ONZE



Onze




            -Eles estão chegando na base. Estão chegando na base, na base! Vamos, Miguel! - gritei.


            Miguel se inclinava para trás e dava tudo o que podia. Todos os outros jogadores do nosso jogo do meio-dia eram imaginários.


            -Fora! Cuidado com Ken Griffey Júnior - eu disse. – Nós temos um jogador de primeira linha bem aqui.


            O rosto de Miguel brilhava. Todo o dinheiro que eu havia gastado com aquela pequena luva de canhoto tinha valido a pena. Depois de conversar com Jim e Anna sobre a situação, comprei a luva e levei Miguel para lançar algumas bolas no campo durante o intervalo de almoço da segunda-feira. Esperava aumentar a confiança dele, encorajando-o a explorar os seus talentos. Isso tornaria todo o resto mais simples para ele.


            Jogamos intensamente por trinta e cinco minutos. Olhei para o céu que ficava cada vez mais escuro, e acenei para ele. O vento estava aumentando e havia apenas um pedacinho de azul à esquerda.


            -Por favor - implorou Miguel - Mais uma bola.


            Lancei a bola e o observei correr ao longo do campo. Era rápido como um gato. Nunca tinha visto uma criança com tanta agilidade.


            - Por favor, tia Hermione, só mais uma bola - ele me pediu novamente.


            Eu balancei a cabeça:


            - Prometi ao chefão que você iria almoçar.


            Ele permaneceu no meio do campo por um momento, as pernas curtas plantadas firmemente no chão, esmurrando a luva com o punho - o primeiro sinal de resistência que eu havia visto  em Miguel.


            - Vamos, menino. Vai começar a chover.


            Ele veio andando relutante. Abri a sacola com os sanduíches, e os guardanapos começaram a voar na nossa frente. Miguel se sentou perto de mim na arquibancada, devorando o pão até que sobrasse apenas a casca. Ele a colocava de lado e pegava outro sanduíche.


            - Sabe, Miguel, pode ser mais fácil comer se você tirar a luva.


            Ele me olhou, os olhos escuros procurando os meus para saber se eu estava falando sério, então, sorriu e continuou com a luva.


            - Como é que você não fica irritada comigo quando eu faço alguma trapalhada? - ele perguntou com a boca cheia.


            - Irritada? Por que eu ficaria? - repliquei. - Eu me atrapalho o tempo todo. Ninguém quer, mas todo mundo se atrapalha.


            - José não - disse Miguel firmemente.


            - Quem é José?


            - O namorado - falou.


            - Da sua mãe?


            Miguel fez que sim com a cabeça.


            - Você gosta do José? - perguntei.


            Miguel desviou o olhar.


            -Ahã.


            Não acreditei nele:


            - Ele mora com vocês?


            - Às vezes. Onde é que você mora? Você tem um quintal?


            - A uns seis quilômetros daqui. Tenho, eu tenho um quintal.


            - Você mora perto do tio Harry?- ele quis saber.


            - O tio Harry mora perto do clube de golfe, onde nós vamos nadar.


            Ele lambeu a pasta de amendoim de seus dedos.


            - Eu queria poder morar com o tio Harry.


            - Você gostaria de poder jogar golfe?- brinquei com ele.


            - Ele é legal - Miguel disse casualmente.


            Concordei e fiquei desejando que nós não tivéssemos que conversar muito sobre Harry. Já tinha pensado muito nele no dia anterior e tentei evitá-lo naquela manhã. E Miguel havia me proporcionado uma boa desculpa para não almoçar com ele e Anna.


            - Ele diz coisas legais.


            - É mesmo - concordei de novo. - Às vezes, ele toca violão pra gente. E conta histórias,  várias histórias sobre mágicas. Eu acho que ele acredita nisso. Acho mesmo. Você acredita?


            -Costumava acreditar - disse, enfiando o meu sanduíche de volta na sacola.


            - Você não está com fome? - perguntou.


            -Acho que não. Comi um monte de brownies no fim de semana - contei a ele.


            -É? Tem algum aqui? - ele enfiou a mão dentro da sacola de papel.


            - Só biscoitos.


            -Tá bom - o garoto sorriu e levantou seu braço de repente, apontando com a sacola ainda em suas mãos. - Ei, olha lá o tio Harry.


            Olhei rapidamente sobre o meu ombro.


            -Quem é? - perguntou Miguel. - Quem é aquela garota com ele?


            -Uma amiga do tio Harry. O nome dela é Gina.


            Por que eu não disse que era uma amiga minha também?


            Miguel e eu observamos os dois percorrerem o caminho que circundava o campo. Não tinha certeza se haviam nos visto. Provavelmente estavam muito concentrados um com o outro.


            - Ela é namorada dele?


            - Parece que sim - disse.


            - Ei, tio Ha...


            -Shhh! Não o chame. O tio Harry está conversando com a amiga dele.


            "E se ele beijasse a amiga dele?", pensei. Seria bom para Harry se as crianças da segunda série parassem de fazer desenhos da monitora maluca de cabelos castanhos e começassem a desenhá-lo ao lado de uma ruiva. Gina e Harry desapareceram atrás de uma árvore - "Meu Deus, eles gastam bastante tempo atrás de árvores e arbustos", pensei -, mas o caminho realmente seguia naquela direção para se chegar ao prédio em que Gina tinha aulas de dança. Alguns minutos depois, Harry reapareceu, sem a Gina, andando sozinho em nossa direção.


            - Ei, tio Harry! Ei, olha aqui! Olha o que a tia Hermione me deu.


            Miguel correu para encontrá-lo. Eu fiquei onde estava. O rosto de Harry se iluminou com um grande sorriso. Ele se curvou para falar com Miguel e examinar a luva. Ela não cabia na mão de Jack, mas ele a prendeu com os dedos e fingiu que estava agarrando uma bola. Miguel o imitava. Então Harry olhou para cima como se estivesse tentando pegar uma bola bem alta. Ele começou a esticar os braços, dizendo:


            - Eu peguei! Eu peguei! Eu peguei! Eu não peguei...


            Miguel caiu na grama de tanto rir.


            Harry o puxou do chão, então colocou a mão sobre o ombro do garoto. Senti uma ponta de inveja: queria ser alguém que pudesse rir com Harry, alguém que ele quisesse alcançar e tocar carinhosamente. Foi como ter visto ele junto da Anna, aquele ciúme idiota que senti quando vi a intimidade com que se tratavam.


            - Se segura, Hermione - eu murmurei para mim mesma.


            Harry colocou a luva na cabeça de Miguel, então olhou para mim, sorrindo. Olhei rapidamente para ele com um sorrisinho, me levantei e comecei a pegar as coisas do almoço.


            - Oi, Hermione.


            - Oi, Harry.


            - Parece que vocês dois andaram se divertindo.


            - É mesmo - disse, evitando olhá-lo de frente. – Miguel é um astro. Espero que ele se lembre da gente quando ficar famoso.


            Miguel sorriu.


            - Como está a Gina?- perguntei.


            - Gina?


            - Sua namorada – disse Miguel.   


            Harry deu uma piscada.


            - Ah, certo. Sentimos sua falta durante o almoço. "Com certeza", eu pensei e olhei para o céu. A chuva chegaria tarde demais.


            - Acho que você já deve saber que saí com ela no fim de semana - continuou Harry.


            "E saiu, e saiu de novo e saiu mais uma vez", eu pensei.


            - Ahã. A mãe dela me contou - disse. Começamos a andar juntos para o centro acadêmico. - Isso é ótimo. Realmente ótimo.


            - Como foi o seu final de semana? - perguntou Harry.


            - Ah, foi ótimo também.


            - Ela comeu um monte de brownies- entregou Miguel. Harry riu:


            - Ovos Mexidos gosta de brownies?


            - Não, eu gosto - respondi secamente.


            Harry inclinou-se um pouco para a frente, como se tentasse ler o meu rosto. Tentou fazer com que eu o olhasse de volta, tentou fazer que nossos olhares se cruzassem.


            - Se a gente não se apressar - falei - Vamos ficar encharcados.


            "Por favor, chova, por favor, comece a chover agora." Alguém devia estar me escutando. Um relâmpago tomou o céu. Agarrei a mão de Miguel. Ele gritava como um porquinho, e nós corremos para o centro acadêmico. Miguel e eu não paramos até chegarmos perto das crianças que saíam da lanchonete. Eugene puxou o meu cabelo molhado. Janet quis saber por onde eu tinha andado. Estava feliz por estar entre as crianças, que não paravam de rir e conversar. E, além disso, eu me sentia aliviada por elas estarem aglomeradas ao meu redor, protegendo-me dos olhares questionadores de Harry.


           


 




            À noite ainda continuava chovendo. Era possível ouvir as gotas no telhado e o barulho de uma velha calha solta que não parava de sacudir. Joelle e eu estávamos sentadas no sofá assistindo a um dos seriados de TV mais idiotas que eu já vi. "É assim que vamos terminar", pensei, " Joelle e eu, duas irmãs solteiras vivendo juntas, assistindo a seriados estúpidos, cuidando do Camarada."


            - Devo assar uns brownies?- perguntou Joelle.


            - Não - acho que eu tinha voltado a suspirar.


            - E aí, o que é que o Draco disse quando você falou que estaria ocupada no sábado à noite? - Joelle quis saber.


            Ele havia ligado logo após o jantar, e ela ouvira a conversa até o momento em que eu peguei o telefone sem fio e entrei dentro do guarda-roupa. Mas eu fiz aquilo apenas para irritá-la. No fundo, não ligava se ela soubesse alguma coisa sobre Draco.


            - Ele perguntou sobre o domingo.


            - E você falou? - disse, querendo que eu continuasse.


            - Que estava ocupada. - E ele?


            Apanhei o controle remoto e comecei a trocar de canal.


            - "Que tal segunda-feira?". Mas ele precisa dormir cedo, lá pelas dez horas.


            - Sabe, Draco não deve ser esperto o suficiente para entender uma indireta - minha irmã disse, colocando a mão sobre a minha.


            - Não diga! - falei, "zapeando" ainda mais rápido. - Bem... eu acabei falando que não estava a fim de sair com ele.


            - Ele ficou destruído?


            - Perguntou se eu gostaria de vê-lo numa competição que está para acontecer.


            Ela chegou a se engasgar e tive de rir um pouco.


            - Ah, Mione - disse ela.


            - Ah, Joe. - Nós não usávamos esses apelidos há muito tempo.


            - E você contou ao Harry que você e o Belo Adormecido não estão mais juntos?


            - Por que eu deveria contar isso ao Harry? - perguntei, ácida. Estávamos de volta ao seriado estúpido. Olhava furiosa para os atores. - Pensei que estivesse acompanhando tudo o que está acontecendo, Joelle. Já deveria saber que ele está saindo com a Gina.


            - Eu sei. Mas isso nunca foi um motivo para ela parar,não é?


            Levantei do sofá. Talvez eu realmente precisasse de chocolate.


            - Não, porque o cara sempre estava interessado nela. Mas Harry não está interessado em mim - minha voz tremeu. – Sorte da Gina.


            Joelle se levantou para me seguir,então afundou o corpo de novo no sofá.


            - Tá tudo bem? - perguntei.


            - Tá, com certeza - ela me dispensou com a mão.


            Ela não estava com uma cor boa desde que eu voltara para casa.


            - Você está com uma cara estranha. O que há de errado?


            - Como vou saber? - ela balançou os ombros. - Eu não controlo mais o meu corpo. Parece que ele está possuído.


            Franzi as sobrancelhas e abracei o meu corpo. Sentia como se o meu coração estivesse possuído. "Primeiro, alguém rouba o seu coração", eu pensei, "então tudo começa a escorregar de suas mãos."


            - Quer alguma coisa da cozinha?


            - O que você for comer está bom para mim - ela respondeu.


            Eu voltei com um pacote de biscoito e leite. O rosto de Joelle estava com uns dois por cento de sua cor habitual.


            - Vamos ver um vídeo - sugeri.


            Abri a porta de vidro do armário.


            - O que você quer ver? - Eu sei, minha disposição estava incrível. Eu estava realmente preocupada com ela.


            - Nosso amor de ontem.


            - O quê? - Esse filme fazia parte da coleção dos meus pais e era um melodrama horrível. - Por quê?


            - Assim a gente pode chorar e sentir pena de outra pessoa - Joelle sugeriu.


            - Mas eu odeio esse filme. Odeio a personagem da Barbara Streisand. Ela tem um cabelo seco, é incrivelmente teimosa. E se apaixona perdidamente pelo cara errado.


            - É, bem... - minha irmã deu de ombros.


            Fiquei surpresa que ela tenha se segurado para não fazer um comentário maldoso do tipo: "Olhe-se no espelho, Hermione". Devia estar se sentindo muito mal.


            Coloquei a fita no videocassete e fui pegar os lenços de papel.


            Já estávamos na metade do filme, quando Joelle se curvou para a frente e apertou o botão para desligar o vídeo.


            - Acho que preciso dar uma ida ao banheiro.


            Ela ficou em pé, imóvel por um instante.


            - Joelle?


            - Estou bem.


            Quando olhei para a parte de trás do vestido dela, um arrepio gelado tomou conta do meu corpo. Havia uma grande mancha vermelha nele. Joelle virou o pescoço para ver o que era.


            - Ai - disse e sentou de volta no sofá - O que a gente faz agora? - Parecia que ela estava prestes a desmaiar.


            - Ligamos pro corpo de bombeiros?


            Ela franziu a testa.


            - Brincadeira - murmurei e corri para o telefone.


 


 


Eu fico aflita nesse capítulo com a Joelle. Eu tenho uma relação bem parecida com a minha irmã e acho que se ela estivesse na mesma situação eu também ficaria como a Hermione ficou!


Bem, Harry é um sacana! Parece que ele faz de propósito! E a Gina? Antes ela ligava o tempo todo e agora nada! Isso que é amiga! HUNF!


Por hoje é só! Att está ai, como pedido! rsrs




Milharesdebeijos ♥

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