Capitulo IV



Fazia tanto tempo que não tinha esse tipo de sensação... E, que mal havia, afinal? Uma moça atraente que, percebe¬ra, era desinibida e não se importava em demonstrar o in¬teresse que sentira por ele.
Mas um aperto no coração o fez perceber que alguém podia sair magoado. Entretanto, o risco poderia valer a pena... se não se tratasse da filha de Molly e Arthur Weasley.
Conhecia muita coisa a respeito de Gina Weasley. Baila¬rina, socialite e amiga das artes. Harry preferia ir ao dentis¬ta do que assistir a um espetáculo de bale e já se fartara de cultura na época de seu breve casamento.
Mas Cho fora especial. Uma pessoa simples e natu¬ral em um ambiente pomposo e arrogante. Mesmo assim, fora difícil para os dois, lembrou Harry. Jamais saberia se continuariam a percorrer o caminho juntos, se ela continuas¬se viva, porém gostava de pensar que sim.
Por mais que a amasse, o casamento lhe ensinara que era mais fácil viver ao lado das pessoas de sua terra natal.
Voltando ao presente, felicitou-se por ter resistido à ten¬tação de convidar Gina Weasley para sair. Ainda bem que descobrira quem ela era antes de flertar abertamente. A paternidade apagara de seu caráter a arrogância e a temeri¬dade dos tempos de rapaz, transformando-o em um homem amadurecido.
Naquele instante, ouviu o motor do ônibus que se apro¬ximava e aprumou-se no assento da picape, todo sorriden¬te. Não havia lugar no mundo, pensou, onde gostaria de estar, além de Shepherdstown.
O grande ônibus amarelo parou com um gemido, os faróis brilhando. O motorista acenou, da maneira atenciosa e alegre das cidades pequenas. Harry cumprimentou tam¬bém, e viu seu filho vir correndo.
James era um menino forte. O rosto era redondo e alegre, os olhos verdes como os do pai, e a boca ainda mostrava a inocência da infância.
Observando o filho, sentiu uma onda de carinho e amor inundar-lhe o coração. Então a porta da picape se abriu, e o menino entrou, estabanado como um cãozinho novo.
— Olá, papai! Está nevando! Talvez a neve cubra tudo e não tenha aula amanhã, e a gente possa ficar fazendo bonecos de neve. Que tal?
— Se isso acontecer, prometo que faremos os bonecos e andaremos de trenó.
— Verdade?
— Sim. Sem dúvida.
— Oba! Adivinhe!
Harry ligou o motor do carro.
— O quê?
— Faltam só quinze dias para o Natal. A vovó diz que o tempo voa, portanto o Natal praticamente já chegou.
— Praticamente — repetiu Harry, estacionando em fren¬te à casa de três andares.
— Então — continuou James entusiasmado —, se é quase Natal, posso ganhar um presente?
Harry franziu o cenho e cerrou os lábios, como se esti¬vesse pensando muito no assunto, depois disse:
— Sabe, James? Foi uma boa tentativa.
— Ora! — exclamou o menino, desapontado. Harry riu, abraçando o garoto.
— Mas se me der um abraço, farei a famosa Pizza Mági¬ca dos Potter para o jantar.
— Certo! — replicou James, passando os braços pelo pes¬coço do pai.
Harry sentiu-se em casa.


— Está nervosa? — perguntou Arthur Weasley, observan¬do a filha servir-se de café.
Era uma perfeição, pensou, orgulhoso. A massa de ca¬belos ruivos e brilhantes estava presa para trás com uma tiara e descia pelas costas delicadas. O conjunto cinza-chumbo de calça e jaqueta realçava a elegância natural do corpo delgado. O rosto, tão parecido com o da mãe, era sereno e belo.
Sim, concluiu, era perfeita e adorável. Uma mulher no auge de sua beleza. Por que era tão difícil para os pais cons¬tatarem que os filhos cresceram?, perguntou-se, com melan¬colia.
— Por que deveria estar nervosa, papai? Quer mais café?
— Sim, obrigado. Porque hoje é o dia D. Dentro de al¬gumas horas, será proprietária de um imóvel, com todas as alegrias e problemas que isso implica.
— Estou ansiosa! — Gina sentou-se e começou a mordiscar o pãozinho que torrara para o café da manhã. — Planejei tudo com muito cuidado.
— Sempre age assim. Não é novidade.
— Estou ciente de que é um risco usar a maior parte das minhas economias nesse investimento. Mas sei que posso arcar com as despesas do projeto pelos próximos cinco anos.
Arthur aquiesceu, comentando:
— Tem o tino comercial de sua mãe.
— Agrada-me pensar que sim. E também gostaria de ter sua habilidade de professor. Afinal, sou uma artista, filha de pais artistas. E o pouco que lecionei em Nova York des¬pertou meu interesse para ensinar. — Gina acrescentou lei¬te ao café. — Estou me estabelecendo em minha cidade natal, onde tenho sólidos contatos com a comunidade.
— Sem dúvida!
Gina largou o pão e pegou a xícara com café.
— O nome dos Weasley é muito respeitado, e sou co¬nhecida no mundo da dança. Estudei bale por vinte anos, suei e penei durante centenas de aulas. Devo saber o sufi¬ciente para ensinar.
— É claro!
Gina suspirou. Tinha certeza de que não enganava o pai. Ele a conhecia de dentro para fora e era um homem sábio.
— Muito bem, papai! Sabe o que é sentir um nó no es¬tômago quando se morre de medo?
— Sei.
— Pois eu sinto um aperto na garganta também. Não fiquei nervosa desse jeito nem na primeira vez que fiz um solo de dança.
— Porque jamais duvidou de seu talento. Agora está pisando em terreno desconhecido, meu bem. — Cobriu-lhe a mão com a sua. — Aliás, ficaria preocupado se não se sentisse assim.
— E também preocupa-se que eu esteja cometendo um erro.
Spencer apertou os dedos da filha.
— Não é bem isso. Temo que, em breve, sinta falta de se exibir no palco outra vez. Que tenha saudade da compa¬nhia de bale e da antiga vida. Eu preferia que tivesse espe¬rado um pouco mais para tomar a decisão de parar e assu¬mir novas responsabilidades. Por outro lado, estou radian¬te que esteja de volta.
— Bem, pode ficar sossegado. Quando assumo uma ta¬refa, vou até o fim.
— Sei disso também.
E isso era uma das coisas que o preocupava, pensou, mas não expressou o pensamento em voz alta.
Gina voltou a mordiscar o pão e sorriu, mudando de assunto:
— Então, conte-me sobre os planos de reforma da cozi¬nha.
Arthur fez uma careta e olhou em volta, passando a mão por entre os cabelos ruivos, entremeados de fios pra¬teados.
— Não estou de acordo. Sua mãe está com essa mania de reformas. Só fala em mudar isso e aquilo, e em Harry Potter. O que há de errado com a nossa cozinha?
— Nada, além do fato de que ela é a mesma de vinte anos atrás.
— E daí? É maravilhosa e muito confortável. Mas Harry teve que chegar e dar uma série de palpites para encher a cabeça de sua mãe!
Gina sufocou uma risada ante o desespero do pai, mas mostrou-se solidária.
— Sabe como são os empreiteiros, papai.
— E estão falando em janelas arredondadas. Já temos uma janela normal! — Arthur fez um gesto em direção à pia. — Está ótima. Pode-se olhar através dela à vontade. Ouça o que digo, aquele rapaz seduziu sua mãe com pro¬messas de revestimentos em carvalho.
Dessa vez Gina riu de verdade e apoiou um cotovelo sobre a mesa.
— Fale-me sobre Potter, papai.
— Trabalha bem. Mas nem por isso quero que venha pôr abaixo minha cozinha
— Mora na cidade há muito tempo?
— Cresceu aqui perto, mas partiu com vinte anos. Foi para Washington trabalhar em construções.
Gina não conseguia vencer a curiosidade.
— Ouvi dizer que tem um filho.
— Sim, James. A esposa de Harry morreu há vários anos. Tenho a impressão que ele voltou para educar o menino perto da família. Regressou faz um ano, acho. Logo adqui¬riu a reputação de executar trabalhos de qualidade. Fará um bom serviço na sua escola de bale.
— Se eu resolver contratá-lo — enfatizou Gina.
Imaginou Harry com roupas de trabalho, mas não ou¬sou contar ao pai o que pensava. Teria apenas um relacio¬namento profissional com o empreiteiro. Mas, de qualquer modo, imaginava que devia ficar muito bonito manejando suas ferramentas.

Acabara. O nó na garganta continuava, mas já era pro¬prietária de um grande, belo e dilapidado prédio na linda cidade universitária de Shepherdstown, no Estado da Vir¬gínia Ocidental.
O prédio ficava a poucas quadras da casa de seus pais, da loja de brinquedos da mãe e da universidade onde o pai lecionava. Estava cercada pela família, amigos e vizinhos.


Proximo capitulo, sexta ou sabado ;)

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