XXV
O telefone tocou alguns minutos após Gina entrar em casa.
- Ainda está tremendo?- Era Potter.
- O que você quer?
- Convidá-la para passar o Natal comigo. Não quero ficar o dia todo sozinho, assistindo televisão e comendo comida congelada.
Gina ainda estava ressentida. Pela Segunda vez haviam dado um espetáculo em público e agora seriam alvo de comentários maliciosos durante semanas.
- Não é tão ruim. O descanso lhe fará bem.
- Ainda prefiro um pouco mais de agitação. Se você preparar um belo peru, prometo levar a sobremesa.
Gina hesitou. Queria muito ter alguém a seu lado no Natal, especialmente Potter.
Mas, do jeito como as coisas estavam, isso só traria mais complicações.
-Vamos lá, Gina. Será uma oportunidade de passarmos algum tempo juntos. Você irá embora. O que tem a perder?
“Nada demais” pensou ela. “Somente a auto estima, a honra, a virtude e o orgulho”.
- Está bem. Eu o esperarei.
- Ótimo. Estarei aí às onze da manhã. - E desligou, antes que ela mudasse de idéia. -
“Creio que me arrependerei disso o resto da vida”, concluiu ela ao afastar-se do telefone.
Decisão tomada precisou ir às compras.
Na véspera do Natal, o dia estava ensolarado e a possibilidade de nevar, segundo o meteorologista, afastada. Gina imaginou como seria bom ter uma paisagem típica do
Natal americano.
Deixou tudo pronto para o dia seguinte, ligou a televisão e encolheu-se no sofá usando um velho jeans, suéter de lã e meias. Conseguira relaxar um pouco quando um carro estacionar lá fora. Eram oito horas, e ela não esperava visitas.
Foi até a janela e avistou o Jaguar prateado estacionado. De dentro dele saiu um homem alto, moreno, usando jeans, suéter de couro e botas. Carregava uma grande caixa.
- Abra a porta - Potter pediu ao se aproximar.
- O que é isso?- ela perguntou, cheia de curiosidade.
- Comida e presentes. - Dirigiu-se à cozinha e abriu a caixa. - Aqui estão todos os acompanhamentos para o peru, além de torta de maçã e bolo de chocolate com recheio de mousse. Há lugar na geladeira?
- Para que tanto doce?
- Eu gosto. Você não?
- Gosto muito.
Gina abriu a geladeira e ajudou-o a guardar as embalagens. Potter retornou à caixa e lá tirou dois pacotinhos.
- Este eu entrego a você. Este outro ,você entrega para mim.
- Mas já comprei um presente para você - protestou ela.
- É mesmo?
- Claro. O fato de eu não pretender passar o Natal a seu lado não significa que fosse deixar de comprar-lhe presente.
- Na festa de Natal todos trocaram presente, mas você não me deu nada.
- Nem você.
Potter sorriu.
-Guardei o seu presente para entregar amanhã. Vamos colocá-los sob a árvore?
- Faça o favor....-Gina seguiu-o até a sala de estar.
O fogo crepitava na lareira de pedra,sobre a qual se encontravam vários enfeites natalinos. Diante da janela da frente havia uma enorme árvore, que Gina arrastara para dentro da casa no começo da semana e cuja decoração brilhava.
Mas o que mais chamou a atenção de Potter foi o trenzinho elétrico que ela colocara ao pé da planta.
-Não posso acreditar. É um American Flyer!- exclamou, e abaixou-se para examinar mais atentamente o brinquedo.
- Foi mamãe que me deu. Sou fanática por trenzinhos elétricos. Tenho mais dois e quase um quilometro de trilhos guardados no armário, mas não tive coragem de armar tudo sozinha.
- Em que armário estão?- perguntou ele, com os olhos brilhando.
- No do corredor. Gosta de trens?
- Se gosto? Tenho uma coleção!
- Eu jamais poderia imaginar....
Gina conduziu-o até o armário e de lá tiraram as caixas. Em seguida , como duas crianças, sentaram-se no chão e passaram horas montando os trilhos. Ela preparou café, que tomaram ali mesmo.
Quando a miniatura de uma linha férrea que passava por dento de uma vilazinha ficou pronta, a eletricidade foi ligada e o efeito foi surpreendente. Os prediozinhos iluminaram se e o trenzinho começou a mover-se.
- Adoro ficar no escuro observando. È como se fosse uma vila de verdade, com os habitantes escondidos em suas casas – comentou ela.
Potter encontrava-se de bruços no chão, encantado com o brinquedo.
- Mas é surpreendente! Eu não fazia idéia de que você gostasse de trens.
Gina riu.
- Sempre me senti culpada por mantê-los dentro das caixas, quando milhões de crianças fariam qualquer para poder brincar com eles.
- Também me sinto assim. Tinha oito anos quando meu avô me presenteou com um desses.. Na verdade, ele estava presenteando a si mesmo. Adorava brincar. –disse, sorrindo. De repente seu rosto ficou sério. - Quando fui para Houston com papai, senti tanta falta do trenzinho quanto de meus avós. Demorei para voltar mas, quando fiz isso, o trenzinho ainda funcionava.
- Você disse que não contou a Jane sobre seu pai...
- É verdade. É algo do qual durante muito tempo me envergonhei.
- Mas não devia. Certo ou errado, as crianças fazem sempre o que as mandam fazer.
- Eu estava ciente de que era errado, mas tinha medo de meu pai. - Potter voltou-se e sorriu. - Você deve entender o que estou dizendo.
- Mais do que ninguém.
Ele apoiou o queixo nas mãos e olhou, pensativo, para o trenzinho.
- Graças a Deus pode contar com a ajuda de pessoas bem intencionadas. Hoje procuro, de alguma forma, retribuir. Por isso fiz medicina. Para poder ajudar quem precisa.
- Entendo.
Gina se pôs a observá-lo. Potter era tão diferente, assim relaxado...Tão mais gentil...Lembrou que logo não se veriam mais. Seu olhar triste voltou-se para o pequeno trem. O barulho dos vagões soava como uma cantiga reconfortante e deliciosa em seus ouvidos.
- Você precisa comprar mais alguns acessórios para ficar completo. - disse ele -Se houvesse alguma loja de brinquedos por perto,poderíamos ir comprar. Mas já deve estar tudo fechado.
- Creio que sim.
- Se você ficasse na cidade, poderíamos juntar o que temos e formar um grande circuito. Poderíamos montar as pontes e os prédios com os novos acessórios que comprarmos.
Gina admirou-se com aquele entusiasmo. No entanto,estava mais interessada em aproveitar bem o tempo que lhes restava.
- Seria muito bom, mas já assinei um contrato e tenho de cumpri-lo.
- Contratos podem ser rompidos. Há sempre uma cláusula que prevê estes casos.
- Há gente demais comentando sobre nós, interferindo em nossas vidas. Não gosto disso.
- Em cidadezinhas como esta não há como evitar. – Potter puxou uma pequena alavanca, que desviou os trilhos, e o trem mudou de curso. -Não é uma beleza ?
- Acho. - Gina riu - Se eu tivesse mais tempo livre, brincaria todos os dias. É bom estar de folga nesse fim de semana. Como conseguiu?
- Com ameaças e subornos. – brincou ele - Nós dois trabalhamos no Natal passado, lembra-se?
- Claro que me lembro. E, como sempre, brigamos.
- Mas as brigas eram necessárias, sabia?- disse ele, rolando no chão. - Se não brigássemos. Com certeza eu a deitaria sobre a mesa de exames e faria amor com você a toda hora.
- Oh, Potter...
- O problema era que você se afastava bruscamente toda vez que eu me aproximava. Foi o que a salvou. Desejei-a muito , doutora, e lutei contra isso como um louco- confessou ele, acariciando-lhe o rosto, explorando-lhe a boca.
- Pare com isso. - ela pediu.
- Por quê? Você gosta, e eu também.- Aproximou-se e passou a perna sobre a dela, prendendo-a ao chão. - Posso sentir as batidas do seu coração...sua respiração entrecortada...-constatou, a boca colada à dela. A mão máscula e forte deslizou até seus seios, parando ali para brincar com os mamilos. - Sente isso? Seu corpo gosta de mim.
Gina abriu a boca para protestar, mas retraiu-se. Era noite de Natal e ela ama aquele homem. Não havia por que resistir.
(...)
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