Nível de Segurança 1



Capítulo VII - Nível de Segurança 1


— Harry...

— Este não é um bom momento, Hermione. — Harry tinha os olhos totalmente inexpressivos, como se voltados para dentro, contemplando uma paisa­gem que só ele podia ver. — Importa-se de pegar o assento de Abigail?

Parecia mais fácil concordar do que discutir, naquela conjuntura. Mas Hermione o interrogaria a respeito da escolha do nome de Abigail, mais tarde. Tratava-se de um fato importante demais para ignorar. Quando voltou com o assento, a família já se reunira na sala de jantar.

Harry despejou vinho nos cálices de fino cristal, tão destoantes da comida chinesa embalada em caixinhas de papelão. Sabendo que Hermione evitava ingerir álcool por es­tar amamentando, serviu-lhe água.

— Esqueci de comprar suco. Desculpe.

Hermione não queria que ele pedisse desculpas. Por nada. Nem pela casa esquisita, nem pela excentricidade dos pais.

— Prefiro água mesmo — assegurou.

— Mas o que é que você faz, Hermione? — indagou a sogra, gentil.

— No momento só estou cuidando de Abigail. Mas durante cinco anos colaborei com a SSI

— O que é SSI?

Hermione arregalou os olhos.

— É a empresa de Harry. Sistemas de Segurança Internacional.

— Ah, sim, de computadores. Você também cria programas?

— Não, somos incompatíveis. Meu ramo é vendas.

— Ah, você vende computadores.

— Não, eu...

O sogro interveio:

— Por que vende computadores se são incompatíveis? — Hermione refrescou-se com um gole de água.

— Eu vendo sistemas de segurança.

— Pensei que tinha dito que vendia computadores.

— Não, eu não disse isso.

Hermione buscou socorro nos olhos de Harry, mas ele se limitou a erguer o cálice de vinho e, sarcástico, brindar:

— Boa sorte.

Eu vendo sistemas de segurança operados por com­putadores — especificou Hermione, encarando os sogros.

— Ela vende alarmes, querido — resumiu Lilian, tirando arroz de uma caixa de papelão. — Como o que Harry instalou no laboratório, para nos avisar de que chegou.

Hermione respirou fundo.

— Trata-se de algo um pouco mais sofisticado. Temos de aperfeiçoar constantemente os sistemas, pois o mer­cado está cada vez mais competitivo. Mas estamos indo bem. A SSI está presente em vários países e é conhecida mundialmente.

— Mundialmente, é? — O sogro refletiu um pouco. — E quanto ao mercado doméstico?

Hermione baixou o garfo.

— Temos muitos clientes domésticos também.

— Uma vergonha que só tenham conseguido isso — replicou James. — Bem, ao menos tentaram.

Estupefata, Hermione protestou:

— Mas a SSI é uma empresa de sucesso. Harry é um homem muito bem-sucedido.

— Você é mulher dele — rebateu Lilian. — É claro que pensa assim.

— Muito mais fácil vender alarmes — concluiu James.

— A instalação é mais simples.

— E funcionam a bateria. — Lilian fitou Hermione com a cabeça inclinada. — Seus sistemas funcionam a bateria?

— Claro que não!

— Pois aí está, minha querida. — James espetou no garfo um cubo de carne suína. — Os alarmes são mais fáceis de usar. E mais baratos. Quanto mais barato um produto, mais se vende, você sabe.

— Mas nossos sistemas vendem como pão quente! —garantiu Hermione, certa de que mergulhara num filme surrealista.

— Não exagere, querida — manifestou-se Harry, pela primeira vez em dez minutos. — Pães vendem muito mais.

James concordou:

— Pães são muito populares. Praticamente se vendem sozinhos.

— Assim como nossos sistemas de segurança — reba­teu Hermione. — E é fácil vendê-los porque Harry é brilhante. Na verdade, é a ele que vendo.

— O Q.I. dele é mesmo muito alto — orgulhou-se Lilian. — Coloca-o na categoria de gênio, se não me engano. Pena não ter estudado biologia.

— Ou engenharia química — completou James.

— Mas ele inventou um programa de computador que pensa! — replicou Hermione. — Gem é um sistema incrível.—Olhou para os sogros. — Não se orgulham disso?

— Você é uma mulher apaixonada, mas não muito lógica — observou James. — Não estamos criticando Harry, querida. Estamos só discutindo suas realizações, ou a falta delas.

Hermione empurrou o prato para o lado, sem apetite.

— Para sua informação, seu filho é tão genial que já se tornou bilionário.

— Nem tanto — contrariou o sogro. — Devem ter somado errado. Se refizerem as contas, chegarão à verda­deira cifra, bem mais modesta.

— Ele está bilionário, sim — garantiu Hermione. — Não está, Harry?

Harry parecia constrangido.

— Já fui. Mas, como sabe, os negócios não vão muito bem por aqui. Acho que, no momento, sou apenas milionário.

— Por que não se defende? — ralhou Hermione, inconformada. Ele bebericou o vinho antes de retrucar, calmo:

— De que adiantaria?

Hermione sentiu os olhos arderem com lágrimas. Mais um minuto e cairia em prantos.

— Veja só o que você fez. — Colocou o guardanapo de linho sobre a mesa. — Abigail está chorando.

Com o bebê adormecido nos braços, retirou-se para a sala. Estava mesmo na hora de amamentar, supondo que conseguiria acalmar-se o bastante para fazê-lo. Ao desa­botoar a blusa, pela primeira vez em semanas sentiu falta da melodia suave ao saxofone. De repente, em algum lugar do casarão, um alarme soou. Cadeiras arrastaram-se, vozes murmuraram e, então, silêncio. Fechou os olhos e tentou relaxar. Sem sucesso. Abigail choramingou.

— Voltamos à estaca zero — sussurrou à filha, cansada.

Dali a pouco, o sofá afundou a seu lado e mãos quentes envolveram seus ombros.

— Relaxe — sugeriu Harry, carinhoso. Hermione fungou.

— Não consigo.

— Vou ajudar.

No instante seguinte, Hermione viu-se no colo dele. Recos­tando a cabeça em seu ombro, suspirou.

— E a música?

— Não instalei Gem aqui. Ela não gostaria deste mau­soléu, e meus pais também não se entenderiam com ela.

— Dou razão a ela. — Percebendo que se mostrara crítica demais, Hermione pediu desculpas. — Não foi o que eu quis dizer.

— Eu sei o que quis dizer.

— Harry...

— Esqueça, Hermione. Eu não devia ter trazido vocês. Meus pais... Leva-se tempo para se acostumar com eles.

— Mas...

— Não pense mais nisso. Se continuar preocupada, não vai conseguir amamentar.

Ela aquiesceu, roçando o rosto no algodão da camisa dele. Era como um porto seguro, firme, tranquilo. A ten­são aos poucos esvaiu-se.

— Parece que a bomba trava quando fico chateada — confidenciou.

— Eu sei. — Harry afagou-lhe os cabelos e pousou o queixo no topo de sua cabeça. — Vamos ver o que se pode fazer.

Mas Hermione não conseguia esquecer a causa de seu estresse.

— Onde estão seus pais?

— De volta ao laboratório.

Ela o espiou.

— Por minha causa?

— Não. Não ouviu o alarme? A experiência deles atin­giu um estágio crucial e eles tiveram de descer lá.

— Hum... — Hermione refletiu um pouco. — Isso acontecia muito quando você era criança?

— Eu era uma criança independente.

— Por escolha ou... por necessidade?

Harry afastou uma mecha de cabelo escuro de sua testa.

— Isso importa?

Harry mostrava-se estóico e falava em tom fatalista. Hermione decidiu imitá-lo.

— Se não importasse, eu não perguntaria.

O suspiro que ele soltou pareceu vir de muito fundo, de um lugar que ele devia ter encerrado em gelo havia muito.

— Meus pais sempre se envolveram muito com suas experiências. Em consequência, não tinham muito tempo livre. Logo descobri que era mais fácil e mais rápido resolver tudo sozinho. Isso responde a sua pergunta?

Hermione franziu o cenho, balançando um pé. Harry tivera uma infância radicalmente diferente da dela. Com tantos filhos e filhas, seus pais não poderiam ter-se refugiado no porão da casa nem que quisessem. Viviam apressados, levando-os à escola, a apresentações de dança e a eventos esportivos.

— James e Lilian assistiram a alguma atividade sua na escola?

Hermione, para que...

— Assistiram, Harry?

— Foram a algumas. — Ele não pôde evitar o riso. — Só que sempre chegavam atrasados.

A pequena Abbey agarrou o tecido da camisa do pai e puxou-o com força.

— Como em nosso casamento? — sugeriu Hermione, adi­vinhando tudo. — Aquele tipo de atraso?

— Exato.

Ela o viu, então. O menino moreno, magro, de olhos ca­rentes e expressão fechada. Ia da escola para uma man­são sombria com jardim mal cuidado. Tinha de fazer mui­ta força para abrir a porta. E lá dentro encontrava... o silêncio. Nenhuma luz, nenhum cheiro de comida gostosa vindo da cozinha. Só uma geladeira cheia de produtos químicos, frascos com experimentos e terra vegetal. Seus pais passavam o tempo todo no porão. Quando sentia fome, preparava sozinho uma refeição. Para discutir ma­térias do colégio, procurava um vizinho. Mas e quando precisava de um abraço ou de um tapinha nas costas?
Hermione fechou os olhos, tomada pela dor. Ainda menino, Harry instalara o alarme no laboratório dos pais. Quando se desesperava por um pouco de atenção, apertava o botão. Duvidava de que ele houvesse cedido ao impulso muitas vezes. Quando cedia, sem dúvida tinha de esperar nos de­graus da escadaria escura. Muito tempo. Provavelmente, passara a vida toda esperando. E se decepcionando.
No dia do casamento, a cena se repetiu. No corredor, junto à porta do gabinete do juiz, ele retardara ao máximo o início da cerimônia. Nutrira a esperança de que os pais, daquela vez, compareceriam?

Aquela altura, Hermione não conteve as lágrimas.

Harry se enrijeceu.

— Não quero sua piedade, Hermione. Não quero, nem pre­ciso disso.

— Do que você precisa?

— Disto.

Ele pousou a boca sobre a dela, apartando-lhe os lábios com insistência. Tratava-se de um contato bem diferente do que haviam tido no escritório, uma centelha rápida e ardente. O desejo avassalara, espiralando-se e torcen-o-se a ponto de não poderem mais detê-lo. Mas o beijo de agora era único, terno, não duro, uma bênção, não uma exigência.
Harry estreitava Hermione e a filha, com extremo cuidado. Sua boca degustava vinho e gengibre. Com um suspiro brando, ela apoiou a cabeça em seu ombro e relaxou, sentindo o estresse desaparecer. Ele abriu-lhe a blusa e apalpou um seio repleto de leite, afagando o mamilo sen­sível com o polegar. Tratava-se do momento mais erótico que ela já experimentara, e sua resposta foi instantânea e inequívoca.

—O leite fluiu — informou Harry, com a mão molhada. Erguendo a cabeça do bebê, aproximou-o da fonte de ali­mento. — Prontinho, doçura. Hora do jantar.

Hermione fechou os olhos, mais confortável do que imagi­nava ser possível, e aprofundou-se no abraço de Harry. Apenas um pensamento ameaçava o prazer do momento. Como transformar aquela fantasia em realidade? Tinha um marido e uma filha. Devia estar satisfeita. No en­tanto, ansiava por mais. Queria um casamento de ver­dade e um marido em quem pudesse confiar. Mas, acima de tudo...
Queria amor.
O amor de Harry.

Harry certificou-se de que a porta frontal da casa dos pais estava bem trancada. Satisfeito, deteve-se um pouco na varanda, contemplando o desolado jardim. Fazia anos que estava assim. Certa vez, muito tempo antes, tentara transformar o canteiro de ervas daninhas num recanto verde, florido. Tentativa vã. As mudas não vingaram.

— Harry, vamos?

Ele ergueu o olhar do jardim abandonado. Através do portão de ferro frio, viu Hermione com metade do corpo dentro do carro, prendendo o assento de Abigail no banco tra­seiro. Enquanto o belo bumbum rebolava para lá e para cá, o tempo pareceu transcorrer mais lentamente.
A suas costas, erguia-se seu lar de infância, sombrio contra o céu nublado de inverno. Uma folha solitária flutuou diante de seus olhos, tremulando ao sabor do vento arisco. Não conseguia se mover, a despeito do ar gélido e da luz cada vez mais escassa, cedendo à escu­ridão. Não podia liberar as emoções que lhe açoitavam a alma.

"— Do que você precisa? — indagara Hermione."

Sabia a resposta. Apenas fora incapaz de explicar, de revelar do que precisava para sobreviver. As palavras haviam desaparecido de seu vocabulário, assim como as emoções que expressavam tinham sido banidas de sua alma.

Hermione apoiou as duas mãos nas grades enferrujadas.

— Harry, o que está esperando?

Ele inspirou ofegante, com o queixo duro e os punhos cerrados. Havia vida do outro lado do portão. Uma vida rica e abundante.
Era disso que precisava. Para escapar do frio, precisava do que estava além daquele portão.

— Não estou esperando nada — declarou, por fim, convicto. — Não mais.

____________________________________________


Hermione deu um chute na pilha de caixas de papelão.

— Harry, não cabe mais nenhuma caixa no quarto de hóspedes. Do jeito que está, já vou ter que subir nelas para chegar a minha cama.

— Não precisa dormir lá. Sabe disso.

— Já discutimos isso. Não vou dormir com você. Agora, onde vamos pôr estas outras caixas?

— Que tal no corredor?

— Não. As visitas vão ver. — Harry exasperou-se.

— E daí?

— Você me disse que Raven Sierra ficou com trauma de casamento por causa da ex-mulher. Não quero aprofundá-lo.

Harry ergueu o sobrolho.

— Não entendi. De que maneira as caixas empilhadas no corredor o fariam ter um conceito ainda pior do casamento?

Hermione bufou, impaciente.

— Se vir as caixas, ele vai ficar intrigado. Estamos casados há cinco semanas. Não acha que ele estranharia o fato de eu estar me mudando só hoje?

— Você nunca deu importância à opinião pública antes.

— Pois mudei.

Era verdade, ainda que não soubesse explicar por quê. Chutou de novo a pilha de caixas. Ou melhor, podia ex­plicar, sim. Desde que conhecera os pais de Harry, passara a abominar a idéia de infligir-lhe o mínimo sofrimento ou constrangimento. Ele ja sofrera e se constrangera mais do que era justo.

— O fato de já termos uma filha de cinco semanas, em cinco semanas de casamento, chama muito mais a atenção do que algumas caixas empilhadas no corredor.

Hermione endureceu o queixo.

— Que tal colocarmos no seu escritório?

— Não. Que tal no quarto do bebê?

— Não. E no seu quarto? Harry suspirou.

— Está bem. Mas vamos logo. Raven chega daqui a uma hora e ainda temos de nos aprontar.

Hermione ficou apreensiva.

— Esqueci de perguntar sobre o jantar. Posso ajudar em alguma coisa?

— Não será preciso. Encomendei tudo a um bufe, uma vez que não teríamos tempo para preparar nada.

— Esse jantar é tão importante assim?

— Mais ou menos. Já se espalhou a notícia de nosso fiasco na Toy Company.

— Mas não foi culpa nossa!

Ele ergueu a caixa de cima.

— Claro que foi. Um sistema de segurança tem de ser seguro. Os concorrentes não vão perder a oportunidade de alardear que uma menina de dez anos conseguiu violar nosso sistema e causar muita confusão.

Hermione estremeceu.

— Tem razão. Precisamos ser muito convincentes esta noite.

— Seremos. — Harry ergueu o queixo. — Formamos uma boa equipe, não, querida?

Ela sorriu lindamente.

— Formamos.

Hermione acabara de fechar o zíper do vestido quando Gem anunciou a chegada das visitas.

— EXPLICAR REBENTO FEMININO SIERRA — re­quisitou o computador.

— A filha de Raven? O que quer que eu explique?

— O REBENTO SIERRA ANDA E FALA. ESCLARE­CER ANOMALIA.

— Ah, River é mais velha do que Abbey. Acesse es­tágios de desenvolvimento humano, Gem. Terá todas as informações de que precisa. Logo Abbey também vai an­dar e falar.

— PROCESSANDO.

— Ótimo. Processe. Mas, enquanto isso, vou me juntar aos convidados.

Todos já se encontravam acomodados na sala. Raven Sierra era um tipo alto e magro, de cabelos pretos e feições rudes. Lembrava um puma ferido e esfomeado que se aproximara da civilização em busca de ajuda, mas que, cauteloso demais, não a aceitava, ainda que isso implicasse morte certa.
Não podia evitar imaginar qual seria a escolha de Ra­ven, confiar e salvar-se, ou isolar-se e, por consequência, morrer emocionalmente. Mas o que desencadeara tais pensamentos? Raven Sierra submetia-se ao exame com descontração, observando-a também com uma intensida­de semelhante à do puma. Eis que ele estende a mão, num aperto frio e firme. Havia um certo cinismo em seu olhar, como um já entediado conhecedor do mundo.

— É um prazer conhecê-la, senhora Potter.

Hermione notou um certo distanciamento na voz áspera, como que anunciando um "homem da zona proibida".

— Por favor, me chame de Hermione. — Olhou então para a filha dele. Coitada. Como seria ter um pai tão sexy quanto pecador, mas que não pretendia dar à filha uma mãe? — E você deve ser River.

O nome combinava com a garota pequena e ágil, de olhos num raro tom entre o cinza e o azul. Tinha cabelos negros, como os do pai, e usava-os compridos, os cachos chamando a atenção para os olhos incomuns. Após es­tudar Hermione séria por alguns segundos, deu um tímido sorriso banguela.

— Gostaria de ver Abbey? — convidou Hermione. — Ela está dormindo, mas pode dar uma espiada nela, se quiser.

A pequena River não esperou que insistissem. Pôs a mão na de Hermione e acompanhou-a ao quarto do bebê.

Gem contava uma historinha.

— O que é isso? — indagou a garota, de olhos arregalados. Hermione suprimiu um gemido de desgosto.

— Deve ser A Bela Adormecida.

River olhou em torno pelo quarto.

— Mas quem está contando?

— E Gem, nosso computador. Ela faz todo tipo de coisas para nós. Acende e apaga luzes, tranca e destranca portas, faz café, chá e chocolate. Consegue até cozinhar, com um pouco de ajuda.

— Ela... conversa com você?

— O tempo todo. — Hermione alegrou-se com o fato de a pequena visitante não poder detectar a secura em sua voz. — Gostaria de falar com ela?

— Gostaria. — A menina uniu as duas mãos, incerta. — O que posso dizer?

— O que quiser. — River respirou fundo.

— Olá!

— IDENTIFIQUE-SE, POR FAVOR.

Ante a expressão atónita da garota, Hermione explicou:

— Ela quer que você se apresente. Diga-lhe seu nome.

— Ah, meu nome é River Sierra e vim ver o bebê.

A curta sentença bastou para que se estabelecesse uma amizade. Com grande prazer, Gem contou a River tudo sobre o rebento feminino. Aparentemente, já acessara os vários estágios de crescimento e desenvolvimento huma­no. Hermione tratou de interromper o discurso quando o com­putador ia detalhar a puberdade.
Implementar programa educacional concentrador na faixa etária de seis anos, para discussões com River.

— CÓDIGO DE AUTORIZAÇÃO?

— Não preciso de código de autorização, Gem. Harry já lhe disse para aceitar o comando de voz, e você sabe muito bem disso.

— COMANDO DE VOZ ESTABELECIDO NA RESI­DÊNCIA DE GRANGER, NÃO NA RESIDÊNCIA DE POTTER.

— Só pode estar brin...

— Algum problema?

Hermione abriu um sorriso ao voltar-se para Raven Sierra, rezando para que o cliente não notasse sua perturbação. Se bem que estivera quase gritando com o computador.

— Nenhum. Eu só estava programando o computador para manter a conversa e a linguagem apropriadas à idade de River.

— Tive a impressão de que não se saía muito bem.

Para alívio de Hermione, Harry entrou no quarto.

— Creio que a culpa é minha. Gem, o comando de voz de Hermione aplica-se a todos os lugares.

— AFIRMATIVO. REPROGRAMAÇÃO EM ANDAMENTO.

— Pronto, River — anunciou Hermione. — Se Gem disser algo que você não entenda, basta pedir-lhe que explique.

— Ela pode me contar uma história? — A menina olhou apreensiva para o pai. — Como as mães fazem?

A tensão endureceu os ombros quadrados de Raven, e Hermione desejou ter coragem para abraçar maternalmente aquela criança.

— Claro. Gostaria de se sentar na cadeira de balanço ao lado do berço? Pode olhar o bebê enquanto ouve a história. Se ela chorar, vá me chamar.

— PEDIDO DESNECESSÁRIO— protestou o com­putador. — O CHORO DO BEBÊ DISPARA O NÍVEL DE SEGURANÇA ALERTA UM.

— Gem, eu gostaria que River fosse me avisar, está bem?

O computador emitiu um som grave de desgosto. A menina ergueu o sobrolho e Hermione deu um sorriso inocente.

— Isso significa "está bem".

Felizmente, Gem comportou-se após o episódio. "Brin­cou" um pouco com River e depois explanou em detalhes suas capacidades, demonstrando-as. Durante o jantar, discutiu-se como o sistema beneficiaria a família Sierra tanto em casa quanto na empresa. Difícil, como sempre, era determinar o grau de interesse do cliente. Raven era capaz de manter-se tão inexpressivo quanto Harry.
Terminada a refeição, Hermione foi para a cozinha preparar um café, enquanto Harry respondia às questões técnicas. A equipe que levara e servira o jantar pronto partira havia muito, deixando a cozinha impecável. Os balcões, os armários e até os eletrodomésticos reluziam de tão limpos. Como tudo era preto e com puxadores e painéis de controle embutidos, não conseguia mais distinguir o fogão e a geladeira.

— Gem, sabe onde está o fogão?

— AFIRMATIVO.

Hermione fechou os olhos e contou até dez.

— Pode me dizer onde está?

— INCAPAZ DE REALIZAR. TAL INFORMAÇÃO RE­QUER A RETIRADA DO NÍVEL DE SEGURANÇA ALERTA UM.

— Só pode estar brincando!

— ACESSANDO "BRINCANDO". UM MOMENTO. — Segundos depois, Gem anunciou: — BRINCANDO. MEN­TIR POR BRINCADEIRA. UTILIZAR OU EMPREGAR PROVOCAÇÃO, HUMOR OU LOGRO PARA BRINCAR. NÃO ESTOU PROGRAMADA PARA TAL FUNÇÃO.

— Harry me deu comando de voz, seu monte de lixo mecânico. Agora, me diga onde estão o fogão e a geladeira!

— INCAPAZ DE REALIZAR. TAL INFORMAÇÃO RE­QUER A RETIRADA DO NÍVEL DE SEGURANÇA ALERTA UM. VOCÊ TEM ACESSO AUTORIZADO SO­MENTE AO NÍVEL DOIS.

— O quê?!

Harry escancarou a porta da cozinha.

— Que diabo está havendo aqui? Dá para ouvir vocês duas berrando lá da sala!

— A culpa não é minha! — eximiram-se Gem e Hermione, ao mesmo tempo.




E aii, gostaram?
Sei que não tem muito nesses capítulos, mas achei um bom começo, para os sentimentos de Harry.
Para alegria de vocês, nesse sábado, vou postar mais um capítulo... E com certeza vcs vão AMAR.
Ahh... e pra quem gosta de Gem, além de também ter dado risadas com esse capítulo, garanto que vão adorar o papel de Gem nessa história. (Que em minha opinião, toda história deviar ter uma Gem como essa :)
Romance à todos.

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