Acima de tudo



- Me perdoem. – se desculpou a senhora Doumajyd para os Vanderbilts – Realmente não sei o que pode ter acontecido para o Christopher sair assim. Ele-
- Não é assim que se pode ter um futuro promissor. – lamentou-se o senhor Vanderbilt, levantando e não demonstrando estar disposto a ouvir as desculpas – Creio que devemos ir embora. Vamos, Summer.
A garota, que ainda olhava para a porta com olhos perdidos, balançou a cabeça para se recompor e se pôs de pé juntamente com a mãe.
- Vão embora? – perguntou a senhora Doumajyd, não escondendo a preocupação com a reação deles.
- Não há motivos para ficarmos se o noivo não está presente. Boa noite, senhora Doumajyd. – cumprimentou o bruxo educadamente e saiu, conduzindo a mulher e a filha.
Depois que a porta se fechou, a bruxa agarrou com força o guardanapo que segurava na mão e as finas taças sobre a mesa explodiram em incontáveis pedacinhos, se espalhando junto com a bebida que ainda restavam nelas.
- Richardson! – ela chamou o secretário entre os dentes – Sabe para onde ele foi?!
- Sinto muito, senhora. – respondeu ele polidamente.
- Esse casamento não pode ser cancelado! – com um estralar de dedos ela fez com que sua esfera surgisse em sua mão – De forma alguma esse casamento pode ser cancelado!


***


Doumajyd praticamente invadiu o hospital e não ouviu os apelos da moça da recepção, gritando que ele não podia correr daquele jeito no local. Assim que o dragão avistou um curandeiro vindo distraidamente na direção contraria a sua, não pensou duas vezes em agarrá-lo pelas vestes e praticamente rosnar:
- Mary Ann Weed! Onde ela está?!
- Q-quê? – gaguejou o curandeiro ao invés de responder, surpreso demais por ter sido subitamente erguido do chão.
- Weed! Veio para cá esta noite! Onde ela está?!
Ainda tremendo, o curandeiro indicou as escadas e disse:
- Ala especial, qua-quarto oito.
Sem agradecer, Doumajyd o largou pesadamente no chão e correu para as escadas. Enquanto subia, percebeu que uma fumaça saia de seu bolso, indicando que sua esfera clamava desesperadamente por sua atenção. Mas ele, tendo certeza que seria a sua mãe furiosa com o que tinha feito, não deu atenção. Correu por mais corredores e passou pelas portas duplas da ala especial com a mesma delicadeza com que passara pela entrada principal. Porém, nesse momento, ele paralisou.
Foi por um instante, mas Doumajyd viu uma figura inconfundível de cabelos vermelhos entrar por uma das portas do corredor.
- Ryan... – o dragão murmurou, respirando fundo para se acalmar e tentar dar passos mais discretos.
Doumajyd fez o mesmo caminho que Ryan fizera e parou na frente da porta que ele entrou, com o número oito na frente. E por uma pequena fresta da porta entreaberta ele pôde ouvir a senhora Weed falando:
- Desculpe por incomodá-lo dessa maneira tão tarde da noite.
- Tudo bem. – respondeu Ryan da sua maneira calma de sempre.
Doumajyd se aproximou mais e pôde ver as costas de Ryan, parado ao lado de uma cama. Foi quando ele avistou o rosto de Mary, deitada inconsciente, e seu coração disparou. Por um momento ele quase cedeu ao impulso de empurrar a porta correr até lá, mas as palavras ditas pelo pai de Mary agiram como um encantamento, que congelaram seus movimentos:
- Parece que você sempre está cuidando da nossa Mary!
- Ela sempre fica muito feliz quando nos conta sobre você. – acrescentou a mãe – Muito obrigada por tudo o que faz por nossa filha!
- Só de pensar que mesmo tão longe de nós, Mary Ann tem por perto alguém que se importa assim com ela nos deixa mais tranqüilos! – disse o pai contente.
- Esperamos que continue ao lado de nossa filha por um looongo tempo! – ajudou a mãe.
- Eu também espero. – disse o dragão sorrindo um tanto constrangido com os elogios.
- Por favor, cuide dela! – pediram os dois em coro.
Diante do que ouviu, Doumajyd deu dois passos para trás, sem conseguir tirar os olhos da parte do rosto de Mary que via pela fresta da porta.
- Eu posso ficar com ela aqui essa noite se quiserem. – se disponibilizou Hainault, ao mesmo tempo em que sentava na cadeira ao lado da cama e fechava a visão que Doumajyd tinha.
Lutando com a sua vontade de entrar no quarto, Doumajyd percebeu que o melhor a se fazer naquele momento, era ir embora.


***


Dentro do quarto, a mãe de Mary ajeitava as coisas que trouxera para a filha.
- Que bom que foi nada grave. – comentou Hainault, observando Mary respirar calmamente, com um soro flutuando ao seu lado.
- Tenho vergonha de dizer isso, mas exigimos muito dela nessa última semana. – lamentou-se o senhor Weed.
- Apesar de o Hospital permitir que vocês fiquem aqui mesmo não sendo bruxos, sei que devem estar exaustos. Podem voltar para casa e descansar.
- Mas, nós...
- Não se preocupe, senhor Weed. Não teremos aulas na Academia amanhã e eu posso ficar o tempo que for necessário.
O pai de Mary foi para dizer algo, mas ao mesmo tempo levou um cutucão da mulher e recebeu um olhar cheio de significado.
- Então, já que insiste. – disse ele com um sorriso, entendendo perfeitamente a situação – Contamos com a sua ajuda. Muito obrigado!
E sem perder tempo, os dois pegaram suas coisas e saíram do quarto.
Quando já estavam fora do hospital, a mãe de Mary bateu palmas e exclamou:
- Ele parece estar interessado na nossa Mary e também é rico!
- Mas e o Doumajyd? – perguntou o pai.
- Bom, pode não ser o Doumajyd, mas não é qualquer um!... Vamos, temos que arrumar tudo essa noite! O Charles já deve ter terminado de embalar as coisas...


***


Doumajyd procurou abrir o mais silenciosamente a porta da sua mansão. Se pudesse, preferia ter aparatado diretamente no seu quarto. Não que quisesse fugir da mãe ou do sermão, porque não havia forma alguma de fugir do que tinha feito aquela noite. Mas naquele momento, só queria ficar sozinho e não ter que falar com ninguém.
- Onde você foi? – perguntou a voz rouca da sua mãe e a luz do hall de entrada foi acesso subitamente, junto com todas as outras luzes da parte de baixo da mansão.
Doumajyd não se assustara com a aparição da mãe. Desde que havia saído do hospital, nada do que acontecia a sua volta parecia ter importância suficiente para fazê-lo reagir.
Diante do silêncio e da imobilidade do filho, que olhava fixamente para o ponto mais baixo da parede do hall, a senhora Doumajyd insistiu:
- Tem consciência do que fez hoje?
- Cancelaram o noivado? – perguntou o dragão, com um tom de voz que demonstrava que aquela era simplesmente uma pergunta aleatória que ele fizera, e que a resposta para ela não importava.
- Felizmente não é algo para se romper. Mas você decepcionou os Vanderbilts!
Doumajyd permaneceu imóvel.
- Mary Ann Weed. – a bruxa sibilou o nome – Como você pode se importar tanto assim por essa sangue-ruim?!
- ...Se eu me importo ou não, não faz diferença. – resmungou ele.
- Se importa mais com ela do que com a sua própria mãe?! – perguntou ela com um fungado triste, muito bem ensaiado – Por essa sua mania de ter atitudes contrarias as que deveria ter, estamos nessa situação! Não se esqueça que por causa de uma ação sua que você considerava sem importância o nome dos Doumajyd quase desmoronou! Se não fosse pelos meus esforços, onde você estaria agora, Christopher?! Sim, nós somos a elite da sociedade bruxa! Mais do que magia e tradição, temos o poder do dinheiro a nosso favor! Mas esse grande poder está associado com várias outras coisas, Christopher! Com apenas uma palavra sua, tornará pessoas que não têm culpa em vítimas!
- CHEGA! – explodiu o dragão – Eu já desisti da Weed! Não vou cometer o mesmo erro duas vezes! Acima de tudo sou um Doumajyd! – e sem dizer mais nada ele passou pela mãe com passos furiosos e subiu as escadas.
Ao entrar no seu quarto, bateu a porta com força e chutou todos os móveis que pôde ver no escuro. Pegou a sua varinha e explodiu os objetos que decoravam o lugar. Então ofegando, se escorou na parede fria e se deixou escorregar, até cair sentado no chão e voltar ao seu estado de estupor de quando chegara.

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