Capítulo 7
— Por sua culpa? Como assim? — perguntou Hermione, perplexa.
— Eu estava tão envolvido com o trabalho, e tentando me entender com Marie, que nem me dei conta de que ela se envolvera com más companhias. Saía com o farmacêutico mau-caráter que era seu fornecedor de drogas. Uma noite, tomou uma dose excessiva, e foi parar na emergência do hospital, com um ataque cardíaco. O covarde desapareceu assim que soube da gravidade da situação.
— Ele conseguiu se livrar?
— Não, eu o peguei. Custou tempo e dinheiro, mas consegui encontrá-lo. Contratei detetives particulares. Ele foi pego em flagrante, portando drogas. Está atrás das grades, cumprindo pena de dez anos. Mas infelizmente isso não fez minha irmã voltar.
Hermione notou o quanto o assunto era doloroso para Harry. Sentou-se na cama e o movimento fez sua cabeça doer.
— Entendo. Mas não há muito a fazer para afastar quem amamos de problemas. Quando resolvem se machucar, ninguém consegue impedir, não importa quanto as ame.
— Você tem uma maneira profunda de analisar as pessoas. Isso demonstra quanto é sensível.
Hermione deu de ombros.
— Mas às vezes torna a vida mais difícil. Harry lhe fez uma afago no rosto.
— Bem, vou deixá-la e irei preparar algo para você comer. Foi até sua casa, pegar alguns mantimentos. Fez ovos mexidos com bacon, torradas com canela, suco de laranja e o insubstituível café com leite.
Hermione, sem muito apetite, observou-o comer e sorriu ao vê-lo esvaziar o prato.
— Você é um excelente companheiro de férias, sabia?
— Não precisa parecer tão surpresa. Não passo de um homem comum.
— Um homem comum que construiu um império do nada. E sozinho.
— Tive alguma ajuda. O problema é que, quando se fica famoso, as pessoas deixam de nos ver como simples mortais. Não sou diferente de quando costumava levar minha irmãzinha à escola. Estou apenas mais velho e mais bem-vestido.
— Algumas pessoas se deslumbram com o sucesso...
— Algumas? A maioria, suponho. Mas não sabem o sacrifício que se fez até chegar ao auge. Ninguém em sã consciência devia cometer excessos apenas para ficar rico.
— Mas não foi o que você fez?
— Não foi sacrifício, foi diversão. Para mim, é um grande desafio combinar números e lógica, criar um novo programa a partir do nada. Quando comecei a mexer com computação, jamais me ocorreu ganhar dinheiro com isso.
Hermione deu uma risadinha.
— Mas ganhou.
— E como! Foi muito bom ser rico, mas continuo o mesmo homem, mesmo sem dinheiro, e gosto do desafio de tentar conseguir tudo de volta.
Ela o entendia. O mesmo lhe acontecia; era um desafio iniciar um novo livro. Perguntou-se qual seria a reação de Harry quando descobrisse sua verdadeira profissão. O conceito que ele fazia das mulheres famosas não era muito bom. Claro que Hermione não era tão famosa assim, e ele tampouco estava apaixonado...
— Você não está bem, não é? — comentou Harry, afastando-lhe os cabelos do rosto com carinho. — Por que não deixa Kurt comigo e tenta dormir um pouco?
— Creio que vou aceitar a sugestão. Obrigada.
— Trancarei a porta ao sair. Kurt tem as chaves? — perguntou ele, ajeitando-lhe as cobertas.
— Sim. Estão no bolso do casaco que ele deixou no sofá.
— Vou pegar. — Inclinou-se beijou-a carinhosamente na testa. — Ficará bem sozinha, ou prefere que eu fique?
— Ficarei bem, obrigada. Você é de fato um grande amigo — disse ela, meio zonza. O remédio começava a fazer efeito.
— E para que servem os amigos senão para ajudar?
— Se algum dia estiver com problemas, pode contar comigo — afirmou ela, e viu-lhe a expressão surpresa. Estendeu a mão e acariciou-lhe o rosto. — Ninguém cuida de você quando precisa de ajuda?
— Carly. Pelo menos tenta.
— Pobrezinho... Prometo cuidar de você. Quando melhorar, claro.
Harry lançou-lhe um olhar impenetrável e nada disse.
— Voltarei mais tarde para vê-la. Precisa de alguma coisa?
— Não. E obrigada pelo café.
— Durma bem.
Hermione deitou-se e fechou os olhos. Ouviu os passos dele, afastando-se, e em seguida o barulho da porta sendo fechada.
No meio da tarde, sentia-se bem melhor. Levantou-se e vestiu os habituais jeans e camiseta.
— Você está com uma aparência melhor, mais descansada — comentou Harry ao chegar.
Ela sorriu.
— Obrigada. Como estão as crianças?
— Ah, ótimas. — Harry mantinha as mãos nos bolsos da calça folgada e a fitava com interesse. — Venha cá — pediu naquele seu tom de voz macio e aveludado.
Hermione obedeceu, embora sua mente ordenasse que se afastasse daquele homem. Mas, quando ele a tocou, somente a força dos braços, a boca insistente e faminta, passaram a contar. Tudo o mais perdeu o significado.
Ela abandonou-se com um suspiro desalentado, a determinação de proteger-se desaparecendo como fumaça ao vento.
— Eu poderia ficar viciado nessa boca — disse ele, soltando-a com relutância quando vozes vindas da varanda anunciaram a chegada das crianças.
— Pensei a mesma coisa — comentou Hermione, rindo.
— Mas não tenha muita esperança — murmurou ele, olhando para a porta. — Teríamos mais sorte se estivéssemos no pátio da estação central!
Antes que pudessem dizer mais alguma coisa, Kurt e Carly entraram correndo.
— Podemos ir até o shopping? — perguntaram em uníssono. — Daríamos um passeio e tomaríamos sorvete.
— Como vocês têm se comportado, não vejo por que não ir. Concorda, Hermione? — Ela assentiu. Harry então pegou duas notas de vinte dólares do bolso e entregou aos garotos. — Isso deve ser suficiente.
— Obrigada, papai! — exclamou Carly. — Iremos e voltaremos de táxi.
— Mas voltem direto para casa — ordenou ele, dando-lhes mais dinheiro para a condução. — Se por acaso se perderem, procurem um policial e peçam para nos avisar. Sabem o número do telefone?
— Sabemos, pode deixar. Até mais!
Saíram numa corrida alucinada. Hermione e Harry foram para a varanda, vê-los partir.
De repente, um movimento chamou a atenção dela. Lá estava o homem suspeito, parado ao lado de um carro, no outro lado da rua. Naquele momento, as crianças pararam e entraram em um dos táxis vindos dos hotéis da redondeza. Hermione gelou ao ver o estranho passar a segui-los.
— Viu aquilo? — perguntou, horrorizada.
— O quê?
— O homem. Estava naquele carro, e foi atrás do táxi.
— Que carro ele dirigia?
— Um velho sedan. Já o tinha visto nas redondezas. Acho que não foi uma boa idéia deixar as crianças sozinhas. E se ele estiver atrás de Kurt? Vai ver que souberam que meus pais encontraram algo valioso e planejam seqüestrá-lo.
— É melhor nem pensar. Vou atrás deles. Mas não se preocupe. Mesmo um criminoso profissional pensaria duas vezes antes de seqüestrar uma criança americana nas ruas de Cancun.
— Não tenho tanta certeza.
Hermione não parou de se preocupar até que Harry chegasse com as crianças. Passado o susto, foram para a praia. Ela, no entanto, continuava preocupada. Não apenas por causa do desconhecido misterioso, mas também porque Harry não pareceu ter dado muita importância ao incidente, como se seus temores fossem exagerados.
— Não perguntei antes por causa da enxaqueca, mas como foi a reunião em Miami? — perguntou ela, mais tarde, após servir café a ambos.
— Melhor do que eu esperava. Aparentemente, os investidores estão confiantes.
— Concordo plenamente com eles.
Harry a fitou e sorriu.
— Confia tanto em mim?
— Você é do tipo que inspira confiança nas pessoas. Aposto como deve ser do tipo de patrão a quem os funcionários idolatram.
Ele deu de ombros.
— Já lhe ofereci emprego, e a proposta continua em pé: Por que não vem trabalhar para mim? Vou transformá-la numa mulher rica.
— Não estou certa de que é o que quero. Dinheiro não é tudo, mas deve ser de muita ajuda quando se tem pais idosos e doentes. Estou pensando nos meus. Ainda não tive notícias deles. Liguei para a universidade esta manhã, mas lá também nada sabem.
— Como costumam entrar em contato com vocês?
— Pela Internet, via correio eletrônico — explicou ela. — Mas não enviam notícias, e o serviço de guias locais não consegue contatá-los. Temo que possa ter acontecido algo, mas não comentei nada com Kurt.
— Por que não me disse antes? Ainda tenho uma certa influência. Precisarei dar apenas alguns telefonemas.
Harry fez as ligações em espanhol, e por isso ela não as entendeu. No entanto, um dos nomes mencionados lhe era familiar.
— Conhece o presidente do México? — indagou ao vê-lo desligar o telefone.
— Como sabe que falei o nome dele? Você não entende espanhol.
— Conhece-o?
— Sim, conheço. Prometeram enviar um helicóptero para tentar localizar seus pais. Teria ido eu mesmo, mas o Learjet não é ideal para esse tipo de busca.
— Como saberão onde procurar?
— Seus pais não precisaram contatar a agência do governo apropriada para pedir permissão para escavar?
Ela sorriu, aliviada.
— Claro. Obrigada.
— Por nada. Agora, tome seu café.
No fim do dia, Harry recebeu notícias através de um breve telefonema.
— Seus pais estão bem — informou ele, após desligar. — O equipamento de comunicação quebrou, e tiveram dificuldade em encontrar um técnico que fizesse o conserto.
— Ainda bem! — exclamou ela, aliviada.
Harry sorriu de modo travesso.
— E eu? Não ganho nada?
— O que deseja? — perguntou Hermione, aproximando-se, ciente de que as crianças encontravam-se na varanda, observando a praia. — Uma recompensa ou um certificado de gratidão?
— Confesso que estava pensando em algo mais... especial — sussurrou ele, tomando-lhe o rosto.
— Especial como? — perguntou ela, quase sem fôlego.
— Nada demais...
Harry chegou mais perto. Quando abraçou o corpo frágil, sentiu que estava perdendo a batalha e a guerra. No instante seguinte abaixou a cabeça para alcançar-lhe a boca.
Hermione fechou os olhos, estonteada pelo prazer que aquele toque lhe proporcionava.
— Você me deixa tonto... me vicia... — disse ele, num tom rouco.
— Quanto a mim, já estou viciada. — Hermione se aproximou mais e foi gentilmente afastada.
— Vá com calma, mocinha. Você não é esse tipo de mulher.
— Isso não importa.
— Importa, sim.
— Quero que faça amor comigo.
— Saiba que não pretendo levá-la para a cama.
Hermione ergueu as mãos.
— É sempre tão precavido? Foi assim que conseguiu seus milhões?
— Não me importo de correr riscos, mas somente quando se trata de dinheiro. Erros graves costumam ser cometidos no calor da paixão. Não quero me arriscar com você, Hermione. Prefiro que se case com alguém como o seu professorzinho. e viva feliz para sempre.
Ela o fitou com olhos repletos de tristeza.
— Será que terei de passar o resto da vida apenas sonhando com você?
— Aconselho-a a tentar me esquecer. É uma garota ingênua e se iludiu comigo. Ora, tenho espelho em casa. Sei bem o que as mulheres vêem em mim.
— Acredita que eu esteja atrás do seu dinheiro? — indagou, irritada. "Uma garota ingênua!!... Pois sim! Era mundialmente famosa!
— Não acredito. Mas acho que se sente atraída por uma imagem que não existe.
— Imagens não beijam como você me beija.
— Acho melhor eu ir embora. Não gosto de discussões inúteis. Vejo-a amanhã. Carly! — chamou. — Hora de dormir!
— Já vou, papai.
Ele se despediu e se foi.
— Mamãe e papai estão bem — disse Hermione ao irmão. Abraçou-o enquanto observava os Potter se afastar. — Harry ligou para o presidente, e conseguiu que fizessem uma busca. Enviaram um helicóptero à região e entraram em contato com eles.
— Harry é de fato influente! Que bom que ele é nosso amigo — comentou o garoto.
— De fato. É um alívio saber que nossos pais estão bem.
— Você sabia que ele lê seus livros?
— Não diga!
— Carly me contou que tem todos, inclusive O segredo da catacumba. Tomara que ele não resolva dar uma boa olhadela na foto da autora, na contracapa...
— Mesmo que faça isso, não me reconhecerá.
— Por que não conta a verdade?
Hermione encolheu os ombros.
— Ele iria querer saber por que escondi a verdade. Além disso, vive dizendo que não gosta de mulheres famosas.
— Mas gosta de você, e não se importará.
— Acha mesmo? Não tenho tanta certeza... — disse ela, pensativa.
— Por que não? Ele não é legal?
— Isso é o que Carly vive dizendo... — Ao mencionar o nome da garota, Hermione lembrou-se do carro que os seguira. — Por acaso tornou a ver aquele homem na cidade? O que anda rondando por aqui?
— Sim, vi. No shopping. Mas parece que notou que eu estava de olho nele e desapareceu quando me aproximei de um policial.
— Não estou gostando disso.
— Nem eu. Mas pode ficar tranqüila. Não darei chance a ele.
Hermione foi se deitar, mas a lembrança dos beijos de Harry não a deixou dormir. Decidiu levantar-se e foi para a varanda. A luz do luar, percebeu um vulto na praia, dirigindo-se à casa dos Potter. Algo brilhava contra a claridade do luar, parecendo metal. Seria um telescópio? Notou luz na sala vizinha, e uma silhueta delineada contra a janela. Deduziu que fosse Harry.
A luz da lua tornou a refletir-se no objeto de metal, fazendo seu coração disparar. E se fosse um revólver? E se alguém planejasse atirar nele?
Sem pensar na própria segurança, saiu em disparada, em direção à casa dos Potter. Ao aproximar-se, gritou para a pessoa que agia furtivamente.
Tratava-se de um homem, que a viu e de imediato ergueu o braço, fazendo um sinal. Dois desconhecidos surgiram na escuridão e, antes que Hermione percebesse, cobriram-na com uma espécie de lençol. Então bateram-lhe na cabeça, e o mundo desapareceu.
Hermione acordou zonza, e com a cabeça doendo terrivelmente. Estranhou a cama dura. Abriu os olhos e notou que não estava em casa. Encontrava-se na cabine de um barco, e viu o homem suspeito da praia falando com impaciência com outros dois homens.
Gemeu, chamando-lhes a atenção. Sabia que, se não mantivesse a calma, acabaria sendo morta. O desconhecido levava um revólver na cintura, e tocou-o ao suspeitar que ela havia acordado.
Hermione fingiu estar inconsciente. Se o homem soubesse que o vira, e que poderia reconhecê-lo, provavelmente a mataria. De olhos fechados: sentiu-o aproximar-se. Tirou-a da cama e a fez sentar-se numa cadeira. Amarrou-lhe as mãos para trás.
— Não pegaram a menina Potter, seus idiotas. Essa é a vizinha — resmungou.
Então a haviam confundido com Carly! Eles falavam em espanhol, mas Hermione entendeu as palavras "menina Potter" e "não". Pretendiam de fato seqüestrá-la.
A coisa devia ser séria, pois todos estavam armados. E ela se tornara uma testemunha em potencial. Podiam estar planejando eliminá-la. Precisava fugir, avisar Harry e Carly.
Os homens permaneceram por perto, e ela continuou fingindo estar inconsciente. O mais alto murmurou algo, de modo agourento. Seus comparsas concordaram e o seguiram ao convés da embarcação.
Hermione ouviu o som de um motor, mas, pela distância, não era o do barco no qual se encontravam. Obviamente, era o de uma lancha, mantida para embarque e desembarque. Certamente havia muito dinheiro envolvido naquela tentativa de seqüestro. A questão era quem poderia querer prejudicar os Potter? Harry não tinha dinheiro, mas talvez possuísse algum seguro. Ou quem sabe mantivesse alguma conta em um banco da Suíça.
O coração de Hermione batia, disparado, enquanto ela tentava relaxar os pulsos. Deixara-os deliberadamente tensos enquanto era amarrada, um velho truque que seu professor de caratê ensinara. Agora, com os pulsos relaxados, as cordas estavam bem mais frouxas. Tinha chance de conseguir soltar-se, mas precisaria de tempo e de muita concentração.
Depois, pensaria em uma forma de escapar. Se o iate estivesse ancorado próximo da praia, conseguiria fugir a nado. Mas, se houvesse correnteza, na certa seria arrastada para alto-mar.
Mas não perderia tempo se preocupando com isso. Primeiro, precisava se soltar, só então encontraria um modo de se safar.
Agora, só precisava de sorte. De muita sorte.
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N/A: Obrigada por todos os comentários!
Comentem que o próximo capítulo sai mais rápido! xD
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