O Cão da Semana
7. O Cão da Semana
Na escola, a nossa turma estava fora de si na semana seguinte. Penso que a onda de calor afectara o cérebro de todos.
Começou na aula de Ciências quando o stôr Dixon perguntou se alguém sabia a fórmula química da água.
Gabby Jones levantou a mão. – HIJKLMNO – respondeu, orgulhosamente.
- Hã, podes dizer porquê? – perguntou ele.
- Ontem – respondeu Gabby – o senhor professor disse que H a O era a fórmula da àgua.
- H2O – suspirou ele, escrevendo depois no quadro. – H 2 como no número e O. Está bem, última pergunta sobre a água. Que podemos fazer para poupar água quando há falta?
- Deitar menos na chaleira – propôs a Lucy.
- Excelente. Mais alguém?
- Não utilizar a mangueira – sugeri.
- Outra boa resposta. Mais algumas para poupar o nosso abastecimento de água?
A mão de Jade Wilcocks levantou-se rapidamente. – Diluí-la, senhor professor – disse ela.
O senhor Dixon abanou a cabeça, mas percebi que estava a fazer um esforço para não se rir.
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Depois, fomos para a sala de reuniões da escola ver um filme sobre o cosmos e todos os planetas e estrelas. A seguir, a stôra Watkins fez-nos perguntas para ver se tínhamos prestado atenção, pois acho que algumas raparigas utilizaram a escuridão como pretexto para dormir uma soneca.
- O que é um cometa? – perguntou a stôra.
Sabia a resposta e levantei a mão.
- Uma estrela com cauda, senhora professora.
- Correcto. E alguém sabe o nome de algum?
A Candice Carter, uma das que eu tinha visto a cabecear, estendeu a mão. – Mickey Mouse, senhora professora – respondeu e todas desataram a rir.
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Mas o melhor foi em ER. Foi outra vez a stôra Watkins a dar a aula e perguntou se alguém sabia qual o nome de Deus.
Desta vez, foi o Mo Harrison quem levantou a mão.
- Andy, senhora professora.
- Andy? Por que razão Andy seria o nome de Deus?
- Está em todos os hinos, senhora professora – disse o Mo. – Andy a caminhar comigo. Andy a falar comigo… Há montes de exemplos.²
- Não, Mo – reprovou miss Watkins, virando-se para a Marlene que chorava a rir. – Marlene McKinnon, já que claramente achas isto muito engraçado, qual pensas ser o nome de Deus?
- Hã, não tenho a certeza – disse a Marlene, parecendo ter sido apanhada desprevenida. – O que é que acha?
- Não acho – corrigiu a stôra. – Sei.
- Também acho que não sei – riu-se a Marlene.
Toda a turma foi castigada, mas valeu a pena. Pareceu-me ter passado a manhã toda a rir à gargalhada.
Nunca chegámos a saber qual era o nome de Deus.
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- Como te estás a entender com a revista? – perguntou a Izzie enquanto nos sentávamos a escrever o castigo no intervalo do almoço.
- Assim assim. Tenho algumas ideias, mas preciso de pô-las no papel – repliquei.
- Vem a nossa casa no fim-de-semana – convidou a Lucy. – Tenho a certeza que o James gostaria de voltar a ver-te e ele pode ajudar. E eu, a Izzie e a Marlene também.
A oferta de ajuda era tentadora. Estávamos a menos de duas semanas da entrega das propostas e ia haver muita competição. Discussões intensas e conversas murmuradas aconteciam por toda a parte.
- Podia fazer-te uma página de horóscopo, se quiseres – ofereceu-se a Izzie.
- Isso seria óptimo – concordei. – E talvez faça um artigo sobre o Canil de Battersea.
Mostrei à Lucy e à Izzie as fotografias do Mojo. Em breve, todas queriam vê-las, pelo que passaram por toda a turma. Todas exclamaram «Oh» e «Ah» até chegar a vez da Wendy Roberts.
- Rrr, que querido – disse em voz alta. – O novo namorado da Lily. Eh, Lily. Isto é tudo o que consegues? Precisa de se barbear.
Algumas raparigas riram-se com pouca vontade mais por alinharem do que por acharem a Wendy Roberts divertida. Por que estava ela a ser tão horrível para mim? Era porque o Sam gostara da minha resposta e não da sua? Ou porque tivera uma classificação baixa depois copiar o meu trabalho de casa? Eu não tinha culpa de ser um zero à esquerda em Matemática. Esforcei-me por encontrar uma resposta divertida para parecer que não me importava, mas não consegui pensar em nada rapidamente. Bolas e bananas, como a Hannah costumava dizer. Por que não me ocorrem as palavras certas quando preciso delas?
Depois do castigo, saímos todas para os últimos dez minutos do intrevalo. Comi as minhas sanduíches e estendi-me ao sol, mas não pude deixar de reparar que algumas raparigas faziam circular um pedaço de papel, olhando-me depois rindo.
Oh, que se passava agora, pensei, enquanto a Izzie se me juntava no banco.
- O que se passa? – perguntei.
- Oh, é a Wendy. Sabes que também vai concorrer a editora. Tem apenas inveja…
- Não ligues – aconselhou a Lucy, vindo juntar-se a nós. – Não precisas de saber, Lily. É uma vaca e devias ignorá-la.
- Não, quero ver – retorqui, levantando-me e aproximando-me do grupo de raparigas que estava à volta da Wendy a olhar para o pedaço de papel. Espreitei por cima do ombro da Wendy. Tinha a fotografia de um cão sem cabeça e com a minha em seu lugar. Recortara a minha fotografia de grupo da revista do mês anterior. Por baixo, a Wendy escrevera «O Cão da Semana».
- Que te parece, Lily? – perguntou a Wendy, rindo. – Como tens um cão, ocorreu-me a ideia. Na revista, em cada mês escolhemos alguém para ser O Cão da Semana. Que achas?
Enquanto procurava a resposta apropriada, uma voz atrás de mim chegou primeiro. – Acho, Wendy, que mesmo que tentasses, não conseguirias ser mais estúpida.
Virei-me e dei de caras com a Marlene. Parecia furiosa.
Pegou no papel e, para grande espanto da Wendy, rasgou-o. – Isto não tem graça nenhuma, Wendy. E tu bem sabes que não. Não é jornalismo. É apenas maldade. Vem, Lily. Não te rebaixes a respirar o mesmo ar desta forma de vida inferior.
Fiquei tão estarrecida como a Wendy, mas afastei-me com a Marlene e segui-a até ao banco onde a Lucy e a Izzie estavam sentadas.
- Obrigada, Marlene – agradeci -, mas não valia a pena. Eu consigo lidar com a Wendy Roberts.
- Eu sei. Mas tenho estado à espera de uma oportunidade para te mostrar que estou do teu lado. Lamento o que se passou no outro dia. Por vezes, as palavras saem-me da forma errada.
- Mas agora não – ri-me. – Foi óptimo. Gostava de conseguir dizer coisas assim. Só me ocorre aquilo que deveria ter dito tarde demais, tipo quando estou a adormecer ou assim…
- O talento especial da Marlene é defender as amigas – brincou a Lucy. – O seu defeito é a língua afiada.
- Bem, eu sei o que é ter uma sádica como a Wendy a descarregar em ti – disse a Marlene.
- Não sei porquê. Nunca lhe fiz nada.
- Com o feitio dela, não precisas de fazer nada – esclareceu a Marlene. – Provavelmente, tem inveja.
- De mim? Não sejas tonta.
- És bonita e tens miolos – afirmou a Marlene. – Uma combinação fatal.
Senti-me mesmo orgulhosa. Afinal, talvez ela não achasse que eu era demasiado horrível.
Depois, olhei para a Wendy que nos fulminava com o olhar do outro lado do pátio. Esperava que isso não fosse o começo de alguma coisa.
A seguir, olhei para a Lucy, a Izzie e a Marlene que fulminavam com o olhar como se fossem as minhas melhores amigas. E esperei que isso fosse o começo de alguma coisa.
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De: Lily
Para: Hannah
Data: 18 de Junho
Assunto: nadadespecial
Querida H,
O tempo está lindo. Gostava que estivesses aqui.
Lily
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De: Hannah
Para: Lily
Data: 18 de Junho
Assunto: nadadespecial também
Querida Lily,
O tempo está aqui. Gostava que estivesses linda. Ão ão.
Tenho de ir. Vou ao cinema. Ao ar livre.
Grandes abraços e hihihasta la vista baby.
Hannah
Título de livro:
Problemas peitorais de Ivor Tickliecoff [significado «Tenho uma tosse coceguenta»]
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De: Marlene
Para: Lily
Data: 18 de Junho
Assunto: sexta-feira à noite
Olá, cabeça vermelha,
Queres vir dormir a minha casa na sexta-feira à noite? A Iz e a Lucy vêm. Por volta das 7?
Marlene
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- Trocadilho fonético entre a preposição «to» e o algarismo «two», que em inglês se pronunciam do mesmo modo;
²- Trocadilho fonético entre o nome próprio «Andy» e a expressão «And Thee» («E Vós»), que em inglês se pronunciam do mesmo modo.
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