Seis Dias
Mary decidiu que prestaria seus exames de NIEMs diretamente na Academia Bruxa em Londres.
De todos os alunos do sétimo ano de Hogwarts, ela fora a única que escolhera essa opção, tendo seus próprios motivos. O primeiro deles era porque ela teria mais chances de conseguir uma bolsa. E um dos principais era que, estando em casa, poderia se dedicar exclusivamente aos estudos.
Como a professora Karoline lhe informara, até o resultado dos exames, ela não precisaria voltar para a escola. Caso suas notas para admissão na Academia fossem satisfatórias, Mary poderia já se considerar uma bruxa formada, tendo que voltar para Hogwarts somente para a cerimônia de graduação. Caso ela não tivesse êxito, teria que prestar os exames finais na escola, como os outros alunos, porém sem ter a oportunidade de ingressar na Academia.
Mary pensara durante toda a sua viagem no Expresso de Hogwarts e no caminho em Londres: teria que dar tudo de si para conseguir. Então a primeira coisa que fez ao chegar em casa foi anexar um calendário com números bem grandes na parede do seu quarto, onde boa parte do mês já estava riscado e ainda havia um espaço de seis dias até a data circulada.
- Certo! – ela olhou satisfeita para o calendário – Agora é só desfazer a mala e começar a estudar!
Porém, ao arrastar o malão para começar a desfazê-lo, sua mãe bateu na porta e a chamou:
- Mary Ann, pode vir aqui um pouco.
A garota encarou a porta com um mau pressentimento. O tom de voz que a sua mãe não era dos melhores e deixava transparecer que havia algo muito errado. Então ela não perdeu tempo e correu para a sala, onde seu pai e seu irmão também a aguardavam.
- O que aconteceu? – perguntou ela analisando com cuidado as expressões deles antes de se sentar.
- Mary, – começou seu pai – nos perdoe por não ter lhe dado essa notícia antes, mas você estava se empenhando tanto para ser uma advogada que nós... Bem, – pigarreou ele ao receber um olhar de ‘fale de uma vez’ da esposa – a empresa onde eu trabalhava faliu.
- Faliu?! – Mary quase pulou do sofá – Como assim? Por que não me disseram nada?!
- Foi há um mês. – informou a sua mãe – Pensamos que poderíamos dar um jeito até que você voltasse, mas não conseguimos.
- O papai investiu tudo em ações da empresa. – disse seu irmão com um suspiro.
- Tudo... – ecoou seu pai desolado.
- Por hora, ainda temos a casa, mas não será por muito tempo. – continuou sua mãe – Seu pai está trabalhando em empregos temporários desde então. Eu consegui um trabalho de meio período, mas também é temporário. E seu irmão tenta fazer o possível para estudar e ajudar ao mesmo tempo. Mas mesmo assim ainda temos dívidas para pagar e precisamos resolver isso antes que o prazo de entrega da casa termine.
- Quer dizer que... de novo?
- Sei que você está se esforçando, Mary, mas... precisamos da sua ajuda também.
Mary percebeu que finalmente a mãe havia chegado onde ela queria chegar naquela conversa, e sabia exatamente o que era.
- Eu vou arranjar um emprego também! – disse ela decidida – Eu posso muito bem trabalhar de manhã e estudar a noite. Os exames serão em seis dias e eu posso arranjar trabalhos temporários!
- Desculpe por isso, filha. – resmungou seu pai.
- Não se preocupe, pai. Eu vou conseguir! Desde as férias de natal que eu venho me empenhando... Já passamos por uma crise dessas uma vez, não? E não conseguimos resolver? Vamos conseguir agora também!
Mary evitou a qualquer custo dizer algo que os fizessem lembrar que quem os havia ajudado da outra vez fora Doumajyd, e estava aliviada por nenhum deles ter mencionado o Dragão como recurso para aquela nova crise.
***
- Vai trabalhar durante o dia?! – perguntou surpresa a pequena imagem de Vicky na esfera – Mas e os exames, Mary?!
- Eu vou conseguir, Vicky. – afirmou Mary, tanto para a amiga quanto para ela mesma.
- Eu sei que determinação para isso você tem, mas... nos últimos dias você não dormia e nem comia direito para estudar e, pelo tanto que eu te conheço, sei que vai fazer o mesmo aí! Vai agüentar isso?
- Serão somente nesses seis dias, Vicky. Depois eu posso só trabalhar até os resultados. Não se preocupe...
Vicky a encarou de um jeito desconfiado, mas sabia que não levaria a nada continuar com aquela conversa:
- Ok, faça o que achar melhor. Mas não vá passar mal!
- Ok.
- Viu, Mary, eu lhe chamei para contar uma coisa... Lembra do que eu falei que aconteceu depois de eu ter saído correndo atrás do Simon?
- Que você conseguiu finalmente arrastar ele para o Três Vassouras em um encontro forçado?
- Eu não arrastei!... Ele meio que... percebeu que não adiantava ficar fugindo e me deu uma chance.
Mary riu e pediu para a amiga continuar.
- Lembra que eu falei que, por mais que eu tentasse mudar de assunto, ele sempre ia para poções? E como ele ficou empolgado quando eu contei que a minha mãe fazia poções e como ele ficou decepcionado quando eu confessei que eram poções de amor de adolescente?
- Sim.
- Então, eu decidi que devo ampliar os meus conhecimentos sobre poções! O que aprendemos aqui em Hogwarts não o suficiente! Por isso me inscrevi em um curso semanal em Hogsmeade! – disse ela por fim com um grande sorriso satisfeito.
- Curso semanal? – repetiu Mary para confirmar.
- Isso! Eu fui na primeira aula. Achei que só teria pessoas velhas, mas tem muitos jovens lá que não são alunos de Hogwarts. E a nossa professora é uma moça incrível! Ela sabe muito sobre poções e nos dá muitas dicas que não estão nos livros! Ela me ajudou a conseguir fazer uma daquelas poções complicadas para curar alergia a gnomos! E além de inteligente ela é muito bonita! Você ia adorar conhecê-la, Mary! Ela família dela não é rica e nem tradicional, sabe? Se a nossa escola não fosse tão fechada, garanto que ela seria a melhor professora de poções que Hogwarts já teve!
- Inacreditável. – disse Mary em tom incrédulo.
- Por quê? – perguntou Vicky sabendo como a amiga usava essa expressão.
- Você fez isso sozinha! – exclamou Mary – Geralmente você não dá passos tão grandes assim sem falar comigo antes ou me levar junto.
- É. – confirmou Vicky contente – Eu também fiquei surpresa com a minha coragem em ir lá me matricular sozinha.
- Que bom, Vicky! Dê o seu melhor!
- E você também nesses seis dias! Prometo que não vou mais te chamar para ficar conversando e atrapalhar seus estudos. Boa noite e boa sorte, Mary!
- Boa noite, Vicky.
Assim que a imagem da amiga se transformou em um redemoinho de fumaça azulada, Mary voltou para o jornal estendido na sua cama, onde circulava os seus prováveis empregos temporários para ajudar seus pais, e leu novamente o anuncio de um grande supermercado.
***
- Tenho algo importante para falar! – Doumajyd entrou no escritório de sua mãe da mansão sem cerimônia alguma, mas seu tom de voz decidido desapareceu ao receber um olhar mortal da bruxa, que fora interrompida em seu trabalho – Eu preciso falar... É sobre... a Weed...
- Pense muito bem no que vai dizer, Christopher. – sibilou sua mãe entre os dentes – Lembre-se de que, por causa de uma palavra desnecessária sua, estamos hoje nessa situação! Sabe quanta confusão pode causar com sua irresponsabilidade!
Diante dessa acusação da mãe, Doumajyd não conseguiu falar o que tinha planejado.
- Rompa o compromisso com a Vanderbilt e diga para todos que vai ficar junto com essa sangue-ruim que não tem um galeão sequer! – sua mãe continuou com um sorriso desafiador, percebendo que já havia conseguido desarmar o filho – Hoje, mais do que antes, você sabe que temos vidas de pessoas ligadas direta ou indiretamente aos nossos negócios, não? O que acontecerá com elas se, por causa de um capricho seu, eles perderem tudo o que têm?
- Eu sei que temos que-
- Eu fiz tudo o que foi possível, Christopher! – ela não o deixou falar – Você sabe muito bem que não existe uma alternativa melhor do que esse casamento!... Portanto, está na hora de começar a agir como um adulto e cumprir seus deveres!
Doumajyd continuou encarando a mãe, e mesmo pensando em várias possíveis alternativas para tentar rebater o que a ela afirmava, sabia que nenhuma delas era tão a prova de falhas quanto o casamento. E ao mesmo tempo, a voz de Mary ecoou em seus pensamentos dizendo ‘Ela é uma boa pessoa. Realmente perfeita para ser a sua noiva...’.
***
Depois de muita insistência, Mary conseguira um emprego temporário no supermercado, em dois períodos. Ela começava a tarde e saia de madrugada. Assim, podia ajudar sua família e ainda usar a manhã para estudar. E depois que prestasse os exames, ela ainda poderia ficar no emprego por mais um tempo.
Pensando nisso, ela voltava contente para casa depois do seu primeiro dia de trabalho. Porém, ao chegar perto das escadas, se deparou com alguém todo encolhido em um canto, atrapalhando a passagem.
- Olá? – perguntou Mary cautelosamente, já que aquele não era um bom horário para pessoas decentes ficarem sentadas em escadas.
Ao ouvir a voz de Mary, o alguém levantou a cabeça em um pulo e a encarou com olhos estreitos inchados, escondidos por um cabelo preto escorrido.
- O que faz aqui?! – perguntou Mary surpresa ao perceber que era Summer Vanderbilt.
Ela parecia ter chorado muito. Além dos olhos inchados e o cabelo preto, o rosto da garota estava todo amarrotado e ela teve dificuldade em se levantar, o que sugeria que ela já estava um bom tempo esperando encolhida contra a parede fria.
- Mary! – a metamorfomaga correu até ela e a abraçou forte, quase fazendo com que as duas caíssem no chão.
Mary, despreparada para aquela reação, ficou sem saber o que fazer. Mas ao perceber que a bruxa começava a soluçar, ela tentou saber o que tinha acontecido:
- O que foi? Por que está chorando? O que faz aqui em Londres tão tarde?
- Ele disse, Mary! – começou ela entre os soluços – Ele disse e eu tinha que falar com você! Por isso eu vim até aqui! Mas como você não estava em casa eu esperei, porque eu não podia deixar de falar com você! Eu fiquei tão feliz que eu não consigo mais parar de chorar, Mary!
- Então você está feliz? – perguntou ela tentando não deixar transparecer a sua perplexidade.
- Eu estou muito feliz, Mary! Ele me chamou de repente e disse que sim! Ele concordou com o noivado! O Chris aceitou finalmente e disse que vai se esforçar para gostar de mim! E eu fiquei tão feliz que comecei a chorar! Eu não fazia idéia que gostasse tanto assim dele, a ponto de ficar desse jeito, mas eu gosto!... O que eu faço, Mary? Eu só podia falar com você!
Apesar de tudo ter sido dito de uma forma afobada e um tanto atropelada, Mary entendeu tudo o que ela dissera. E, como Summer Vanderbilt falara, o dragão finalmente tinha aceitado. Não apenas o noivado, mas também deixar para trás tudo o que tinha acontecido antes. Finalmente, era o ponto final entre os dois.
- Mary? – chamou a metamorfomaga, vendo que a outra havia se perdido em pensamentos.
- ... Que bom, não é mesmo? – disse Mary voltando a si, com um meio sorriso.
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