- O coração peludo do mago -

- O coração peludo do mago -



Era uma vez um jovem mago alto, esbelto e atraente, o qual chamava a atenção de muita gente. Desde pequeno sempre fora dotado de incrível inteligência e habilidades mágicas, as quais o fez ganhar vários prêmios e ser titulado como mente brilhante em comparação com muitos outros bruxos, e ainda era rico. Sua família era de uma longa geração de bruxos famosos e importantes que fizeram incríveis descobertas.
Porém, toda esta parte intelectual e misteriosa escondida em seu coração, o tornava egocêntrico e muitas vezes desumano. Nunca levou algum sentimento a sério, só pensava em si e em seu talento “excepcional”. A alegria para ele era apenas um modo de mostrar sentimentos supérfluos, a esperança era outro modo de contar com a sorte, porém ele não acreditava na sorte; e amor era um grande equívoco. Definiria o amor era o modo com que os outros ocupavam o tempo o qual não tinham nada pra fazer. Um dos poucos sentimentos reais que transmitia era a amizade, que aos poucos estava se esvaindo.
Quando saía com seus amigos, era forçado a agüentar os comentários sobre umas garotas bruxas e outras.
“Olha só aquele anjo! Linda, não?” – dizia Rowan.
“Infelizmente estou comprometido... Estou apaixonado por Alena! Ela é incrível... E você?” – disse outro se referindo ao jovem mago.
“Não.” – era a comunal resposta dele. “Não me vejo hipnotizado por algo tão simples quanto o amor... Poupe-me!”
“Como não? Nunca gostou de ninguém? Eu faria tudo por Alena, disso tenho certeza...” – e muitas vezes não obtinha resposta.
Quando obtinha resposta era o usual: “Por isso mesmo que não vou me rebaixar tanto.”
Este era o verdadeiro problema dele. Começou a se envergonhar dos amigos que tinha, pois ambos estavam apaixonados. E isso, na opinião do mago, era sinônimo de fraqueza. A fraqueza levaria a abstinência, e desta a loucura, podendo arriscar seriamente a vida por este “simples sentimento”.
Via que os amigos não mais poderiam sair, por causa de ocupações com suas namoradas. Achou que seria certo acabar com este sentimento, para não acabar adquirindo tal fraqueza, este era seu verdadeiro desejo. Então, para evitar que se apaixone, acabou utilizando magia negra.
Em uma noite de lua cheia, arrancou o próprio coração por meio de um ritual terrível, e o guardou dentro de um baú cristalino, escondendo este de todos, era seu grande tesouro. O mago tinha a consciência do que havia feito, e se orgulhava daquilo.
Sentia-se agora livre da terrível fraqueza. Estava convencido de sua sabedoria e ter alcançado total indiferença. Poderia ver qualquer um morrer diante dele, e não se emocionaria. Tornou-se um verdadeiro coração de pedra, tratava todos do mesmo modo, porém não emitia quaisquer emoções. Estava certo de que fizera a coisa certa e nada iria mudar quanto a isso.
Um dia, em um almoço com a família, ele se levantara para falar sobre sua nova decisão.
“A partir de hoje, eu decidi que não terei o sentimento de fracos, como o amor!”
Sua família riu. Ninguém sabia das medidas tomadas pelo mago. Todos pensavam em como ele era ingênuo sobre os verdadeiros sentimentos para dizer algo tão absurdo. Todos pensavam em como ele poderia se rebaixar a dizer isso.
“Filho, filho, a garota certa irá mudar seus pensamentos...” – disse o pai, por fim.

Conforme o tempo passa, o mago assiste seus amigos casarem e terem suas próprias famílias. Porém, permanece satisfeito com sua decisão, considerando-se sortudo por ter se livrado de sentimentos que, segundo ele, encolhem e esvaziam os corações.
Seus pais contraíram uma doença incurável na época. Todos os familiares viviam em torno dos dois, todos estavam preocupados com a saúde deles. Enquanto o jovem mago estava bocejando, deitado em sua própria cama, com os pensamentos voltados apenas para si. Em um dos dias, quando não tinha nada pra fazer, aproveitou para visitar os pais que estavam sob cuidados médicos em seu próprio castelo. Para ver como o jovem estava se tornando sólido internamente.
Os dois estavam deitados, muito magros, com feridas por todo o corpo, de onde saia pus e sangue. Estavam pálidos e sem energia, suas vozes roucas soavam baixinho. Olhavam incrédulos para o filho, com suas enormes olheiras, não acreditavam na indiferença que este fazia por eles. Ele apenas dizia que não havia com o que se preocupar se nada iria fazer diferença.
Os dois perderam vontade de viver ao ver o filho deste jeito... Morreram... O jovem mago se sentiu até abençoado por não se importar ao ver os dois deitados serenamente sobre seu leito de morte. Pareciam mais que estavam dormindo, mas ele não sentia tristeza... Sentia o próprio vazio que é viver sem a parte mais importante da alma, e não se importava... Nuca se importou com algo que não fosse sobre ele.
Muito menos se emocionou no enterro. Tratou daquilo como apenas um momento de seu dia.
“Soube que seus pais morreram...” – comentou Rowan.
“Sim.”
“Como?”
“Uma nova doença destas que ainda não foram achadas curas...”
“Pensei que você iria estar triste...”
“Por quê?”
“São seus pais!”
“Eram... Morreram. Todos morrem um dia. Não há como evitar.”
Com a morte dos pais, herdou o castelo e transferiu o grande tesouro para um dos escuros calabouços. Aos poucos, ele acaba obcecado por sua solidão e começa a acreditar da inveja de todos em relação a sua esplêndida e perfeita solidão. O mago acabou desiludido.
Quase não saía mais do seu castelo. A maior parte do tempo ficava trancado em seu quarto, solitário... Muitas vezes ficava falando palavras sem sentido, palavras que descreviam sua genialidade. Ele estava começando a assumir atitudes insanas.
Para piorar a situação, ouviu dois serviçais fofocando sobre ele.
“Olha... Ele é muito solitário e tímido, mulheres gostam de homens extrovertidos... Esse tipo de coisa... Ele é muito fechado!”
“Eu acredito que ele não goste de mulheres, nem ao menos tem uma esposa.” – e uma gargalhada era abafada.
Irado com aquela pequena discussão, decide que iria arranjar uma esposa, alguém rica, talentosa e bonita, alguém que fizesse com que todos o invejassem.
Enquanto caminhava pelo pequeno vilarejo perto de seu castelo, no dia seguinte, viu o seu “prêmio”: uma linda mulher bem vestida logo ali, sentada em um banco, solitária. Não perdeu a chance, fora um golpe do destino. Sentou-se ao seu lado, e assim começou um breve romance, ainda assim ele teve que a perseguir para finalmente obter algum resultado. Tentou ainda convencer a todos que conhece de que era um homem mudado.
Apesar de ter conseguido o coração da bela moça, ainda não era capaz de sentir a verdadeira emoção que é o amor, isso fazia com que ele se distanciasse dela aos poucos, o que mais a preocupava. Ela o amava, mas pelo fato deste não estar se preocupando por ela, a fazia o querer menos... Mas o amor é inconseqüente.
Ele tentava formar algum laço amoroso entre os dois, mas ainda assim, achava que apenas diante de todos poderia finalmente convencer de que havia mudado. Propôs uma festa. Convidou todos os parentes, amigos, amigos de amigos, parentes dos amigos. Com um baile nobre sob a presença dos famosos menestréis.
Quando teve a oportunidade, chamou a moça para um canto do salão e começou a cortejá-la. Esperava que tudo desse certo, porém...
“Você me ama mesmo?” – perguntou o confrontando.
“Amo! Sim, amo!” – respondeu.
“Portanto, só acreditarei em suas palavras se você me mostrar que tem um coração!” – e cruzou os braços.
“Como?!”
“Mostre-me se você tem um coração! Aí saberei se você realmente me ama...”
O jovem mago levou-a por um corredor largo e sombrio, puxando-a pelo braço. Logo estava no terrível calabouço. A moça estava ficando assustada com tudo aquilo, não entendia o porquê de ter levado-a para lá.
“Onde estamos? Por que me trouxe aqui?”
“Você verá...”
A moça chegava a prender a respiração de horror que sentia pelo lugar. Até o mago apontar um baú cristalino, onde estava guardado seu próprio coração pulsante. Aquilo foi suficiente para a moça soltar um grito de exclamação. O coração não era algo muito comum, e ainda mais fora de seu devido lugar. Este era encolhido e peludo.
“Co-consegue co-colocá-lo no lu-lu-lugar?” – com muita dificuldade pronunciou palavras desafiadoras.
Como sabia que isso deveria ser preciso, o mago aponta a varinha para o próprio peito e uma fenda é aberta e, com muito esforço, consegue colocar o coração dentro do seu peito. Foi uma terrível, porém gloriosa, sensação, que durou apenas por alguns segundos. Imaginando que o mago pudesse amar novamente, a moça o abraça com ternura emocionada.
Porém, o coração havia se desenvolvido na escuridão e fora de seu devido lugar por muito tempo, evoluindo de uma forma diferente, estava atrofiado. As emoções que estavam contidas dentro dele haviam sumido por completo, apenas havia rancor e tristeza, uma grande carga negativa de emoções que haviam se acumulado. Ao sentir a bondade da moça, toda aquela ternura, o jeito como era bem-tratada, o cheiro perfumado, o coração acabou se rompendo. O que restava de bondade guardada fora destruído, o coração atrofiou ainda mais.
Com uma terrível atitude, o coração tenta dominar o mago...

“Você viu o jovem mago?” – perguntou um dos convidados que bailava no salão principal, horas depois.
“Não... E aquela noiva dele? Ela também sumiu não?”
O jovem parou de dançar, dirigiu-se para um dos serventes do mago e perguntou sobre ele. Nada eles sabiam. O amigo do mago perguntou a todos os presentes e, como não houve resposta, esperou o retorno dele, sendo que estava desconfiado de tanta demora.
“Ninguém sabe nada sobre ele. Para aonde foi e porque sumiu!” – comentou o par que estava antes dançando com ele. “Não acha que devemos procurá-lo...”
“Acho que já devíamos ter feito isso há bastante tempo... Desde o momento em que ele desapareceu.” – concluiu o rapaz pensativo.
Em pouco tempo haviam organizado uma pequena equipe para ir atrás do anfitrião da festa. Não o encontraram tão cedo, até o próprio amigo dele dizer que estava escutando sussurros do corredor para o calabouço.
Lá estava ele e a bela moça, deitada, muito quieta, com o peito aberto, sem o coração. Enquanto mago ajoelhado ao seu lado, lambia o coração da donzela. Ria incontrolavelmente com uma expressão débil na face. Todos e espantaram ao ver a cena.
O mago recusara-se a obedecer a seu coração que estava se rompendo aos poucos, e pretendia trocá-lo pelo de sua ex-noiva. Ninguém correu para socorrê-lo, algo parecia impedi-los. Aquele coração ainda pulsava em sua mão, sangrento.
Havia um sério conflito entre suas emoções. Ele se sentiu vulnerável com aquele horrível coração, sabia que morreria se continuasse com ele. Foi arrebatado por uma imprudente tristeza, seguida de ódio e rancor, mas estava decidido.
Enlouquecido pelos desejos e emoções aterradoras que sentia, puxou um punhal e cortou fora o próprio coração. Foi apenas por alguns segundos que se sentiu vitorioso, segurando os dois corações: o seu, peludo e atrofiado, e o de sua noiva. Logo depois sua visão escureceu; seus músculos não mais o obedeciam; a audição começou a falhar até não escutar mais nada, sentia uma pressão sobre a cabeça.
Sentiu um vento frio, vindo do além. Antes mesmo de morrer, foi possível ser vista uma lágrima escorrendo pelo seu rosto, ele morreu com um sorriso eterno. Foi enterrado diante de se castelo, e na lápide fora escrito: “Aqui jaz quem nunca ligou para sentimentos, mas sabia que no fundo, não ter sentimentos é não ser humano.”




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Notas do autor:
Espero que tenham gostado.
Estamos postando hoje, pois é aniversário de uma amiga nossa: Pandora Black Riddle. Parabéns, Pan!

P.S: sabendo que os capítulos principais serão postados em ordem decrescente, este foi postado dia 06/04/08.

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