CAPÍTULO III




Dora Lupin tirara uma folga dos seus afazeres domésticos, pois toda a família saíra de casa, e aproveitava aquele raro momento de sossego para fazer um lanche no chalé de Ginny. Queixava-se um pouco da vida, valendo-se dos ouvidos pacientes da amiga.

- Será que Remo não vê que com cinco crianças não é fácil trazer tudo em ordem? Desabafou, magoada, jurando que até a hora do churrasco não trocaria uma só palavra com ele. Depois perguntou, com ar de curiosidade: - Quem será a pessoa que Harry vai trazer?

- Não sei quem é. Harry não me disse. - Ginny sorriu com ternura e pousou a mão sobre a de sua vizinha. - E, quanto ao seu problema com Remo, quero lhe dizer que tenho certeza de que ele acha você maravilhosa. Às vezes, Remo tem seus rompantes de mau humor apenas isto.

Absorvida pelos próprios problemas, Dora resmungou:

- Sabe o que piorou tudo hoje de manhã? Remo não conseguiu achar nem escova, nem pente para se pentear, apesar de ter comprado uma dúzia de cada, na semana passada. Bem, eu ri quando ele saiu todo descabelado e ele quase explodiu de raiva. - Dora deu uma gostosa gargalhada e continuou: Mas, voltando a Harry, acho que ele tem uma nova namorada. Remo o viu nas corridas, acompanhado por uma mulher, há algumas Semanas... Matt Bartholomew estava junto também.

Aparentando completa indiferença, Ginny perguntou:

- Matt? Aquele ruivo alto que tem vindo muito à fazenda ultimamente?

- Este mesmo. É um mulherengo, não dê confiança para ele.

- Por que ele tem vindo tanto aqui?

- Ele tem direito a uma percentagem sobre a venda de Tiara Tahiti, nosso melhor animal.

Dora lançou um olhar disfarçado a Ginny, como se quisesse fazer algum comentário sobre Matt Bartholomew, mas desistiu. Preferiu retomar o assunto da nova namorada de Harry.

- Todas as mulheres ficam caidinhas por Harry. Nenhuma resiste ao seu charme. Mas ele sofreu muito por causa de uma mulher, há muitos anos atrás, e agora não quer saber de nada sério. Conquista a todas, mas não ama ninguém. É um solteirão convicto.

- Que história é esta, Dora? - Ginny perguntou curiosa. - Conte para mim.

Enquanto cuidava da água para o chá, Dora contou o que sabia sobre o passado do patrão.

- Quando Harry chegou aqui, ainda não era rico. Tinha apenas capacidade de trabalho e uma enorme ambição de vencer. Começou como capataz numa fazenda de cavalos de corrida e em pouco tempo ficou perdidamente apaixonado por uma das filhas do proprietário. Ela também gostou dele, mas seus pais não quiseram nem ouvir falar daquele romance. Dispensaram Harry, mandaram a filha às pressas para a Europa e deram um jeito de casá-la com uma pessoa da antiga nobreza européia. Foi terrível para Harry. Um golpe duríssimo, no começo da vida; mas, por outro lado, depois desta experiência triste ele ficou ainda mais determinado a fazer fortuna e vencer.

Dora abriu os braços amplamente, num gesto de desolação.

- Harry conseguiu o sucesso, mas, apesar de ter tantas mulheres que o adoram, nunca mais amou ninguém.

- Você acha que ele ainda ama aquela moça? - Ginny perguntou.

- Acho que sim. Já se passaram quinze anos. Ele adora crianças, mas não tem filhos, nem um verdadeiro lar. Segundo Remo, a única vez em que Harry se embriagou na vida foi quando ele soube do casamento de Fairleigh, a filha de seu antigo patrão e sua antiga namorada.

Ginny permaneceu em silêncio, refletindo sobre aquele novo e inesperado aspecto da personalidade de Harry Potter. Lembrou-se das palavras dele quando tinha lhe falado da importância do primeiro amor. Devia estar pensando em si mesmo e na sua grande desilusão amorosa.

- Dora, você conhece Harry há muito tempo?

- Desde que casei com Remo, que convive com ele praticamente desde garoto. Mas há um lado de Harry que ninguém conhece realmente. Ele tem um lado selvagem muito bem controlado, mas que é indomável.

- Qual é a idade de Harry?

- Deve estar perto dos trinta e cinco anos...

- Bem, uma vez ele me disse que tinha idade para ser meu pai... Acho que exagerou.

Entre um gole e outro de chá, Ginny contou a Dora o incidente do elevador.

- Coitadinha! Você é meio desastrada, não? O que aconteceu no elevador é tão surpreendente como o caso da Delegacia de Polícia. Precisa de um guarda-costas, Ginny, para não fazer mais trapalhadas assim!

Ginny suspirou:

- Às vezes, acho que Harry age como se fosse meu pai ou meu anjo da guarda.

- Assim está ótimo! Mas quando eu noto o modo...

Dora interrompeu-se bruscamente.

- O que disse?

- Nada! Dora respondeu, porém em seguida mudou de idéia. - Ginny, meu bem, você precisa tomar cuidado. Não pense que estou bancando a antiquada, mas este Matt Bartholomew olha para você de um jeito... Acho que ele não vai lhe trazer nada de bom. É melhor não dar confiança a ele.

Ginny arregalou os olhos, sinceramente espantada.

- Dora! Você está fantasiando a realidade, mas, de qualquer modo, fique tranqüila. Não pretendo me envolver com tipos como o Bartholomew. Por enquanto nem penso em ter namorados.

- Isto é parte do problema, Ginny. Os homens vêem o quanto você é ingênua e todos querem iniciá-la nos mistérios do amor. Você é um desafio para o ego masculino.

Ginny pretendia discutir o assunto, mas um súbito pensamento manteve-a calada. Não fora completamente honesta com Dora. Nos últimos tempos sua curiosidade a respeito do sexo masculino andava muito viva. Às vezes, descobria-se sonhando com um abraço apaixonado, com um beijo prolongado. Gostaria de saber como seria... No entanto, não pensava em nenhum dos rapazes conhecidos. Nos seus sonhos, era sempre o rosto de Harry Potter que surgia diante dela.

- Sei cuidar de mim, Dora. Tenho boa formação e estou preparada para me defender dos ataques dos homens. Não precisa ter medo de que eu perca a cabeça com o primeiro homem que cruzar o meu caminho.

- Você aprendeu muita teoria, mas não vai adiantar muito, diante de um verdadeiro sedutor. Apesar de sua formação, tome muito cuidado.

Ginny levantou-se de um pulo.

- Oh! Dora estou cansada desta conversa - ela falou, exasperada. - Vamos falar sobre o churrasco.

Dora fez uma careta e não insistiu. Contudo; ficou com medo de ter falado demais.







- Bem, agora chega. Estou quase sem fôlego - disse Ginny e guardou a gaita, que já tocava há horas.

Era uma noite cálida. As lenhas da fogueira no centro do pátio da fazenda estalavam, aquecendo os rostos risonhos das pessoas sentadas à sua volta.

O churrasco fora um sucesso e em grande parte devido a Ginny. Ela tocara incansavelmente, intercalando violão e gaita, alegrando a todos com o som de sua música. As crianças comeram e brincaram até o cair da tarde. Os adultos, descontraídos pelos aperitivos, entregaram-se à dança e até Harry Potter, que afinal de contas não levara seu par, dançou com as mulheres de seus empregados num clima amigável.

De repente, Remo Lupin ergueu a voz acima da euforia geral e disse:

- Pessoal vocês não acham que Ginny também deveria ter uma chance de dançar?

- Ora, deixe Remo, também me divirto tocando.

No fundo, morria de medo que Miguel a tirasse para dançar!

Resolveu então tocar uma velha canção folclórica que obrigava os dançarinos a pularem de modo cômico.

Ginny riu tanto vendo as piruetas desengonçadas das pessoas que foi obrigada a parar de tocar.

Ao vê-la às gargalhadas, Harry aproximou-se e sentou-se ao seu lado.

- Você faz todo mundo pular e depois morre de rir de nossas palhaçadas.

- Mas você estava ótimo, Harry.

E ela voltou a rir com tanta vontade que teve uma crise de soluço.

- Bem feito! - Harry falou e, depois, acrescentou com ternura: - Você foi esplêndida, Ginny; a festa não seria a mesma sem sua presença!

- Obrigada! Foi um dia divertido para mim também - disse ela. Contudo percebeu que sua voz não soava com a mesma naturalidade de sempre. Sentiu-se subitamente tímida e com a respiração ofegante. Sabia com certeza que não era efeito do riso. Aquela sensação desconhecida tinha origens mais profundas, que a deixaram alarmada e surpresa.

Aos poucos, as pessoas começaram a se despedir e Ginny ajudou as crianças a se recolherem. Quando finalmente ficou sozinha, desejou aproveitar um pouco mais o ar puro da noite e sentou-se na varanda de sua casa.

A lua, quase cheia, prateava os prados, as cercas brancas e o topo das árvores, transfigurando o cenário familiar, que naquele momento parecia cheio de novo e misterioso encanto. Inexplicavelmente, Ginny sentiu-se solitária e sem vontade de entrar no seu chalé vazio.

- É estranho. Todos me querem bem aqui, mas sinto que não tenho ninguém e que não pertenço a ninguém. Se ao menos tivesse irmãos - murmurou ela, melancólica.

- Falando sozinha, Ginny? - A voz de Harry soou perto dela e seu coração disparou dentro do peito, com o impacto do susto.

- Harry! O que está fazendo aqui?

- Resolvi olhar os cavalos antes de dormir. - Harry recostou-se na grade de ferro que protegia a varanda. - Pensei que você já estivesse dormindo.

- Não sei o que aconteceu, mas não tenho a menor vontade de ir para a cama.

- Se é assim, venha comigo, vamos tomar um último drinque. Também não estou com sono...

- Está bem - disse Ginny, levantando-se.

Eles caminharam em silêncio em direção à casa-grande. As¬pirando o ar perfumado, Ginny suspirou:

- Foi idéia sua plantar laranjeiras e limoeiros neste caminho, Harry?

- Sim. Por quê?

- Foi uma grande idéia. Sempre que passo por aqui, paro e respiro este perfume. Tenho a sensação de estar numa exótica região tropical.

- Ginny, você é muito observadora. Foi exatamente pensando nisto que mandei plantar estas árvores. .

- Você já esteve nestes lugares exóticos, Harry?

Ele segurou a mão dela.

- Sim, estive. Será por acaso um dos seus sonhos conhecer a África?

- Oh! Sim! Sonho com o perfume de flores silvestres, com peixes pulando em águas cristalinas, com um sol vermelho e abrasador - disse ela, os olhos brilhantes de entusiasmo. - Não é só a África que me atrai. Também me imagino na Ásia. Penso no monte Everest e nas flores do Nepal. Um dia conhecerei isto, juro!

O pensamento romântico dava um ar sonhador ao rosto de Ginny, que brilhava ao luar.

De repente ela riu e retirou a mão das dele.

- Fiquei arrebatada demais. Nunca contei a ninguém estes meus sonhos, mas, como você andou por estes lugares...

- Mas ainda não conheço o monte Everest.

- Pois conhecerá! É tão bom sonhar!

Eles recomeçaram a andar, envolvidos pelo ar suave da noite enluarada. Harry rompeu o silêncio, perguntando:

- Serão estes sonhos os responsáveis pelo seu jeito distraído? Às vezes você olha para as pessoas e não as vê. Parece viver no mundo da lua.

- Verdade? Nunca me dei conta. Talvez seja porque me concentro demais no que faço. Meu pai já tentou me corrigir uma vez! Tenho de perder este mau hábito.

Harry baixou os olhos para Ginny, que mal atingia seu ombro, e contemplou com ternura a massa ruiva de seus fartos e longos cabelos. Ela sentiu-lhe o olhar e ergueu o rosto com um sorriso tímido.

- Já fiz uma lista das coisas que preciso modificar em mim. Não posso continuar andando por aí, no mundo da lua. Você também tem este tipo de problema, Harry?

- Meus pecados devem ser bem maiores do que os seus - ele riu. - Seu pai costumava dizer que eu tinha um temperamento terrível.

- Oh! Acho que não. Já vi você irritado, às vezes muito frio, mas nunca o vi num acesso de raiva. Acho que estes im¬pulsos passam com a idade, não é?

Harry riu de modo irônico e disse sarcástico:

- Minha querida Ginny, ao seu lado, às vezes me sinto velho como o próprio tempo.

Ginny imediatamente parou de caminhar e virou-se para ele, angustiada.

- Este é meu maior problema, Harry. Às vezes sinto-me tão adulta, mas, de repente, basta um comentário e toda a minha maturidade cai por terra e volto a me sentir como uma criança ingênua. Você me fez sentir assim agora. Eu sou mesmo tão infantil Harry?

Ginny contemplou-lhe o perfil, que até então estivera na obscuridade, mas que naquele momento revelava-se plenamente à luz do luar, com toda a sua beleza viril. Harry virou-se ligeiramente e pousou o olhar no seu rosto com ternura, os lábios curvando-se num breve sorriso. Com naturalidade, tocou-lhe o rosto gentilmente.

- Não é bem infantil o que quero dizer, mas... Ingênua. E acho que você sempre será ingênua. Não se preocupe Ginny. Às vezes, a ingenuidade é um dom precioso, num mundo de falsos espertos, pessoas cheias de malícia.

Ginny inspirou profundamente e, enchendo-se de coragem, falou:

- Às vezes, sinto-me tão só! Isto é ser infantil? Se for dormir agora, por exemplo, vou sentir uma grande solidão. Você se sente assim, Harry?

Ele parou de acariciar-lhe o rosto e um brilho diferente apareceu em seus olhos.

- Sim e compreendo seus sentimentos. Percebi como você se sente só naquele dia em que não queria se desfazer do cãozinho perdido...

- Oh! - Ginny deixou escapar um pequeno suspiro e sorriu. - Mas eu sobreviverei! Sou forte por dentro. Acho que foram o luar e este perfume de laranjeira que me deixaram melancólica. Bem, afinal de contas, estou é com sono!

Harry contemplou-a, pensativo; depois, como se tomasse uma decisão segurou-lhe os ombros. Ginny ergueu os olhos para ele admirada.

- Acho que posso lhe dar um beijo paternal de boa-noite, não?

Por uma fração de segundo a terra pareceu deixar de girar e o tempo parou quando seus olhares se encontraram e perderam-se um dentro do outro. No instante seguinte, Harry tomou-a nos braços, beijando-lhe os lábios.

O beijo foi pouco mais que um rápido toque, mas provocou uma sensação avassaladora em Ginny. Subitamente teve total consciência de seu corpo de mulher, de suas formas curvilíneas, da maciez de seus seios contra a rigidez do peito musculoso de Harry.

Que revelação! Aquele breve contato com um corpo masculino acendeu uma curiosidade excitante em Ginny. Queria saber mais, sentir melhor aquele homem e ver o poder de sua feminilidade sobre ele. Mas uma súbita tristeza tomou conta dela, pois notou que Harry a via como uma criança imatura. Foi quando ele a soltou, recuando um pouco.

Num gesto espontâneo, Ginny levou a mão aos lábios que ele acabara de beijar, mostrando todo o seu espanto.

Uma expressão desconhecida modificou o resto de Harry diante desta atitude de Ginny. Essa mudança não passou despercebida e ela enrubesceu violentamente. Imóvel, fitou-o sem saber o que fazer ou dizer.

Finalmente Harry rompeu o silêncio constrangedor e falou antes de deixá-la:

- Vá dormir Ginny.

Somente então se rompeu o estranho encantamento em que o beijo a deixara. Ginny sacudiu a cabeça e, ainda meio aturdida, dirigiu-se ao chalé.







Alguns dias após aquele breve incidente, Ginny admitiu para si mesma que sua vida esplêndida e divertida na fazenda de Harry se tornara triste e enervante. Ela tentara desesperadamente não pensar naquele beijo dado na noite enluarada, mas sem nenhum sucesso. Vezes sem conta surpreendera-se revivendo todas as emoções do momento em que Harry a tocara. No entanto, ele parecia completamente alheio às mudanças que ocorriam no espírito de Ginny. Estava mais distante dela e já não fazia suas habituais brincadeiras, parecendo sério e preocupado. Ginny atribuía sua austeridade às preocupações do trabalho.

Para completar a tristeza dela, havia ainda aquele desagradável Matt Bartholomew a aborrecê-la. Na verdade, ele nunca dissera nada que justificasse a implicância de Ginny, porém o modo como a olhava irritava-a demais! Ele simplesmente a despia com o olhar, deixando-a com os nervos à flor da pele.

Contudo, apesar das pequenas frustrações e dos aborrecimentos, a vida seguia seu curso normal. Então, num belo dia ensolarado, um incidente sacudiu a vida de Ginny. Ela voltava para casa, quando viu uma garotinha cair da bicicleta. Sentada no chão, a menina rompeu em soluços, olhando o vestido rasgado.

Ginny parou o carro e foi em socorro dela. A pequena, porém não soube dar informações sobre sua família. Ginny, penalizada, resolveu levá-la para casa e fazer-lhe um curativo no joelhinho machucado.

Aos poucos, a criança adquiriu confiança, passou a rir e gostou intensamente dos pássaros que Ginny lhe mostrou. O tempo passou tão rápido que, quando Ginny percebeu, já era tarde. Precisava levar a menina a uma delegacia de menores e comunicar que a encontrara perdida.

Naquele exato momento o locutor da rádio interrompeu com estardalhaço uma canção de sucesso para alertar os ouvintes sobre o desaparecimento de uma criança que possivelmente teria sido raptada.

- A polícia já deu início às buscas! - Berrou o locutor. Um arrepio de terror percorreu Ginny dos pés à cabeça.

E se pensassem que ela agira criminosamente? Quase em pânico, pegou a menina no colo e saiu correndo pelos longos corredores da fazenda, a caminho do escritório de Harry.

Mais uma vez teria de pedir socorro a ele, naquela enrascada em que se metera.

- O que é isto? Que está acontecendo? Quem é esta criança? Perguntou Harry, ao vê-la muito pálida e com a criança chorando, no colo.

Ginny inspirou profundamente para reunir coragem e, sentindo-se como alguém que despenca de um precipício, narrou o que estava acontecendo.

- E, além disto, Harry, o carro da polícia que está patrulhando a região é aquele mesmo do incidente com o cavalo, quando passei o dia na delegacia.

A primeira reação de Harry foi de fúria seus olhos verdes a fuzilaram.

- Meu Deus! Às vezes nem eu acredito no que você apronta. Por que não pensa, antes de agir?

- Eu... ela gaguejou pronta para romper em soluços.

- Está bem, está bem. Vá para o carro. Estarei lá em um minuto.

Harry apanhou o telefone e Ginny correu para o carro, obedecendo prontamente. O que aconteceu depois foi o episódio mais embaraçoso da vida dela, algo que jamais esqueceria.

Harry levou a menina à delegacia que realizava a busca e explicou a situação; ficou ao lado de Ginny, procurando inocentá-la, mas nada pôde salvá-la da vergonha de encarar mais uma vez o sargento que já a detivera há algum tempo.

A mãe da criança chorava, acusando-a de tê-la feito envelhecer dez anos em algumas horas. Ginny ouviu a tudo calada, não ousando defender-se, consciente da raiva de Harry, que de certa forma era a única coisa que realmente temia.

Quando afinal voltaram para casa, Ginny tentou escapar para seu chalé, mas Harry a deteve.

- Nada disso. Tenho umas coisinhas para falar, Ginny.

Dirigiram-se à biblioteca em silêncio. Ali, Harry chamou-a de irresponsável, criançola e criadora de problemas. Quando Ginny achou que ele já estava exagerando, ergueu o queixo e, com um brilho desafiador nos olhos cinzentos, enfrentou-o:

- Pouco me importo com o que você pensa. Aquela criança estava machucada e sozinha. Fiz o que minha consciência mandou. Você não tem o direito de gritar comigo.

- Não era da sua conta se a criança estava sozinha. A mãe dela logo apareceria. E por que não devo gritar com você? Até um santo perderia a paciência.

- Meu pai nunca gritou comigo.

- Pois foi pena! Teria sido bom para você.

Com lábios trêmulos e olhos marejados, ela o encarou.

- Foi tudo uma infeliz coincidência. Só queria fazer um curativo e levar a menina a um posto policial para que tomassem providências. O que há de errado nisto?

- Ginny, você nunca imagina as conseqüências dos seus atos. Para você tudo é tão simples! Estou ficando cansado de bancar seu anjo da guarda. E você não precisa mais de um pai, está precisando é de um marido para mantê-la ocupada na cama e fora dela. Para que você tenha muitas crianças e satisfaça seu instinto maternal. Ficará tão ocupada, que não terá tempo para discutir com homens que batem em cavalos ou para recolher crianças com joelho ralado. É isto que lhe falta um marido! - Ele disse, com olhar frio e duro.

Os lábios de Ginny entreabriram-se de espanto, mas, antes que pudesse dizer qualquer coisa, ele sorriu com malícia e disse irônico:

- Se você se casar, vamos ter um pouco de paz por aqui.

Aquilo foi demais para Ginny! Lágrimas quentes e sentidas desceram abundantes pelas suas faces e ela se precipitou para fora do escritório, dizendo entre soluços:

- Está bem. É melhor eu fazer alguma coisa para vocês terem paz.

Harry tentou segurá-la, mas não conseguiu.

"Oh! Eu odeio você, Harry! Odeio você!" ela dizia para si mesma.

Nervosa, entrou no carro e dirigiu-o a toda velocidade. Depois de rodar muitos quilômetros, Ginny parou para pensar. Não tinha para onde ir!

Após refletir por um tempo, resolveu voltar ao seu antigo lar, a casa do Reverendo Clayton.

Ao chegar lá, não encontrou ninguém. De certa forma, ficou satisfeita. Assim teria tempo de pensar melhor e retomar seu equilíbrio emocional.

Quando finalmente o Reverendo Clayton e sua esposa chegaram, deram a Ginny uma acolhida festiva.

- Passe o dia conosco, querida - insistiu a Sra. Clayton.

Ginny concordou e no final da tarde recuperara certa tranqüilidade no bate-papo simples com o casal amigo. Pensou que já era hora de voltar para a fazenda, muito embora não tivesse idéia de como iria encarar Harry. Também não imaginava que aquele dia desastroso ainda não tivesse acabado...

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