela esteve a ponto de contar-lhe tudo. Com Harry ali, diante dela, encarando-a com olhos frios e acusadores, Gina sentiu-se tentada a acabar com o mundo que ele construíra para si mesmo. Mas o bom senso e o orgulho evitaram que o fizesse, e disse apenas: - Não vejo como qualquer coisa que digamos possa mudar o que sentimos quanto ao passado.

- Pois eu esperava que houvesse me perdoado. Porque Deus é testemunha de quanto demorei para perdoar a mim mesmo.

Gina engoliu em seco. Sentia vontade de chorar, mas não o faria ali, diante dele.

- Também já lhe perdoei, não se preocupe com isso. Só não quero falar a respeito. – E deu-lhe as costas, indo para a porta interior da cozinha. – Acho que vou encontrar tia Nell. Deve haver alguma coisa que eu possa fazer para ajudá-la.

- Para ajudá-la, mas não para “me” ajudar! – Harry replicou, seguindo-a e segurando-a por um braço. – Por favor, Gina, não faça isso comigo!

Ela espantou-se com aquela atitude, mas não sabia como encará-la. Harry prosseguia, quase sem voz:

- Ontem à noite você disse que poderíamos ser amigos!

Amigos... A palavra doía para Gina mais do que qualquer outra que Harry pudesse escolher para dizer. Por isso pediu direta e fria:

- Solte meu braço. Parece que se esqueceu do motivo pelo qual estamos aqui!

- Não, não me esqueci de nada – ele respondeu muito próximo, fazendo com que Gina sentisse o calor de todo seu corpo. E, escorregando a mão por seu braço, tocou-lhe de leve a palma da mão, em lugar sensível, e sussurrou: - Pelo amor de Deus, Gina, não foi apenas minha culpa!


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- Então quando será o funeral? – perguntou Cho, tentando mostrar-se compreensiva.

Harry trocou o telefone de ouvido e recostou-se melhor à cabeceira da cama.

- Na terça, eu acho – respondeu. Queria parecer mais carinhoso para com a namorada, mas não conseguia esquecer o que se passara na cozinha, com Gina. Se tia Nell não houvesse aparecido assim que Gina se dispusera a procurá-la, ele não sabia até que ponto teria ido, fazendo-se passar por tolo novamente.

- Terça?! – Cho reclamou pesarosa. – Mas isso é quase no meio da semana que vem!

- É, eu sei. – Harry ainda não sabia ao certo quais os preparativos que sua mãe havia feito para o enterro de Arthur.

- Mas ele não morreu na quarta? – Cho continuava insistindo. – Seis dias é muito tempo para...

- Acredito que deve ter havido uma autópsia – Harry interrompeu-a, querendo parecer suave. – Sabe como são essas coisas... A morte foi repentina... E depois, o tempo está péssimo por aqui.

- Entendo. Bem, mas disseram no rádio que vai melhorar...

- Espero que sim. – Harry percebeu muito bem a falta de entusiasmo na conversa, em especial de sua parte, e Cho logo acusou-o por isso:

- Você não se importa, não é? Sabe muito bem que estou de partida para a Antiqua na próxima quinta e eu imaginava que poderia persuadi-lo a viajar comigo, mas agora me parece que nem sequer o verei até lá.

- Não planejei para que as coisas acontecessem dessa forma, Cho. – Ele tentava se justificar, mas, no intimo, sentia-se culpado, na verdade, esquecera completamente a viagem dela para Antiqua. – Sinto muito.

Ela não parecia convencida. E, após uma breve pausa, indagou, quase em uma afirmativa:

- Ela está aí?

- Quem? – Harry sabia muito bem a quem Cho se referia, mas precisava de mais alguns segundos para colocar os pensamentos em ordem.

- Sabe muito bem de quem estou falando! Gina! Quanto tempo ela vai ficar por aí?

- E isso importa? – Ele tentava parecer indiferente.

- É claro que importa ou não estaria perguntando! Sabe, eu gostaria de conhecê-la. E, se ela vier para Londres depois dos funerais...

- Eu não sei quais são os planos dela e nem me interesso por eles. Mas, mesmo assim, duvido de que Gina tenha tempo para ir a Londres.

- Por que não?

Ela o pegara. Não sabia como justificar o que acabara de dizer. Pensou por instantes, buscando desesperadamente uma explicação e saiu-se com uma que não lhe pareceu tão boa:

- Bem, o pai dela acabou de morrer, Cho. Deve haver coisas que ela tenha de fazer... Talvez assuntos de Arthur...

- E sua mãe não estará encarregada disso?

- Bem... ela talvez precise de alguma ajuda... Além do mais, você sabe como são os advogados. Coisas legais podem ser complicadas.

- Sei. Em outras palavras, você não quer falar com ela para que venha para Londres e fique em sua casa. – Cho parecia impaciente. – Honestamente, Harry, por que não consegue dizer a verdade? Não gosta dela, não é? E, sabe de uma coisa, estou começando a imaginar o que, de fato, aconteceu há anos atrás!

Harry revirou os olhos.

- Não aconteceu nada! – alterou-se. – Pelo amor de Deus, Cho! Pare de fazer um drama com isso, sim?! Se isso a agrada, prometo que falarei com Gina para que ela fique por alguns dias em minha casa antes de voltar para os Estados Unidos, está bem assim?

- Está, mas não precisa fazer parecer que eu o estivesse forçando a isso.

Harry não estava entendendo mais nada.

- Meu Deus! – exclamou, mas Cho acalmou-o depressa: - Está bem, está bem! Ficamos acertados assim, então. E... promete que teremos algum tempo juntos assim que eu voltar de viagem?


Continua...



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