Capitulo XII
O trabalho estava quase concluído, Gina constatou, exausta. Tinha passado metade da noite cuidando dos livros contábeis da academia, e odiava fazer aquilo.
Suspirando, ajeitou o corpo na cadeira e esfregou os olhos. Dentro de um ou dois anos a escola geraria lucro suficiente para justificar a contratação de um contador. Mas, por enquanto, ela não iria desperdiçar dinheiro com coisas que podia fazer sozinha. Não quando esse dinheiro poderia ser usado para subsidiar outro aluno ou para comprar um bom par de botas de montaria.
Era tentador, em ocasiões como aquela, recorrer à sua conta bancária particular. Mas se tratava de uma questão de honra manter a escola funcionando com recursos próprios.
Gina sentiu o cheiro do chá antes mesmo de virar-se e ver a mãe chegando.
- O que está fazendo aqui, mãe? Passa da meia-noite.
- Bem, eu estava acordada e vi luz em seu escritório. Pensei: "Acho que essa menina precisa de um pouco de combustível, já que decidiu passar a noite trabalhando". – Molly colocou o bule e uma bandeja sobre a mesa. - Chá e biscoitos.
- Eu amo você.
- Também a amo. Querida, seus olhos estão vermelhos. Por que não deixa isso de lado e vai dormir um pouco?
- Estou prestes a terminar, mas a pausa é bem-vinda... e o combustível também. - Ela mordiscou um biscoito antes de sorver um bom gole do chá. – Eu me atrasei um pouco porque fiquei brincando hoje pela manhã.
- Pelo que seu pai me disse, você, definitivamente, não estava brincando. - Molly puxou uma cadeira, aproximando-a da escrivaninha. - Ele está muito entusiasmado com a forma como Harry cuidou sozinho de Betty. Bem, na verdade, está feliz com o próprio Harry, e eu concordo com ele. Betty, de fato, é um desafio e tanto.
- Humm. - Então era sobre Harry, Gina concluiu. - Ele tem um jeito muito especial de lidar com as coisas, mas parece estar funcionando.
Por que se sentia nervosa? Sempre tinha discutido tudo com a mãe. Por que mudar isso agora?
- Sinto-me atraída por ele.
- Eu ficaria preocupada se você não sentisse isso. Harry é um excelente rapaz.
- Mãe. - Gina segurou a mão de Molly. – Estou muito atraída por ele.
O olhar de Adélia era brilhante, mas não surpreso.
- Oh... Bem...
- E ele está muito atraído por mim.
- Entendo.
- Não quero falar sobre isso com papai. Os homens não vêem esse tipo de coisa como nós.
- Querida. - Depois de uma pausa, a mãe soltou um suspiro. - As mães também não enxergam esse tipo de coisa da mesma forma que as filhas. Você já é adulta e deve seguir suas próprias intuições. Mas ainda é minha filhinha, não é?
- Nunca estive com um homem antes.
- Eu sei. - O sorriso de Molly era suave, sábio. - Acredita que eu não saberia se algo tão importante tivesse acontecido com você? Eu a criei e sei que é tão exigente com os homens como é consigo mesma. Nenhum chegou à sua altura até hoje.
Aquele era um terreno perigoso, Gina concluiu.
- Eu não sei se é assim que penso em Harry. Porém me sinto diferente quando estou com ele. Eu o quero. Nunca quis ninguém antes. É excitante... e um pouco assustador.
Molly levantou-se e passou os olhos pelas fotos e medalhas nas paredes.
- Já conversamos sobre esse aspecto antes, quando você ainda era uma adolescente. Sobre responsabilidade e precaução.
- Eu me lembro.
- Gina, embora tudo isso seja importante, não vai lhe dizer... nem pode... o que é estar com um homem. É como uma força da natureza, algo que não podemos controlar racionalmente. Não é apenas um ato, embora alguns possam pensar assim. Cada pessoa entende a intimidade física de uma forma. Eu jamais lhe diria que se entregar a um homem significa o mesmo que perder a virtude. Não é assim... não precisa ser assim. Para mim, trata-se de uma abertura para um novo universo. Seu pai foi meu primeiro - ela murmurou. - E meu único homem.
- Mãe. - Comovida, Gina tornou a segurar mãos de Molly. Eram mãos fortes. Tudo em relação à sua mãe era forte. -Que coisa bonita você acabou de me dizer.
-S ó lhe peço para ter certeza, para não se entregar apenas ao desejo, mas também ouvir seu coração. Afinal de contas, o calor da paixão pode se transformar em gelo com o tempo.
- Claro, mãe. - Sorrindo, ela levou às mãos de Molly aos lábios e as beijou. -Mas ele não é esse tipo de sujeito. E pode parecer estranho, mas foi a reação de Harry quando lhe contei que seria a minha primeira vez que me deu mais certeza. Você entende? Eu sei que também significo algo para ele.
Era realmente espantoso o fato de duas pessoas viverem e trabalharem no mesmo lugar e conseguirem evitar um ao outro por completo. Uma coisa em que se devia pensar.
E Harry, de fato, pensou no assunto por vários dias. Havia trabalho bastante para mantê-lo ocupado e razões mais do que suficientes para que passasse mais tempo nas corridas do que na fazenda. Mas ele acabou concluindo que aquele tipo de comportamento não era digno. Na verdade, estava bem próximo da covardia.
Além disso, tinha prometido a Gina que a ajudaria na escola de equitação e não fizera nada a respeito. Não era o tipo de homem que falta com a palavra empenhada, independente de quanto isso lhe custasse. Lembrou a si mesmo, enquanto caminhava até os estábulos de Gina, que também era um homem capaz de manter o autocontrole. E não tinha a menor intenção de seduzir ou tirar vantagem de uma mulher inocente.
Essa decisão já estava tomada.
Então ele entrou no estábulo e a viu. Não poderia dizer que ficou com água na boca, mas sentiu algo muito próximo disso.
Gina vestia um daqueles trajes chiques outra vez... calça de montaria cor de chocolate e uma blusa creme que lhe emprestava uma aparência fluida. Seus cabelos estavam soltos, revoltos e selvagens como se ela tivesse acabado de correr ao vento. Antes de anunciar sua presença, Harry ainda teve tempo de vê-Ia retirar uma tira elástica de um dos bolsos e prender os cabelos, como se tivesse lido seus pensamentos.
Hary concluiu que o melhor lugar do universo para colocar as próprias mãos era dentro dos bolsos da calça, e rápido.
- Acabaram as aulas?
Gina ergueu a cabeça, ainda segurando os cabelos. Já estava começando a se perguntar quando o veria cruzar seu caminho de novo.
- Por quê? Você por acaso está interessado em ter uma?
Franzindo as sobrancelhas, ele achou melhor não dar nenhuma resposta que pudesse ser mal-interpretada.
- Prometi que viria ajudá-la quando tivesse um tempo livre.
- É verdade. E, para ser franca, chegou no momento certo. Você disse que sabe montar, não é?
- Eu disse e é verdade.
- Ótimo. - Perfeito. Ela indicou uma das baias com um gesto. - O velho Mulai precisa de exercício. Se você o pegar, poderei exercitar Sam também. Nenhum dos dois se mexeu muito nos últimos dias. Tenho certeza de que deve haver uma sela grande o bastante para você. - Ela abriu a porta de outra baia e tirou dela o já encilhado Sam. - Nós esperamos vocês dois no paddock.
Assim que a viu sair, Harry olhou para Mulai, e Mulai olhou para Harry.
- Ela é mandona, você não acha? - Então Harry encolheu os ombros e foi até os fundos do estábulo escolher uma sela para si.
Gina estava marchando pelo paddock quando ele saiu. O corpo feminino era tão colado ao do animal que ambos pareciam fazer parte da mesma figura. Com comandos precisos no ritmo e angulação, fez a montaria saltar três obstáculos. Ainda marchando, começou a descrever o próximo círculo, e então, ao perceber a presença de Harry, diminuiu a velocidade e aproximou-se dele.
- Está pronto?
Como resposta, ele deu um tapinha amistoso no flanco de Mulai.
- Por que está toda arrumada hoje?
- Era dia de retratos. Tiramos fotografias de todas as turmas. Os alunos e os pais gostam muito dessas recordações.
Cavalgaram juntos por cerca de uma hora antes de voltarem para o estábulo da academia. Já de regresso, Harry notou a perfeita arrumação do lugar. Era bem trabalhoso manter uma escola como aquela, sobretudo se a pessoa não contasse com ajuda.
A questão o incomodou por alguns minutos, mas então ele decidiu falar sobre o assunto.
- Acho que um pouco de ajuda por aqui não seria nada má.
- Ora, você já está me ajudando, não é?
- Eu me refiro a outro tipo de ajuda. Uma pessoa fixa que dividisse as tarefas por aqui.
Gina ficou calada por um momento, terminando de tirar os arreios do cavalo. Depois de carregar arreios e sela até uma bancada próxima, abaixou-se para checar as ferraduras do animal, e só então falou.
- Pode não perceber, Potter, mas muita gente me ajuda por aqui. Minha mãe, meus irmãos... até mesmo meus primos aparecem de vez em quando.
- Não vi ninguém trabalhando aqui, a não ser você - ele observou, enquanto tirava os arreios de sua montaria.
- Bem, isso é muito simples. Fred e Luna estão na faculdade... e Harry, que é outro que eu posso amedrontar colocando-o em estábulos, também. Rony está viajando mais do que de costume agora. Tio Charlie se encontra na Irlanda, e os primos voltaram para a escola depois do feriado. Tanto meu pai quanto minha mãe aparecem aqui quase todo dia no final da tarde. E nem preciso pedir.
Ela se levantou.
- E como parece tão interessado, estive pensando em contratar um auxiliar de cavalariço para trabalhar aqui em meio período. Vai funcionar muito bem. Afinal de contas, esta é apenas uma pequena escola de equitação.
Enquanto dizia isso, Gina começou a preparar as rações noturnas dos animais.
- Você realmente podia usar uma garota ou um garoto ambicioso para aparecer antes e depois da escola... e pagá-lo com aulas.
- Garotos e garotas ambiciosos devem tomar café antes da escola, e depois dela, provavelmente estão ficando com os amigos ou fazendo a lição de casa.
- Isso é muito rigoroso.
Rindo, Gina acrescentou algumas cenouras picadas como complemento extra para as rações.
- É o que meus alunos costumam dizer. Mas eu os quero bem formados e saudáveis. Minha família vê isso como interesse e amizade extra-estábulo, pois tive uma boa educação, viajei e conheci muita coisa além das pistas de corrida e dos estábulos. E realmente faz diferença.
Os dois distribuíram as rações, e as baias ficaram silenciosas como num passe de mágica, enquanto os cavalos comiam.
- Se não se incomodar que eu diga, você não anda viajando muito nos últimos tempos.
- Sou compulsiva. Objetiva. Quando vejo o que quero, é como... bem, como se eu colocasse viseiras numa corrida e só conseguisse enxergar realmente alinha final.
Continua [...]
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