Capitulo IV
Naquele momento, o que mais desejava era ter alguém com quem conversar, contar seus problemas.
No entanto, tomava café sozinha no pequeno restaurante da esquina. Não era de fazer amizades facilmente, e na verdade preferia ficar só. Quando não estava trabalhando, não permitia que estranhos se aproximassem. Mas nem se dava conta disso.
Olhou fixamente para a xícara e lembrou de cada palavra que Potter dissera. O médico deixara claro que a desprezava. Bem , talvez fosse de fato desprezível. Seu pai quando vivo, parecia achar o mesmo,pois queixava-se constantemente dela, dizendo que seria uma eterna perdedora.
- Com licença....
Ela ergueu os olhos e deu com a garçonete.
- Pois não?
- Deseja mais alguma coisa?
Gina tentou esboçar um sorriso, sem muito sucesso.
- Não , obrigada. Na verdade, hoje não estou com muita fome.
A garçonete entregou-lhe a conta ,que LouiseGina pagou.
- Se precisar de alguma coisa, é só chamar- disse a moça. Sorriu e afastou-se.
Gina tomava o último gole de café quando Potter entrou apressado no local. Tinha uma expressão zangada e olhava em torno como se procurasse alguém. Em seguida avistou-
“ Deve haver alguma emergência” , pensou ela enquanto o médico se aproximava e depositava o envelope aberto sobre a mesa.
- Pode me dizer o que significa isso? – indagou num tom perigosamente calmo.
Gina ergueu os frios olhos dourados.
- Meu pedido de demissão.
- Isso eu já sei. Quero saber porque resolveu demitir-se.
Ela olhou ao redor e percebeu que o restaurante estava quase vazio.Apenas um rapaz e a garçonete prestavam atenção a eles.Ergueu o queixo com altivez antes de responder:
- Se não se importa, prefiro não discutir assuntos particulares em público.
Ele cerrou os dentes,zangado.
- Muito bem.Se terminou de almoçar eu gostaria que me acompanhasse.-disse, e recuou, permitindo que ela se levantasse.
O coração de Gina disparou quando ele guardou o envelope no bolso e pegou-a pelo braço para gentilmente conduzi-la à saída.
Ela já havia tirado as chaves do carro de dentro da bolsa, mas Potter a impeliu na direção contrária ao estacionameto,até uma praça que ficava perto dali.Era dezembro, o ar estava frio, e as árvores pareciam tristonhas sem as folhas.No entanto, o nervosismo a fazia transpirar.
Ele as obrigou a sentar-se num dos bancos e permaneceu em pé,com uma das pernas apoiadas num tronco de árvore.
- Porque essa decisão súbita?
- Não é tão súbita assim.Há tempos venho planejando voltar para Austin.De qualquer forma,o contrato que assinei é de um ano e está para terminar.
- Por que voltar para Austin? Não há ninguém à sua espera naquela cidade.
- Há sim:meus amigos. E estou certa de que a mudança me fará bem.
- Pelo que sei, o único amigo que possui é Dino Thomas.
Gina brincava com as chaves e olhava para a própria mão ,sem demonstrar suas emoções.
Os olhos de Potter seguiram os dela e algo novo surgiu em sua expressão.O médico pegou-lhe a mão rígida, abriu-a e franziu a testa ao notar os vincos vermelhos que as chaves haviam produzido.
Gina podia ouvir as batidas frenéticas do próprio coração e detestou aquela falta de controle.Puxou a mão .Potter recuou um pouco , e já não havia o menor traço de rancor nele.
- Nenhuma parceria se torna bem sucedida do dia para a noite-disse ele- Você deu menos de um anos à nossa.
- Exato.
A ênfase colocada na palvara chamou a atenção dele.Fitou-a com os olhos verdes estreitados.
- Parece até que não colaborei para que desse certo.
Ela manteve os olhos fixos no do médico.
- Para que desse certo, precisaríamos manter um relacionamento no mínimo razoável, e tolerar um ao outro. Você não gosta de mim, disso eu suspeitava ,mas esta manhã, após o que disse a Dino...
- Você ouviu a nossa conversa?- indagou ele, com a voz rouca- Ouviu ...toda a conversa?
- Quase toda.
Potter tentava se lembrar daquilo que dissera a Dino num momento de explosão.Costumava falar sem pensar quando se esquentava, mas depois se arrependia. Dessa vez, porém , lamentava-se ainda mais.Nunca lhe ocorrera que Gina , com aquela aparência fria e distante,pudesse ter um coração.
No entanto, nos últimos cinco minutos descobrira coisas incríveis sobre ela , e sem que uma só palavra fosse dita. Magoara-a sem querer, mas havia uma explicação para isso. Estava desnorteado porque acabara de diagnosticar leucemia num garotinho de quatro anos, e aquilo o deprimira.
Descontara em Dino Thomas, agredindo Gina. Mas não podia imaginar que estivesse sendo ouvido.Agora ela queria ir embora e com razão.Estava sinceramente arrependido e temia que Gina jamais fosse acreditar em seu arrependimento.
- Você me contratou apenas para fazer um favor a Dino.Bem , agora está livre para contratar quem bem desejar.
- Espere um pouco....
- Prefiro não continuar discutindo.Estou cansada de brigar com você. Se sou um estorvo, como disse, deve alegrar-se por se ver livre de mim.Mas não pretendo deixa-lo na mão.Ficarei até que encontre alguém que me substitua- disse ela, e levantou-se.
Potter desesperou-se.Detestava explicar o motivo de seus maus humores.
- Você precisa entender.Às vezes digo coisas que não estou sentindo. Fiquei arrasado com a notícia da leucemia do garoto.
- Ambos sabemos que você foi absolutamente sincero quando disse aquilo.Sempre me detestou e na verdade às vezes mal conseguia ser civilizado comigo.Como eu poderia adivinhar que guardava tanto rancor contra mim?
Gina percebeu uma sutil mudança na expressão dele.Era como se suas palavras despertassem lembranças antigas.
- Então você também ouviu essa parte da conversa?
- Infelizmente.Mas, afinal ,o que houve? Meu pai causou a morte de alguém?
Potter manteve silêncio por um momento. Gina trazia à tona recordações muito antigas que continuavam dolorosas e que ele preferia guardar no coração .Mas talvez fosse melhor falar.Há um ano vivia fingindo.
- Seu pai engravidou a mulher com que eu iria me casar e depois a convenceu a fazer um aborto.Assim ,eu me casaria com ela e jamais descobriria o que haviam feito. Só que ele não contou com as complicações que quase a mataram após a cirurgia, que ele mesmo fez.O conselho médico do hospital convidou-o a demitir-se.
- Oh, não !
Gina empalideceu.Sua mãe chegara a saber disso ?E o que acontecera à moça?
- Poucas pessoas souberam ,e duvido que que a história tenha chegado aos ouvidos de sua mãe- explicou Potter, como se tivesse adivinhado seus pensamentos-Ela sempre me pareceu uma excelente pessoa e não merecia o marido que tinha.
- E sua noiva? O que aconteceu com ela?
- Deixou a cidade e casou-se com outro.- Potter enfiou as mãos nos bolsos da calça e a fitou. –Se deseja saber toda a verdade, poderei lhe dizer. Dino ficou penalizado quando você ficou sozinha no mundo após o acidente que matou seus pais e a recomendou quando soube que eu procurava um assistente. Não fiz ligação com os sobrenomes. Irônico,não ? Escolhe justamente a filha do homem que odiei até o dia de sua morte.
Gina o fitou, com uma expressão ansiosa no rosto bonito e pequenos pontinhos dourados brilhando nas profundezas dos olhos cor de mel.
Continua [...]
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