O que pretende?



- Tem certeza que não se esqueceu de nada, Charles? – perguntou Mary enquanto corria de um lado para o outro pelo apartamento apertado guardando coisas espalhadas em sua mochila, recolhendo as coisas do café-da-manhã, colocando as suas canecas na pia da cozinha, recolhendo o que seu irmão deixava cair com o seu nervosismo em pegar tudo o que precisava – Seus documentos? Sua inscrição?
- Está tudo aqui. – disse ele procurando por cada item na sua mochila.
- Certo. – ela parou por um momento, com as mãos livres, e o segurou pelos ombros – Depois do almoço vou direto para o trabalho. Tenho que compensar esses dias em que eu não fui. Então volte direto para cá e me espere, ok? – ela o empurrou para a porta – Por favor, tente fazer uma letra decente e entendível. Não se esqueça de escrever o seu nome na prova! E boa sorte! – então o soltou no corredor do prédio – Agora se apresse ou vai se atrasar!
- Boa sorte também, Mary!
- Dê o seu melhor! – ela ainda viu a mão dele fazendo um sinal positivo antes de descer as escadas.
Respirando fundo, ela ergueu os braços bem alto para se espreguiçar, e então exclamou:
- Isso! Eu também tenho que me esforçar! – e virou-se para voltar pegar a sua mochila, mas parou antes de passar pela porta do apartamento.
Com toda a correria daquela manhã, ela tinha esquecido do seu novo vizinho. Não que ela realmente acreditasse que Doumajyd ficaria naquele prédio, e que tudo não passara de um plano idiota dele para importuná-la. Mas antes que percebesse, ela já estava na frente da porta dele, tossindo disfarçadamente.
Como não veio nenhum sinal de vida de dentro do apartamento, ela chegou bem pertinho da porta, para tentar ouvir algum movimento lá. E novamente houve apenas silêncio.
- O que eu estou fazendo? – ela resmungou para si mesma.
Tinha uma prova importante e ficava perdendo tempo com aquilo. Então voltou para o seu apartamento, determinada a não pensar mais nesse problema pelo resto do dia.


***


Mary encarou a pilha de pergaminhos a sua frente e então esperou pelo aviso do professor monitor. Havia chegado cedo à Academia e logo foi levada para um lugar distante de onde eram ministradas as aulas, para poder fazer as suas provas.
Não havia mais ninguém além dela na sala, o que a fez se sentir constrangida no começo. Mas a sua vontade de entrar para a Academia era muito maior do que a vergonha de ter dependido novamente de Ryan Hainault e sua influência para sair de uma situação difícil.
- Pode começar. – disse o monitor, depois de verificar o seu relógio de bolso.


***


- Então, o Chris esteve no apartamento da Mary. – comentou Hainault, como se não soubesse da notícia que acabara de receber.
Ele e os outros dois dragões estavam no refeitório da Academia, onde eles também tinham um lugar especial reservado, mas que não se comparava à Ala dos Dragões de Hogwarts. Lá havia apenas uma mesa diferenciada das demais, onde eles recebiam o serviço especial.
- Acho que nem mesmo ele entende o significado do que faz... – lamentou-se MacGilleain, depois de contar para os amigos sobre Summer Vanderbilt.
- Basicamente ele segue os seus instintos. – disse Nissenson, revendo o que anotara nas aulas do dia.
- Não importa o que ele faça, sempre acabamos envolvidos em seus problemas. – reclamou MacGilleain – Sério, eu queria que ele tomasse jeito e nos desse um tempo...
- É você que se deixa envolver nos problemas dele, Adam. – falou Nissenson.
- Não deixo me envolver! – o dragão se defendeu.
- Se deixa sim, igual ontem com a Vanderbilt. Por que não deu uma desculpa e simplesmente aparatou?
- Eu não ignoro as pessoas. – afirmou MacGilleain.
- A natureza gentil do Adam é tão fácil de mudar quanto a teimosia do Chris. – comentou Hainault, sem desgrudar os olhos do novo livro que lia.
- Viu, é exatamente esse o ponto. – disse MacGilleain para Nissenson – ...Ele está demorando... Será que vai vir?
No mesmo instante, ouve uma explosão de gritos estridentes vindo das garotas do refeitório, e os três já sabiam que a pergunta estava respondida. Tendo que abrir caminho entre as pessoas que o cercavam, e parecendo extremamente irritado com isso, Doumajyd conseguiu chegar até eles.
- Bom dia! – cumprimentou MacGilleain, antes que o amigo pudesse reclamar do ponto escolhido para o encontro.
- Oi, Adam. – respondeu ele, já declarando pelo tom de voz que não estava de bom humor – O que você... O Ryan está aqui. – falou ele, parecendo dizer isso para si mesmo.
- Olá. – disse Hainault, novamente sem erguer os olhos do livro.
- Pode se sentar, Chris, nós-
- Eu tenho que falar com ele! – disse Doumajyd indo com passos furiosos até o antigo dragão da Grifinória.
- O que foi? – perguntou Nissenson, prevendo que algo ruim aconteceria – Por que está agressivo logo de manhã?
- Cala a boca! – rosnou ele para o amigo, que se ofendeu, mas sabia que não adiantava revidar.
- Ryan, vem comigo para outro lugar. – ordenou o líder.
- Por quê? – perguntou calmamente – O que é tão importante que eles não possam ouvir?
- Apenas levante e venha comigo! – disse Doumajyd usando um tom de ameaça.
Ryan se levantou da sua maneira indiferente, deixando o livro de lado, mas disse mantendo um olhar desafiador:
- Não lembro de ter feito algo para que ficasse bravo comigo.
- Ei, se acalmem! – pediu MacGilleain, tentando intervir.
- O que você fez com a Weed no hospital?! – Doumajyd tentou não gritar a pergunta.
- Como você sabe? – perguntou Nissenson sem entender.
Doumajyd lançou para os outros dois um olhar mortal que dizia com todas as letras ‘Então vocês já sabiam?!’, e voltou a perguntar para Hainault:
- O que você fez com ela?!
- Está bravo por que descobriu que eu a beijei? – perguntou o interrogado.
A forma calma com que ele falara aquilo foi o limite de Doumajyd, que partiu para cima dele para lhe dar um soco. Já esperando essa reação, Hainault se desviou de um, dois, três socos do dragão e então achou uma brecha e conseguiu acertá-lo no rosto. Doumajyd, surpreendido por ter falhado em sua investida e mais ainda por ter apanhado, quase se desequilibrou ao recuar. Então passou a mão pelo canto na boca e viu que sangrava.
- EU É QUE PERGUNTO O QUE VOCÊ FEZ COM ELA! – gritou Hainault, saindo da sua calma habitual. Mas ele logo se recompôs e perguntou, em tom de quem queria entender – O que pretende, Chris?
- Você... – começou Doumajyd, ainda chocado com a explosão de fúria do amigo, que conseguiu superar a sua – É sério, Ryan? – não recebendo uma resposta, o dragão perguntou de uma forma mais clara – Você está mesmo levando ela a sério?
- Estou sim.
Eles se encaram por alguns instantes e Doumajyd, mesmo sabendo qual seria a resposta, ainda perguntou:
- Não é brincadeira?
- Não é... Resolvi deixar você pensando que isso nunca seria sério, já que é meu melhor amigo. Eu pensava que, se os dois estivessem bem, então tudo estaria bem. Eu disse isso naquela vez, não é?
- Daquela vez? – perguntou Doumajyd confuso.
- Você disse que não iria deixar ninguém machucá-la, e eu disse que não pensaria duas vezes em ficar no seu lugar se não cumprisse essa promessa. – ele ajudou a se lembrar.
Doumajyd engoliu em seco. Podia parecer que aquela briga na estação de Hogsmeade entre eles havia acontecido há séculos, mas ela não poderia ser esquecida tão facilmente.
- Desde que você foi para Nova York, – continuou Hainault – você a abandonou... Pisou nos sentimentos dela e a machucou mais do que qualquer um. Eu realmente não entendo o que você pretende, Chris? Não continue agindo como se fosse o namorado dela... Será que não percebe o quão horrível você está sendo?!
Os outros dois se limitavam a assistir, mas sabiam que aquelas palavras haviam atingindo intensamente Doumajyd. Este, sem poder revidar a verdade, se virou e foi embora. Não sem antes descontar toda a sua raiva nos alunos desavisados que ficavam no seu caminho e explodindo as mesas do refeitório com a varinha.

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