Capitulo XIX
Foi então que, pouco à vontade, olhou para a porta e viu KateGina ali parada.
— Olá! Desculpe interromper — disse ela com voz gelada. Percebendo o clima
tenso, Jerry tratou de lançar seu mais belo sorriso e preparou-se para sair de cena,
deixando o amigo com a bomba na mão.
— Como vai, Gina? Que bom revê-la! Nossa! Veja que horas são! Preciso
correr. Voltaremos a conversar, Harry. Até logo!
Saiu com a velocidade de um raio, e Harry pegou a furadeira sem saber o
que fazer com ela, resmungando:
— Era Jerry.
— Sei disso — replicou Gina com frieza.
— Vou colocar seus armários hoje. Acho que fez a escolha certa. A cerejeira
natural é linda. Até o final do dia estará tudo pronto.
— Que maravilha!
Gina sentia a raiva sufocá-la, crescendo em ondas no seu íntimo como um
vespeiro prestes a explodir. Tinha vontade de esbofetear Harry.
— Então, pelo que ouvi, não estamos namorando, apenas... o quê? — Entrou
no aposento e parou. — Apenas dormindo juntos? Ou tem outra explicação?
— Jerry me deixou constrangido.
— Sério? E foi por isso que disse a ele que nós dois estamos "apenas"
saindo? Nunca pensei que definir o nosso relacionamento fosse um dilema tão
grande para você ou que se sentisse tão envergonhado de falar a respeito com um
amigo.
Harry fez um gesto impaciente.
— Se pretendia ouvir atrás das portas, deveria ter prestado atenção na
conversa inteira. Jerry queria que eu convidasse a irmã dele para sair, e eu estava
tentando explicar que não era uma boa idéia.
— Percebo. — Gina tinha vontade de pegar o martelo e arremessá-lo na
cabeça de Harry. — Em primeiro lugar, não estava ouvindo atrás da porta. Esta é a
minha casa e tenho o direito de entrar aqui à hora que quiser. Segundo, por que não
disse logo "não", sem tantas hesitações?
— Porque não estava prestando atenção...
— Então deixe-me dizer uma coisa, Potter. — Enfatizou as palavras
seguintes, batendo com o dedo no peito: — Não durmo por aí com qualquer um.
— E quem disse o contrário?
— Quando estou com um homem é apenas com ele. Ponto final. E se ele não
está disposto a fazer o mesmo comigo, espero que seja honesto o suficiente para
dizer.
— Eu não...
— E também não sou apenas uma desculpa que traz no bolso, pronta para
ser usada, quando não quer fazer um favor a um amigo. Portanto, nunca tente me
usar, dando explicações esfarrapadas sobre nosso relacionamento. Entretanto,
como parece que não existe nada de concreto entre nós dois, está livre para sair
com a irmã de Jerry ou com qualquer outra.
— Ora, Gina! Resolva-se! Vai ficar brava porque usei-a como desculpa ou
porque não aceitei sair com Tiffany ?
Gina cerrou os punhos, mas contou até dez. Caso batesse nele, raciocinou,
perderia a dignidade.
— Idiota! — gritou, disse mais alguma coisa em ucraniano e saiu.
— Mulheres! — exclamou Harry, ficando feliz por poder chutar a caixa de
ferramentas e espalhar chaves de parafuso e alicates por todos os lados.
Uma hora mais tarde, os armários estavam colocados e Harry trabalhava na
copa. Já remoera a cena com Gina meia dúzia de vezes mas, a cada repassada,
lembrava-se de alguma coisa que poderia ter dito e que não dissera. Comentários
curtos e diretos que teriam virado o vento a seu favor. Mas, na primeira
oportunidade, despejaria tudo para ela
Não pretendia se humilhar, pensou, enquanto martelava uma prateleira. Não
tinha nada para pedir desculpas. As mulheres eram um bom motivo para que muitos
homens preferissem viver sozinhos, concluiu. Se era um idiota, por que ela insistira
tanto em envolver-se?
Ocupado com esses pensamentos, deu um passo para trás, virou-se e quase
esbarrou em Arthur Weasley.
— Que susto! O que há com as pessoas hoje? Todo mundo chega atrás de
mim feito um gato, sem fazer barulho?
— Desculpe. Achei que não iria me ouvir com tantas marteladas por aqui.
— Vou pendurar cartazes — disse Harry, pegando uma outra prateleira. —
Proibida a entrada de mulheres em geral e de homens de gravata.
Spencer arqueou as sobrancelhas. Era a primeira vez que via Harry irritado.
— Imagino que não tenha sido o primeiro a interromper seu trabalho hoje.
— Acertou. — Harry testou a prateleira, que deslizou perfeitamente no
encaixe. Pelo menos alguma coisa estava dando certo naquele dia, pensou com
sarcasmo, voltando a falar em voz alta: — Veio conversar sobre o projeto de sua
cozinha, Sr. Weasley? Basta aprovar o material que irei providenciar. Dentro de
algumas semanas poderei começar o trabalho.
— Na verdade, estou fora desse assunto. Molly é dona absoluta dos
problemas da cozinha e da reforma. Só passei para ver os progressos no prédio de
minha filha. E vejo que a obra está bastante adiantada.
— Sim, está indo bem rápido. — Harry apoiou uma outra prateleira que ia
encaixar e respirou fundo. — Desculpe, Sr. Weasley. Não estou tendo um bom dia.
Arthur gostaria de saber o que acontecera entre Harry e Gina, para que ela
tivesse ficado tão mal-humorada, mas apenas disse:
— Gina está no térreo arrumando o escritório.
Harry voltou a mexer na prateleira de modo lento e deliberado.
— Não sabia que ainda estava aqui.
— A mobília que encomendou acabou de chegar. Também não fui recebido
com muito entusiasmo lá embaixo. Portanto, somando dois mais dois, creio que
vocês discutiram.
— Não chega a ser uma discussão quando alguém salta no seu pescoço sem
aviso prévio. Foi um ataque.
Arthur segurou o riso.
— Bem... correndo o risco de ser considerado inconveniente, as mulheres de
minha família sempre acham que têm um bom motivo para brigar com os homens. É
claro que se têm razão ou não é indiscutível.
— E por isso que são um problema.
— Entretanto, ruim com elas, pior sem elas ..
— Estava indo muito bem sozinho com James. — Um olhar de frustração
dominou o semblante de Harry, que voltou-se para Arthur Weasley. — Afinal, o que
há de errado com as mulheres para complicar tanto as coisas e deixar os homens se
sentindo como perfeitos idiotas?
— Filho, milhares de gerações masculinas vêm se questionando o mesmo, e
ainda não chegaram a uma conclusão.
Com uma risada seca, Harry voltou-se de novo para o trabalho e, com um
gesto automático, perscrutou as prateleiras, tentando descobrir alguma falha.
— Bom — falou —, acho que já não importa mais. Gina terminou tudo entre
nós.
— Não parece ser o tipo de homem que desiste com facilidade diante de um
problema qualquer, Harry.
- Mas sua filha é especial. — Harry piscou um olho para Arthur. — Lamento.
- Prefiro encarar essas palavras como um elogio. Minha impressão é de que
um magoou o outro, e ambos estão com o orgulho ferido. Em geral, a reação de
Gina para esse tipo de ofensa é uma crise de raiva e depois a frieza.
Harry selecionou os ganchos que seriam pendurados na copa. DEveria deixar
esse trabalho para um dos operários, pensou, mas precisava ocupar-se com algo
manual para não se deixar engolfar pelo aborrecimento provocado com a briga.
Falou em voz alta:
- Ela deixou a situação muito clara. Chamou-me de idiota e algo mais em
ucraniano. Não sei o que foi.
- Ela o insultou em ucraniano? — Arthur lutou para não achar graça. —
Devia estar muito nervosa!
Harry estreitou os olhos, pegando na chave de fenda.
— Não sei o que significa, mas não gostei do tom.
- Deve ter sido algo parecido com "desejo de que asse no fogo do inferno". A
mãe de Gina também usa muito essa expressão. — Arthur fez uma pausa,
encarou Harry e perguntou: — Você gosta de minha filha? As mãos de Harry
ficaram úmidas.
— Sr. Weasley...
— Chame-me de Arthur. Sei que não é uma pergunta fácil nem simples,
mas gostaria de obter uma resposta.
— Primeiro, poderia sair de perto da caixa de ferramentas? Há muitos objetos
pontiagudos.
Arthur mergulhou as mãos nos bolsos da calça.
— Tem minha palavra de honra que não vou desafiá-lo para um duelo com
chaves de fenda.
— Certo. — Harry tomou fôlego. — Gosto muito de sua filha. Meus
sentimentos são confusos e mal resolvidos, mas gosto. Não pretendia me envolver
com ela. Não estou em posição de fazê-lo.
— E posso perguntar por quê?
— Acho que é óbvio. Sou um pai viúvo. Estou tentando construir uma vida
decente para meu filho, mas não se compara com o estilo de Gina, e não posso
oferecer-lhe tudo com que está acostumada.
Arthur sacudiu os ombros.
— Eles o fizeram comer o pão que o diabo amassou, não foi?
— Como disse?
— Os pais de sua esposa. Ao contrário de certas famílias, a nossa é
barulhenta, gosta de se meter na vida de todo mundo, é protetora e irritante. Mas vai
descobrir que também respeitamos e apoiamos as escolhas e sentimentos uns dos
outros. Harry, é um erro julgar uma situação por outra do passado. — Arthur fez
uma pausa e continuou: — Mas deixando isso de lado no momento, já que se
importa com Gina, vou dar-lhe um pequeno conselho, e você decidirá se o aceita ou
não. Lide com o problema e com ela. Posso garantir-lhe que, se Gina não gostasse
muito de você, teria terminado tudo com um sorriso e de maneira polida.
Concluindo que dera bastante assunto para Harry pensar, Arthur virou-se e
passou a examinar os armários em construção, em meio à poeira, parafusos e
martelos.
— Então é isso que me espera se resolver fazer a obra — resmungou mais
para si mesmo. — Lançou um olhar consternado para Harry. — E você acha que
tem problemas!
Continua [...]
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!