Capítulo 5



Rony chegou três dias depois. Hermione encontrou–o no aeroporto em Cancun, amarrotado e de péssimo humor.
— Professores ingleses! Julgam-se superiores, sabichões! — resmungou ele pouco depois.
— Alguns de fato são — comentou Hermione. — Conheci um que falava cinco idiomas e possuía memória fotográfica.
— Pois o meu velho professor Blake não conseguia sequer lembrar onde estacionava o carro.
— Sei como ele devia se sentir... — disse ela, olhando em torno, tentando localizar o carro que deixara no enorme estacionamento.
—Mione, não vá me dizer que... Ela ergueu o chaveiro.
— As chaves estão aqui. Só não consigo lembrar onde parei o automóvel. Mas vamos indo. No caminho eu me lembro. Fez um bom vôo?
— Foi irritante. O tal professor inglês que sentou ao meu lado contradisse todos os meus comentários.
Hermione precisou se conter para não lembrá-lo da mania que tinha de fazer o mesmo com ela.
— Aqui é sempre assim, esse calor infernal? — queixou-se o recém-chegado. — No hotel deve ser mais fresco.
— Não muito, mas é equipado com ar-condicionado central. E na praia há sempre uma brisa soprando do oceano.
— Assim espero, porque não suporto calor. Tudo o que eu queria era encontrar uma biblioteca e a sociedade histórica local. Falo espanhol e não será difícil me comunicar.
— A maioria das pessoas aqui não fala espanhol, e sim o dialeto maia. — Hermione sentiu-se culpada ao ver a decepção estampada no rosto de Rony. — Mas quase todos falam inglês. Você se sairá bem.
— Havia uma ruiva no avião que não parou de falar durante a viagem. Só espero que não fique hospedada no Sheraton. Sabe como chegar lá?
— É fácil. Fica perto de casa. Aluguei o carro por um mês e poderei levá-lo a todos os lugares.
— Não é perigoso dirigir aqui?
— Não mais do que em Chicago. Veja. Lá está o hotel!
— Julguei que seu irmão viesse — comentou ele.
— Kurt foi passar o dia na casa de uma amiguinha e eu não quis estragar o programa — Hermione mentiu.
Na verdade, Kurt recusara-se terminantemente a ir ao aeroporto. Rony não era uma de suas pessoas favoritas.
— Continua rebelde?
Hermione detestava quando ele sorria daquele modo, cheio de presunção. O fim de semana prometia ser um grande fiasco.
Kurt tratou Rony polidamente, mas apenas isso. Passava a maior parte do tempo na praia, com Carly, evitando permanecer em casa, onde o "namorado" de Hermione espalhava seus preciosos manuscritos. Eram todos em espanhol. Espanhol antigo.
— Este é do século dezesseis... — resmungava Rony, sentado no tapete da sala, com folhas de papel amareladas espalhadas pelo sofá e pelo chão. — Alguns são tão arcaicos que é impossível traduzir.
Sentada em uma das poltronas, Hermione pesquisava, num livro de medicina, novos métodos de envenenar seus vilões.
Carly e Kurt retornaram da praia acompanhados do pai da menina. Os garotos tinham os rostos afogueados e pareciam constrangidos.
— Lembra-se da mangueira que comprei? —Harry entrou perguntando e olhou em torno, para a desordem da sala.
— Sim, claro... — disse Hermione calmamente.
— Pois peguei esses dois com um facão afiado cortando-a em pedacinhos.
Hermione olhou para o irmão com ar de reprovação.
— Onde foi que vocês conseguiram o facão? — perguntou. Antes que o garoto pudesse responder, Rony levantou-se e interferiu, os óculos na ponta do nariz:
— Eu avisei que sozinha você não consegue segurá-lo.
— Kurt não é para ser "segurado". Não é um objeto — respondeu ela, impaciente.
Harry observava a cena com curiosidade e Hermione lembrou-se de que precisava apresentá-los.
—Rony, esse é o sr.Potter, pai de Carly, amiguinha de Kurt. — Em seguida voltou-se para Harry. — Ronald Weasley, professor de história antiga na universidade de Indiana e amigo da família.
— Muito prazer... — disseram os dois homens.
— História antiga? Que período exatamente? — perguntou Harry.
— Renascentista — respondeu Rony, segurando a cópia de um antigo manuscrito espanhol. — Estou pesquisando esses textos...
Harry interrompeu-o ao pegar a folha de sua mão. Pôs se a examiná-la.
— E parte de um diário. Muito parecido com aquele que Bernal Diaz escreveu ao vir pela primeira vez ao Novo Mundo, com Cortez.
— Isso mesmo! — exclamou Rony, impressionado.
— Mas não deve ser dele. Esse texto tem conexão com os maias, não com os astecas. — Começou a ler o texto em voz alta, traduzindo-o sem dificuldade para o inglês. — Quem será que escreveu isso? — perguntou, voltando-se para Rony quando terminou de ler.
O professor pareceu acordar de um transe; estivera ouvindo, fascinado.
— O autor é desconhecido — respondeu Rony. — Porém escreve como se fosse um religioso, não acha? Como conseguiu traduzir o que está escrito? Alguns desses verbos são obsoletos.
— Minha mãe era espanhola — informou Harry. — Nasceu em Vailadoid, onde se fala um dialeto que desde a Renascença vem passando de geração em geração, quase sem mudanças. .
— Vailadoid! Isabella e Ferdinando se casaram lá, em 1492. Uniram seus reinos com isso e expulsaram os mouros da Espanha — explicou Rony. — Conhece a região?
— Sim — respondeu Harry. — Tenho primos que ainda vivem lá.
Aquilo era, fascinante. Hermione fitou Harry com curiosidade e corou ao encontrar seus olhos brilhantes.
— Bem, agradeço a ajuda — disse Rony. — Gostaria que traduzisse outras páginas, claro, se tiver algum tempo disponível.
— Lamento, mas estou de partida para Nova York. Meu vôo sai amanhã bem cedo — respondeu Harry. — Devo retornar à noite. Vim perguntar se Mione poderia hospedar Carly enquanto eu estiver fora.
Era a primeira vez que ele abreviava seu nome. Hermione emocionou-se.
— Claro, será um prazer — concordou ela. — Garanto que nos divertiremos bastante.
— Você é muito gentil. Virei trazê-la pela manhã, a caminho do aeroporto. Será bem cedo.
— Foi muita sorte ter conseguido passagem num fim de semana — comentou Rony.
Harry deu uma risadinha.
— Felizmente eu não tenho esse tipo de problema. Possuo um Learjet. Preciso ir agora. Vejo vocês pela manhã.
— Está bem. — Hermione levantou-se e acompanhou-o até a porta.
— Fique tranqüila. Tirei o facão deles e escondi — informou Harry, olhando para os garotos, sentados na varanda. — Mas não os perca de vista. Que malucos, estragar uma mangueira novinha!
— É...
Atrás deles, Rony estava atento ao que lia, aparentemente esquecido de que não se encontrava sozinho.
— Dedicado ele, não? — indagou Harry.
—Rony é apaixonado por história. Eu também gosto, mas meu período favorito é o vitoriano. Não ligo muito para o que houve antes disso.
Uma brisa leve soprou, vinda de alto-mar, e Hermione distraidamente afastou da testa uma mecha de cabelo. Harry não perdeu o movimento e, por um instante que pareceu uma eternidade, ficou apenas olhando para ela.
— Você fala espanhol como um nativo... Estudou o idioma? — perguntou ela, mais para romper o silêncio.
— Sou nativo, embora não pareça. Quanto a estudar... Estive muito ocupado na juventude para ir além do colegial. Mas possuo um certificado que é equivalente a um diploma de curso superior. — Tocou-lhe o rosto. — Como vê, não sou nenhum acadêmico. Aprendi o que sei com a vida.
— Você é um gênio em sua área de trabalho. Alguém que cria softwares como os seus só pode ser muito inteligente. Sua família era abastada?
O comentário o pegou desprevenido.
— Eram pessoas simples. Consegui cada centavo sozinho. Na verdade, srta. Enigmática, meu pai era operário. Tive que deixar a escola e ir trabalhar para sustentar minha irmã quando ele adoeceu e morreu. Eu tinha apenas dezessete anos. Minha mãe já era falecida.
— E chegou tão alto sozinho?
Harry deu uma risadinha.
— Sou do tipo viciado em trabalho. Não percebeu ainda?
Ela assentiu.
— Notei também que você é inteligente.
— Me bajulando, para o caso de eu ficar rico novamente? — perguntou ele, num tom debochado.
— Pareço alguém para quem o dinheiro tem alguma importância?
— As mulheres são diabólicas e sabem tramar as coisas. Você poderia parecer um anjo e, no fundo, não passar de uma mercenária.
— Obrigada pelo elogio — disse Hermione, com o orgulho arranhado. Virou-se para entrar.
Harry puxou-a de volta, levou-a para fora e fechou a porta.
— Seu amigo é acadêmico. É por isso que gosta tanto dele? Quanto a mim, mal tenho um diploma de segundo grau.
— 0 que isso poderia importar? Somos vizinhos de praia, passando as férias de verão e nada mais — retrucou ela.
— Mas eu gostaria de ser muito mais do que isso — murmurou ele, os olhos fixos nos lábios sensuais.
O vento soprando do oceano agitava os cabelos de Hermione, e a surpresa tornou seu rosto ainda mais corado, enquanto os arregalados olhos verdes pareciam absorver cada raio de sol de fim de tarde.
A presença daquele homem desencadeava reações estranhas nela, como se fossem uma corrente elétrica que a percorresse rapidamente. Era uma sensação deliciosa.
De repente, ele roçou levemente os lábios nos dela.
— Agradeço-lhe por concordar em ficar com Carly. Espero algum dia poder retribuir.
— Ora, não é nenhum sacrifício.
— Gosta de estar rodeada de crianças, não é?
— Adoro — respondeu ela, sorrindo.
De repente, Harry respirou fundo e disse, fazendo um gesto em direção à porta:
— Não durma com ele.
— Dormir com ele?
— Nem com mais ninguém.
E envolveu a boca de Hermione antes que houvesse tempo para protestos. Soltando um grito abafado, ela tentou escapar, levando aos mãos ao peito forte para empurrá-lo. Ele, porém, não teve a menor dificuldade em dominá-la.
Ela pensava em Rony, ou nas crianças, saindo para o terraço e vendo-os juntos. No entanto, quanto mais os lábios dele se moviam nos seus, saboreando-os, provocando-os, menos ela oferecia resistência.
As mãos relaxaram no peito largo e subiram até os ombros, para juntar-se por trás do pescoço. Ah, era muito bom sentir aquelas carícias...
De repente, Harry interrompeu o beijo e afastou-se.
— Eu queria não tê-la conhecido — sussurrou. E em seguida se foi, deixando-a atônita.
Carly e Kurt eram adoráveis, mas pareciam empenhados em encontrar novas formas de irritar Rony, desde ouvir música a todo volume enquanto ele tentava estudar seus manuscritos, até jamais deixá-lo a sós com Hermione.
Isso sem falar em outro fato que a preocupava. O rapaz suspeito tornara a aparecer na praia. Não se aproximou da casa, porém permaneceu ali toda a manha, sentado dentro do carro, observando tudo com a ajuda de binóculos. Mais uma vez Hermione resolveu enfrentá-lo, mas, ao se aproximar do veículo, ele ligou o motor e foi embora.
A situação a deixava com os nervos à flor da pele. E, para piorar, já fazia algum tempo que não recebia notícia dos pais. Tentou falar sobre suas preocupações a Rony, mas ele nem a ouviu, empolgado com a descoberta que fizera de uma referência a Chinchen Itza em um dos manuscrito. Agora, só o que lhe importava era ir para lá.
— Há uma excursão de ônibus até as ruínas, mas lhe tomará o dia inteiro e só retornará tarde da noite.
— Não importa. Tenho o sábado livre. Por que não vamos todos?
— Não seria conveniente levar Kurt para uma viagem tão longa. Ele ainda está se recuperando.
— Tem certeza? E uma oportunidade única e não posso perdê-la. Quero muito conhecer os templos e as inscrições feitas pelos maias.
— Lamento, mas não poderei ir. Vá você. Tenho certeza de que se divertirá.
— Sério? Você não se importa? — perguntou ele timidamente.
— Claro que não. Vá em frente.
— Obrigado. Sabia que compreenderia.
E quando foi que ela fez outra coisa? Rony não se importava em deixá-la sozinha! O fato era que ele estava determinado a fazer somente o que lhe agradava. Sem saber por que, Hermione lembrou-se da voz profunda de Harry Potter traduzindo o elegante espanhol do antigo manuscrito para o inglês. Até mesmo Rony ficara impressionado, o que não era muito comum.
— Gostei do seu vizinho. Engraçado, seu rosto me pareceu familiar... — comentou ele de repente.
— Não tem lido os jornais? Já ouviu falar de Harry Potter? Criador do programa Chipgrafix?
— E isso! Harry Potter! Imagine só, uma mente brilhante como aquela! Se eu tivesse passado por ele na rua, nem o reconheceria. Mas Potter me faz lembrar outra pessoa... Já sei! O ator que interpreta o alienígena naquela série de ficção.
— Não os acho parecidos.
— Mas a voz é a mesma. Clara e agradável.
Hermione não esperava que Rony fosse se tornar fã de Harr Potter. Supostamente, devia sentir ciúme. Suspirou, desalentada. Nada estava saindo conforme planejara.
Ela passou o sábado trabalhando, embora atenta às crianças. Rony havia embarcado num ônibus do hotel, bem cedo, e retornaria tarde da noite. Apareceu em sua casa no domingo, a caminho do aeroporto.
— Eu me diverti como nunca em Chichen Itza — disse ele. — O único aborrecimento foi ter encontrado a bruxa ruiva na excursão. Infelizmente ela voltará no mesmo vôo. Espero que a coloquem sentada sobre a asa do avião. Sabe tudo sobre a cultura maia e fala espanhol fluentemente — acrescentou, desgostoso. — E formada em inglês e arqueologia. Uma exibicionista.
— Casada?
— Creio que não. Quem seria o maluco que se casaria com aquela presunçosa? Começou a ler as inscrições na rocha antes que o guia fizesse isso.
— Ah, é?
Hermione sorriu, educadamente.
— Mas foi uma viagem maravilhosa — continuou ele. — Ainda bem que me convenceu a vir. Obtive um excelente material para meus alunos, e tirei várias fotografias da região. Pensei em fornecer algumas para o departamento de arqueologia. Acha que seus pais teriam interesse nesse material?
Hermione não quis decepcioná-lo dizendo que, provavelmente, eles já teriam material suficiente.
— Deve perguntar-lhes — sugeriu.
— Farei isso. Bem, vejo você em Bloornington, quando for visitar seus pais. Alguma novidade sobre eles?
— Nada. Começo a me preocupar.
— Relaxe. Mais cedo ou mais tarde darão notícias. Bem, preciso ir, ou vou acabar perdendo meu vôo. Foi bom tornar a vê-la. Você tinha razão, eu estava precisando mesmo de uma folga.
Deu-lhe um ligeiro beijo no rosto e apressou-se em direção ao táxi que deixara à espera. E isso foi tudo.
A tarde, as crianças assistiam ao torneio de surfe, na praia, enquanto Hermione lia um artigo sobre medicina legal. Uma batida repentina à porta a fez erguer os olhos da revista. Seu coração disparou ao deparar com o pai de Carly à porta. Usava calça clara de brim e camisa de malha escura, mostrando a quem quisesse ver que se encontrava em perfeita forma física.
— Carly está? — perguntou, sem cumprimentá-la. Hermione continuava magoada com as palavras duras que ele lhe dirigira antes de viajar.
— Estão assistindo ao torneio de surf, aqui perto. Mas não se preocupe, recomendei-lhes que não saíssem de lá.
Harry foi até a varanda, protegeu os olhos com a mão e olhou para a praia.
— Posso vê-los daqui. De fato, estão sentados na areia, admirando as manobras dos surfistas.
— Eu não disse para não se preocupar?
Ele retornou à sala e olhou em torno.
— Onde está seu namorado?
— Acaba de passar por aqui, rumo ao aeroporto.
— Pena ele precisar ir embora... — disse Harry, irônico.
— De fato. — Hermione não conteve um sorriso. Harry olhou para a tela do computador e notou o processador de textos ligado.
— Você ainda usa esse velho processador? Está totalmente obsoleto. Não se decidiu pela nova versão?
— Ainda não. Custo a me adaptar a um programa novo — respondeu ela, rindo. — Para você, não deve haver problema. Eu não conseguiria criar um software nem que minha vida dependesse disso.
— E por que não?
— Porque nada entendo de números, nem de máquinas — explicou ela honestamente. — É preciso ter dom. Como foi que você descobriu essa sua habilidade?
— Mexendo com computadores. Trabalhei com dois homens que haviam sido funcionários da NASA e que trabalhavam em programas espaciais. Ensinaram-me tudo o que sabiam e mais tarde fundamos uma companhia juntos. Logo comprei a parte deles e fui em frente por conta própria.
— Sinceramente, eu o admiro.
— E você? O que faz com seu diploma de faculdade? Leciona, como seus pais?
— Não.
— E por que não? É feliz como tradutora eternamente explorada pelo patrão?
Hermione lembrou-se da história mentirosa que inventara sobre sua profissão.
— Bem, hoje em dia um diploma não tem muito valor. Conheço um rapaz que é doutor em psicologia e que abriu uma pizzaria.
— Ah, sei. Diga uma coisa: com que velocidade você consegue digitar? — perguntou ele, recostando-se à parede e cruzando os braços diante do peito.
— Cerca de cem palavras por minuto.
Harry assobiou.
— Muito bom! Se eu conseguir o empréstimo de que preciso para me reerguer, quero que venha trabalhar comigo.
— Agradeço, mas...
— Pense nisso. Vou avisar Carly que cheguei.
— Você descobriu alguma coisa sobre o homem que anda rondando por aqui? — Hermione quis saber.
— Não.
— Seria bom investigá-lo.
— Ele tornou a aparecer?
— Tem estado por perto e confesso que me deixa inquieta.
— Lamento. Verei o que posso fazer.
— Obrigada.
Hermione olhou para o computador, com o processador de texto sem uma palavra escrita.
— Está muito ocupada?
— Bastante.
Harry estendeu-lhe a mão.
— Venha comigo. Vou ver Carly. O trabalho pode esperar.
— Bem...
Ela sorriu, tentada a aceitar. E por que não? Afinal, era apenas um passeio.
— Comigo você estará segura — disse ele ao vê-la hesitar.
— Vamos dar as mãos, como velhos amigos, e fingir que nos conhecemos há anos.
Desceram os degraus do terraço e caminharam na areia úmida.
Kurt lançou-lhes um olhar curioso, ao vê-los de mãos dadas. Acenou, sorriu e continuou pegando conchinhas. Carly se encontrava mais adiante, junto com outras menina da sua idade. Ainda não vira o pai.
— Quando seus pais pretendem voltar? — indagou Harry.
— Quem é que sabe? — respondeu Hermione, desanimada.
— O trabalho para eles é tão envolvente que não percebem o tempo passar. Estão lá agora, lidando com antigos tesouros maias, sem ninguém para protegê-los. Eu me preocupo com os ladrões.
— Ladrões? Você quer dizer... colecionadores?
— Melhor dizendo, intermediários, pessoas que roubam tesouros arqueológicos e vendem no mercado negro. Muitas vezes agem a mando de um único comprador. Essa nova descoberta arqueológica parece muito valiosa. Só espero que tenham cuidado.
— Sua mãe não devia estar aqui, cuidando de Kurt?
Hermione sorriu.
— Você não conhece meus pais. São como duas crianças. Ainda jovem, eu me tornei a pessoa mais velha da família. Passei a cuidar de Kurt... e deles.
— Você devia se casar e cuidar dos próprios filhos — sugeriu Harry, acariciando-lhe sensualmente a mão.
Antes de conhecer aquele homem, Hermione jamais havia pensado naquela possibilidade. Mas, ao sentir-lhe a força, a atração que lhe despertava, pensou emocionada em ter um filho dele.
Involuntariamente, aproximou-se mais, ansiosa pelo calor de seu corpo.
Harry soltou-lhe a mão e segurou-a gentilmente pelos ombros.
— Tenho quatorze anos a mais do que você e nada possuo para lhe oferecer. Sou um homem pobre.
— Isso não me perturba. Considero o dinheiro apenas um meio de sobreviver.
— Não deve pensar assim. Somos dois estranhos unidos pelas circunstâncias e longe do ambiente natural. Confesso que a acho extremamente atraente, mas tenho os pés no chão.
— Entendo... Então o que sugere que façamos? Harry soltou-lhe os ombros e pegou suas mãos outra vez.
— Agir como velhos amigos. Gostamos da companhia um do outro, nos divertimos juntos e ponto final. Nada formal, nada permanente. Apenas amigos.
Hermione sorriu.
— Gostei.
Naquele instante, Carly os avistou e aproximou-se correndo.
— Papai! — exclamou, pegando a mão do pai ao alcançá-los. — Que bom que está de volta! Fez boa viagem? — Olhou em torno. — Viu aquelas mantas? São lindas! Eu gostaria de comprar uma delas, mas não sei falar espanhol. Pode me ajudar?
— Claro.
Aproximaram-se da vendedora e Carly apontou para uma das mantas, trabalhada em tons de azul e vermelho. Harry falou espanhol tão bem que Hermione deliciou-se ao ouvi-lo. Comprou a peça e entregou-a à filha.
— Obrigada, papai! Gostei da manta, mas não conseguia me fazer entender.
— Preciso lhe dar algumas aulas de espanhol.
— Ótimo! Quero aprender. Vou mostrar a Kurt — avisou Carly, afastando-se. Antes de desaparecer, gritou por sobre o ombro: — É bom vê-lo de volta!
— Ela é uma criança adorável.
— Sim, é. Pena que precisa dividir-se entre o pai e a mãe. Agora terá de conviver com um padrasto, que é "carinhoso" demais para o meu gosto. Faço o possível para que minha filha veja a mãe na ausência dele.
— Mas um encontro é inevitável.
— Sei disso. Tive uma longa conversa com o sujeito. Agora ele sabe do que sou capaz e vai manter as mãos longe da minha filha. Duvido de que queira arriscar o pescoço. Marie quer a custódia e tem sido muito insistente. Já lhe disse o que penso, e ela sabe o que farei se continuar falando nisso. Posso não ter dinheiro, mas ainda tenho influência.
Hermione sorriu.
— É verdade que os homens com sangue latino são temperamentais e passionais?
— Se não fôssemos apenas velhos amigos, eu lhe mostraria quanto.
— Ainda bem que somos. Velhos amigos, quero dizer.
— Claro.
Caminharam pela praia, satisfeitos com a companhia um do outro. Hermione concluiu que nunca fora tão feliz.
Quando voltaram para casa, ela começou a subir os degraus de entrada quando Harry avisou:
— Viajarei para Miami amanhã.
— Outra vez? Mas você acabou de chegar de Nova York!
— Não é fácil tentar me reerguer. Irei ao encontro de um grupo de investidores em potencial. Carly vai comigo. Você e Kurt não gostariam de nos acompanhar?
Hermione pensou em recusar o convite, mas sabia que Kurt jamais a perdoaria se o privasse de um vôo até Miami num jatinho particular.
— Haverá lugar para todos nós no avião?
— Claro. O aparelho acomodaria perfeitamente mais quatro pessoas.
— Seu piloto é de confiança?
— Eu sou o piloto, mas não se assuste. Sou habilitado e tenho muitos anos de prática. Não cairemos.
— Eu não quis dizer isso — rebateu ela, constrangida.
— E então? Irá comigo?
— Sim, irei. Kurt adora aviões e jamais me perdoaria se eu recusasse o convite.
— Então, está combinado. Pego vocês de manhã.
— Obrigada.
— De nada — murmurou ele, os olhos estreitados ao fitá-la. Olhou para a praia e viu os dois garotos absortos na construção de um castelo de areia, perto da manta recém-comprada, pela qual Carly parecia já ter perdido o interesse.
— O que foi? — perguntou Hermione ao vê-lo hesitar.
— Nada. Eu só queria responder a pergunta que me fez há pouco sobre os latinos... — sussurrou ele, abraçando-a com força. E mal concluindo a frase, beijou-a.
Não foi um leve roçar de lábios. Beijou-a com ânsia. Precionando a boca na dela com desejo, devorando-a, possuindo-a, roubando-lhe o alento.
Hermione retribuiu com paixão. Passara o dia na expectativa daquele momento. Tinha antecipado as emoções intensas, o êxtase, o prazer, que o beijo lhe proporcionaria. Harry lhe sorveu os lábios como se houvesse esperado a vida inteira por aquele instante.
Quando o contato terminou, ele afastou-se para fitá-la nos olhos.
— Você é muito inocente para uma mulher da sua idade. Não vou mais fazer isso — prometeu seriamente. — Não me julgava tão vulnerável. Me perdoa?
— Sim... — Hermione assentiu, as pernas trêmulas e a cabeça girando.
— Vejo você e Kurt pela manhã.
Hermione tornou a assentir.
Harry piscou e afastou-se, aparentando despreocupação.
Mas, por dentro, um turbilhão de emoções o dominava. Não devia brincar com os sentimentos daquela mulher, tão jovem e inocente. Hermione não era do tipo moderno e sofisticado, com quem estava acostumado a sair. Era do tipo que se casaria virgem. E vivia num mundo totalmente diverso do dele.
Talvez casar-se não fosse má idéia. Mas já não fizera isso uma vez? Embora Hermione fosse o sonho de qualquer homem, no momento era mais sensato concentrar-se na recuperação da fortuna perdida. O amor podia esperar.


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N/A: Obrigada a todos que comentaram! Espero que continuem comentando! Rsrsrs

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