O sol



O sol

Encarando a fantasma branco-pérola à sua frente, Érika tentava imaginar o que fazer. - Nunca vou perdoar Nicole por essa encrenca em que me meteu. - pensou ela, esforçando-se para aparentar tranqüilidade.


-“Até agora você só ameaçou. Vamos, mostre-me o que você tem!” – provocou ela, ao que Luísa sorriu.


-“Você não perde por esperar! Pumpkin, agora!”- ordenou Luísa.


Obedecendo ao comando da garota, o boneco com cabeça de abóbora fez surgir uma pequena foice para si.


-“Você pretende me atingir com isso?” – disse Érika, rindo.


-“Olhe direito.” – falou Mlle. Lautrec, com uma foice própria nas mãos, pronta para atacar.


-“Oops, problemas!” – disse Érika, para si mesma.


Com uma risada fantasmagórica, Mlle. Lautrec avançou. Sem pensar muito, Érika pulou e rolou por baixo da fantasma, que acabou golpeando o ar.


-“Volte aqui!” – gritou ela, colérica.


-“Sim, senhora.” – respondeu Érika, virando-se novamente para encarar a adversária, que ergueu a foice para um novo golpe.


Naquele momento, Érika atirou o pêndulo, que prendeu no colar de Mlle. Lautrec. Com um puxão, o colar arrebentou e saiu do pescoço da fantasma. Seus olhos e os do boneco deixaram imediatamente de serem vermelhos.


-“O que eu estou fazendo?” – perguntou Mlle. Lautrec, mirando a arma em suas mãos, completamente confusa.


-“Tudo está bem agora.” – disse Érika, virando-se na direção de Luísa, que tinha o pânico estampado no olhar, mas recuperou-se depressa.


-“Pumpkin, rápido, controle-a novamente!” – ordenou ao boneco.


No entanto, antes que este pudesse fazer alguma coisa, Érika atirou o pêndulo na direção de Luísa. Guiado pela magia da garota, o objeto envolveu boneco e manipuladora. Segurando uma das pontas do fio, Érika apertou o laço, fazendo com que Luísa largasse o boneco.


-“Acabou.” – disse Érika, sorrindo.


 


            *   *   *


 


No meio do corredor, Nicole James e o espectro Crawler travavam uma luta feroz. A garota atacava o monstruoso animal, que se esquivava com agilidade.


-“Achou que fosse fácil, James?” – disse Pedro, rindo das frustradas tentativas da garota de ferir seu espectro.


Nicole não respondeu, era melhor não dar ouvidos às provocações. Ela sabia que faltava apenas um pouco mais de concentração para vencer aquela luta.


Crawler aproveitou um intervalo entre os golpes de Nicole para começara a atacar. Foi a vez de a garota fazer malabarismos para desviar dos ataques que sofria, uma tarefa dificultada pela velocidade do espectro e pelo peso do machado que ela carregava.


Vendo que a adversária começava a cansar-se, a hiena preparou-se para desferir um golpe certeiro. No entanto, ergueu demais a pata, dando espaço a Nicole, que chutou o peito do animal com toda a força que possuía e correu para longe do inimigo. Sem fôlego, Crawler cambaleou.


Parando há alguns metros do adversário, Nicole respirou fundo. Estava ficando cansada e sentia que não poderia prolongar a luta por muito mais tempo. Com urgência, ela começou a pensar em uma estratégia para vencer seu inimigo o quanto antes.


-“Já está cansada?” – provocou Pedro – “Eu não estou nem suando!” – e riu, com a hiena acompanhando seu riso.


Nicole riu também.


-“Cansada? Eu estou apenas começando!” – e dizendo isso, ela ergueu o machado novamente, encarando seu inimigo nos olhos.


Pedro ficou sério, assim como Crawler, que bateu as garras e afastou as pernas, preparando-se para um novo ataque.


Nicole estava pronta, mas esperou. Se fizesse a hiena se precipitar e avançar primeiro poderia obter uma vantagem. Sustentando o olhar provocador, ela esperou. O silêncio agora caía sobre todo o corredor, quebrado apenas pela bufar de Crawler e pela respiração arquejante de Nicole. Quando a garota achou que não poderia esperar mais, Pedro gritou para o espectro, ordenando-o que atacasse. Enfurecido, o animal obedeceu.


Vendo-o correr em sua direção, Nicole correu também, fingindo que seu golpe viria da esquerda. Porém, quando aproximou-se do espectro, ela mudou a posição da arma em suas mãos e desferiu um golpe vindo da direita. Pego de surpresa, Crawler teve pouco tempo para reagir, mas conseguiu esquivar-se e cortar o braço esquerdo da garota com suas garras.


Nicole sentiu uma forte ardência no braço. No entanto, ao passar pelo adversário, ela virou-se e cravou-lhe o machado nas costas. Urrando de dor, Crawler caiu no chão e desapareceu em meio a uma nuvem de fumaça negra.


-“Não! Volte já aqui e lute!” – gritou Pedro.


-“Ele não vai voltar, idiota.” – disse Nicole, apertando o braço ensangüentado.


Branco de pavor, Pedro começou a correr na direção em que Alice fora, minutos atrás.


Sem forças para dete-lo e sentindo sua visão turvar-se, Nicole caiu desmaiada.


 


            *   *   *


 


-“Ah, não!” – gritou Mlle. Lautrec, adiantando-se para bloquear a passagem de Pedro.


-“Nicole!” – disse Érika, ao ver a outra desfalecida no chão.


Preocupada, ela correu na direção de Nicole, puxando Luísa, que caminhava a contra-gosto atrás dela.


-“Está desmaiada.” – disse Érika para Mlle. Lautrec, quando esta retornou escoltando Pedro – “E veja quanto sangue!”


-“Pobrezinha!” – suspirou a fantasma – “Faça alguma coisa, se não ela vai acabar me fazendo companhia aqui pelo resto da eternidade!”


-“Não brinque com uma coisa dessas!” – ralhou Érika, cada vez mais assustada – “Gostaria de poder fazer alguma coisa...”


Naquele momento, o talismã da Estrela soltou Luísa e abandonou a forma de pêndulo. Em meio a uma forte luz azul, sua magia fechou os cortes no braço de Nicole, que recobrou a consciência.


-“Érika, mas o que...”


-“Você está viva!” – gritou ela, abraçando Nicole com toda a força.


-“Você...está...me sufocando!” – engasgou-se a outra.


-“Oh, desculpe.” – disse Érika, largando-a.”


-“Está bem, obrigada. Você... me curou?” – disse Nicole, pasma, procurando os cortes em meio aos resquícios de sangue em seu braço.


-“Bem, sim. Mas agora meu talismã sumiu.”


-“Você deve ter usado muita energia. O meu sumiu também.” – ela explicou, olhando para o lugar em que seu machado caíra e que agora estava vazio.


-“Essas... brigas todas” – começou Mlle. Lautrec – “são por causa do que o meu Gabriel deixou aqui em baixo?”


Nicole confirmou com um aceno da cabeça.


-“Mas e essas armas que nós temos? Essas em que os talismãs se transformam?” – indagou Érika.


-“Haverá muito tempo para explicações depois.” – disse Nicole, levantando-se – “Agora temos que encontrar Alice. E vocês vêm conosco.” – acrescentou, apontando para Pedro e Luísa.


Revistando-os, Nicole confiscou-lhes as varinhas e as guardou consigo. Empunhando a própria varinha e fazendo sinal a Érika para que a imitasse, ela avançou pelo corredor.


-“E os talismãs deles?”


-“São inofensivos por enquanto, Érika. Eles gastaram muita energia, vai demorar um pouco para que consigam utilizá-los novamente.”


-“Mas não são talismãs do mal? Não deveríamos destruí-los?”


-“Prefiro deixar que outra pessoa decida sobre esse assunto.” – respondeu Nicole, em tom de quem encerra a conversa.


-“Depressa!” – disse Mlle. Lautrec, com urgência.


As garotas apressaram o passo, forçando Pedro e Luísa a irem na frente, apontando sempre as varinhas para as costas dos dois. Fazendo a curva para a esquerda, o grupo avistou adiante uma luz azulada. Avançando mais alguns metros, eles chegaram até a porta entreaberta.


 


*   *   *


 


-“Abra o baú, pegue o talismã e entregue-o a Henry Monfort.”


Alice estava com as mãos sobre a tampa do baú. Aquela voz em sua cabeça parecia impossível de ser desobedecida. Porém, ao mesmo tempo, parecia estranhamente familiar.


-“Isso mesmo!” – vibrava Henry – “Me entregue o talismã!”


A garota começou a levantar a tampa, o brilho azulado intensificou-se cada vez mais. Ela sabia que não devia fazer aquilo, mas não conseguia se controlar. Ainda que utilizasse todas as forças que possuía para reagir ao encanto, de nada adiantava. Todos os seus esforços eram inúteis. Henry venceria no final e ela teria desapontado àqueles que acreditaram nela.


-“Alice, não!” – gritou Nicole, escancarando a porta.


-“O quê?” – surpreendeu-se Henry, parecendo assustado em ver tão inusitado grupo invadir a sala.


-“Elas nos derrotaram!” – disse Luísa, chorosa.


-“Estou vendo.” – respondeu-lhe Henry, rudemente – “Mas não vai adiantar, Alice já está prestes a me entregar o talismã, e não há nada que vocês possam fazer para impedir!”


Àquela altura, Alice já tinha levantado por completo a tampa do baú e a intensidade da luz azulada era mais forte do que nunca. Olhando para o interior do objeto, só o que a garota encontrou foi um ovo, um grande ovo com manchas vermelhas.


-“Isso é o talismã?” – perguntou Henry, pasmo.


Nicole e Érika, que não podiam ver o que estava acontecendo, fizeram menção de se aproximarem, ao que Henry apontou a varinha na direção delas, ameaçando:


-“Não se atrevam!”


-“Você não se atreva!” – disse Nicole, mostrando que ela e Érika tinham Luísa e Pedro como reféns.


Henry calou-se e seu olhar voltou a Alice que, ainda sob o efeito do feitiço, retirara o ovo da caixa. Sorrindo, o garoto a viu aproximar-se.


-“Alice, não faça isso.” – murmurou Érika.


-“Pare o feitiço, Henry, ou eu garanto que seu parceiro nunca mais falará novamente!” – ameaçou Nicole, segurando Pedro pelo colarinho e apontando sua varinha diretamente para o rosto do garoto.


-“Você realmente acha que eu vou cair nessa, James?” – respondeu Monfort, rindo.


Nicole ficou vermelha de raiva. Alice agora começava a estender o braço para entregar o ovo a Henry. Ela tentava reter o movimento, trazer seus braços novamente para si, mas não conseguia. Lágrimas discretas e silenciosas brotaram de seus olhos. Eram lágrimas de tristeza e frustração, mas mais ainda, de vergonha. Érika e Nicole tinham vencido seus desafios, mas Alice não conseguira vencer o dela.


De repente, o barulho de algo se partindo sobressaltou a todos – a casca do ovo começava a rachar-se. Tensos, todos prenderam a respiração. Um pedaço lateral da casca caiu, revelando um brilho vermelho vindo de seu interior. 


-“Entregue-me logo isso!” – exasperou-se Henry.


Naquele momento, o topo do ovo rachou e uma cabeça de pássaro saiu de seu interior. Era a cabeça vermelha de uma jovem fênix.


-“O quê?” – disse Pedro, sem entender.


-“Acho que é uma fênix.” – murmurou Luísa.


Como se acordasse de um transe, Alice viu-se livre do poder do feitiço.


-“Não vou entregar-lhe nada!” – falou, encarando Henry.


-“Estupefaça!” – gritou ele.


Alice não se mexeu, pois não precisou – o feitiço simplesmente não teve efeito algum. Ante a expressão de espanto de Henry, os olhos da menina se tornaram dourados e uma aura de luz amarela a envolveu. A fênix, por sua vez, terminou de sair do ovo.


-“Você acha que isso funciona contra mim?” – perguntou Alice.


-“Isso, vai Alice!” – vibrou Érika, mas acabou descuidando-se de Luísa, que se desvencilhou dela e roubou-lhe a varinha.


-“Devolva minha varinha.” – disse para Nicole – “Ou eu arrebento a sua amiga.”


-“Você se esqueceu que seu amigo ainda é meu refém?” -   perguntou Nicole, segurando Pedro com mais firmeza.


-“Não, mas acho que eu não me importo tanto com ele quanto você se importa com ela.” – provocou Luísa.


As duas se encararam durante alguns segundos. Por fim, Nicole empurrou Pedro na direção de Luísa e devolveu-lhes as varinhas.


-“Obrigada.” – sussurrou Érika, quando Luísa a largou.


-“Não agradeça.” – disse Nicole, secamente, ainda encarando os adversário, varinha em punho.


Há alguns metros de distância, Alice aproximava-se de Henry, que andou para trás até encostar na parede.


 De repente, a porta fechou-se com um baque, como se movida por uma corrente de ar, mas não havia vento. Érika aproveitou-se da distração de Luísa e Pedro para recuperar sua varinha.  Alice tinha a fênix recém nascida aninhada em suas mãos. As duas juntas irradiavam tamanho poder que Henry não conseguia fazer mais do que encará-las, amedrontado.  A pequena ave abriu o bico e emitiu um som agudo, mas melodioso. Naquele momento, uma luz dourada surgiu à frente de Alice, intensificando-se até parecer que o próprio sol brilhava na sala escura.


Todos, à exceção de Alice e da Fênix, desviaram o olhar. Pedro e Luísa aproveitaram que ninguém estava prestando atenção e escapuliram pela porta. Quando a intensidade da luz diminui, um pequeno sol feito de ouro maciço surgiu pairando no ar em frente à Alice.


 


 


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