Mentindo
Ryan Hainault não podia ver o que estava acontecendo pela pequena imagem que aparecia no fundo esfumaçado da esfera, mas ouviu claramente a voz de Doumajyd dizendo:
- Não vá... por favor.
E então a voz de Mary depois de um momento de hesitação:
- Mas isso não é bom! – e houve um barulho de movimentos, como se ela tivesse tentado se soltar – Tenho que-
- Já falei para não ir! – rosnou Doumajyd e mais movimentos, seguido de um banque, como se ele a impedisse de sair correndo, a fazendo cair no chão.
- Se ela entender errado teremos problemas! – tentou explicar Mary com um tom de urgência.
- Não terá problemas! – afirmou Doumajyd.
- Mas ela é sua noiva! Vocês vão se casar e ela-
- Ainda não! – ele a cortou – Ainda... não é oficial esse casamento... Quando nossas famílias se reuniram, eu sai no meio do jantar correndo. Então... ainda não foi oficializado.
- O quê?! – surpreendeu-se Mary.
E foi tudo o que ele ouviu. A fumaça azulada da esfera voltou a girar calmamente, e o dragão deixou-se cair sentado na sua cama, não sabendo que pensar do tudo o que acabara de ouvir.
***
- Como assim foi embora? – perguntou Mary incrédula.
- Indo embora! – respondeu Doumajyd impaciente.
- Mas... mas você não disse para a Summer que estavam namorando e tudo mais? Por que foi embora de uma cerimônia tão importante?
- Porque você só me preocupa, idiota! – exclamou ele, como se isso explicasse tudo.
- Eu te preocupei? – perguntou ela confusa, tentando inutilmente decifrar o que o dragão relutava em contar de uma forma clara.
- Isso mesmo! Você sempre está fazendo coisa errada! – acusou ele.
- Como assim coisa errada? – ela elevou o tom de voz para se defender.
Mary estava formulando mentalmente um bom discurso sobre coisas erradas e como ele se encaixava perfeitamente no perfil, quando Doumajyd falou:
- Você desmaiou!
- ... O quê? – foi tudo o que ela conseguiu pronunciar, com todas as suas formulações lhe fugindo da mente.
- Mesmo sabendo que não deveria ir, sai correndo daquele jantar assim que fiquei sabendo... Foram os ‘sintitos’.
- Sin... instintos?
Doumajyd lhe lançou um olhar carregado, como se dissesse que aquele não era momento para ficar corrigindo as pessoas.
- Então... você foi?... Ao hospital?
- Fui. – respondeu ele simplesmente, como se fosse um menino tendo que confessar a autoria de uma travessura.
- Qu-uando você foi? – perguntou ela tentando fazer a sua voz soar normal – Q-que horas vo-você foi lá?
- Por que está gaguejando? – questionou ele irritado.
- Nã-nã-não estou gaguejando! – disse ela tentando disfarçar o seu nervosismo, e se atrapalhando ainda mais.
Coisas constrangedoras haviam acontecido no pouco tempo que ela esteve consciente no hospital. E se Doumajyd tivesse visto? Seria por isso que ele estava agindo daquela maneira anormal?
- Está agindo como uma culpada! – falou ele se levantando, adivinhando o comportamento dela – Você fez alguma coisa e está preocupada?
Mary teve vontade amaldiçoá-lo. Como ele conseguia ser tão esperto justo nos momentos em que isso era totalmente desnecessário?
- Nã-não tem como eu ter feito alguma coisa! – ela se levantou também – Eu estava desmaiada, lembra?
- Então porque está afobada assim?
- E-e-eu não estou! Me diga logo que droga de hora você foi lá!
- Logo depois de você ter sido levada para o hospital! – respondeu ele de uma vez, e então acrescentou, prestando atenção na reação dela – Mas o Ryan já estava lá, então eu fui embora.
- Ma-mas você encontrou ele? – perguntou ela cautelosa.
Doumajyd a encarou por um tempo. Se o dragão fosse transparente, Mary podia jurar que veria as engrenagens funcionarem dentro da cabeça dele. Então ele sibilou a pergunta:
- Aconteceu alguma coisa entre você e o Ryan?
- Não aconteceu nada! – disse ela depressa, e se arrependeu logo em seguida, por que a resposta imediata a denunciara completamente.
- Aconteceu sim! – disse Doumajyd como se já tivesse descoberto tudo – O que aconteceu?
- Nada. – ela passou a olhar para o chão, dessa vez ela parecia a menina que confessava a travessura.
- Ele te beijou ou algo assim? – inquiriu ele.
- Não. – ela se espantou.
- Então porque está assim... toda assustada?! Você se beijaram sim!
- Não nos beijamos!
- Beijaram sim! – ele acusou aumentando o tom de voz.
- Não! – ela também respondeu no mesmo volume.
- Com certeza se beijaram! – ele deu um passo à frente.
- Com certeza não nos beijamos! – ela o imitou, se mantendo firme em sua negação.
- Não minta para mim, Weed!
- O que aconteceu? – perguntou Charles aparecendo assustado na porta aberta do apartamento – Por que estão gritando?
- Ah, desculpe, Charles! – Mary apressou-se em se agarrar à oportunidade de fugir do assunto – Nós atrapalhamos o seu estudo, não é?
- Mary, você também tem a sua segunda chamada amanhã. – disse Charles – Não deveria estar preocupada também?
- Ah, é mesmo! – dessa vez a reação dela foi verdadeira.
Com todo o problema da mudança, o trabalho temporário e a prova do irmão, Mary tinha se esquecido de sua segunda chamada especial que Hainault havia conseguido marcar para o dia seguinte. Então, em tom de ordem, ela pediu ao dragão:
- Pode voltar para o seu apartamento agora? E Charles volte para cá.
- Ok, vou pegar as minhas coisas. – concordou o garoto saindo.
- Ficou em uma situação ruim e está me expulsando. – reclamou Doumajyd.
- Claro que não! Eu realmente tenho que estudar! – e, como se isso provasse o que dissera, ela foi até a sua mochila, jogada no canto da sala.
Decidido a não sair derrotado, Doumajyd a seguiu. Mas foi em um tom de pedido que ele perguntou mais uma vez:
- Vocês realmente se beijaram?
- Que insistência, Doumajyd! – brigou ela sem parar de retirar seus livros da mochila.
- Se você falasse a verdade eu não seria insistente!
Mary deu um grande suspiro e se virou para ficar de frente para ele, o encarando com a expressão que o dragão conhecia da sangue-ruim valente de Hogwarts:
- Então eu vou ser sincera! Foi ele quem me beijou!
A confissão pareceu ter paralisado Doumajyd. E Mary percebeu que havia dito aquilo de uma forma em que colocava Hainault como culpado.
- Quer dizer... aconteceu de repente. – ela tentou explicar melhor – Não quero arrumar justificativas, mas... eu fui pega de surpresa! Levei um susto!... E fiquei confusa na hora...
- Como pôde ficar se beijando no hospital, Weed?! – brigou ele, voltando a si.
- Acho que você não tem direito algum de me julgar! – rebateu ela, falando claramente sobre ele e Summer Vanderbilt em Hogsmeade.
- Não gosto disso!
- Inacreditável! – foi tudo que ela conseguiu dizer na sua mistura de incredulidade e raiva.
- Não sou idiota! – rosnou ele.
- Obrigado por emprestar o seu apartamento! – novamente Charles apareceu na porta, carregando tudo o que havia levado antes, e interferindo na briga.
- Volte para o seu quarto! – foi a vez de Mary sibilar.
Furioso, Doumajyd saiu sem olhar mais para ela. Só parando na porta para bagunçar o cabelo de Charles e se despedir:
- Boa sorte amanhã, irmãozinho trouxa.
- Obrigado. – agradece o garoto contente, mas seu sorriso desapareceu assim que reparou na expressão carregada da irmã.
***
- Como era a relação entre o Chris e a Mary? – MacGilleain repetiu a pergunta para confirmar com Summer se era isso mesmo.
- Sim, por favor. – pediu ela.
A metamorfomaga havia cercado o dragão na sua saída de casa para a Academia logo de manhã e o convenceu a ir tomar o café-da-manhã com ela, para poderem conversar. Ela não estava com o seu costumeiro cabelo roxo e vivo como sempre. Ele tinha um tom de azul pálido e sem graça, e ninguém precisava adivinhar que ela estava extremamente deprimida. MacGilleain, vendo isso, não pôde negar o pedido dela.
- Bom, o Chris era apaixonado de verdade por ela. – contou ele – Mas, pode-se dizer que a relação entre eles sempre foi conturbada e por isso não seguiu adiante...
- Tem certeza que terminou? – perguntou ela.
O dragão deu um grande suspiro e começou a explicar pacientemente:
- Olha, o Chris sempre foi teimoso e impulsivo. Nem mesmo nós sabemos lidar com ele às vezes... Mas, ele sempre cumpre o que promete... Ele disse que ia namorar com você, não? Que ia aceitar o noivado?
- Sim. – confirmou ela – Ele disse que se esforçará para gostar de mim.
- Então se ele disse, acredite e espere. Isso também faz parte da teimosia dele, cumprir com o que fala.
- Sim, mas...
- Sabe... O que você viu... Acho que ele está tentando de todas as maneiras se separar da Mary, isso mesmo antes de te conhecer na festa de aniversário... Então não fique deprimida! O Chris, sempre a vendo determinada e com energia de sobra, não acabou decidindo por você?
Summer sorriu, demonstrando ter ficado um pouco feliz em ouvir isso, e o azul do seu cabelo ficou levemente mais brilhante.
- Obrigada, Adam. – agradeceu ela, de uma maneira incrivelmente sem jeito, já que se tratava da sempre animada Summer.
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