O Desconhecido Desengonçado



Capítulo 2 – O Desconhecido Desengonçado




Era sexta à noite e Ella andava pelas ruas de Londres acompanhada por Morgan. Ventava bastante, então tentava andar o mais próximo do amigo, na tentativa de se esquentar no enorme casaco negro dele. Sabia que deveria ter levado um casaco mais grosso, afinal, estavam em pleno outono, mas quem em sã consciência levava um casaco para um show? Era pedir para morrer de calor com toda aquela multidão pulando e gritando.
Tinham acabado de voltar de um show da banda de Oscar, um dos antigos colegas de escola. Haviam se encontrado por acaso em um café na zona norte da cidade, e ele a convidou para o show da banda. Sempre soube que o rapaz tinha um talento peculiar para a música, e sua teoria se consolidou após assistir a apresentação do antigo Lufa-Lufa.
Agora só restavam Ella e Morgan caminhando pela calçada procurando pelo endereço que Oscar lhes dera. Iria haver uma festa após o show na casa de uns dos integrantes da banda e eles estavam convidados. O difícil era achar o bendito do endereço.
- É ali. – falou Morgan, apontando para um prédio a menos de um quarteirão de onde estavam. – Vamos logo porque daqui a pouco os trouxas chamam a polícia para abaixar o som.
- Ou que o wisky acabe. – completou Ella.
- Olha a cirrose, Ella. Olha a cirrose. – Morgan a puxou pelo braço para se apressarem. Tinha conhecido uma mulher no show, e já estava atrasado para encontrá-la.
- Vá para os infernos, Morgan. Eu tive uma semana dos infernos. – bufou a loira, escondendo uma careta de dor. Fazia duas semanas quase que recebeu o distintivo, e logo na primeira patrulha acabou machucando a perna enquanto caçava um vampiro fujão. Queria matar o chefe, aquele era trabalho para o Departamento de Controle de Animas Mágicos, não para aurores. Teve sorte do maldito não ter mordido seu pescoço, embora fosse uma enorme fatalidade ser atingida por Mayers “por engano”.
- Está nervosa só porque o Mayers te mandou passear no St. Mungus. – Morgan estendeu o braço, ajudando Ella a subir as escadas. Sabia que ela sentia ainda um pouco de dor na perna esquerda, mas também havia aquele enorme sentimento que ver a morena e olhos castanhos que conheceu naquela noite.
Subiram os sete andares pelas escadas mesmo, no térreo a placa amarela que “Elevador com Defeito” se destacava entre as paredes brancas. Ella só não consertou o elevador ali mesmo com a varinha porque haviam dois trouxas conversando perto da entrada.
Ao chegarem ao terraço, viram que a festa já estava animada. O pessoal da banda estava cada um para um canto, a maioria cercados de pessoas, conversando animadamente umas com as outras. Ella pensou em ir falar com Oscar, mas o moreno flertava com uma jovem de cabelos acastanhados. Não iria interromper, então o melhor a fazer era pegar um copo com uma das várias bebidas sobre a mesa e se afastar por um momento para conversar. Olhou para o lado e viu que Morgan já tinha sumido há tempos, então sua última teoria de como passar o tempo foi por água abaixo. Seria só ela, a vodka e a dor infernal da perna.
Com o copo já cheio, deixou a multidão para trás e rumou para um lugar mais quieto, perto da sacada, onde a música era mais abafada e o vento mais forte. Passar um pouco de frio seria o preço a pagar por um pouco de silencio, Ella queria descansar a cabeça, não pensar em nada ou em ninguém. Pensava que depois de conseguir a promoção, as coisas iriam melhorar, mas se enganou, estava mais árdua sua rotina.
Sentou na beirada da sacada, tomando cuidado para não escorregar. Bebeu um gole da bebida, que desceu queimando pela garganta. Fitou a vista da cidade iluminada, e soltou um suspiro. Adorava aquilo, aquele ambiente urbano e ativo, provavelmente seria essa a causa de não gostar muito da Mansão em Wiltshire. Preferia muito mais seu pequeno apartamento desorganizado do que o antigo quarto impecavelmente arrumado na mansão.
- Dia difícil? – perguntou uma voz ao seu lado.
Ella se assustou e só não caiu porque sentiu um par de braços fortes segurá-la. Reconheceu a voz, e quando virou-se para ver a face do dono desta, pensou reconhecer aquelas feições também. Era um rapaz um pouco alto, com os cabelos extremamente bagunçados e ficava pior à medida que o vento soprava sobre estes. Seus olhos era um tom verde-esmeralda, e ao abrir um breve sorriso, apareceram duas covinhas. Apesar de não ter visto aquele rosto, lembrava-se perfeitamente daquele tom de voz, mas na ocasião um pouco mais irritado. Era ele quem esbarrara quando saiu do escritório de deus pai há duas semanas atrás.
- Não é da sua conta. – respondeu arrumando uma posição mais confortável longe dos braços dele. Olhou para o copo vazio e ao liquido que escorria por muro abaixo, e revirou os olhos.
- Bela maneira de demonstrar sua gratidão. – o desconhecido sentou-se ao lado dela, agora segurando uma garrafa cheia da bebida derramada há poucos segundos atrás. – Aceita?
Ella estendeu o copo e deixou que ele o enchesse, em seguida tragou mais um gole.
- Você sabe que foi você quem derrubou suco em mim há alguns dias, não sabe? – ele sorriu bebericando a bebida direta do bico da garrafa.
- Se você é desengonçado a culpa não é minha.
- Eu desengonçado? Você, toda esquentadinha, esbarrou um mim e só não me azarou porque tinha gente olhando.
- Isso provavelmente você tem razão. – Ella virou o copo e deixou as últimas gotas do líquido transparente cair sobre sua boca. – O que quer? Não tinha mais ninguém para torrar, não?
- Na verdade, sim. – ele começou a se remexer, dando a impressão de estar indo embora. – Já que não me quer aqui, e eu meu líquido mágico vamos passear por aí.
- Você pode ir, a garrafa fica. – a loira tomou a garrafa das mãos dele e tragou direto do bico desta, exatamente como ele fizera há poucos instantes. Sentiu um gosto de menta, e sorriu. Ao menos ele não tinha um hálito ruim.
- Vai sonhando. Se eu fizer isso estarei ajudando a você dar de cara no chão, lá embaixo. Não quero criar problemas com a justiça.
- Covarde. Faça o que quiser, então. – Ella fitou pela primeira vez sem desviar daqueles olhos esverdeados. – Responda-me uma coisa: Por que eu de todas as pessoas nessa festa? Porque você veio logo até mim?
- Isso é fácil de responder. – ele tomou a garrafa das mãos de Ella, e aquela não seria a última vez que faria isso. – Bom, deve ter algo de diferente em você para não ficar se jogando aos pés da banda ou dando uns amassos com um qualquer da festa.
- Isso se chama senso, coisa que todos deveriam ter. – disse seca. Talvez em outro dia, pudesse apreciar a companhia daquele rapaz, mas não naquela noite. O infeliz parecia não ver que queria ficar sozinha, ou apenas sabia e ignorava. Não tinha muita certeza se apreciava aquele tipo de persistência, afinal, sempre foi assim para conseguir o que queria, mas nunca pensou que fosse tão ruim para o lado dos outros. Observou um pouco a índole de rapaz, ele parecia convicto, não ia dar o braço a torcer e se retirar. – Já que vai ficar me amolando aqui, eu tenho o direito de saber seu nome pelo menos, não acha?
Ele abriu um sorriso de meia boca e meneou a cabeça, sem desviar o olhar dos olhos cinzentos dela.
- Para que tocar em nomes? São míseros detalhes.
- Preciso de um dado seu para prestar queixa ao ministério, caso você seja um maníaco ou coisa parecida.
- Deixe de ser desconfiada, garota. E se eu fosse um maníaco, garanto que você já estaria lá embaixo há muito tempo. Eu te segurei, não lembra. Não acha que eu mereço um pouco de confiança?
- Estranhos nunca merecem confiança. Isso é uma das poucas coisas que meu pai me falou e eu ouvi de verdade. – Ella não se deu conta o quão próximo estava seu rosto do dele. Podia sentir o hálito de menta misturado com o odor forte da bebida quando ele falava. Àquela distancia podia-se reparar também nos lábios avermelhados e carnudos dele, e em uma pequena cicatriz acima do lábio superior. Aqueles eram pequenos detalhes, e certamente faziam toda a diferença.
- É verdade, estranhos não merecem confiança. – ele balançou a cabeça, concordando. – Me chame de Severus. Agora creio que não sou mais um estranho.
- Já é um começo. – Ella buscava algum dado na memória. Já tinha ouvido aquele mesmo nome em algum lugar e não foi somente uma vez. – Severus... um nome bastante incomum, não?
- E todos os pais chamam suas filhas de Ascella? – ele argumentou, deixando a garota surpresa.
- E você sabe meu nome porque...
- No dia que nos trombamos no corredor, aquela mulher falou seu nome. A principio, pensei que fosse uma espécie de praga, mas isso não vem ao caso agora.
- Não se preocupe, até eu penso que é uma praga às vezes. – a loira fez uma cara de descaso, embora estivesse intrigada com as palavras dele. Era o primeiro que ousava comentar sobre isso, apenas Morgan brincava com seu nome, o resto tinha medo de sua varinha e de seu sobrenome. – Por isso, espero que saiba voar, pois da próxima vez que você se dirigir à mim por Ascella, eu lhe jogo daqui de cima.
- Feito. Então como me dirigirei à Vossa Alteza? – ironizou Severus.
- Ella, somente Ella.
Eles não tocaram no assunto de sobrenomes, Ella chegou até pensar que ele queria esconder o seu tanto como ela queria ocultar o Malfoy das conversas. Se dirigia à ele por Severus, ainda que pairasse a sensação de que aquele não era seu nome. Ele não tinha cara de Severus, não mesmo. Tinha um rosto de menino, muito liso e sem nenhum fio de barba, embora os olhos transmitissem serenidade.
A noite acabou sendo agradável, ele era uma boa companhia, conversavam sobre coisas banais, e acabou descobrindo que Severus estudara em Hogwarts no mesmo ano que Scorpius. Ele não mencionou a casa que pertenceu, nem se conhecia seu irmão, falava simplesmente que aqueles sete anos foram os melhores de sua vida, especialmente o sétimo.
Ella nem se lembrava da perna latejando ou da cara imensamente satisfeita de Mayers quando a atingiu com o feitiço. Conseguiu o que queria ali, espairecer a mente, não pensar nas preocupações do dia seguinte, e por isso estava grata ao moreno e às duas garrafas de vodka que consumiram praticamente juntos, apesar de na segunda terem derramado metade do líquido devido à falta de sobriedade.



Os raios de sol batiam diretamente em seus olhos, e isso forçou á abri-los, embora resistisse em despertar. Sentia sua cabeça latejar, mas o pior foi sentir um abraço forte entrelaçando seu corpo.
Virou a cabeça devagar para o lado, ainda doía à beça, e o viu. Severus ressonava tranqüilo, com os cabelos negros mais bagunçados que na noite anterior caindo sobre sua testa. Ele não usava camisa, e os lençóis cobriam apenas da metade do corpo para baixo, deixando à mostra a barriga lisa do rapaz.
- Essa não. – murmurou Ella, percebendo que não era somente ele quem estava sem a camisa. Seus olhos rondaram o quarto, observando o lugar e pensando como fora parar ali. A última coisa que se lembrava era da primeira garrafa vazia, Severus indo pegar outra vacilante, e ela já sentada no chão, longe da sacada.
Um pequeno barulho a fez despertar para a realidade. O relógio ao lado avisava que já eram quase nove da manhã.
- Bosta! – Ella deu um pulo da cama, se arrependendo amargamente depois. Meio tonta e com uma enorme ânsia de botar seu jantar para fora, saiu em busca de suas roupas. Achou as principais, agora restava apenas a blusa cinzenta e a malha que vestia por cima desta.
- Está ali.
Ella voltou a atenção para onde estava dormir há poucos minutos. Ele acordou, o que era óbvio depois de todo o estardalhaço que fez ao procurar pelas vestes. Severus apontava para a cadeira da escrivaninha, e sobre ela estava o que ela procurava.
- Obrigada. – agradeceu Ella, pegando a blusa e a malha, vestindo-as rapidamente em seguida.
- Você ia embora mesmo sem me avisar? – perguntou ele, um tanto desconfiado. – Assim vou me sentir usado.
- Nada é perfeito, Severus. – Ella se olhava no espelho do banheiro, após jogar uma água no rosto. Tentava inutilmente arrumar a maquiagem, e tirar as marcas de ressaca de seu rosto.
Não sabia aonde enfiar a cara. Passara a noite com um desconhecido, estava mais do que atrasada para o trabalho, e ainda iria aparecer na rua com aquela cara de hipogrifo embriagado. Morgan não lhe deixaria em paz pelo resto de sua vida se soubesse das suas aventuras da noite anterior.
- Ok, ok. Espere cinco minutos que eu lhe preparo um café. – falou ele, se levantando da cama. Pegou a calça do pijama perto de onde estavam as blusas de Ella, e rumou para a cozinha.
Ella olhou novamente para o espelho e soltou um muxoxo. Melhor que isso não ficaria. Saiu do banheiro e deu uma olhada no quarto de forma rápida, verificando se não estava esquecendo nada. Como se já não bastasse àquela situação, não queria nem imaginar na possibilidade de voltar ali outro dia para pegar alguma peça de roupa deixada para trás.
Ao pegar a bolsa sobre a mesa de madeira, vieram alguns flashes em sua cabeça
Uma segunda garrafa. Risadas e mais risadas. Uma sugestão. Um apartamento. E, enfim, a cama.
- Um juro que nunca mais vou olhar para uma garrafa de vodka, nunca mais. – repetia as duas últimas palavras com força, na tentativa de enfiar aquela idéia na sua cabeça.
Pegou a bolsa e deixou o quarto. Não era um apartamento grande, eram apenas dois quartos, dois banheiros, uma sala e a cozinha. O segundo quarto era ocupado como escritório, Ella passou pela porta deste para chegar até a cozinha. Estava entupido de livros, e no chão havia vários papeis amassados ou rasgados.
- Quem diria, um intelectual. – comentou para si.
Ao entrar na cozinha, viu Severus bebericando o café em uma caneca e estendendo outra à Ella, que aceitou.
- Belo apartamento. – comentou Ella, na tentativa de acabar com o silencio constrangedor.
- Obrigado. É bem vinda aqui quando quiser. – falou ele, com um sorriso coberto de malícia.
- Quem sabe em uma próxima festa. – tentava beber o café rápido e dar o fora dali o mais rápido possível, mas estava quente demais, acabaria queimando a língua. – Olha, eu estou atrasada para o trabalho. Vou pegar o rumo.
- Que tipo de gente trabalha num sábado? Por Merlin! – Severus fez sinal para ela não abaixar a caneca ainda cheia com o líquido escuro. – Se quiser, leve a caneca, mas beba todo o café. Eu misturei um pouco de poção aí dentro, vai fazer a ressaca melhorar.
- Bom, eu tenho que pagar as contas, não é mesmo? Obrigada pelo café, e como exatamente eu vou lhe devolver isso? – disse Ella, apontando para a caneca com a estampa de um pequeno leão.
- Uma coisa de cada vez, Ella. – ele fez uma pausa, depois a fitou de forma divertida. – Você não tinha de ir trabalhar?
- Droga! Tenho mesmo. – a loira pegou a bolsa e já ia passar pela porta, quando Severus passou à sua frente. – Quando cavalheirismo.
- Disponha. – falou ele, retribuindo com a mesma sagacidade.
Severus caminhou descalço pela sala e com a barra da calça arrastando pelo chão. Pegou um molho de chaves sobre a mesa de jantar e abriu a porta, depois ficando ao seu lado com as costas escoradas na parede.
Ella suspirou fundo e foi até ao encontro dele. Parou à frente de Severus, fitando aqueles olhos verde-esmeralda.
- Obrigada pelo café. Bom, adeus. – ia saindo, mas ele a barrou com o braço. – Sim?
- Não está esquecendo-se de nada? – Severus ergueu a sobrancelha direita e sorriu de forma um tanto arrogante, lembrando um pouco Scorpius. Mostrou o punho fechado e quando o abriu, uma pequena corrente prateada veio à mostra, juntamente com o pingente em forma de “A”. A letra era cingida por um pequeno dragão dourado, fazendo contrastes entre o ouro e a prata.
- Não me lembrava de ter deixado cair isso. – Ella deixou Severus recolocar a corrente sobre o seu pescoço. Ao sentir o toque dele em contato com sua pele novamente, veio-lhe pequenos arrepios subindo pela espinha. – Até a próxima.
- Essa não foi única coisa que você está esquecendo. – dizendo isso, o moreno a puxou para um último beijo.
Ella ficou tão sem reação quando ele fez aquilo, que acabou correspondendo o beijo. Deu passagem para a língua do rapaz passear pela sua boca, e agora sim ela lembrava-se da noite anterior. De outros beijos como aquele, e de outras coisas que certamente ele fazia muito com. Quando estava começando a sentir suas pernas fraquejaram e sua mão livre assanhar os seus rebeldes tufos negros, Severus a soltou. Ele a encarava de forma sobranceira, e com aquele maldito sorriso de meia boca nos lábios avermelhados.
- Agora você pode dizer “adeus”. – falou ele, alargando o sorriso.
- Adeus, então. – Ella lançou um último olhar ao moreno antes de desaparecer pelo corredor.
Assim com a festa da banda, o apartamento de Severus era no sétimo andar, mas este tinha o elevador. Sua perna ainda estava um pouco dolorida, e não daria conta de descer pelas escadas, embora tenha conseguido agüentar perfeitamente a noite anterior.
Desceu até o térreo bebericando o café já frio. Saiu pelo saguão de entrada e foi o beco ao lado do prédio, ainda precisava aparatar. Lançou um último olhar à janela do sétimo andar, e viu que Severus a observava. Ele deu um breve adeus com a mão e sua imagem sumiu da janela.
Ella caminhou até o final do beco escuro, olhou para os lados e logo não estava mais lá. Foi aparecer em frente à porta do Departamento de Aurores do Ministério.



Tragou mais um gole da bebida forte e adentrou no recinto. Havia uma média de seis ou sete pessoal ali, passou por elas e as cumprimentou de forma breve, pois o indivíduo que queria papo estava mais ao fundo da sala.
Morgan arqueou as sobrancelhas um tanto surpreso, depois abriu um sorriso sagaz. Esperou até a amiga se sentar na poltrona ao lado da sua para soltar seu comentário.
- Vejo que a noite foi boa, hein? – Morgan deu uma piscadela, mas mantinha o olhar na caneca que ela segurava.
- Por que? A sua não foi, não? – bebeu o que restava do café e depositou a caneca sobre a mesa de centro, não se importando que sujasse o vidro desta.
- Oras, Ella. Não vai me dar detalhes? Porque eu tenho provas suficientes para alegar que você saiu ontem com o cara que conversava na festa.
- Morgan, isso não é um tribunal. Você tem de parar de ver tantas séries jurídicas e médicas também, melhor, você tem de parar de ver tanta televisão. – Ella revirou os olhos. Desde que Morgan descobrira as maravilhas da televisão trouxas quando conheceu Ella, não conseguia parar de assistir os programas, em especial os filmes. – E na minha casa!
- A sua televisão é melhor. Mas não fuja do assunto! Você passou a noite com ele. – e caiu na gargalhada, chamando a atenção de outros ali presentes. Não podia evitar, Ella nunca fazia aquele tipo de coisa, nem na época de escola. – É a única explicação para o batom borrado, a mesma roupa de ontem e AINDA amassada e essa cara de ressaca.
Ella nem se deu o trabalho de responder, lançou um olhar ao amigo que se não a conhecesse bom, pensaria que ela fosse azará-lo ali mesmo.
- Pelo menos sabe como o sujeito se chama?
- Mas é claro que eu sei, Morgan! Não sou como você. – e deu um leve tapa na testa do amigo, que não pestanejou. – O nome dele é Severus.
- Severus? Você arruma cada um, Ella. – Morgan meneou a cabeça em negativa, mas logo voltou a atenção à loira ao seu lado. – É só Severus? – e ela afirmou com a cabeça. – Por Merlin! Você não sabe mais nada sobre o cara?
- Ele possui um ótimo apartamento.
- Ella, Ella, quem diria que um dia o pupilo ia superar o mestre.
- Vira essa boca para lá, Morgan. Pupilo, mestre? Não mesmo! No dia que eu seguir o seu estilo de vida, me interne no St. Mungus porque provavelmente eu perdi a sanidade.
- A pouca que ainda lhe resta, não? – completou o moreno, tirando a franja os olhos. – Então vai ver o cara de novo?
- Ainda não sei. Tenho muita coisa para lidar agora. – respondeu Ella, concisa.
- Muita coisa para lidar? Você está louca? Acabou de ser promovida, tem seu próprio teto, ganha um salário razoável, e ainda tem a mim! O que ronda tanto a sua cabeça, Ella? Porque daqui a pouco eu juro que te deixo na área psiquiátrica do St. Mungus.
- Não seja tão dramático, Morgan. Eu não procuro um namorado agora. – o que realmente era verdade.
- Quem falou em namorado, mulher? É só se divertir um pouco, depois larga o cara.
- Quanta sensibilidade. – disse Ella, sarcástica. Tentava tirar as idéias de Morgan da sua cabeça, o problema era que Morgan conseguia até convencer alguém que preto é branco e vice-versa.
Passaram a manhã conversando, e perto da hora do almoço, foram chamados para interceptar um carregamento de artefatos proibidos pelo Ministério. Foi jogo rápido, prenderam os tripulantes do navio e deixaram a mercadoria sob às vistas de outro Departamento. Após o pequeno trabalho, voltaram ao Departamento para almoçar. Foi só chegaram que um homem alto, de cabelos castanhos muito curtos e olhos da mesma cor, os chamou.
- Cadê o Potter, Malfoy? – perguntou Edgard Mayers.
- Bom. – a loira deu uma piscadela para Morgan, e puxou a manga da blusa, como se estivesse procurando por algo. – Ops, ele não está aqui. Agora, se manda.
- Ohh, Malfoy. Você só está assim porque eu lhe meti um baita de um feitiço bem no meio da bunda. – rui o homem desdenhoso.
- Primeiro, Mayers, Perna é bem diferente de bunda, talvez você devesse voltar ao primário e abrir o seu velho livro de ciências. – Ella só falara aquilo porque sabia que ele tinha pai não bruxo e estudara até os dez em uma escola trouxa. – Segundo: porque procura o Potter?
Mayers mostrou um envelope com um símbolo de uma fênix. Era da antiga Ordem de Albus Dumbledore, Ella reconhecia o emblema porque o pai já recebera uma carta daquelas há anos trás.
- Pode deixar que eu entrego isso para ele. – tomou a carta da mão do colega de trabalho, que só não pegou de volta porque Morgan entrou na frente. – Bom que eu mostro para o chefe como você é bom de pontaria. Acerta minha perna e não a desgraça do vampiro fujão.
Mayers viu que não havia como tomar o papel de volta, e voltou a sentar-se com um grupo de colegas ali perto.
Ella olhou para a carta e leu no verso Não enviar por correio-coruja. Era por isso que Mayers não deixou logo a ave entregar a carta para o chefe.
- Vamos dar uma olhada na sala dele, às vezes a secretária sabe aonde ele está. – e saiu da sala, com Morgan logo atrás.
A sala de Harry Potter era logo ali do lado. Não retornara àquele aposento desde que recebera o distintivo, e isso era algo bom. Só via o chefe quando fazia algo de errado, e geralmente levava uma punição.
- Julie? – chamou e a mesma mulher que lhe atendera antes a olhou e sorriu. – O senhor Potter está no escritório?
- Não, ele foi para casa. É urgente? – perguntou ela, olhando o papel que a loira segurava.
- Creio que sim. Eu preciso entregar-lhe isso pessoalmente. – e mostrou a carta.
- Nesse caso, a senhorita terá de ir à Toca, a casa da família da senhora Potter.
- Certo, é só me dizer como chegar lá.
Julie passou as coordenadas para Ella, que logo em seguida, saiu do escritório acompanhado de Morgan.
- Mas quanta dedicação, meu Deus! – brincou o amigo.
- Tudo tem um preço, meu querido. E espero que isso valha a minha ida para o esquadrão A5.
- Sua tratante picareta! Eles têm as melhores missões!
- Eu sei, por isso vou agradando o chefe para ele me transferir de uma vez. – fez uma pausa no meio do corredor, e deu um leve beijo na bochecha de Morgan. – Nunca subestima a inteligência feminina.
- Certo, certo. Mas não esquece de citar o meu nome também. Diz que eu ajudei em algo. – Morgan já começara a andar na direção do elevador, mas parou por um instante ao ouvir Ella chamá-lo. – Eu pego o almoço. Vai querer peixe mesmo?
- Ainda bem que você sabe. Até mais tarde. – no momento que ele entrou no elevador, Ella aparatou no lugar que Julie lhe falou.
Era muito um lugar aberto e verde, ao fundo havia uma espécie de campo de quadribol, e ao lado uma pequena casa de madeira, parecendo um depósito ou algo do gênero. A casa de onde vinham vozes e barulhos foi o que mais chocou à Ella, era exatamente do jeito que seu pai descrevera. Não pensou maldosamente como o pai na hora que ele fez a descrição, achou interessante, ainda mais pelo fato dos Weasleys terem um certo status no Ministério e ainda viverem na mesma casa.
Caminhou até a casa, já pensando em como iria falar. Nunca estivera ali, na verdade, quase nunca teve a oportunidade de ter uma longa conversa com um Weasley, embora tenha sido do mesmo ano que dois deles e sempre ver várias cabeças vermelhas andando pelos corredores de Hogwarts.
Parou em frente à velha porta de madeira e deu algumas batidas. Iriam escutá-la, afinal dava-se para ouvir perfeitamente as vozes vindo de dentro.
E como o esperado, alguém veio ao seu encontro. Era uma mulher ruiva com os cabelos presos em um coque frouxo, deixando alguns fios soltos. Tinha olhos castanhos e várias sarnas na bochecha e nos braços descobertos.
- Em que posso ajudá-la?
- Err, boa tarde. Estou procurando pelo senhor Harry Potter. – apressou-se em mostrar o envelope um pouco amassado. – Assuntos do Ministério.
- Oh, sim. Entre. – a ruiva deu passagem e Ella entrou. – Venha até a sala, ele deve estar aqui.
Ella fez que sim e começou a seguir a mulher ruiva. À medida que caminhava, via mais ruivos pelo cominho, duas ou três crianças correndo e dois adultos conversando entre si. Viu um rosto conhecido por entre aquela maré avermelhada, era o de uma mulher com cachos castanhos e volumosos. Conhecia Hermione Granger de vista do Ministério.
- James, aonde está seu pai? – perguntou a ruiva que Ella seguia.
O rapaz era muito parecido com o pai, mas tinha os cabelos num tom ruivo escuro, quase negros, e os olhos da mãe. Era alto e com um belo físico. Ella se lembrada dele, jogava no time de quadribol da escola.
- Lá fora, mãe. – respondeu ele. – Peça o Albus para chamá-lo, eu acabei de chegar do treino.
Ella sorriu ao ver a ruiva revirar os olhos para o filho. Ela procurava por alguém, e Ella imaginava ser o outro filho.
- Albus! – chamou ela.
- Sim, mãe? – a voz veio do lado de fora da casa. – Chame seu pai. Tem alguém do Departamento aqui para vê-lo.
Não ouve resposta de volta.
Ella fitou para o teto, tentando não prestar atenção nos olhares curiosos que lhe eram lançados. Quase nunca falava seu sobrenome, mas como Morgan dizia “No raio de quilômetros dá para ver que você é uma Malfoy”. Seu cabelo liso e platinado sempre a denunciava, juntos com o par de olhos cinzentos e frios, herdados do pai. Realmente, não podia negar, os dois, ela e Scorpius, puxaram mais à família do pai do que a da mãe.
- Como se chama, querida? – perguntou a ruiva, virando-se para Ella.
- Ella. – responder a loira. Dizer o nome completo era pedir para morrer, ainda mais numa casa cheia de Weasleys. Não que tivesse algo contra, mas seu pai foi realmente muito maldoso com os outros na época de escola. Era melhor garantir se eles não guardavam nenhum rancor antes de dizer o sobrenome.
- Aceita alguma coisa, Ella? Suco? Água? – indagou a anfitriã, sorrindo bondosamente.
- Não. Obrigada, senhora, meu colega me aguarda para o almoço.
Foi só dizer aquilo que quase caiu para trás. Uma figura de cabelos morenos, de olhos verdes muito vivos e um sorriso de meia boca estampado no rosto entrou na sala, acompanhado de dois homens conhecidos.
Ella pediu com todas as forças que fosse outra pessoa aquele sujeito, que não fosse o homem com quem acordara naquela manhã. Encarou-o nos olhos, e ele parecia se divertir com a situação.
Sabia que o conhecia de algum lugar, ele era a cara do pai. Fora um burra de não se lembrar disso, ainda mais, sempre o via de vista na escola junto com os primos e irmãos.
- Olá, senhorita Malfoy. – e foi só Harry dizer isso que todos os olhares voltaram-se para Ella. – Está tudo bem?
- Esta carta chegou para o senhor. Tomei a liberdade de entregá-la pessoalmente, acredito ser importante. – e entregou o envelope ao moreno.
- Fez muito bem. Ron? – o ruivo fez que sim com a cabeça. – Certo. Albus, leve a senhorita Malfoy até lá fora. Vou só trocar algumas palavras com o seu tio, e já vou encontrá-los.
Harry beijou levemente a bochecha da esposa e rumou para a cozinha, com Ron e Hermione, embora esta não tenha sido chamada.
Eles deixaram Ella para trás desejando que se abrisse um buraco ali mesmo para poder pular e acabar logo com aquela situação. Olhou o moreno que fez sinal para que ela o acompanhasse. Saíram da sala e já conseguiam ouvir alguns murmúrios.
Albus sentou no degrau da escada de madeira, e Ella fez o mesmo ao seu lado. Ela mantinha o olhar sobre o jardim e em algumas crianças que voavam em vassouras pelo quintal. Não tinha coragem de encará-lo, não acreditara que tinha passado a noite com o filho de seu chefe. Demorou tanto para construir a sua reputação no Ministério e agora tudo ia por água abaixo.
- Estava mais tagarela ontem, Ella. – falou ele, sorrindo.
- Você mentiu para mim. – disse a garota num tom chateado.
- Eu omiti fatos, é diferente. Meu nome é Albus Severus, e eu sei que é uma desgraça, não preciso de comentários sobre o caso. – seu comentário a fez rir de leve. – Que eu saiba você não me disse quem era verdadeiramente. Só fui descobrir hoje de manhã.
- Não vai me dizer que olhou meus documentos na bolsa? – Ella ergueu a sobrancelha direita, desafiante.
- Era uma opção também. Mas eu descobri por isso daqui. – ele tocou no pingente que devolvera de manhã cedo. – Isso é magia antiga. Cada vez que é passado para frente, o dragão se enrosca na primeira letra do nome de seu dono. Dizem que trás sorte.
- Eu não estava errada quando pensei que você fosse um intelectual. – comentou Ella sobre seu pensamento do escritório.
- Trabalho com isso. Símbolos antigos, traduções e por aí vai? – explicou o moreno. Ella riu ao ver o quão orgulho ele ficava de dizer aquilo.
- Por acaso você está pensando em ocupar a vaga do Binns? Acho que o Longbotton não vai aceitar isso, não.
- Longe disso. – riu o moreno. – Eu ainda prezo por um pouco de atenção vinda dos outros.
Ella sorriu. Ao menos já sabia mais alguma coisa sobre ele, e Morgan não ficaria torrando-lhe a paciência.
Apertou os lábios entre os dentes, sempre fazia isso quando nervosa. Não lhe vinha nenhum assunto para uma conversa duradoura, Albus também não fazia perguntas. Apenas a fitava de forma divertida.
- Você...hum...comentou com alguém sobre ontem à noite? – perguntou Ella, quase num sussurro.
- Não, e não vou. – Albus também disse num sussurro, brincando. – A menos que você queira...
- Obrigada, mas não precisa se incomodar. – Ella o cortou. – Ainda estou com sua caneca.
- Eu sei.
- E eu vou devê-la quando...
- Eu for conhecer seu apartamento. É juto, já que você conhece o meu.
- Como é pretensioso. E se eu não abrir a porta?
- Em entro pela janela mesmo. Será uma boa oportunidade para eu pegar a vassoura de James.
Ella não pôde dar a resposta que estava na ponta da língua, os dois homens estavam da volta. Levantou-se logo depois de Albus e encarou o chefe. Ele estava mais sério que o usual, e o ruivo ao seu lado parecia também não ter ficado satisfeito com o conteúdo da carta.
- Fez muito bem em trazer isso – levantou o envelope aberto. – para mim, senhorita Malf...
- Ella.
- ... Ella. Se chegar outra, não mostre à ninguém, guarde-a e depois entrega à mim. – falou Harry seriamente.
- Sim, senhor. – Ella fez que sim com a cabeça. Vacilou um pouco, mas acabou fazendo a pergunta que rondava a cabeça desde que vira aquele envelope. – Senhor? Posso lhe perguntar algo?
- Vá em frente.
- A Ordem... ela ainda existe? – seu tom de voz foi baixando a cada palavra, até que a última pronunciada saiu tão baixo que Harry teve se esforçar para compreender.
Harry olhou para o cunhado com o cenho franzido. Ron deu de ombros e nada disse.
- Existe. Algum motivo especial para você querer saber disso?
- Bom, na lógica, cada vez que uma organização dessas fez um chamado, significa que há algo errado por aí. Voldemort está à sete palmos do chão e já deve ter virado pó, certo? – Harry assentiu. – Então devo me preocupar com mais alguma coisa?
- Está tudo bem, Ella. – mentiu Harry, e Ella percebeu pelo tom ligeiramente suave de sua voz. Alguém lhe havia dito que ele fazia isso quando queria transmitir confiança, e sempre estava mentindo. – Mais alguma coisa?
- Não, senhor. – não iria insistir. – Tenham um bom final de semana. – fez um pequeno aceno para os demais, ignorando os olhares de Albus.
No segundo seguinte Ella não estava mais ali, aparatou. Harry pediu para o filho do meio entrar, este obedeceu, não tinha muito interesse nos assuntos do pai. Agora só restavam ele e Ron.
- Você acha que eles estão... ? Você sabe o que quero dizer.
- Acho pouco provável. Malfoy não ia fazer uma burrice dessas, ainda mais tendo a ficha que tem. Ele não usaria a filha para essas coisas. – Harry falava convicto, tentava acreditar arduamente em suas palavras, embora sempre houvesse dúvidas pairando em sua cabeça.
- Harry, eu não sei. Malfoy nunca foi um homem de muita palavra, pode simplesmente quebrar o acordo.
- Ele pode. – fez uma pausa, como se pensasse em um bom argumento. – Mas as pessoas mudam Ron. Além do mais, nós não temos de nos preocupar com a garota, embora seja o focinho do pai, ela me lembra outra pessoa.
Ron sorriu de leve.
- Ela te lembra a quem?
- Sirius.



CAP N BETADO AINDA, ^^"
N/Autora: Oiee. Bom, desculpa a demora, e poxa, gente, vamos comentar, rsrs, senão assim eu penso que não tem ninguém gostado da fic. Espero que tenham gostado do cap, e ainda tem muita coisa para acontecer, não vai girar apenas em torno de casais. Obrigada pelos votos e comentários, e não esqueçam de indicar a fic à alguém. Beijos e até o próximo cap.

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Comentários (1)

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