May Burnsdale



Mary finalmente achou um bebedor em um corredor e quase se afogou na sua pressa de aliviar a queimação que sentia na garganta.
Pensara durante toda a noite e tinha esperança de que aquelas encenações fizessem, no mínimo, o dragão sentir que elas representavam algo importante. Mas nada surtira efeito. E, se era assim, precisa encontrar outra maneira de fazê-lo lembra.
Uma voz conhecida falando, seguida de aplausos e elogios, cortou o pensamento de Mary, a fazendo ir até o final do corredor. Lá era um salão amplo, com vista para o mar através de grandes janelas de vidro, e onde haviam vários sofás confortáveis para que os pacientes pudessem relaxar. Em meio a um grupo deles, estava May Burnsdale.
Aparentemente, ela fazia truques simples de ilusionismo com uma moeda, e era isso que arrancava os aplausos dos outros.
- Ela é popular... – Mary comentou consigo, admirando a maneira como a garota conseguira cativar todas aquelas pessoas, muitas delas não parecendo serem fáceis de se agradar.
Uma enfermeira passou por Mary, dando uma boa olhada para a roupa estranha que ela vestia, e foi até o grupo, pedindo gentilmente para que os pacientes fizessem menos barulho.
- Desculpe. – May pediu.
- Não foi culpa da pobrezinha. – uma senhora idosa pediu para a enfermeira – Nós é que estamos nos divertindo demais... Aqui vai ficar tão triste quando ela foi embora.
Os outros concordaram.
- Não se preocupem. – a garota se apressou em dizer – A casa do meu pai fica bem perto e, enquanto nós estivermos aqui, eu venho visitá-los todos os dias!
Isso só fez o alvoroço de vozes aumentar, para desespero da enfermeira. Em meio a isso, a garota acabou notando Mary vendo a cena de um canto e acenou alegremente para ela, indicando para que esperasse um pouco.


***


- Todo mundo adora você aqui, não? – Mary comentou enquanto andava com May pelo corredor iluminado do hospital.
A garota a levara por um de seus caminhos preferidos naquele andar. Era um corredor que tinha como parede uma estrutura de vidro, o que deixava uma visão bem ampla do mar.
- Hospitais não são lugares chatos como se pensa. – disse ela rindo – É só começar a conversar com as pessoas que eu encontro aqui que acabo ficando amiga delas.
- Isso é legal. – falou Mary, não conseguindo evitar se sentir alegre também perto dela.
Era como se a garota tivesse o dom de emitir a sua alegria para os outros. Estava bem claro que ela era alguém que feliz, que tinha tudo o que queria e que fora criada com todos os cuidados. Provavelmente fazia parte da alta sociedade bruxa, mas não era arrogante, o que provavelmente se devia ao fato de ter sido criada fora do país. Exatamente como Sarah Swan, com o extra dela não parecer ter uma personalidade problemática.
- Dizem que as pessoas se curam mais rápido quando sorriem e se divertem. Por isso tento ajudar aqui dessa forma.
- Sabe, May...
- O quê?
- Tem pessoas que são difíceis de se lidar, não?
- Tem sim.
- E... como você conversa com esse tipo de pessoas?
A garota pensou um pouco, ajeitando a sua muleta por debaixo do braço, e então respondeu:
- Na verdade eu não penso sobre isso, apenas converso... Sobre coisas aleatórias... Eu nem sei direito como explicar.
- Ah, é? Mas isso é importante, não é? Conseguir se aproximar das pessoas ao conversar com elas... – Mary deu um grande suspiro – Quanto mais eu tento me aproximar, mais eu o afasto de mim.
Mas May não estava mais prestando atenção nela. A garota olhava fixamente para um ponto a frente delas, parecendo analisar algo. Mary procurou pelo que chamara tanto a atenção dela e logo avistou Doumajyd vindo, meio mancando, meio se arrastando, pelo caminho contrário, se agarrando na estrutura do vidro para não cair. Era bem visível que ele estava furioso com o fato de não conseguir se movimentar direito, mas insistia nisso, com a falsa idéia de que assim poderia superar aquilo. A faixa em volta da cabeça, de onde saiam as pontas dos cabelos bagunçados, estava toda torta, demonstrando que ele já havia tentado arrancá-la sem sucesso.
- Acho que aquele deve ser o paciente que a enfermeira me falou... – comentou May.
- Quê?
Mas novamente Mary não foi ouvida. A garota já avançava com a sua muleta em direção ao dragão.
- Boa tarde. – ela cumprimentou com a sua forma alegre.
Diante disso, Doumajyd lhe lançou um olhar carregado que Mary identificou imediatamente como sendo o usado por ele quando não acreditava que alguém estava tendo a coragem de falar tão facilmente com o Ilustríssimo Eu.
- Muito prazer. – ela continuou, não percebendo o perigo do que fazia – Me chamo May Burnsdale. As pessoas falam muito de você aqui. Parece que você é famoso ou lago assim.
Mary engoliu em seco. ‘Parece que você é famoso?’... Será que se ela soubesse que aquele era o líder do D4 estaria falando tão espontaneamente assim com ele?
Chegando ao seu limite de tolerância com pessoas desconhecidas, Doumajyd voltou ao seu caminho, sem dar mais atenção para a moça. Porém, devido a sua quebra de concentração com o que vinha fazendo, acabou dando um passo além da sua capacidade atual e tropeçou, escorregando pelo vidro. Imediatamente Mary se movimentou para ajudá-lo, mas May foi mais rápida, largando a sua muleta e se jogando de joelhos no chão para segurá-lo.
- É perigoso! – alertou ela, demonstrando toda a sua preocupação com o que acontecera e o ajudando a ficar de pé novamente – Se você cair agora só vai piorar o seu estado! Se machucar a sua cabeça de novo, o que vai fazer?!
- Cala a boca, sua irritante! – replicou ele, não aceitando a ajuda, mas não conseguindo se livrar dela – Vai cuidar da sua própria vida!
- Ei, vo-
Mary tentou interferir, prevendo que aquilo não acabaria bem, mas May a cortou:
- Mesmo se eu estiver te irritando, coisas perigosas são coisas perigosas! – Ela ajeitou a sua muleta e assumiu uma posse imbatível, muito parecida comas das enfermeiras – Se você é famoso ou não isso não importa! Dentro de um hospital todos os doentes são iguais, entendeu?!
Doumajyd encarava a ousadia dela sem acreditar que no que ouvia.
Mary sentiu um abalo ao ver aquilo. Reconhecera imediatamente a expressão que o dragão usara quando ela o enfrentara pela primeira vez em Hogwarts, diante de todos os alunos. Era a expressão com que ele deixou de vê-la como uma escória na escola e passou a notá-la.
- Chris! – aquela atmosfera foi quebrada pelo chamado de Nissenson, que aparecera no corredor junto com os outros dragões, a procura de seu líder.
- O que está fazendo? – perguntou MacGilleain, deixando bem claro que estar fora do quarto era algo ainda não permitido para Doumajyd – Não pode andar ainda!
- CALA A BOCA! – ele berrou em resposta, furioso, e continuou o caminho que estava fazendo, não sem antes esbarrar em Mary para que ela saísse do seu caminho.
- Por que ele está tão nervoso? – perguntou Nissenson intrigado, já conhecendo de longa data as reações do amigo.
- Ele não consegue fazer com que o seu corpo se movimente como de costume. – May explicou – É algo para se ficar extremamente irritado.
Ryan Hainault, que desde que vira a garota na frente de Doumajyd ficara um tanto sombrio, se mostrou incomodado em ouvir ela comentando sobre o estado do amigo.
- É sua conhecida, Mary? – perguntou MacGilleain, pela primeira vez reparando na garota.
- Ah, eu conheci ela ontem aqui. Esta é-
- Meu nome é May. – ela cortou Mary com um sorriso imenso para eles – Muito prazer!
Imediatamente Nissenson e MacGilleain esqueceram do líder, que já ia longe mancando, e ativaram seus modos conquistadores para cima da recém apresentada.
- Não quer dar uma volta? – convidou MacGilleain.
- Desculpe, tenho uma consulta daqui a pouco. – ela recusou educadamente – Preciso voltar agora. Mas nós falamos! Até mais, Mary!
- Até. – ela respondeu, ainda meio chocada com o que acontecera antes.
- Ah! – a garota parece se lembrar de algo e se virou para perguntar – Por acaso a pessoa que você está visitando é aquele mal humorado?
- É. – Mary confirmou, com um meio sorriso de alguém que não podia negar.
- Então, se eu for ao quarto dele, conseguirei ver você de novo, não é? – ela deduziu alegremente e então voltou ao seu caminho – Me espere!
- Que legal, não é? – MacGilleain passou um braço nos ombros de Nissenson, os dois ainda olhando para May – Ela é bonita e alegre, nem parece que está internada em um hospital.
- É verdade. – Mary confirmou, feliz pelos amigos terem simpatizado com ela tão rápido quanto ela própria – Ela sempre está sorrindo e é tão gentil. É como um sol aqui dentro!
Hainault, pelo contrário, deu um suspiro irritado e declarou:
- Eu não gosto dela. – e então saiu atrás de Doumajyd, sem dizer mais nada.
- Quê? – perguntou MacGilleain descrente.
- Ei, ei. O que é isso, Ryan? – perguntou Nissenson, achando estranha a reação do amigo.
Mas o dragão Hainault não ouviu e nem ao menos explicou a sua opinião. Com isso, os outros dois se entreolharam e depois olharam para Mary, que apenas encolheu os ombros em resposta.


***


À noite em casa, deitada em sua cama improvisada, Mary não conseguia dormir. Pensava no que Doumajyd havia dito quando chegara à praia, quando ele estendeu a mão para ela e disse que não se importava mais nada, desde que ficasse com ela... O que teria acontecido se ele não tivesse sofrido o acidente?
Então, a sua esfera, visível em um bolso da sua mochila ao seu lado, chamou a sua atenção, e logo a figura de Vicky surgiu entre a fumaça, reclamando:
- Como é difícil conseguir contato pela esfera nesse final de mundo em que você está, Mary!... Como vão as coisas?
Mary lhe contou sobre o que estava acontecendo e que também nada poderia ser feito a não ser esperar.
- Não tem como ele te esquecer, Mary! – ela reafirmou o que já vinham lhe dizendo – Ele vai se lembrar, você vai ver!... Mas, viu, tem visto o Simon aí?
- Sim.
- Não me diga que ele está levando garotas bonitas na garupa da moto para andar pela praia?! – perguntou ela, sem conseguir esconder o seu tom de preocupação desesperada.
- Ahn? – perguntou Mary rindo – Claro que ele não faz isso! Não se preocupe.
- Mas me conte se algo assim acontecer, ok? Eu aparato aí no mesmo instante!
Mesmo sendo tarde da noite e com todos os problemas que não a deixavam dormir, ouvir Vicky e poder rir era como um vento fresco sobre suas próprias preocupações.
- Vicky?
- O que?
- Eu prometo que eu vou sorrir amanhã.

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