Capítulo Três
Harry Potter retornou a uma das tendas e adquiriu mais um copo de bebida verde. Então acomodou-se sozinho à uma mesinha para duas pessoas e bebeu em silêncio. Ao terminar aquele copo, ele conseguiu um novo e sorveu cada gole totalmente compenetrado em seus próprios pensamentos. Na festa, uma música lenta começou a tocar e os casais se uniram para uma dança aconchegante. Harry imaginou que Neville deveria estar particularmente feliz agora, pondo em prática todo o seu talento na dança com Anna Abbott. Pensou também em Simas, satisfeito com seu belo par, Luna, e seus maravilhosos olhos azuis.
A música lenta tocava e ele estava ali, sozinho. Uma das pessoas mais famosa do mundo mágico estava se embebedando deliberadamente a uma mesa enquanto todos os outros dançavam. Até Draco Malfoy estava dançando naquele momento e, o pior, com sua antiga namorada. Harry olhou para o alto e uma lua crescente o encarou no alto do céu escuro e estrelado. Ela era branca e saudável, parecia ter grandes olhos que o espreitavam. Parecia satisfeita por ser única. Algo na lua fez com que Harry pensasse em Luna. Talvez pela semelhança dos nomes, talvez pela alvura, talvez pelo brilho. Lembrou-se de Luna dançando e imaginou-se no lugar de Simas. Se ele tivesse se aproximado da garota antes da chegada de Simas, estaria agora divertindo-se com o jeito dela e, principalmente, admirando aqueles olhos azuis. Se tivesse se aproximado de Luna, não teria se afastado dela para pegar bebida e não teria visto Gina e Draco.
Talvez Harry estivesse arrependido, mas ele não sabia se estava ou não. Possivelmente a bebida começara a mostrar-se dentro do cérebro dele e, então, olhar para a lua o estivesse deixando hipnotizado. Ele baixou o olhar e deparou-se com reais olhos grandes e azuis. Sem que ele percebesse, Luna chegou e sentou-se na mesa onde ele estava, pondo-se finalmente a olhá-lo desconfiado.
— Está tudo bem, Harry? – ela indagou.
— Sim, está – ele a fitou.
— Onde estão os outros?
— Foram para casa. Você sabe como são os casais...
— Oh, eu sei – ela deu uma risadinha.
— Pensei que estivesse dançando com Simas – Harry comentou.
— Eu estive, mas ele ficou cansado e eu, com sede – ela deu de ombros.
Harry a ofereceu sua própria bebida e ela deu um rápido gole antes de contar:
— Não gosto muito dessa bebida.
— Posso pegar uma outra para você? – Harry perguntou.
— Não, eu já não estou com sede, obrigada — Luna abriu um sorriso pérola.
— Quer dançar?
— É claro!
Eles se ergueram da mesa e caminharam até a pista de dança, no momento abarrotada de casais. As músicas românticas ainda predominavam e Harry sentiu-se particularmente feliz por isto. Puxou Luna delicadamente para perto de si e envolveu-a pela cintura com seus braços. Ela, em contrapartida, envolveu o pescoço dele com os seus braços e sorriu antes de colar seu rosto ao dele. Eles dançaram lentamente, em um mesmo compasso, em uma mesma respiração. Harry não via ninguém, a não ser um grande borrão em movimento a sua volta. Sentia, apenas. Sentia Luna unida a ele e o acompanhando na dança. Sentia seus longos cabelos loiros encostarem-lhe no pescoço e a respiração dela próxima a sua nuca.
Harry a apertou um pouco contra seu próprio corpo e sentiu o calor que emanava dela, juntamente com seu fulgor. Ele a ouviu cantarolar, baixinho, trechos da música que tocava e acabou sorrindo, pois nunca tinha ouvido a voz dela em canto e não a achou tão mal. Harry não pensava em nada, a não ser no presente. Nunca imaginou esta situação, nem em seus mais estranhos sonhos, mas estava, no entanto, sentindo-se terminantemente bem com Luna e passara a admitir um carinho muito grande por ela.
O rapaz a olhou nos olhos seriamente e ela correspondeu, demonstrando uma felicidade calma. Harry sentiu algo o atrair para mais perto e aproximou seu rosto, vendo Luna tão perto como jamais havia visto. Ela era ainda mais bonita assim, mesmo que houvesse fechado os olhos. Harry, por fim, a beijou. Beijava a lua, beijava Luna. Ela era um misto dos dois. Ela era a paz, a esperança, a amizade. Ela era linda e ele a enxergava dentro de seus pensamentos.
Assim que o beijo terminou, eles se entreolharam novamente. Luna deixou escapar um sorriso tímido, porém não menos chistoso, que Harry não conseguiu deixar de retribuir. Por quase uma hora eles permaneceram dançando devagar, trocando beijos miúdos algumas vezes e conversando coisas simples em voz baixa. Luna, sempre que não tinham assunto, cantava próximo ao ouvido dele e ele sorria sem que ela visse. Gradativamente as pessoas foram se despedindo e indo embora, a pista ficando cada vez mais vazia.
— Acho que é hora de irmos – Luna avisou.
Harry tentou encontrar um espaço em seus pensamentos difusos e acabou achando algumas idéias úteis para aquele momento. Pronunciá-las pareceu-lhe um tanto mais fácil devido à quantidade de bebida do dragão verde que ele havia ingerido naquela noite.
— Quer ir para a minha casa?
Luna o olhou com seus olhos arregalados.
— Não estou querendo dizer nada, Luna – Harry explicou. — Estou apenas te convidando para algo simples, como conhecer minha casa.
— Bem, Harry, eu não sei o que dizer...
— Apenas aceite, Luna – ele falou, a voz branda. — E confie em mim.
— Eu sempre confiei em você, Harry, e não é agora que eu irei fazer diferente – ela fez uma pausa. — Vamos à sua casa.
Juntos, eles partiram em direção às carruagens e tomaram uma, a qual dividiram com dois Corvinais que Luna conhecia e trocou algumas míseras palavras. Ao chegarem à estação de Hogsmeade eles desceram e viram muitas pessoas conhecidas.
— Espere, Harry, pois preciso avisar ao meu pai que passarei a noite fora – Luna avisou e conjurou uma lebre prateada. Disse algumas palavras em latim e despachou o patrono, que se dissipou no ar. — Eu adoro esse método – ela sorriu.
— Está pronta? – Harry perguntou e ela assentiu. — Segure em meu braço – e ela assim o fez.
Guiada por Harry, eles aparataram no Largo Grimmauld, exatamente à porta do número doze.
— É aqui? – ela indagou.
— Sim – e Harry abriu a porta.
Luna entrou primeiro, olhando tudo a sua volta com expressão admirada. Harry parou ao lado dela e proferiu as seguintes palavras:
— Seja bem-vinda – sorriu-lhe.
— Obrigada – ela retribuiu o sorriso.
— Está com fome? Vou preparar algo para comermos – ele sugeriu.
— Tudo bem.
— Venha, é por aqui – Harry disse e seguiu à frente dela.
Mal poderia acreditar que Luna estava ali, em sua casa, e dividiria em alguns instantes uma refeição com ele e, ainda mais impressionantemente, dormiria na mesma cama, se ela assim preferisse. Harry, subitamente, teve seus devaneios interrompidos por um grito estridente, seguido de um segundo grito. Antes de olhar para trás, ele soube exatamente do que se tratava aquilo. Viu Luna arfante olhando para o quadro da senhora Black, mãe de Sirius. O quadro gritava e Luna mantinha o olhar assustado, do quadro a Harry.
— De-desculpe, Harry, eu vi o pedaço de um rosto sob a cortina e imaginei quem seria...
— Está tudo bem, Luna – Harry cobriu novamente o quadro. — Fique quieta, senhora Black – e ele voltou-se para a garota. — Não se preocupe, ela permanecerá aos berros por ainda algum tempo. Sempre faz isso.
Eles seguiram através do corredor escuro, levemente iluminado por candelabros espalhados metros adiante. Ao longo da casa a voz estridente da senhora Black ainda ecoava um palavreado ofensivo, mas Harry estava indiferente a isso. Por fim, eles alcançaram a grande e iluminada cozinha.
— Algo em especial que gostaria de comer? – perguntou um gentil Harry.
— Não, nada...
Um guincho excitado proveio de algum ponto de um armário próximo deles e de uma de suas portas saiu um elfo-doméstico aparentemente velho. Seus olhos grandes focaram Luna antes de pousarem-se sobre Harry.
— Mestre Harry! – ele exclamou. — Foi feliz sua formatura?
— Sim, foi excelente – Harry disse. — Monstro, quero que conheça Luna Lovegood. Ela é uma de minhas melhores amigas.
— Boa noite, senhorita Luna Lovegood – ele fez uma notável reverência. — Há algo em eu lhe possa ser útil?
— Na verdade, há, Monstro – Harry respondeu por ela. — Acha que pode conseguir vestes confortáveis para ela?
— Ah, sim, Monstro pode ajudar nisto – ele fez uma nova reverência. — Tem alguma preferência em vestes, senhorita Luna Lovegood?
— Qualquer coisa leve me agrada – ela o enviou um amável sorriso, que fez Monstro fazer uma terceira referência e voltar-se para Harry em seguida. — Precisa de mais alguma coisa, mestre Harry?
— Não, Monstro, isso é o suficiente por hoje. Se não estivermos aqui quando você conseguir as vestes, leve-nas ao meu quarto.
— Como quiser, mestre – e Monstro saiu em passos apressados e cantarolando uma música sem ritmo.
Harry se aproximou de Luna e abonou um leve beijo em seus lábios.
— Acho que vou comer pudim. Você gosta?
— Eu amo!
O rapaz abriu um novo armário e retirou de lá um pudim já preparado. Monstro mantinha os alimentos gelados através de magia élfica, que Harry desconhecia. Sentaram-se à longa mesa da cozinha e comeram lado a lado um pouco de pudim. Luna parecendo satisfeita pela comida e sorrindo sempre que encontrava o olhar de Harry. Ao terminarem, o rapaz a guiou até os aposentos superiores e a apresentou um pouco de sua casa.
— Você tem sorte em herdar uma mansão desta – ela comentou. — É muito, muito bonita.
— Sim, ela é – eles dobraram um corredor e entraram por uma nova porta. — Este é o meu quarto.
Harry havia ficado com o quarto de seu padrinho Sirius e aproveitara para reformá-lo. Não lhe era muito divertido manter a antiga decoração, que tanto o fazia lembrar dos modos e da alegria do homem. Harry, portanto, trocou as cortinas e o papel de parede, trazendo a cor azul para próximo de suas horas de sono naquele quarto, cuja mobília de outrora fora mantida.
Mal haviam entrado e Monstro batera na porta, trazendo roupas limpas para a visita. Harry permitiu que ela se trocasse em seu banheiro e aproveitou sua ausência no quarto para trocar-se também. Vestiu roupas mais leves, as que utilizava em casa, e tentou ajeitar a parte de trás de seu cabelo, dando-se por derrotado em segundos, uma vez que nunca em sua vida conseguira deixá-los perfeitamente assentados. Quando Luna retornou ao quarto, Harry achou-a ainda mais bonita de pijamas e cabelos soltos sobre o peito.
— Penso que você está ainda mais bonita, agora – ele a elogiou e Luna abriu um largo sorriso branco. — Vamos dormir, ou há algo que você queira fazer?
— Não, acho que podemos dormir...
Eles deitaram-se na mesma cama; uma cama larga para um casal. Cobriram-se com os cobertores e mantiveram-se virados um para o outro, admirando-se. Harry ajeitou uma mecha dos cabelos dela e a beijou.
— Obrigado por ter confiado em mim – disse.
— Foi o que sempre fiz – ela falou, quase em um sussurro.
— Boa noite, Luna.
— Boa noite, Harry.
Ele beijou-a novamente antes de voltar às costas para ela. Enrolou-se um pouco mais nos cobertores, mas não fechou os olhos. Começava a sentir-se tímido, pois jamais dividira sua cama com alguém. Nos tempos em que esteve com Gina, eram ambos muito jovens e a casa servia apenas como sede da Ordem da Fênix. Eles namoraram, entretanto, na escola e era lá que as coisas aconteciam entre eles. Como Luna esperava que ele agisse naquela noite? Será que aguardava alguma atitude mais madura ao invés de ver as costas dele diante de seus olhos? Harry realmente não sabia o que ela pensava e isto o estava deixando nervoso.
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