Capítulo 3



Dois dias depois, Hermione estava concentrada no trabalho quando Carly entrou pela varanda.
— Vamos dar uma festa! — anunciou a garota, quase sem fôlego. — E vocês estão convidados.
Hermione lançou-lhe um olhar ausente, a mente ainda no desenrolar da trama principal da novela.
— Oh, desculpe! — exclamou Carly, sabendo que os escritores não conseguem voltar de imediato à realidade quando estão concentrados e são interrompidos.
Não obteve resposta, deu de ombros e foi procurar Kurt.
— Quem virá a essa festa? — perguntou ele assim que a garota o encontrou na praia.
— Alguns amigos de papai. Mas ele concordou que eu convidasse você e Hermione. Sente-se culpado por me deixar tanto tempo sozinha e às vezes atende um de meus pedidos. — Sorriu de modo travesso.
— Você o chantageou, não foi?
— Exatamente! — admitiu a menina.
— Se garantir que haverá coisas gostosas para comer eu irei, mas duvido que Hermione queira ir. Não gosta de festas e, além disso, há o seu pai. Ela o acha ranzinza.
— Então é recíproco, porque ele também não gosta de sua irmã. Mas não é motivo para não serem civilizados um com o outro numa festa.
— Não tenho tanta certeza disso.
— Garanto que ele se portará bem. Sabe que meu pai lê os livros dela? Não sabe que é Diane Woody porque eu não disse, mas comprou todos os seus livros.
— Será que ele nunca reparou na foto de Hermione em todas as contracapas?
— Para ser sincera, a mulher daquele fotografia não se parece nem um pouco com Hermione. Nem eu a reconheci.
— Ela prefere não ser reconhecida — confidenciou Kurt. — Adora escrever, mas detesta publicidade.
— Por que será?
— Timidez, dá para acreditar? — indagou ele, rindo. —-Vive fugindo das entrevistas e das noites de autógrafos. No início da carreira, essa atitude deixava o editor maluco. Mas ele se convenceu de que essa excentricidade daria bons lucros e ela se tornou uma mulher misteriosa. Ninguém sabe muito a seu respeito, e esse mistério em torno de sua identidade fascina o público que compra seus livros.
— Adoro o estilo de sua irmã.
— Eu também, mas não digo a ela. Não quero que fique convencida.
— Hermione tem namorado ou algo parecido? — perguntou Carly, abraçando os joelhos, o olhar perdido no mar.
— Sim, se é que se pode chamar aquilo de namoro. Ele é professor universitário e ensina história antiga.
— Será que vão se casar?
Kurt deu de ombros.
— Espero que não. O cara é legal, mas acha que Mione devia ser menos extrovertida e alega que ela não se dá valor. Eu não acho e gosto da minha irmã do jeito que é, sem precisar mudar nada.
— Ele deve ser um tolo.
— E do tipo conservador. Boa pessoa, mas conservador. Não creio que aprove o estilo de vida de meus pais. São um pouco excêntricos.
— O que eles fazem?
— São arqueólogos — respondeu o garoto. — Lecionam na universidade de Indiana. Moramos em Bloomington, mas Mione mudou-se para Chicago. Ela também é diplomada em história. Com tudo isso, creio que não terei alternativa a não ser freqüentar uma universidade. Confesso que não tenho a menor vontade.
— E o que pretende fazer?
— Quero voar — respondeu ele, olhando para o céu.
— Podemos grudar algumas penas em você... — Carly riu da própria sugestão.
— Quero pilotar aviões, helicópteros, qualquer coisa com ou sem asas. Está em meu sangue. Adoro tudo o que é relacionado à aviação.
Ficaram em silêncio por um momento.
— Vai tentar convencer Mione a vir à festa? — finalmente Carly indagou.
— Prometo fazer o possível, mas não espere milagres.
Kurt ameaçou ir sozinho, caso a irmã se recusasse a acompanhá-lo. E pensar no garoto sozinho na festa inquietava Hermione. Sempre evitara os eventos sociais e jamais freqüentara a alta-roda. Sabia que muitos milionários exageravam na bebida e alguns até usavam drogas.
Agora, seria jogada no meio deles. Ou pelo menos era o que imaginava. Na verdade, não fazia idéia de que seriam os amigos de Harry. Mas talvez estivesse exagerando. Talvez se tratasse de pessoas comuns e simpáticas.
Não levara na bagagem um traje apropriado para festas. No entanto, habilmente improvisou um. O vestido preto, usado com sapatos de saltos altos, meias finas e o conjunto de colar e brincos de pérola que ganhara dos pais, ficou bastante elegante. Escovou o cabelo até que adquirisse um brilho intenso e foi pegar a pequena bolsa de couro preto.
— Por que não me avisaram sobre a festa antes? Assim, eu teria comprado uma roupa mais adequada — queixou-se ao irmão. — Odeio você!
— Estou certo de que vai adorar, e me dará razão quando ver Harry Potter muito bem-vestido, recebendo os convidados.
— Já o vi bem-vestido.
— De acordo com Carly, parece que as mulheres o acham bonitão. Pelo menos as de Chicago, que se atiram sobre ele como abelhas no mel. Especialmente agora, que se tornou um homem livre.
— Eles moram em Chicago? — perguntou Hermione, fingindo desinteresse.
— É onde passam a maior parte do tempo. Mantêm também um apartamento em Nova York, no centro de Manhattan.
Hermione suspirou.
— Por mais que ele possa se esforçar, não creio que volte ser tão rico como era.
— Que tal sair agora? — sugeriu Kurt, olhando para o relógio.
— Vamos. Saiba que estou indo a essa festa contra a minha vontade.
— Vai se divertir. Ninguém sabe quem você é.
Hermione se animou.
— Confesso que não tinha pensado nisso.
Kurt abriu a porta com uma leve reverência e os dois se dirigiram à residência dos Potter. A casa estava toda animada, e uma música suave ecoava na noite enluarada. Algumas pessoas, elegantemente trajadas, conversavam e bebiam seus drinques.
Kurt, alheio a esses detalhes, apressou-se procurar a amiga. Carly usava um vestido curto, de cintura baixa, que provavelmente teria custado mais do que todo o guarda-roupa de verão de Hermione.
Ao alcançar a escada do terraço, ela parou e apoiou-se no corrimão. Tirou um dos sapatos e tirou areia de dentro.
— Precisa de auxílio? — perguntou uma familiar voz aveludada. Um braço forte rodeou sua cintura, apoiando-a. - Deixe-me ajudá-la. — Harry abaixou-se e colocou-lhe o sapato no pé com uma sensualidade que a fez tremer.
Em seguida, ergueu o corpo devagar, fitando-a intensamente. Não sorria, e, por um momento interminável, simplesmente se fitaram.
— Já notei como seus convidados são elegantes, e nem tive tempo de comprar um vestido adequado — explicou ela, quase sem fôlego.
— O que há de errado com esse que está usando? — perguntou ele.
E, com a ponta dos dedos, traçou o contorno do decote, roçando-lhe levemente a pele. O contato a fez estremecer.
— A casa está cheia... São todos seus amigos? — indagou ela, afastando-se.
— São. Mas, nesse exato momento, eu gostaria que estivessem a quilômetros daqui — murmurou Harry num tom profundo.
— Está tentando me seduzir, sr. Potter? — perguntou Hermione, nervosa. — Provavelmente seria bastante eficaz com outra mulher, mas eu sou imune. Você é um homem importante, um milionário, e sou uma simples tradutora.
Harry levantou a mão e riu.
— Quanto a ser milionário, isso é coisa do passado. Atualmente, sou apenas um homem comum tentando vencer no mundo dos negócios. E saiba que parei de seduzir garotas há muito tempo. Mas agora venha conhecer meus convidados.
Seus dedos era fortes e quentes, fazendo-a ser assaltada por emoções desconhecidas. Que diabos estaria acontecendo?
Como a sentisse hesitar, Harry pegou-lhe a mão e entrelaçou os dedos nos dela. Ao alcançarem o topo da escada, uma bela jovem, da idade de Hermione, veio ao encontro deles com uma taça de champanhe na mão. Sorria, mas seu sorriso gelou nos lábios ao deparar com Harry de mãos dadas com outra mulher.
— Aqui está você! Creio que não conheço sua amiga — disse ela, fitando Hermione.
— Provavelmente não. Hermione Granger, esta é Missy Elliger, filha de um velho e grande amigo.
— Não tão velho, querido — disse ela, aproximando-se. Olhou para Hermione e perguntou: — Você mora aqui?
— Não. Vivo na Califórnia, em uma comunidade na qual a população é oitenta por cento masculina.
A outra mulher ficou sem ação.
— Comporte-se — disse Harry, apertando-lhe os dedos. — Esta é Hermione Granger. Está em Cancun passando férias com o irmão caçula, Kurt, que é amiguinho de Carly.
— Sei... — Missy pigarreou. — Que coisa mais estranha para dizer, senhorita... Grangrer?
— Granger — corrigiu-a Hermione. — Por que acha estranho?
— Bem, viver numa comunidade...
— Atualmente, é mais um campo de trabalho — disse ela, dando de ombros. — E para lá que enviam prisioneiros políticos. Andei fazendo umas declarações contra o governo...
— Nos Estados Unidos? — perguntou Missy.
— Não! Nos Bálcãs. Nem me lembro qual país. Bósnia? Ou seria Croácia?
Missy tomou seu champanhe de um gole só. Em seguida, lançou a Harry um olhar revelador.
— Com licença... Preciso falar com Draco Malfoy — disse, e afastou-se.
Hermione olhou para Harry, que se controlava para não rir.
— Nada mau para uma história inventada em cima da hora, não acha?
— Sua maluca!
Bem, ele não era tão ranzinza quanto Hermione pensava.
— Essa moça está interessada em você.
— Sei disso — respondeu ele. Depois, levantou a mão que segurava a dela. — E por isso que estamos de mãos dadas. Para ver se Missy desiste.
Todas as ilusões de Hermione desmoronaram.
— Então, sou seu álibi?
Ele riu, pressionando-lhe os dedos.
— De certa forma sim, e espero que não se importe. Afinal, para que servem os amigos? E pode ser que um dia eu faça o mesmo por você.
— Agradeço, mas não estou precisando — respondeu ela, tensa, — Mas você pode ter a mulher que desejar. Li um artigo a seu respeito numa revista.
— Eles exageram. E eu não quero saber de mulheres por enquanto. Acabo de me divorciar e pretendo aproveitar minha liberdade — respondeu ele com uma voz mais reveladora do que a frieza de seu olhar.
— Azar de sua ex-esposa. Vai se maldizer quando você conseguir tudo de volta.
— Não, não vai. A magia acabou durante o segundo ano de casamento. Ficamos juntos por causa de Carly, mas costumávamos nos afastar durante meses. Era uma união apenas no papel. Mas agora ela está feliz com o novo marido, e eu estou mais feliz ainda sozinho. — Olhou para o mar, pensativo. — 0 único elo é Carly. Terminamos com a custódia conjunta, e isso não a agradou muito. Ela desejava a custódia total.
— E Carly, o que pensa de tudo isso?
— Gosta de ficar a meu lado e de viajar comigo — disse ele. —- E está aprendendo coisas que dificilmente aprenderia na escola que Marie desejava que freqüentasse. Tirei-a de lá justamente para que não ficasse com a mãe, que andou fazendo ameaças sobre querer mais dinheiro.
— Mas a educação é importante.
— E Carly vai recebê-la. Está perdendo apenas algumas semanas de aula, mas é inteligente e em pouco tempo se atualizará. Quero que tenha mais do que um diploma, quando crescer.
— Entendo...
— Eu costumava passar muitas horas lidando com computadores e quase nenhuma com minha filha. Mesmo que não tivesse perdido tudo, precisava dar uma parada.
— Carly disse que você foi para Silicon Valley.
— Sim. Entre outros motivos, fui ver se encontrava alguém que me servisse de cobaia. — Depois, olhou para ela e fez uma careta. — Mas nem precisava ter ido tão longe. Você estava na casa ao lado...
— Eu?
— Sim, você. Preciso de alguém para testar meu novo programa — continuou ele. — Uma variação de meu antigo processador de textos, com uma configuração que o torna mais eficiente. Ainda está em fase de desenvolvimento, mas já é utilizável. O que acha?
— Bem...
Hermione não estava muito segura. Já perdera capítulos inteiros de livros tentando mudar de programa. E seu prazo para a entrega do novo trabalho estava se esgotando.
— Não precisa responder agora. Pense no assunto e depois me diga o que decidiu.
— Está bem. Só que... Bem, meu editor quer o livro para este mês. Não posso mudar de programa no estágio em que estou.
— Nem estou lhe pedindo isso.
— Bem, nesse caso acho que posso pensar a respeito.
— Ótimo — disse ele, tornando a pegar-lhe a mão. Conduziu-a até dentro de casa, apresentando-a a todos os convidados. Surpreendentemente, seus amigos eram pessoas de todas as classes sociais. Alguns, embora muitos ricos, não tinham um ar superior por causa disso. Entretanto, Missy Elliger observava Hermione com olhos frios.
— Sua amiga parece querer jogar o copo que está segurando em minha testa — comentou quando ficaram a sós.
— Missy gosta de desafios. Mas é muito jovem e mimada para mim.
— É mesmo?
— Além disso, não sou um objeto, para ser assim disputado.
— Ponto para você! — brincou ela.
— Não vai questionar minha afirmação?
— Que eu saiba, não lhe fiz nenhuma proposta nem estou na fila de suas pretendentes — respondeu Hermione, rindo. — Somos apenas vizinhos, e temporariamente.
— E se eu quiser ser mais do que um vizinho? — perguntou ele com deliberada sensualidade.
Hermione não titubeou. Sabia que Harry brincava, querendo apenas perturbá-la.
— Rony não vai gostar disso.
— Rony? Então existe alguém esperando por você na Califórnia?
Ela hesitou um pouco. Harry não acreditara na história da comunidade e tampouco acreditaria se mentisse, dizendo estar noiva.
— Rony e eu somos apenas bons amigos — comunicou, o rosto impassível.
Harry soltou-lhe a mão gentilmente.
— Você ainda não o havia mencionado.
— Não tive oportunidade — disse ela, sorrindo. — Rony é professor universitário. Leciona história medieval na universidade de Indiana, no campus de Chicago, onde meus pais dão aula de antropologia.
— Seus pais também são professores universitários? — perguntou ele, surpreso.
— Sim. Mas atualmente participam de uma expedição que explora as ruínas maias de Quintana Roo. Kurt esteve com problemas na garganta; então eles o tiraram da escola e o deixaram comigo. Posso trabalhar enquanto cuido de meu irmão.
— Suponho que também seja formada...
— Claro. Em história.
— Sei.
Ele pareceu distante. Pousou o copo na bandeja e colocou as mãos nos bolsos. Seus olhos percorriam a sala, agitados.
— E você, é formado em quê? — perguntou ela.
Fora uma pergunta errada. Harry se fechou completamente.
— Deixe-me apresentá-la aos Moore — disse ele, pegando-a pelo cotovelo. — São pessoas interessantes.
Hermione notou-lhe a frieza na voz. Sem querer, ofendera-o. Talvez ele tivesse algum preconceito contra arqueologia, ramo da antropologia no qual seus pais haviam se especializado.
Minutos depois, Harry desculpou-se e foi se juntar a Missy Elliger, a mesma que ele afirmara ser muito jovem. Pelo modo como tomou-lhe a mão, parecia ter esquecido esse pequeno detalhe.
A noite foi um desastre. Harry parecia fazer questão de ficar o mais longe possível dela. Foi educado e cortês, mas manteve-se a distância. Foi uma mudança tão radical e repentina que a deixou intrigada.
Até mesmo Carly e Kurt perceberam. Sentados na varanda, apenas observavam o que se passava na festa.
— Julgávamos que eles tivessem se entendido, mas vejo que nos enganamos — disse Kurt.
— Que pena — lamentou Carly, tentando equilibrar um prato com bolo nos joelhos.
— Mione não gosta que os homens a pressionem — comentou o garoto, fazendo uma careta. — Se dá bem com Rony porque ele não a pressiona nem vive falando em casamento. Hermione gosta de sua independência e não pretende se casar.
— Acho que papai pensa da mesma forma — admitiu Carly. — Ele e mamãe nunca estavam juntos. Ela o detesta porque não conseguiu minha custódia, mas jurou que fará tudo para consegui-la. Mas faz algum tempo que não dá notícias. Acho que me esqueceu. Papai também é um pouco esquecido, especialmente quando trabalha num novo programa.
— Ele e Hermione formariam um casal perfeito — Kurt atreveu-se a dizer. — Estariam sempre trabalhando em algo novo.
— Mas parece que não estão pensando nisso no momento — emendou Carly tristemente. — Vê como ele segura a mão de Missy?
— Antes estava segurando a de Mione, mas agora os dois andam se evitando. Adultos! Por que são tão complicados?
— Nem tente entender! Mas talvez eles precisem de um empurrãozinho. Entende?
— Pensei a mesma coisa — falou Kurt, sorrindo de modo travesso para a amiga. — Tem alguma idéia?
— Estou bolando um plano infalível!
Enquanto isso, alheia ao fato de que se tornaria uma cobaia também para os meninos, Hermione sentou-se ao lado de um casal e passou as horas seguintes ouvindo histórias intermináveis sobre a paixão dos dois por pesca submarina.


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N/A: Obrigada a todos que comentaram e votaram, espero que continuem comentando!

Desculpem qualquer erro...

bjOkss

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