Vá embora com cuidado
- Posso perguntar o que estão pretendendo fazer? – perguntou Ryan Hainault de uma forma calma, mas nenhum pouco amigável, apontando sua varinha para os quatro.
Imediatamente os sujeitos avançaram para cima dele, com suas próprias varinhas em punhos. Mas, mesmo estando em maior número, eles não foram páreos para a habilidade de um dragão que sempre teve o melhor treinamento possível em magia.
Ao conseguir arremessar dois deles contra a parede de um prédio com apenas um feitiço, os quatro se acovardaram e fugiram, dizendo em altos brandos que não deixariam aquela humilhação passar em branco.
Quando eles sumiram de vista, Hainault se apressou em ir até onde Mary ainda estava caída no chão, totalmente paralisada.
- Está bem? – ele perguntou preocupado – Eles a machucaram?
Mary não conseguia acreditar naquilo. Mais uma vez, seu Cavaleiro de Olhos Frios simplesmente aparecera quando a situação estava solução e a salvou.
- Eu... eu... me perdi. – ela começou, como se estivesse a ponto de chorar – Então um ladrão pegou minha bolsa e eu fiquei sem nada! E esses caras apareceram e jogaram a bola em mim e eu caí e daí você apareceu... – ela respirou fundo e então admitiu – Eu estava com medo!
Ele riu da confusão que ela mesma fazia ao tentar ordenar os seus pensamentos e comentou:
- Eu suspeitei que algo do tipo aconteceria. Por isso vim correndo assim que soube... Se você queria mesmo vir para cá, eu poderia ter trazido você.
Mary o encarou incrédula pela forma como ele lhe dissera aquilo, como se fosse algo tão simples como ajudá-la a atravessar a rua. Ele lhe deu um sorriso e ofereceu a mão para ela levantar do chão, dizendo:
- Vamos sair daqui antes que aqueles caras voltem com amigos...
***
Enquanto Mary se distraia com um copo de suco que Hainault lhe comprara, sentada em um banco de uma praça, o dragão falava com alguém pela sua esfera, um pouco mais afastado.
Ele a levara o lugar onde estava concentrado maior centro comercial bruxo do planeta, o lugar onde ela estava tentando chegar desde o começo. Em todos os lugares em volta, haviam pessoas vestidas com sobretudos pesados que geralmente eram usados por quem era do mundo dos negócios. E dali da praça, Mary observava atentamente o movimento dessas pessoas apressadas, tentando adivinhar como saber se elas eram bruxas ou trouxas.
- Simon e Adam estarão aqui amanhã. – informou Hainault, vindo se sentar ao lado dela.
- Mas e as aulas da Academia?! – perguntou Mary se engasgando com seu suco.
- Eles também querem ver o Chris. Aulas não são tão importantes quando os amigos, não?
Mary pensou no quanto estava se esforçando no estudo para poder entrar na Academia e então comparou com o quão fácil foi para eles entrarem.
- É, acho que para vocês tudo bem... – ela concluiu, voltando ao suco.
- Também falei com o Ministério daqui e expliquei a sua situação. Não se preocupe que não será detida ou algo assim por não ter seus documentos.
- Obrigada, Ryan. – ela agradeceu mais uma vez, já perdendo a conta de quantas vezes tinha feito isso desde que ele a resgatara.
- Então por hoje sua aventura termina, ok? Vamos esperar pelos outros e iremos encontrar o Chris amanhã, tudo bem?
Mary não conseguiu responder imediatamente.
Na verdade, ela não tinha conseguido pensar direito no que faria se isso acontecesse. A viagem fora tão súbita que ela apenas arrumou as malas, decidindo que iria e pensaria no caminho o que fazer quando chegasse. No avião ficara com tanto medo depois de uma turbulência que não conseguira pensar em nada além de como preferia voar em uma vassoura que ela mesma poderia controlar. Quando chegou e se perdeu não houve a mínima condição de poder pensar... Então, ainda estava totalmente despreparada para rever Doumajyd.
- Tudo bem. – ela concordou por fim.
Com isso, teria um bom tempo para planejar o que falaria para o dragão.
- Parece deprimida. – Hainault comentou, depois da resposta dela.
- Acho... que é mais nervosismo. – explicou ela sem graça.
- É mesmo... já faz um bom tempo...
Rrrooonnccc
Mary cobriu a barriga no mesmo instante, com um misto de susto e vergonha. Hainault riu e disse:
- Realmente você está nervosa!
- É que eu não comi nada desde que cheguei... – ela disse em um resmungo, como se pedisse desculpas.
- Cachorro-quente?
- O quê?
- Está com fome, não está?
- Ah, então deixa que eu compro! – ela se levantou em um pulo, largando o suco no banco – Como agradecimento!
Ele a encarou e perguntou:
- Tudo bem?
- Tudo, tudo! Eu já volto!
E ela saiu apressada pela praça, sendo observada atentamente pelo dragão. Então ela parou de repente, como se tivesse lembrado de algo importante, e deu meia volta, parando na frente dele, sorrindo sem jeito:
- É que... sabe... a minha bolsa foi roubada e eu...
Hainault tirou algumas notas de dólar do bolso do casaco e entregou para ela.
- Assim que voltarmos eu devolvo, Ryan. Obrigada! – e seguiu pelo mesmo caminho que havia feito antes.
***
Mary parou diante de um sinaleiro junto com várias outras pessoas aguardando a permissão para poder atravessar a rua. Ela esfregou as mãos e as assoprou na tentativa de esquentá-las. Agora que seu desespero em estar perdida havia passado e tinha alguém com quem poderia contar por perto, ela começou a perceber a intensidade do frio daquela cidade, mesmo estando bem agasalhada.
O sinal abriu e ela viu logo do outro lado da rua uma daquelas carrocinhas que vendiam os lanches mais famosos e apreciados de Nova York. Pensando que esse seria um dos bônus da sua viajem, ela seguiu contente naquela direção.
Porém, ao pisar na calçada, teve um pressentimento e olhou em volta assustada. Seu coração disparou novamente, como um tempo atrás quando havia sido assaltada. Tentando tirar o pensamento de que isso iria acontecer novamente ela seguiu até a carrocinha, no momento com um fila de clientes esperando por seus lanches.
Um grupo deles recebeu o seu pedido e saíram abrindo mais espaço para que Mary pudesse se aproximar. E então mais uma vez ela paralisou, entendendo a razão do seu pressentimento, e dessa vez prendendo a respiração diante do que via.
Sendo atendido pelo dono da venda, estava alguém de costas para ela, vestido com um dos pesados sobretudos pretos que ela havia observado antes na praça, alguém com um cabelo castanho bagunçado que ela conhecia muito bem.
Mary sentiu que o mundo a sua volta havia parado.
Então ele se virou, saindo com o seu cachorro-quente, e se deparou com ela o encarando chocada.
Sentindo que todas as forças que ela tinha no corpo saiam pelos seus pés para o chão, Mary se esforçou ao máximo em manter seus joelhos firmes e não desabar.
Mesmo usando óculos escuros, ele era inconfundível. Lá estava Christopher Doumajyd, parado diante dela segurando o seu cachorro-quente em uma das mãos, a encarando como se ela fosse uma visão do além.
Esse pequeno tempo em que ficaram paralisados, os dois surpresos demais para falarem qualquer coisa, pareceram horas para Mary. Então quando as pessoas começaram a esbarrar neles, impacientes por eles estarem parados no meio do caminho, Doumajyd tirou os óculos e perguntou incrédulo:
- Como veio aqui?!
Totalmente sem saber o que fazer, Mary deu um grande sorriso, na esperança de conseguir controlar o seu nervosismo e conseguir falar também.
- Há qua-quanto tempo! – ela o cumprimentou, levantando a mão com muito esforço, mas não ousando um movimento maior que esse – Tem passado bem?
Mary queria se jogar na rua para que algum carro passasse misericordiosamente em cima dela. Por que, dentre todas as coisas que poderia ter falado, teve que justo cumprimentá-lo daquela maneira educada e formal?
- Ouviu minha pergunta? – pediu Doumajyd em um tom que sugeria irritação.
- Como eu vim aqui?... Simples! – ela riu, mesmo se arrependendo interiormente de estar fazendo isso – De avião!
Doumajyd a encarou sem reação alguma, e Mary interpretou isso como sendo algo totalmente negativo.
- Ah, você não sabe, não é mesmo? É um meio de transporte que os trouxas usam para atravessar grandes distâncias pelo céu, sabe? Parece um pássaro enorme de metal e as pessoas vão dentro dele e então-
Sem aviso, Doumajyd avançou e a agarrou pelo braço, a forçando a segui-lo,
- Ei! – Mary protestou – O que pensa que está fazendo?! Me solta, idiota!
***
Achando que Mary havia se metido em outra encrenca, Hainault resolveu ir atrás dela para verificar se estava tudo bem. Quando ele parou em frente a um sinaleiro de uma movimenta rua, ouviu gritos familiares:
- Ei! O que pensa que está fazendo?! Me solta, idiota!
Então ele viu Mary sendo arrastada por alguém.
- Chris? – ele murmurou para si mesmo, acompanhando aquela cena surpreso.
***
- Você veio me ver? – perguntou Doumajyd bruscamente, ainda a arrastando pelas ruas, como se fugisse de alguém.
Mary respirou zangada. Não havia conseguido planejar o que falaria nesse momento, mas definitivamente não iria admitir que viera atrás dele, não depois dele agir daquela maneira. Então começou:
- Na verdade eu ganhei uma viagem para cá. E como é muito difícil uma pobre sangue-ruim como eu ganhar alguma coisa, não podia desperdiçar essa oportunidade, não é mesmo?
Ele parou depois de ter dobrado a esquina de um prédio. Mary sentiu novamente a sensação de que havia passado por um portal, e o barulho da cidade movimentada ficara subitamente distante.
- Ah, é? – ele disse apenas, novamente não demonstrando emoção alguma.
Mary pestanejou surpresa: ele realmente havia acreditado no que ela dissera. Não que ela houvesse falado uma mentira, mas... ela esperava que ele tivesse uma outra reação, como gritar dizendo que era mentira e que ela era uma idiota por o ter seguido. Mas depois ele daria risadas, se divertindo, e falaria que era totalmente o que ele esperava que a Mary Ann Weed fizesse.
Então ela tentou consertar a situação, dizendo:
- Quer dizer, eu esperava que nos encontrássemos aqui, mas como essa cidade é muito-
Doumajyd pegou uma esfera do bolso e deu as costas para ela, atendendo a um chamado. Então ele começou a brigar com alguém, por ter feito algo contrário ao que ele havia mandando em um negócio.
Nesse tempo, Mary pôde reparar como ele parecia diferente. Era o mesmo Christopher Doumajyd de meses atrás, mas ele parecia ao mesmo tempo não ser. Ele parecia estar... mais adulto?... mais sério?... ou seria apenas uma impressão dela por não o ter visto por tanto tempo?
- Vou indo. – disse ele, virando para ela e a arrancando dos seus pensamentos.
- Quê? – perguntou ela confusa, demonstrado que não esperava por aquilo.
- Estou ocupado! – ele respondeu, dando um grande suspirou de impaciência – Meu pequeno intervalo para um lanche terminou. Esqueceu que eu sou o herdeiro Doumajyd? Não posso perder tempo com qualquer coisa.
Ser indiretamente chamada de estorvo fez uma fúria inchar dentro dela, algo que há muito tempo não acontecia.
- Como é? – perguntou ela sibilando, tentando se acalmar.
- Essa cidade tem muitos lugares perigosos, então tente não se meter em problemas! – ele falou lhe dando as costas e saindo com a sua pose arrogante e orgulhosa que ela conhecia muito bem de quando ele estava em Hogwarts.
Mary ficou estática no mesmo lugar. Ele iria mesmo embora assim e iria deixá-la ali?...
- Ah! – ele parou no meio do caminho e apenas virou um pouco para poder dizer para ela por cima do ombro – Vá embora com cuidado, ok?
Isso fez Mary reagir e gritar:
- ESPERA!... está mesmo falando sério?
- Sobre o quê?
- É que... nós nos encontrarmos depois de tanto tempo...
- E daí?
A pergunta, dita com um tom acentuado de pouca importância e até com um certo desprezo, ecoou pelos pensamentos de Mary e agiram sobre ela como um encantamento que a deixou completamente perdida e sem reação. Então ela viu, sem poder dizer nada, Doumajyd desaparecer com um estralo, aparatando para algum lugar desconhecido para ela.
Um pouco mais afastado, apenas escorado na parede do prédio, Ryan Hainault observava tudo em silêncio.
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