Magia Celta



Capítulo 1
Magia Celta


A rua estava coberta pela escuridão, o único poste de luz que funcionava não fornecia a iluminação necessária para se identificar pessoas ou rostos, apenas o caminho.


Não chovia, mas o tempo estava bastante úmido e as folhas dos jardins completamente cobertas por orvalho.


Aquela rua não tinha saída, ao invés disso terminava em uma enorme casa de madeira, com um aspecto de velha, e sua estrutura no estilo de anos 20 lhe dava um tipo diferente de beleza.


Em frente à mansão, uma luz branca surgiu durante rápidos segundos, destacando um semblante negro em meio à escuridão.


A porta da casa se abriu e depois tornou a fechar-se, e então lá dentro se podia ver uma luz branca, um pouco mais forte que a anterior, iluminar a casa por dentro e destacá-la entre as outras na escuridão.


A luz parecia se mover lá dentro. Ela não demorou a se apagar no andar de baixo e iluminar duas das várias janelas do segundo andar.


Por um momento o semblante humano ficou evidenciado para qualquer pessoa que passasse na rua e prestasse atenção naquela janela.


Aquele cômodo pareceu relampejar por dentro com uma luz esverdeada, e um grito seco cortou o silêncio da rua por um breve instante.


Toda a escuridão voltou a reinar naquela rua e o vulto pôde ser visto, pela última vez, debaixo do único poste luminoso que funcionava, deixando para trás o cheiro fresco e grotesco da morte que, há 16 anos, Londres não sentia.



#



A mulher, de cabelos negros como a escuridão e olhos escuros e brilhantes, entrou na sala do auror que vira horas atrás na sua casa. Ela parecia transtornada e tinha um aspecto cansado.


Seus olhos vermelhos e inchados evidenciavam o quanto ela havia chorado naquela manhã.


- Eu lamento muito pelo que aconteceu, Srta. Burchell. – disse o chefe dos aurores de forma cordial.


O homem que vestia uma grossa blusa azul de manga longa levantou-se e saiu detrás da sua escrivaninha, bagunçando os cabelos negros num ato de nervosismo. Levantou os olhos verdes para a moça e disse:


- Esse tipo de incidente não acontece há muito tempo. – ele usava um tom de lamento. – O ministério da Magia inglês tem conseguido manter a segurança do mundo bruxo com sucesso. Não entendo como isso pôde acontecer.


- Eu vou ficar bem. – a mulher sorriu tristemente. – Apenas gostaria que o senhor me garantisse que o autor dessa barbárie com os meus pais pague devidamente por tudo o que fez.


- Está mais do que garantido. – o homem sorriu.


Ela também conseguiu demonstrar alguma tranqüilidade em um sorriso sincero.


- A senhorita pode retirar agora mesmo, se quiser, os bens dos seus pais que foram recolhidos pelo Ministério, no Departamento de Itens Mágicos Confiscados. Os bens que a senhorita está herdando não foram sequer tocados. A escritura da casa estará junto e a conta que seus pais tinham no Gringotes será passada para o seu nome assim que a senhorita assinar alguns documentos. Lá eles saberão explicar melhor do que eu essa burocracia relacionada à herança.


A mulher assentiu com um olhar doce, estendendo a mão para o auror que recebeu o comprimento educadamente.


Ela, então, deixou a sala do chefe dos aurores e seguiu para o DIMC. Lá eles a receberam muito bem e, depois de todos os bens da família Burchell passados para o nome da herdeira, entregaram-lhe uma caixa com vários itens mágicos encontrados na sua casa.


A mulher pegou a caixa, agradeceu e deixou o Ministério.


Ela sentou-se em um banco e, chorando, vasculhou a caixa atrás de algo que lhe lembrasse os pais.


Acabou por encontrar várias fotos e cartas dos pais, mas o que mais lhe chamou atenção foi um diário no fundo da caixa. Um diário de capa dura, preta, que tinha vários pedaços do que parecia ser esmeralda, cravejados desenhando um animal de corpo alongado e olhos de rubi.


No rodapé do caderno, em letras douradas e garrafais, lia-se:


Para Astarte Sullivan



#



A velha senhora de cabelos grisalhos sorriu docemente, admirando a visão magnífica que sua casa de campo lhe fornecia do pôr-do-sol.


A mulher caminhou por cerca de duzentos metros à esquerda da casa e olhou, por sobre o enorme penhasco, a densa floresta que havia lá em baixo.


Não era raro que a visão daquele lugar desse medo na senhora.


“A floresta tem vida”, é o que ela crescera ouvindo sua avó falar e agora ela falava para os netos.


De fato, era o tipo de floresta de árvores gigantes, que emitiam misteriosos barulhos durante a noite. Era o lugar aonde as lendas ganhavam vida. A floresta parecia esconder alguma coisa, guardar outras.


- Com licença? – ela ouviu alguém pedir e então se virou.


Uma morena bonita lhe encarava, sorrindo de leve.


- A senhora mora aqui? – ela perguntou.


- Sim, minha casa fica logo adiante, por quê?


- Bem. – a mulher se aproximou graciosamente. – Meu nome é Astarte e eu sou de Londres. E eu estou precisando de ajuda.


A velha senhora sorriu para Astarte.


- O que uma mulher de Londres, linda dessa maneira, faz aqui nos confins da Irlanda? – a mulher perguntou com uma ponta de ironia e bom-humor.


Astarte não pôde deixar de sorrir diante da simpatia da senhora.


- Meus pais morreram há pouco tempo. – ela disse, se pondo a admirar a floresta ao lado da senhora. – E eu li sobre esse lugar em um velho tipo de diário que eles deixaram pra mim. Eu acho que o livro menciona esse lugar porque meus pais, quero dizer, meu pais biológicos deixaram algo pra mim aqui.


- Você foi adotada? – a mulher perguntou e logo em seguida virou-se para a Astarte. – Oh, me perdoe qualquer indelicadeza. Mas você estava falando sobre algum tipo de herança, tem idéia do que seja? Porque não existem muitas famílias que tenham passado por aqui.


- Não tenho nem idéia do que seja, mas o diário mencionava alguma coisa dentro desta floresta.


- Esta? A floresta do Vale do Medo? – a senhora perguntou tomada por incredulidade. – Olha, minha filha, você vai me desculpar, mas eu duvido que alguém tenha deixado algo pra você dentro dessa floresta esperando que você reavisse.


Astarte voltou-se para a mulher.


- Por favor, qualquer coisa que saiba sobre esta região pode ajudar. Eu realmente preciso descobrir se os meus pais biológicos deixaram alguma coisa para mim.


A senhora encarou Astarte por alguns segundos, com uma expressão indecifrável, mas só pôde ver sinceridade e inocência nos olhos incrivelmente negros da mulher.


- Eu não posso te ajudar muito, mas meu neto estuda as lendas locais e já visitou muitas áreas dessa região, talvez ele saiba de algo que possa te ajudar, minha filha.


Astarte sorriu e agradeceu a mulher, que pediu para que a moça lhe acompanhasse até em casa.


A morena deu uma ultima olhada na floresta, vendo a mesma sumir no horizonte aonde o sol a pouco morrera, e depois seguiu a velha até a sua casa.


No curto caminho, ela reparou nas outras três casas que havia ali, além da casa da senhora com quem estava. Já soubera por volta de outras pessoas que aquela região era somente habitada por poucas e antiguíssimas famílias irlandesas que se recusavam e deixar o lugar. Contudo, essas mesmas pessoas lhe haviam contado sobre o temor que aquela floresta e suas lendas causavam sobre a população irlandesa. De fato, era até raro que se falassem nela ali.


- Seu neto está em casa? – Astarte perguntou educadamente, enquanto entrava na casa logo atrás da mulher.


- Por sorte, está. Espero que ele possa lhe ajudar. – a mulher respondeu simpática e logo parou em frente à última porta de um corredor da casa.


Ela abriu a porta e chamou pelo neto, que logo apareceu com os cabelos molhados e uma toalha ao redor do pescoço.


- Brian, querido, está moça perdeu os pais adotivos há pouco tempo e acredita que os pais biológicos eram daqui e deixaram algo pra ela na floresta, você pode ajudá-la?


O rapaz alto, de cabelos castanhos e olhos escuros, sorriu para a avó e Astarte. O sorriso dele era encantador e Astarte correspondeu quase que automaticamente. Ele rapidamente colocou uma camisa, confirmando que ajudaria no que pudesse.


- Como você soube que seus pais teriam deixado algo para você? – ele perguntou, acompanhando Astarte até a sala.


- Por um diário. – ela respondeu.


- E você tem esse diário aqui?


A morena não respondeu, apenas abriu a bolsa que carregava consigo e tirou o diário negro de lá de dentro.


Brian sorriu para ela, deixando-a desconfortável.


- Bem, então vamos começar lendo o que seus pais escreveram aqui.



- Olha, você deve ser ótima em decifrar enigmas, porque o que seus pais escreveram aqui poderia estar se referindo a qualquer coisa. – Brian disse, depois de meia hora lendo o diário cuidadosamente, sentando no sofá ao lado de Astarte. – Veja: “O segredo deixado por hereditariedade está mergulhado no mais profundo do medo, protegido por sangue, selado por mágica”. Nossa, isso pode significar muita coisa!


- Por um momento me passou pela cabeça um lugar chamado de Floresta Negra, mas...


- Olha... – Brian a interrompeu, sorrindo. – Nós somos bruxos também, sabemos da floresta próxima a Hogwarts.


Astarte riu envergonhada.


- Eu deveria ter imaginado, se você consegue decifrar esse tipo de charada.


O rapaz suspirou, virando mais uma página do diário. Ele contraiu o rosto confuso.


- Acaba aqui? – ele perguntou, virando rapidamente as páginas restantes em branco.


- Parece que sim. Por isso preciso de ajuda, eu consegui chegar até aqui: “no mais profundo do medo” se referia a este vale. É o mais profundo do leste da Europa e foi apelidado de Vale do Medo.


Brian voltou na página que estava a frase e a encarou compenetrado.


- Realmente, pra quem recebeu isso no meio de Londres é uma frase bem... Problemática. Mas não se preocupe, eu acho que sei ao que ela se refere.


- Seria ótimo. – Astarte disse animada.


O moreno alinhou os cabelos e se levantou, indo rapidamente até outro cômodo pegar um livro. Ele sentou-se ao lado de Astarte novamente e abriu o livro, procurando uma determinada página.


- Aqui! . –ele disse, e apontou para a foto de um pequeno lago visto de cima, cercado de árvores. – Esse lago fica quase no meio da floresta, eu acredito que a palavra “mergulhar” seria uma referência a ele.


- Eu não sabia que tinha um lago aqui.


- Imagine alguém que não sabe nem da floresta tentando desvendar isso. – o rapaz brincou. – Isso me força a acreditar que seus pais biológicos deixaram algo pra você perto, talvez até dentro do lago, no meio da floresta.


- Desculpe, mas por que te força a acreditar?


- Porque eu nunca acreditaria em você se não estivesse lendo o diário em questão. - ele explicou. – Não me leve a mal, é que é difícil acreditar que pais zelosos quisessem a filha dentro da floresta do Vale do Medo. Ninguém nunca saiu dessa floresta, Astarte, mas muitas pessoas já entraram.


A mulher franziu a testa e crispou a boca.


- Você acha que é tão perigoso quanto dizem? – ela perguntou.


- Eu tenho certeza. Do contrário seus pais deixariam o tal segredo lá dentro, confiando que nada o tirasse de lá, mas veja bem, eles dizem: “protegido por sangue, selado por mágica”. Eles deviam ter certeza de que não estaria seguro só mergulhado no lago.


- Mas você não acha que então eles conseguiram entrar lá e temiam que alguém mais conseguisse?


- Eu concordo que eles devem ter entrado, mas duvido que tenham suspeitado que alguém mais entraria, a proteção deve estar feita para certas criaturas que poderiam roubar, como centauros ou lobisomens, por exemplo.


Astarte coçou a cabeça.


- Você sabe quem eram seus pais biológicos? – Brian perguntou.


A mulher, contudo, negou. E disse que o diário era, inclusive, o único vestígio de que havia sido adotada.


Um longo minuto de silêncio se passou. Enquanto Astarte parecia apenas pensar, Brian ainda lia a frase mais uma vez.


- Quando ele diz sangue, eu acho ainda que seja uma proteção que não funcione contra você, e sim a seu favor.


A mulher suspirou alto e levantou-se de súbito, balançando os cabelos negros.


- Bem, nesse caso eu tenho que entrar na floresta. – ela disse.


Brian olhou-a incrédulo.


- Me desculpe a falta de educação, mas você só pode ter enlouquecido. – ele disse, levantando-se também. – Olha, vai por mim, essa floresta não é o tipo de lugar em que você gostaria de estar.


- Eu não tenho outra escolha. É a única pista que tenho dos meus pais biológicos e eu realmente quero saber o que eles julgaram merecedor de tanto mistério. – ela argumentou veemente. – Olha, você já me ajudou bastante e eu sou muito grata, mas eu vou entrar naquela floresta.


Brian suspirou alto e olhou para o teto. Contraiu bem os olhos e olhou para Astarte se dando por vencido.


- Amanhã pela manhã. – disse ele. – Já anoiteceu e a noite a floresta fica ainda pior e mais perigosa. Amanhã, pela manhã, nós entramos na floresta e vamos o mais rápido possível até o meio.


- Nós? – Astarte perguntou, agora sorrindo.


- Claro, ou você realmente acha que eu vou te deixar entrar naquele lugar, sozinha? Eu vou com você.


Astarte agradeceu, eufórica.


- Está bem. – Brian riu. – Apenas durma bastante essa noite. Nós temos um quarto vago aqui, você pode passar a noite lá. Depois nós vamos pegar tudo o que precisamos e logo pela manhã, partimos.


- Está bem. – a mulher concordou.



#



Astarte olhou para o céu, já quase completamente escondido pelas copas das árvores que, à medida que ela e Brian adentravam mais a floresta, pareciam ficar ainda maiores.


- Você tem certeza que sabe onde estamos? – ela perguntou.


Brian, que há algumas horas já não dizia nada, se virou para trás. Astarte sorriu ao ver que o rapaz sorria.


- Eu nunca fui tão adentro da floresta, mas estudo ela há muitos anos. Já percorri alguns caminhos e já tracei algumas trilhas... Sei quais são as mais seguras, as mais perigosas, sei em que regiões estão os ninhos das piores criaturas.


- Então tem certeza que estamos no caminho mais seguro? – ela perguntou.


Brian voltou a olhar para frente, estendendo a luz na ponta da varinha para o caminho a sua frente.


- Não estamos no caminho mais seguro. – disse ele, sem encarar Astarte. – Estamos no mais rápido.


A mulher riu num tom quase irônico e olhou para os lados, sem conseguir enxergar nada além da escuridão.


Eles haviam entrado na floresta pela manhã, e até as cinco horas ainda era possível se enxergar por entre as árvores só com a pouca luz que atingia o chão. Contudo, já eram quase onze horas e agora os dois estavam rodeados por uma escuridão que, acima de tudo, parecia não só impenetrável, mas também sólida.


- Você acha que só chegaremos ao lago amanhã? – ela perguntou.


- Nesse ritmo, se abrirmos mão de uma noite de sono, chegaremos lá durante a madrugada. Se corrêssemos durante a próxima hora, sem parar, chegaríamos pouco depois da meia noite.


Astarte olhou ao redor, estendendo a luz na ponta da própria varinha para poder enxergar, e depois voltou o olhar para Brian, que estava a sua frente, dando-lhe as costas.


No dia anterior, ela se sentira segura e decidida, enquanto o rapaz temera a sua decisão, agora as coisas pareciam ter-se invertido. Ela se continha para não demonstrar o medo e a tensão que insistiam em angustiá-la.


Brian já parecia mais confiante, mas ainda assim seu silêncio denunciava que também estava apreensivo.


Por mais dez minutos os dois seguiram sem dizer nada, com certa tranqüilidade. Astarte já fechava os olhos e respirava fundo, querendo quebrar o silêncio que já a frustrava, quando Brian virou-se subitamente para trás, parando de andar.


- Isso foi você? – ele perguntou.


Astarte o olhou assustada.


- Isso o que?


- Você não ouviu?


A mulher olhou ao redor, sentindo-se ilhada no meio da escuridão.


- Eu não ouvi nada. – ela disse, abraçando o próprio corpo.


Brian fez sinal para que ela fizesse silêncio e ela sentiu que poderia responder com ironia, considerando-se a situação em que estavam, mas preferiu ficar calada. Prendeu a respiração junto ao rapaz.


Segundos que pareciam eternos se passaram e então a morena ouviu um ruído seco que parecia distante.


Brian pegou o braço dela com força, fez novamente o sinal para que continuasse calada, e seguiu silencioso pela trilha.


Mais alguns segundos e o ruído tornou a se repetir, dessa vez mais perto dos dois. Parecia o som de alguma coisa arranhando as árvores.


Brian diminuiu o passo e, em um movimento lento e suave, estendeu a varinha para cima, iluminando os altos troncos das árvores.


Astarte acompanhou seu olhar e levou as mãos à boca, assustada. Os troncos das árvores ao redor pareciam todos arranhados. Arranhões grandes e profundos, manchados pelo que parecia ser sangue.


- Droga! – Brian exclamou, cerrando os dentes. Ele pegou a mão de Astarte e a puxou com força. – Corre!


A morena se pôs a correr logo atrás dele, segurando ainda firmemente sua mão.


Logo em seguida, os barulhos em seco voltaram a surgir. Agora eram sucessivos, altos e intermináveis, mas não pareciam se multiplicar.


Os dois correram por cerca de dez minutos tanto quanto podiam. Um barulho mais alto, semelhante a um rangido, ecoou alto pela floresta. Astarte olhou para o lado, vendo uma das grosas árvores penderem para cima de si.


Brian disse algo que ela não escutou e, estando a uns cinco metros da morena, estendeu a varinha para frente. Por um momento a luz que a varinha dele emanava se apagou e uma longa e fina corda se lançou da ponta da varinha e se estendeu até o corpo de Astarte, enrolando-se com força no mesmo. Depois Brian puxou a varinha para si e a corda retornou como um elástico, trazendo Astarte junto. Ele tornou a dizer “lumus” e a varinha novamente se iluminou.


A morena, em pânico, observou a árvore enorme despencar no chão, e olhando para o lugar onde ela estava, viu um vulto negro passar tão rapidamente pelos seus olhos, que chegou a se perguntar se não estaria vendo coisas.


Nem teve tempo para isso, na verdade. Brian a puxou para junto de si e os dois voltaram a correr.


- O que foi aquilo? – ela perguntou, correndo com todo o fôlego que tinha.


- Fique quieta. Se te ouvirem podem vir mais daqueles. – o rapaz disse somente, ainda que em um sussurro rouco.


Ela então estendeu a varinha que lhe iluminava o caminho e voltou a correr, sabendo que, de fato, sua vida dependia daquilo.


Só quando os barulhos cessaram os dois pararam de correr e Brian a puxou para junto de si, encolhendo-se em baixo das gigantescas raízes de uma das árvores.


Ele sussurrou algo para a própria varinha e a luz na ponta dela se apagou. Astarte não demorou a imitá-lo, deixando então a escuridão consumi-los.


- O que era aquilo? – ele perguntou, baixo. – Lobisomens?


- Não. – Brian respondeu, ofegante. – Se fossem lobisomens teríamos visto rastros no chão também. O que estava lá se locomove no alto, pelas árvores.


- O que eram, então?


- Era. – ele enfatizou. – Só havia um.


- Um? – Astarte soou incrédula. – Um daquilo derrubou aquela árvore.


- Os Wendigos são fortes. E especialmente rápidos, o que você viu eu também vi, eram sim um deles. – ele respirou fundo e olhou para os lados, como se fosse conseguir ver alguma coisa. – Só espero que não tenha acordado os outros. Eles deviam estar hibernando nesse ano.


- Essas coisas hibernam?


- São criaturas perigosíssimas, principalmente por terem como prato predileto carne humana. Mas eles hibernam de dez em dez anos, aproximadamente. Eu acompanho o desenvolvimento das criaturas daqui, não sei por que este estava acordado.


- Às vezes foram acordados por outras criaturas. – Astarte ponderou.


- São poucas as criaturas que desafiam um Wendigo. Eles são muito mais ferozes do que qualquer outra criatura que viva aqui, só que apesar de mais violentos, não estão perto de serem os mais fortes. – Brian disse e então respirou fundo.


- Talvez, então, o barulho de outra criatura o acordou.


Astarte não teve certeza, mas podia sentir que Brian a encarava através da escuridão.


- Ou então... – disse ele. – Alguém chegou aqui antes da gente e fez exatamente a mesma trilha.


- Você acha que tem mais alguém atrás do que os meus pais deixaram para mim?


Astarte não ouviu Brian responder, mas pôde sentir que ele se levantava. Ela tateou a procura do rapaz e logo sentiu a mão dele segurar a sua firmemente.


Ela se levantou e acendeu a luz na varinha, logo depois dele.


- Agora você pode descobrir. – ele disse.


Astarte olhou para frente e um sorriso se projetou nos seus lábios. Há uns três metros e meio ela podia ver a luz da sua varinha ser refletida com extrema beleza na superfície de um enorme lago de águas escuras, que interrompia a vastidão de floresta.


Os dois se aproximaram do lago e olharam-no maravilhados.


Ele era imenso, suas águas eram tão calmas que pareciam estáticas e naquela região a luz da lua conseguia penetrar com facilidade, dançando bela nas águas escuras.


- Como... Como vamos saber se o que meus pais me deixaram está aí? – ela perguntou mais a si mesma do que a Brian.


- “protegido por sangue, selado por mágica”. – foi tudo o que Brian disse.


Astarte olhou para ele por um momento, o rapaz apenas sorriu. A morena sentiu-se mais confiante e apertou a ponta da sua varinha contra a palma da mão. Ela arrastou a ponta da varinha descrevendo uma linha imaginária de três centímetros e depois um corte se abriu nesse mesmo lugar.


Astarte estendeu a mão acima do lago e viu uma grande gota de sangue cair da sua mão, caindo nas águas rasas do lago.


O vermelho ficou boiando na restante da águas, por um segundo, como óleo em água. Depois, como uma bolha, a gota se estourou e dissipou rapidamente.


Astarte ainda olhava tudo muito apreensiva quando as águas a sua frente começaram a rodopiar como em um redemoinho pequeno e se afastarem cada vez mais, formando um túnel submarino com paredes líquidas. Então, de repente, as paredes de águas se romperam em pequenos buracos, que despejavam uma água um tanto quanto mais clara para dentro do túnel.


Insegura, ela novamente encarou Brian.


Ele balançou a cabeça e disse:


- “mergulhado no mais profundo do medo”.


Astarte então deu um passo a frente e, ainda temerosa, mergulhou no túnel.


Aquelas águas que fluíam para dentro do túnel eram quentes e aconchegantes, diferente de como ela imaginava que seriam as águas negras do resto do lago.


A morena sentiu que Brian mergulhava logo atrás dela, e quando começou a perder fôlego, sentiu que de alguma forma, o lago percebeu e então o fluxo tornou-se ainda mais forte e mais rápido. Ela não demorou a perder o controle do nado e do fôlego, mas quando sentiu que seus pulmões queimavam pedindo por ar, sentiu-se arremessada para fora do túnel, caindo em uma superfície dura e fria.


Ela estava se levantando quando o corpo de Brian caiu sobre o seu.


- Ai, desculpa. – ele sorriu. Ela fez o mesmo.


- Não tem problema.


Os dois olharam ao redor e se acharam em uma gruta submarina. As paredes de pedras não eram simplesmente úmidas, havia água escorrendo por elas com certa abundância.


- Isso é... Um templo celta? – Astarte ouviu Brian perguntar, maravilhado.


Ela então desviou os olhos da parede e olhou para frente.


Há não mais que dois metros a sua frente, havia o templo que Brian citara. Era pequeno, em forma de um círculo perfeito. O chão dentro do círculo era de mármore negro e em quatro pontos distintos, na borda do círculo, havia quatro pilastras que subiam até o teto.


Ao chegar mais perto, Astarte assustou-se ao ver que as pilastras eram formadas de ossos humanos. Todos os tipos de ossos, alguns mais finos, outros mais grossos. Havia os compridos e também outros curtos. Dessa maneira, as pilastras se mostravam tortas e irregulares, mas ainda assim firmes.


- Que horror... – ela ouviu Brian suspirar brandamente, olhando para cima.


O topo de cada uma dessas pilastras era descorado, cada um, por um crânio que lá jazia, impotente, quase como se pudesse observar as pessoas.


- Eu não acho que ninguém tenha vindo aqui, pensando bem. – disse ele. – Quero dizer, eu não teria coragem de estar aqui, se não soubesse que você está atrás de uma herança sua. De qualquer forma, com todo respeito, seus pais biológicos não eram pessoas... Normais.


Astarte apenas deu um risinho, concordando.


Ela entrou no círculo, sentindo a curiosidade explodir no peito. Aquele tinha que ser o lugar citado no diário. Então a sua herança tinha que estar ali.


- O que é isso? – Brian perguntou novamente, agora olhando para o centro do templo.


Astarte balançou a cabeça negativamente sem responder, e se aproximou de um pequeno suporte que sustentava uma bacia dourada, no centro do templo.


Ela se aproximou e espiou por cima da bacia. Lá dentro, um líquido vermelho que ela achava ser sangue rodopiava velozmente como os pensamentos prateados em uma penseira. Ali, contudo, havia duas massas líquidas e vermelhas, rodopiando uma atrás da outra, ganhando velocidade à medida que a mulher se aproximava, como se estivessem atiçadas.


Astarte virou-se novamente para Brian, confusa.


- Parece sangue... – Ela disse. – Só... Sangue.


- Talvez tenha que fazer a mesma coisa que fez com a água, então. – Brian deu os ombros, observando ainda maravilhado a gruta, de fora do templo.


Astarte, achando a mesma coisa que o rapaz, estendeu as duas mãos e apertou a mão cortada, fazendo o sangue voltar a sair.


Dessa vez pingou uma vez, duas, três... E nada aconteceu. Ela apertou mais e o sangue escorreu em mais abundância para a bacia.


Lá, subitamente, as duas massas de sangue pararam de circular entre si, e se chocaram, uma de cada lado, contra o sangue de Astarte. Agora era somente uma bolha de sangue grande e uniforme que circulava velozmente na bacia.


Astarte deu um passo para trás, assustada.


- Está tudo bem? – Brian perguntou, se aproximando.


A mulher abriu a boca, mas não chegou a ter tempo de dizer nada. Antes disso a bolha de sangue se elevou a altura da cabeça de Astarte e estourou violentamente, manchando todo o templo de vermelho.


A cabeça de Astarte rodava tão rapidamente que ela não conseguia mais discernir as coisas que estava a sua frente. Tentou focalizar Brian, mas quando deu um passo a frente, cambaleou e teve que recuar, segurando-se contra a bacia dourada.


- Astarte! – Brian exclamou. – Oh Mérlin, Astarte!


Ele correu até ela, mas ao tentar invadir o templo, seu corpo foi violentamente jogado para trás. O rapaz bateu a cabeça contra a parede rochosa e perdeu a consciência, rolando para um canto mais baixo da gruta, quase escondido.


No alto das pilastras, os crânios humanos começaram a emitir uma luz negra por todas as cavidades.


Astarte ainda ouviu um zumbido agudo antes de tudo parar e ela olhar trás. Ao fundo do templo havia um homem. Um homem de veste negras e rasgadas, com um sorriso malicioso e um olhar insano.


- Fique... Fique longe de mim. – Astarte gritou, levando a mão à testa.


- Eu vou. – ele disse, mostrando uma adaga brilhante em uma das mãos. – Eu vou.


Astarte tropeçou e caiu sentada. Seus olhos estavam arregalados olhando para o homem.


Ele, contudo, apenas reverenciou a mulher e tornou a se levantar. Ela teve a impressão de ver uma marca em um dos braços do homem, mas quando piscou os olhos, ela não estava mais ali.


- Foi um prazer te servir. – disse ele, ainda com o olhar insano.


Mas novamente não demonstrou ser perigoso. Ele apenas se aproximou da bacia dourada e elevou a adaga à altura do pescoço. Sorriu, por um breve momento, e depois, com força e brutalidade, cortou a própria garganta.


Ele não parecia sentir nada além de prazer. Uma grande quantidade de sangue jorrou para dentro da bacia e depois o corpo do homem caiu pesado e sem vida no chão.


O sangue do homem, quase que no mesmo momento, começou a ferver.


Astarte também sentiu o corpo esquentar. Tão quente que ela achou que não suportaria. Tentou gritar com toda a força que tinha, mas sua garganta não emitiu som algum.


A luz negra emanada dos crânios parecia, cada vez mais, preencher a gruta.


Astarte sentiu uma dor fria na barriga, como se uma lâmina atravessasse seu corpo e logo em seguida um calor descomunal no peito.


Ela inspirou tanto ar quanto podia e então, perdendo as forças do corpo, perdeu a consciência. Seu corpo caiu pesado no chão enquanto a luz negra engolia a gruta.







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N/A: cara, vocês não têm noção de como é bom voltar a escrever sobre HP depois de tanto tempo parado. Eu achei que esse sétimo livro ia ser o que ia me fazer parar de escrever sobre HP de uma vez por todas, mas não. No final das contas acabei me sentindo mais, sei lá, inspirado a escrever mais.


E, assim, Lílium TINHA que ter uma continuação, vocês não acham?


Eu, desde o primeiro capítulo de Lílium, achei que a história ficaria incompleta sem um pouco de heron pra vocês, já que ele é meio que o foco de LL e não faz nada. Só que eu não achei que fosse ter coragem de começar outra.


E agora, aqui estou eu!


Então, pra ter a sensação que vou fechar Lílium com chave de ouro, eu vou ENCHER vocês de Heron nessa LL2.


VAI ter H², don't panic!


não vão ser o casal 2o, como em LL, mas vão aparecer.



Aí, aí.


Por enquanto não tenho muito mais o que dizer, vamos ver no capítulo 2, né?


Espero que vocês curtam bastante a fic e comentem bastante.


Porque eu comecei LL2 POR VOCÊS, então é bom que vocês comentem bastante, viu? ;D


Beijão pra vocês.


See ya.

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