Capitulo XVII



Quando as aulas terminaram, com o último cavalo escovado e alimentado, Gina caminhou para a casa principal. Não queria nada além de um bom banho e uma noite de descanso. Mas, se fizesse isso, sua prima Maureen a atormentaria por semanas. Bem, era melhor enfrentar aquele jantar para não se arrepender depois.
Ela entrou pela cozinha, passando em seguida pelo hall. Seu pai estava certo, como era possível se acostumar a tanto silêncio? Por um momento ficou ali, parada, recordando com nostalgia os momentos felizes que a família tinha experimentado naquela casa.
Subiu as escadas e voltou a parar ao chegar ao corredor, olhando para a direita. Era o quarto de George e Fred. Ela ainda se lembrava do dia em que, depois de uma briga entre os dois, George tinha dividido o ambiente em duas partes, colando uma fita adesiva do chão até o teto, nas paredes. Depois disso, o irmão colocara uma placa do lado dele que dizia "Território de George", e outra no lado oposto com os dizeres "Terra de Ninguém".
E quantas vezes ouvira Rony esmurrar a parede do quarto contíguo, gritando para que os irmãos se calassem?
Quando passou pelo quarto de Luna, viu a mãe sentada na cama acariciando um suéter vermelho.
- Mãe?
- Oh! - Molly ergueu a cabeça. Parecia um pouco confusa, mas então balançou a cabeça e sorriu. – Você me assustou. Esta casa anda muito silenciosa nos últimos tempos.
Gina entrou. O quarto tinha as paredes pintadas num azul suave. As cortinas esvoaçavam com o vento que entrava pelas janelas abertas. Era um ambiente bem agradável, muito bem decorado pela irmã.
- Você e papai se comunicam por telepatia? - Mantendo a voz suave, Gina sentou-se na cama. – Ele estava triste hoje pela manhã, e exatamente pelo mesmo motivo.
- Suponho que depois de todos esses anos juntos, somos capazes de captar as mesmas vibrações... ou algo do gênero. Luna ligou minutos atrás. Parece que está precisando desesperadamente deste suéter em especial, que acabou esquecendo de levar com ela. Anda muito ocupada, porém me pareceu feliz e bem mais madura.
- Todos estarão de volta no mês que vem para o Dia de Ação de Graças, e, logo depois, para o Natal.
- Eu sei. Mesmo assim, se fosse possível, eu iria entregá-lo pessoalmente para ela em vez de enviá-lo pelo correio. Nossa! - Molly olhou espantada para o relógio de pulso. - Acabei me esquecendo do horário. Ainda tenho que tomar banho e me vestir para o jantar. E você também.
- Sim. - Gina umedeceu os lábios, pensativa, enquanto a mãe dobrava o suéter e se levantava. - Estou atrasada hoje - ela começou. - Na verdade, nos últimos tempos parece que estou sempre atrasada.
- É isso o que acontece com pessoas bem-sucedidas.
- Creio que sim. E a nova classe vai sugar meu tempo e energia ainda mais.
- Sabe que eu posso ajudá-la sempre que for necessário, e seu pai também. - Molly saiu, acompanhada pela filha, e caminhou para seu próprio quarto carregando o suéter de Luna.
- Sim, obrigada, mãe. Acho que vou ter que considerar seriamente algo mais formal e permanente. Embora não goste disso... Quero dizer, contratar um estranho é algo difícil para mim. Mas...
A palavra ficou suspensa no ar. Gina surpreendeu-se com o fato de a mãe permanecer em silêncio, o que não era comum.
- Sei que é uma tolice... Mas você não estaria interessada em trabalhar meio período na escola?
Molly ergueu a cabeça, encarando a filha através do reflexo no espelho.
- Está me oferecendo um emprego?
- Sei que parece muito estranho quando colocado nesses termos, mas, sim, estou. Porém não quero que se sinta obrigada. Só aceite se achar que dispõe de tempo, se realmente desejar fazer isso.
Um sorriso amplo curvou os lábios de Molly.
- Por que diabos demorou tanto para me dizer? Vou começar amanhã mesmo.
- Verdade? Você realmente quer?
- Estive morrendo de vontade de me oferecer a você. Precisei me esforçar muito, dia após dia, para não descer até lá e parecer intrometida. Uau, isso é tão excitante! - Ela se levantou e foi até Gina para abraçá-la. - Mal posso esperar para contar a seu pai.
Mantendo os braços ao redor da filha, num abraço apertado, Molly ensaiou uma frenética dança da vitória.
- Sou uma cavalariça outra vez!

- Se soubesse que você estava disponível, Molly, e procurando emprego, eu a teria contratado. – Burke Logan ajeitou-se na cadeira e piscou para a prima da esposa. A mesa das duas famílias era das mais animadas no restaurante do hipódromo.
- Nós gostamos de manter o melhor pessoal em Royal Meadows. - Molly sorriu para o cunhado, que se encontrava do outro lado da mesa. Era um homem tão bonito e agradável quanto quando o conhecera, vinte anos antes.
- Oh, eu não sei, não. - Burke descansou a mão no ombro da esposa. - Nós temos a melhor contadora da região na Three Aces.
- Nesse caso, quero um aumento. - Erin ergueu a taça de vinho e encarou Burke com um olhar de desafio. - E um bem grande... - Uma irlandesa típica, ela virou-se para o filho para repreendê-lo, mas sempre com um sorriso nos lábios. - Trevor? Você pretende comer essa costela, ou vai deixá-la no prato como decoração?
- Estou lendo a sessão de turfe, mãe.
- É mesmo filho de seu pai - Erin resmungou, arrancando a folha de jornal das mãos dele. – Coma seu jantar.
O rapaz de vinte e um anos deixou escapar um suspiro profundo.
- Acho que Topeka no terceiro, com Lonesome no quinto e Hennessy no sexto, será uma boa aposta para a trifeta. Papai disse que Topeka lhe dá sorte, e essa é uma dica quente.
Notando o olhar fuzilante da esposa, Burke engoliu em seco. - Coloque aquela costela na boca, Trev. Onde está Jena?
- Arrumando o cabelo - Maureen anunciou, servindo-se de mais batatas fritas. - Como sempre - emendou num tom de censura que só uma irmã mais velha podia usar. - No momento em que completou catorze anos, ela decidiu que o cabelo era o drama de sua existência. Bah. Como se ter brilhantes cabelos longos, lisos e negros fosse um problema. Isto... - Ela pegou um cacho entre o confuso emaranhado dos próprios cabelos ruivos - ...sim é um problema. Não sei como alguém pode se preocupar com algo tão estúpido quanto os cabelos. De qualquer forma, vocês precisam ver o potro desmamado em que estou de olho. Ele vai ser fantástico. E se papai me deixar treina-lo, eu...
Maureen se calou, olhando de relance para o pai.
- Nessa altura do ano que vem você vai estar na faculdade - Burke lembrou-a.
- Não se eu puder evitar - ela murmurou em voz baixa.
Ao perceber o perigo de um motim, Erin preferiu mudar de assunto.
- Gina, Burke me disse que seu novo treinador é excelente com os cavalos, além de se dar bem com Arthur e jogar pôquer como ninguém.
- E eu também ouvi dizer que ele é um pedaço de homem - Maureen observou.
- Onde foi que ouviu isso? - Gina perguntou sem pensar, sentindo um enorme desejo de engolir a própria língua um segundo depois.
- Oh, os rumores correm rápido neste nosso pequeno mundo, você sabe - a prima replicou com um sorriso malicioso. - E Shelley Mason... é uma de suas crianças, não? A irmã dela, Lorna, está na minha classe de história... uma aula muito chata, por falar nisso. De qualquer maneira, Lorna foi pegar a irmã depois da aula, na semana passada, e acabou trombando com o irlandês bonitão. Foi assim que fiquei sabendo. É por isso que estou planejando aparecer em Royal Meadows qualquer dia desses, para conferir por mim mesma.
- Trevor, dê a costela para sua irmã. Quem sabe assim ela acaba se calando.
- Pai! -Rindo, Maureen apanhou outra batata. - Só vou para olhar, nada mais. E então, Gina, ele é mesmo bonito? Respeito sua opinião mais do que a de Lorna Mason.
- É velho demais para você - Gina disse, talvez um pouco ríspida demais, o que fez Maureen revirar os olhos.
- Ora essa. Não estou querendo casar e ter filhos com ele.
A risada de Arthur impediu que Gina replicasse dizendo alguma tolice.
- Essa é boa. Agora que encontrei alguém capaz de substituir Charlie à altura, não pretendo perdê-lo para a Three Aces.
- Certo. - Maureen lambeu o saldo dedo indicador. - Então prometo que só vou comê-lo com os olhos.
Irritada, e sentindo-se ridícula por sua reação, Gina empurrou a cadeira para trás.
- Acho que vou descer e dar uma olhada em Lonesome. Ele sempre fica um pouco emburrado antes de uma corrida.
- Legal. - Maureen levantou-se também. – Vou com você. Também quero ver como está o nosso. Ela saiu tão rápido da mesa que foi impossível para Gina achar um meio de detê-la. - Vai ser divertido para você ter sua mãe trabalhando na escola. Não existe nada como trabalhar em família, você sabe. Isso é tudo o que desejo para mim. Quero dizer, vamos lá, não é preciso ir para a faculdade para me tornar uma treinadora. Se já sei o que quero fazer, e aprendo sobre o assunto diariamente em minha própria casa, o que uma faculdade pode fazer para me ajudar?
- Expandir seus horizontes? - Gina sugeriu.
Ignorando o comentário, Maureen apressou-se em sair pela porta do restaurante. Lá fora estava frio, e um vento cortante soprava vindo das pradarias.
- Conheço cavalos, Gina. Você sabe como é. Para se trabalhar com eles, só é preciso ter um bom instinto e experiência. - A moça fazia gestos amplos com as mãos. - Bem, ainda tenho bastante tempo para infernizar meus pais até que aceitem a idéia.
- Ninguém faz isso melhor.
Com uma risada, Maureen passou o braço pelo ombro da prima.
-Estou feliz por vê-Ia. O verão passou voando, você sabe, e todos nós estávamos trabalhando como loucos.
- Eu sei.
Desceram pela trilha curva que levava aos estábulos. Alguns cavalos estavam sendo preparados para a próxima corrida. Os cavalariços cuidavam de cada animal com todo o carinho, escovando-os e alimentando-os com rações energéticas especiais. Antes de certas corridas, porém, alguns campeões preferiam ficar ao ar livre, desfrutando a liberdade de correr pelas pradarias verdes como um estímulo para competir por um prêmio maior.
- Ora essa, veja só quem eu encontro aqui. - Rony apareceu contornando a curva que vinha do estábulo principal.
- Você voltou!
- Acabei de chegar. - Ele se aproximou das duas e acariciou os cabelos de Maureen.
-Conversei com mamãe duas horas atrás, quando ainda estava na estrada, e ela disse que vocês viriam para cá hoje. Por isso viemos direto.
- Nós?
- Sim. Harry está cuidando de Lonesome... e tendo uma daquelas conversas que ele costuma dedicar aos nossos campeões. Esse é um cavalo danado de bom. Acredito que na próxima corrida não vai nos decepcionar. Bem, que tal eu acompanhar vocês? Acho que Harry pode tirar Zeus do trailer e o colocar na baia.
- Me parece um plano. - Gina ficou feliz ao notar que conseguia controlar a voz, muito embora sentisse o coração galopando. - Na verdade, eu estava indo até o pasto para ver se Lonesome estava lá, mas acho que vou ter que ir para o estábulo em vez disso. Quero ver como o nosso cavalo está.
- Ele é todo seu... e de Harry, claro. Então vou subir para jantar. Vejo vocês na pista. Até mais.
- Agora você vai poder me apresentar para o bonitão. - Maureen apressou-se em dizer, caminhando ao lado de Gina.
- Só farei isso se você prometer se comportar como se tivesse um cérebro, e não apenas um monte de glândulas.
- Isso não tem nada a ver com glândulas, estou apenas curiosa. Não se preocupe, eu sou uma carta fora do baralho quando se trata de homens.
Ao ouvir isso, Gina estacou, com certa curiosidade, diante da porta.
- Como é que é?
- Você sabe, é legal olhar para os rapazes e ocasionalmente sair com um deles. Mas existe um monte de coisas mais importantes. Para ser franca, não pretendo me envolver seriamente com nenhum até ter trinta anos ou mais.
Por um instante, Gina não sabia se devia ficar espantada ou achar o comentário divertido. Então ela ouviu a voz de Harry. E esqueceu tudo o mais.
Ele estava na baia com Lonesome, um garanhão lindo e temperamental. O cavalo parecia desanimado, como habitualmente ficava antes de uma corrida.
- Estão exigindo demais de você, não tenho a menor dúvida – Harry estava dizendo enquanto checava as ataduras nas patas de Lonesome. - É um desafio terrível essa corrida que vai ter que enfrentar, mas você tem demonstrado força e uma grande coragem dia após dia. Talvez, se você ganhar essa para nós, eu possa interceder a seu favor. Você sabe, cenouras extras e esse tipo de coisas, quem sabe até um monte de melaço à noite. E providenciar uma bela placa dourada para a sua baia lá em casa.
- Isso é suborno - Gina murmurou.
Brian virou-se e seu olhar foi caloroso.
- Isso é uma barganha - corrigiu. - Mas se estiver realmente interessada num suborno...
- Ele começou a abrir a porta da baia com a intenção de puxar Gina para dentro e recebê-la com um beijo de boas-vindas.
Quase atingiu Maureen.
- Desculpe-me. Eu não tinha visto você.
- Sou pequena. Essa é a cruz que tenho que carregar. Olá, sou Maureen Logan. - Ela estendeu a mão para cumprimentá-lo. - Prima de Gina, da Fazenda Three Aces.
- Prazer em conhecê-la. Não tem um cavalo seu correndo hoje à noite, srta. Logan?
- Maureen, por favor... Hennessy, no sexto páreo. E meu instinto me diz que ele vai ganhar essa rindo.
- Vou me lembrar disso se passar pelo guichê de apostas.
- Também vou querer dar uma olhada em Hennessy antes da corrida. Talvez ter com ele uma conversa como essa sua... Apareça no restaurante, se tiver tempo, Harry, mesmo que seja apenas para tomar um drinque. A família está toda reunida lá.
- Obrigado pelo convite. Bela menina - ele emendou assim que Maureen se afastou o bastante para não ouvi-lo.
- Ela veio para dar uma olhada em você, sabia? Ouviu dizer que você era um bonitão.
- É mesmo? - Divertido, Harry abriu um sorriso. - Foi você quem disse isso a ela?
- Claro que não. Respeito você o bastante para não usar esse termo para descrevê-lo. Além disso, gosto de proteger meus interesses.
- Respeito é uma coisa boa. - Ele encurralou-a contra a porta da baia, tomando os lábios dela num beijo antes que houvesse tempo para qualquer reação. - Mas estou apostando na paixão neste exato momento. Você é apaixonada por mim, Gina?
Aquelas palavras soaram como música para os ouvidos de Gina.
- Aparentemente - respondeu, sorrindo. - Oh, Harry, eu quero... - Ela avançou com tamanho ímpeto a ponto de fazê-lo perder o equilíbrio. Os dois acabaram caindo dentro da baia, quase colidindo com as patas do cavalo. - Você. Agora. Em qualquer lugar. Não podemos... já faz tanto tempo...
- Quatro dias - ele completou, com a voz rouca. Queria despi-Ia daquele vestido sofisticado e montá-la como um garanhão, obedecendo ao desejo cego e primitivo que o dominava.
Tinha pensado, convencido a si mesmo, que devia ser sensato em relação a ela, mantendo o próprio desejo sob controle. Mas bastara vê-Ia outra vez para que toda a sua determinação caísse por terra. Exatamente o que havia acontecido na primeira vez em que a vira. Um impulso animal que incendiava o sangue em suas veias e fazia seu coração disparar.
-Gina... - Beijou-a no rosto várias vezes, acariciando-a nos cabelos e nos seios. - Eu te quero tanto... É como se estivesse queimando por dentro. Venha comigo, vamos até o caminhão.
- Sim. - Naquele momento ela iria com Harry para qualquer lugar. Parecia que ele desejava engoli-la inteira. - Rápido. Vamos rápido.
Ela tomou-o pela mão, passando apressada pela porta. Teria se esborrachado no chão se Harry não a segurasse a tempo.
- Nunca aprendi a andar de salto alto num estábulo - Gina resmungou. - Minhas pernas estão trêmulas. - Com uma risada nervosa, virou-se de costas até sentir as pernas pararem de tremer. Agora ao menos conseguia senti-las. Mas seu coração continuava batendo num ritmo enlouquecido.
Harry a observava com um olhar intenso. Quando ela voltou a se virar para encará-lo, disse simplesmente:
- Você é tão linda.
Gina nunca acreditara que palavras como aquelas importassem. Elas sempre eram ditas num tom fácil e frívolo. Mas não era a mesma coisa quando saíam dos lábios de Harry. Não havia nada de frívolo na entonação de sua voz. Antes que pudesse falar, antes que pudesse pensar no que devia ser dito, houve um grito seguido do som de passos correndo.
- Gina, rápido, venha comigo! - Ignorando a intimidade da cena que interrompia, Maureen irrompeu no estábulo e pegou Gina pela mão. - Preciso de ajuda. Aquele bastardo!
- O quê? O que aconteceu? .
- Se ele acha que vai se sair bem dessa, nunca esteve tão enganado. - Puxando Gina, Maureen passou para o outro lado dos estábulos, correndo até um pavilhão que ficava no lado oposto ao que estavam.
Já era possível ouvir as vozes masculinas discutindo. Gina imediatamente reconheceu um dos homens. Peter Tarmack, com seu cabelo oleoso e roupas baratas, era um aproveitador que comprava animais em leilões judiciais e os explorava até a morte. O tipo de sujeito que ela mais odiava.
O jóquei também tinha um rosto familiar. Já estava em fim de carreira, e era conhecido por se embebedar com freqüência nos bastidores dos circuitos de corridas. Mesmo assim, ainda conseguia correr alguns páreos quando o jóquei oficial estava doente ou ferido.
- Eu já disse, Tarmack, não vou montá-lo assim. E não vai conseguir ninguém que faça isso. O bicho não está bem para correr.
- Não me diga o que está bem. Vai montar e vai correr, e chegar numa boa posição. Você já foi pago.
- Não para montar um cavalo ferido e doente. Vai receber seu dinheiro de volta.
- Como? Já não gastou tudo com bebida?
Como Maureen estava pálida, trêmula e incapaz de falar, Gina resolveu tomar a pulso a situação.
- Algum problema aqui, Larry?
- Srta. Gina... - O jóquei tirou o boné e virou-se, encarando-a com uma expressão frustrada em seu rosto enrugado. - Estou tentando dizer ao sr. Tarmack que esse cavalo não pode correr hoje. Não está em condições, como pode ver.
- Não é sua função me dizer nada. E também não preciso de um dos poderosos Weasleys interferindo em meus negócios, especialmente essa vadia mimada!
Antes que Gina pudesse responder, Harry irrompeu no recinto. Num instante, pegou Tarmack pelo colarinho e o ergueu do chão como se fosse uma pluma.
- Isso não é jeito de tratar uma dama - ele falou em voz baixa, mas seu olhar era feroz. Um olhar realmente feroz e perigoso. - Vai querer se desculpar por isso enquanto ainda tem dentes para ajudá-lo a articular as palavras?
- Harry, eu posso cuidar disso.
- Não duvidei de sua capacidade nem por um minuto. - Ele mantinha os olhos no rosto apavorado de Tarmack. - Mas juro por Deus que ele vai se desculpar antes de respirar outra vez.
- E... eu peço... desculpa - Tarmack balbuciou, sem fôlego porque o colarinho apertado o impedia de respirar. Só então Harry relaxou um pouco o aperto. - Eu só estava tentando negociar com esse jóquei bêbado... a quem, aliás, paguei adiantado.
- Vai ter seu dinheiro de volta - o jóquei replicou, virando-se em seguida para Gina.
- Srta. Gina, não vou montar nesse animal. Ele está meio manco por causa de um ferimento no joelho, e qualquer pessoa com olhos pode ver que não é um corredor. Talvez tenha até sido usado como cavalo de carga.
- Com licença. - Com um tom de voz extremamente frio, ela passou por Tarmack e foi até a baia examinar o cavalo com os próprios olhos. Instantes depois voltou com a mandíbula tremendo de raiva.
- Sr. Tarmack, se tentar colocar um jóquei em cima desse cavalo, vou denunciá-lo ao comitê estadual de corridas. Na verdade, farei isso de qualquer forma. O animal está doente, ferido e maltratado. Posso lhe assegurar que não vai conseguir renovar sua licença para colocar animais em nenhum hipódromo neste Estado.
- Não venha com essa para cima de mim. Só estou com o bicho há menos de duas semanas.
- E em duas semanas não pôde checar as condições de saúde dele? Continuou submetendo-o a todo o tipo de esforço, não é?
- Agora escute aqui. - O homem ergueu o dedo em riste e fez menção de avançar, mas desistiu ao notar o olhar ameaçador de Harry, que o observava em alerta máximo. - Escute
- agora seu tom de voz era mais suave, e evidentemente fingido. - Talvez você possa ser sentimental quando se trata de dinheiro. Mas eu ganho a vida comprando cavalos e colocando-os para correr. Se eles não correm, fico no vermelho.
- Quanto? - Gina voltou para a baia e acariciou o pescoço do cavalo. No coração dela, aquele animal já era seu. - Quanto ele lhe custou?
- Ah... uns dez mil.
Harry limitou-se a dar um passo para a frente, olhando no fundo dos olhos do homem.
- É melhor dizer a verdade e ser razoável. Ainda não me viu zangado, e acho que nem vai querer ver.
Tarmack encolheu os ombros.
- Talvez tenha sido cinco mil. Preciso checar os meus livros.
- Você terá um cheque de cinco mil à sua espera amanhã. Vou ficar com esse cavalo agora. Harry, pode examiná-lo, por favor?
- Me dê um minuto - ele respondeu.
Dessa vez foi Gina que encarou Tarmack com olhos cheios de fúria.
- Seja esperto. Pegue o dinheiro. Porque quer queira, quer não, esse cavalo vai ficar comigo.
- O joelho precisa de tratamento - Harry disse depois de um exame rápido. Estava indignado com a forma como o ferimento do animal fora negligenciado. - Podemos cuidar disso. Pelo que vi, diria que é um caso que vai requerer talas. Precisa ficar em observação.
- Vamos providenciar isso agora mesmo. – Gina limitou-se a olhar sobre o ombro para Tarmack. – Você pode ir. - Sua voz carregava um ar de nobreza implacável, como se fosse uma princesa falando com um ladrão. - Alguém vai lhe entregar o cheque pela manhã.
O tom de desprezo irritou Tarmack. Ela não seria tão metida sem seu maldito guarda-costas, concluiu. Teria ensinado uma lição àquela vadia se o bastardo irlandês não estivesse por perto.
Ele enfiou as mãos nos bolsos, impotente, e ainda tentou uma última bravata.
- Não vou deixar você ficar com o cavalo sem me dar nada além da palavra. Não dou a mínima para quem você é.
Harry encarou o homem novamente, com os olhos injetados, mas Gina limitou-se a erguer o braço.
- Maureen, você poderia, por favor, levar o sr. Tarmack até o restaurante? Peça a meu pai para fazer um cheque de cinco mil dólares e entregar ao homem, e diga-lhe que eu me entendo com ele depois.
- Com prazer. - Maureen apoiou-se no ombro da prima e beijou-a no rosto. - Eu sabia que você resolveria tudo. - E então, com a mesma expressão fria de Gina, virou-se. - Venha comigo, Tarmack. Vai ter seu dinheiro.
- Sinto muito, srta. Gina. - Larry apertava o boné entre os dedos nervosamente. -Não sabia que o estado do animal era tão grave até chegar aqui. Eu não podia montá-lo depois de ver como está ferido.
- Fez a coisa certa, Larry , não se preocupe.
- Ele me pagou adiantado, como disse.
Ela assentiu, saiu da baia mais uma vez e encarou o velho jóquei.
- Quanto vai ficar devendo?
- Cerca de vinte dólares.
- Venha me ver amanhã. Nós cuidaremos disso.
- Muito obrigado. Aquele cavalo ali, a senhorita sabe, claro... não vale cinco mil.
Gina estudou o animal. Era um alazão castanho, magro demais para manter a elegância, e maltratado ao extremo. Tinha os olhos muito tristes também.
- Claro que vale, Larry. Vale mais do que isso para mim.


Continua [...]

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