Capitulo 7



CAPÍTULO VII


Hermione acordou às seis horas e às sete já estava pronta para sair, mas quase atropelou os pais na porta do apartamento.

- Mãe? — Olhou para o pai enquanto a mãe a agarrava num abraço. — Mãe, estou bem.

- Está nada. — Cilla continuava abraçada à filha, coração contra coração, bochecha contra bochecha, a própria Cilla questionava como pudera permanecer controlada a noite toda só para desmoronar ao ter a filha nos braços.

Respirou fundo e juntou forças.

- Pronto. — Deu um beijo demorado na têmpora e então a afastou para examinar bem o rosto. - Eu tinha que ver pessoalmente. Tem sorte por seu pai conseguir me segurar por tanto tempo.

- Eu não queria que se preocupassem.

- É minha função me preocupar e a exerço com a máxima eficiência.

Hermione fitou com ternura o rosto materno, percebeu esforço para não chorar.

- Você faz tudo com a máxima eficiência.

Cilla O’Roarke Granger tinha olhos castanho dourados também e cabelos negros curtos que combinavam com suas feições angulosas e voz rouca.

— Fiz da preocupação uma ciência — reconheceu.

Como eram quase da mesma altura, Hermione teve apenas que se achegar para beijar a mãe no rosto.

— Bom, pode descansar um pouco agora. Estou bem. Juro.

— Agora, acredito.

— Entrem. Vou fazer mais café.

— Não, está de saída. Eu só precisava ver você. — E tocá-la, completou Cilla, em pensamento. Minha filhinha. — Também vou trabalhar. Vou entrevistar um novo gerente de vendas na KHIP. Seu pai vai me deixar lá. Pode ficar com meu carro hoje.

— Como souberam que eu ia precisar de um carro?

— Tenho minhas fontes — replicou George. — Vão devolver o seu em ordem por volta do meio-dia.

Contrariada, Hermione trancou a porta.

— Eu teria me arranjado.

— Sim, teria tratado do carro, de Overton e de toda a burocracia — afirmou Cilla. — Espero não ter criado uma filha ingrata, que espera ver o pai de mãos nos bolsos ao vê-la atribulada. — Fingiu severidade. — Seria uma decepção.

George sorriu, abraçou os ombros da esposa e a beijou nos cabelos.

— Tem razão — reconheceu Hermione. — Obrigada, pai.

— De nada, Hermione.

— Agora, quem vai arrancar o couro de Overton? — Cilla esfregou as mãos, ansiosa. — Os três juntos? De qualquer forma, quero pegá-lo primeiro.

— Ela tende à violência — advertiu Hermione ao pai.

— E eu não sei? — George encarou a mulher. — Cilla, isso é atribuição do sistema. Agora, detetive... — Abraçou os ombros da filha enquanto seguiam pára o elevador. — Apresente-se primeiro no hospital. Vai interrogar um suspeito lá.

— E o inquérito sobre o tiroteio?

— Será processado nesta manhã. Precisa dar seu depoimento e entregar um relatório. Lá pelas dez horas. O investigador Hickman já entregou o dele e dá uma boa descrição. Não precisa se preocupar com nada.

— Não estou preocupada. Fiz o que tinha de fazer, dormi mal esta noite... — Hermione expirou cansada. — Muito mal. Mas agora estou bem. Na medida do possível.

— Não devia ter ficado sozinha — opinou Cilla.

— Na verdade... Uma pessoa me fez companhia.

George abriu a boca e a fechou. Após o telefonema da filha na noite anterior, contatara Kiniki e soubera que Harry a pegara no hospital e levara para casa. Só podia ser ele a lhe ter feito companhia.

Só não sabia se gostava da idéia.


Hermione parou o carro da mãe no estacionamento para visitantes e avistou Hickman enquanto acionava os segredos e o alarme.

O colega assobiou ao se aproximar com as mãos nos bolsos, os olhos estreitos sob o brilhante sol matinal.

— Nem todo tira tem de reserva na garagem um carro de luxo feito esse!

— É da minha mãe.

— Mãe rica. — Hickman conhecia Cilla e estava só brincando. — E então, como está?

— Melhor. — Tomaram juntos o rumo do hospital.

— Soube que já entregou seu relatório sobre a ação de ontem. Gostaria de agradecer por se apressar em me dar respaldo.

— Descrevi exatamente o que aconteceu. Se ainda tem dúvida, saiba que atirou um milésimo de segundo antes de mim. Se estivesse encabeçando a perseguição, eu é que teria abatido aquela mulher.

Hermione sorriu.

— Obrigada. E Dietz?

— Continua crítico. — Hickman tornou-se sombrio. — Conseguiu atravessar a noite, o que dá alguma esperança. Ainda pego o sujeito que fez isso com ele.

— Fique a postos.

— Já sabe como agir?

— Andei pensando. — Atravessaram o saguão e rumaram ao conjunto de elevadores. — A mulher usou o celular, de modo que há no mínimo mais um comparsa. Eu diria que são dois: o olheiro no bar e o cabeça, aquele que organiza tudo. Esse que vamos interrogar agora atirou num policial e sabe que vai se dar mal. A mulher está morta, o esquema acabou e ele pode ser condenado à morte.

— Ele não tem muito incentivo para falar. Vai negociar prisão perpétua?

— É o caminho. Vamos ver se ele se anima.

Hermione mostrou o distintivo policial ao guarda na porta do quarto de Fricks e entraram.

Fricks estava deitado na cama, extremamente pálido, meio cinzento até. Tinha os olhos embaçados, mas abertos. Olhou para Hermione e Hickman e voltou a fitar o teto.

— Não tenho nada a declarar. Quero um advogado.

— Bem, isso facilita o nosso trabalho. — Hickman aproximou-se da cama, a boca contraída. — Nem parece assassino de policial, não é mesmo, Granger?

— Não. Talvez não se torne. Dietz pode escapar. Claro, mesmo assim, este cara pode ser imobilizado numa mesa e levar uma injeção letal feito cão vira-lata. Furto, posse de arma sem registro, assalto, tentativa de assassinato de um policial. — Hermione deu de ombros. - Quem sabe mais o quê?

- Não tenho nada a declarar.

- Claro, para que tentar se ajudar? — questionou Hermione. — Que um advogado se encarregue de tudo. Acontece que não estou com vontade de fazer acordo com advogado, e você, Hickman?

- Também não.

- Não estamos com vontade — repetiu Hermione. — Não com nosso colega entre a vida e a morte na UTI. Não gostamos de advogados que tentam salvar da forca assassinos de policiais. Certo, Hickman?

- É, não gostamos nem um pouco. Não vejo por que fazermos concessão a esse sujeito. Que se dane.

- Mas também não devemos ser desumanos. Temos compaixão. Ele perdeu a esposa esta noite. — Hermione viu a dor no rosto de Fricks antes de ele fechar os olhos.

Essa era a chave para se chegar a ele.

- Deve ser duro. A mulher morreu e ele está aqui. Ferido, na expectativa de uma condenação à morte. — Hermione deixou os ombros caírem. — E os comparsas, que ajudaram a colocá-lo nessa situação, estão livres. Livres e ricos, enquanto ele balança na ponta de uma corda curta e a mulher é enterrada.

Inclinou-se sobre o ferido.

- Deve estar pensando nos comparsas, sim. Ou talvez nem amasse a esposa...

- Não se atreva a dizer isso — protestou Fricks. - Ela era a minha vida.

- Entendo. Estou comovida. Talvez Hickman aqui não se impressione, mas eu tenho um fraco por amor verdadeiro. Por isso, vou lhe sugerir como se ajudar neste momento, porque, se ela era sua vida, ela não ia querer que você assumisse a culpa por tudo isso sozinho.

Tremulo, Fricks fechou os olhos.

— Se cooperar e nos contar tudo o que sabe, pediremos à promotoria que acrescente um fator atenuante em seu processo. Demonstre algum remorso agora, Richard, e estenda a mão. Assim, passará bem longe da sala de execução daqui a alguns anos.

— Eu falo, pois já estou morto.

Hermione trocou um olhar com Hickman.

— Terá proteção.

Fricks continuava de olhos fechados, mas vertia lágrimas.

— Eu a amava...

— Sei que sim. — Hermione baixou a grade de proteção e se sentou perto dele.

Era hora de se tornar íntima. Demonstrar solidariedade. Adotou um tom de voz bem macio.

— Vi vocês lá no Blackhawk's. O modo como se olhavam revelava que havia algo especial entre os dois.

— Ela... ela está morta.

— Mas você tentou salvá-la, não é mesmo, Richard? Saiu correndo da casa primeiro, para lhe dar cobertura. Por isso, encontra-se nesta situação. Mas ela o amava e agora deseja que você se ajude. Ela quer que você viva e faça tudo aquilo que ambos haviam planejado. Richard, você tentou salvá-la ontem à noite, atraindo os policiais para cima de você enquanto ela fugia. Fez o que pode. Agora, tem de se salvar.

— Não era para ninguém se machucar... As armas eram só precaução, para intimidar, se alguém aparecesse.

— Entendo. Não planejaram nada disso. Acredito isso vai fazer diferença no seu processo, também. As coisas escaparam ao controle.

— Sempre tinha dado certo antes. Mas ela entrou em pânico. Foi isso. Ela entrou em pânico e não tive outra idéia.

— Não queriam machucar ninguém. — Hermione controlava-se, fingindo compaixão, embora a imagem do colega Dietz sangrando no chão não lhe saísse da mente. - Você só queria dar a ela tempo para fugir. — Aguardou enquanto o homem sofria nova crise de choro.

— Como passaram pelo sistema de segurança da casa? — indagou, quando ele se acalmou.

— Entendo de eletrônica — informou Fricks, aceitando os lenços de papel que Hermione ofereceu. — Já trabalhei com segurança. De qualquer forma, as pessoas nem sempre se lembram de acionar o mecanismo ao sair. Estando acionado, eu dava um jeito de desarmar. Se disparava, fazíamos um trabalho rápido e saíamos logo. Para onde levaram Madeline? Onde ela está?

- Já falaremos sobre isso. Ajude-me a esclarecer os pontos que faltam e arranjarei para que você a veja. Quem lhe telefonou do bar para dizer que ocorria algo estranho com os Barnes? Foi a mesma pessoal que Madeline contatou pelo celular?

Fricks soluçou e meneou a cabeça.

— Quero isenção de pena.

Hickman praguejou e tentou afastar Hermione da cama.

— Ele quer isenção! Você está prometendo o que não pode para ajudá-lo e ele quer passear. Que se dane. Que vá para a forca!

— Calma, Hickman. Não vê que ele está desesperado? Ferido nessa cama ele não pode nem providenciar o funeral da esposa.

Fricks voltou-se para eles, aflito.

— Ela queria ser cremada. Era importante para ela.

— Podemos ajudar você a conseguir isso. Talvez consiga dar a ela o que queria. Tem apenas de colaborar conosco.

— Quero isenção de pena.

— Richard, não pode pedir a lua e as estrelas ao mesmo tempo. Eu poderia até lhe prometer, mas estaria mentindo e enganando você. Garanto o fator atenuante.

— Não precisamos dele, Mione. — Hickman pegou a ficha de Fricks ao pé da cama e a examinou. — Em poucos dias, teremos o resto da quadrilha na cadeia.

Hermione suspirou, resignada.

— É verdade — disse a Fricks. — Em pouco tempo, teremos o caso encerrado. Mas, se nos poupar tempo e trabalho, se demonstrar remorso por ter baleado um policial, prometo brigar por você. Sabemos que há outros envolvidos. É só questão de tempo para pegarmos essas pessoas. Ajude-me e o ajudarei. Ajudarei você a realizar o último desejo de Madeline. Tem minha palavra.

— Era o irmão dela. — Com dentes cerrados, Fricks abriu os olhos, não mais enevoados nem lacrimejantes, mas flamejantes de ódio. — Ele a convenceu a fazer tudo isso. Disse que seria excitante, uma aventura. Era o cabeça e foi ele que a mandou para a morte.

— Onde está ele?

- Mora em Littleton, numa casa grande diante do lago. Chama-se Matthew Lyle e vai querer me pegar depois do que aconteceu com Madeline. Ele é louco. Era obcecado pela irmã e agora vai querer me matar.

- Não se preocupe, ele não vai chegar nem perto de você. — Hermione abriu o bloco de anotações. — Fale-me mais de Matthew Lyle.


Às quatro horas daquela tarde, Harry tentava se concentrar no trabalho sobre a escrivaninha, porém não conseguia, furioso como estava por não conseguir localizar Hermione. Nem em casa, nem na delegacia.

Já se convencera de que cometera um grande erro ao se recusar a passar a noite com ela e tomar o que tanto desejava. Fora um erro com o qual teria de conviver, bem mais confortavelmente, acreditava, do que teria sido conviver com as opções.

Tudo o que desejava de Hermione agora era a cortesia de uma notícia. Maldição, ela lhe devia isso. Afinal, deixara-a entrar em sua vida, em sua empresa, trabalhando ao lado de seus funcionários amigos sabendo que os enganava. Que ambos os enganavam.

Agora, raios, queria notícias!

Já pegava o telefone de novo quando as portas do elevador se abriram e Hermione entrou.

— Tenho o código, esqueceu?

Sem responder, Harry pôs o fone no gancho. Estava vestida para o trabalho, notou. Trabalho de policial.

— Providenciarei a alteração.

Ela pareceu surpresa, mas atravessou a sala e se sentou confortavelmente na cadeira defronte à mesa.

— Imaginei que gostaria de saber dos progressos.

— Acertou em cheio.

Ele estava esquisito, reparou Hermione. Depois descobriria qual era o problema.

— Fricks entregou o cunhado. Matthew Lyle, ou Lyle Matthews, ou Lyle Delaney. Crimes por computador, na maioria, alguns assaltos. Tem uma longa ficha criminal, mas a maioria das acusações foi arquivada por insuficiência de provas. Está foragido. Batemos a casa dele há algumas horas, mas ele não estava.

Ela fez pausa e esfregou os olhos.

— Ainda não fechei o relatório sobre ele. A casa estava cheia de artigos furtados. Aparentemente, converteram pouca coisa em dinheiro, talvez nenhuma. Precisava ver o lugar, parecia um leilão. Ah, e você vai ficar sem uma garçonete esta noite.

— Não imaginei que fosse aparecer.

— Não falo de mim, mas de Jan. Segundo Fricks, ela e Lyle eram... — Hermione esfregou os dedos indicadores esticados. — Muito íntimos. Ela era a olheira. Localizava os alvos, passava o número do cartão de crédito para Lyle via bip. Os Fricks entravam, ela dava cobertura enquanto roubavam as chaves. Depois, ela os avisava com outro código quando as vítimas pediam a conta. Os Fricks tinham tempo para terminar a limpeza e sumir. Tudo muito bem esquematizado.

— Já a prenderam?

— Não, parece que ela não voltou para casa esta madrugada. Meu palpite é de que foi ao encontro de Lyle e, com o fracasso da ação, fugiram juntos. Mas íamos pegá-la. Vamos pegar os dois.

— Não duvido. Suponho que isso marque o fim de sua carreira aqui no Blackhawk's.

— Infelizmente. — Hermione levantou-se, foi até a janela abriu uma fresta nas persianas, hoje cerradas. — Precisarei entrevistar o pessoal. Acho que se sentirão mais à vontade aqui. Pode me ceder seu escritório?

— Não.

— Ótimo. Vou começar por você. — Hermione voltou a e sacou o bloco de anotações. — Diga o que sabe sobre Jan.

- Trabalha aqui há cerca de um ano. Era boa garçonete, a preferida de muitos clientes regulares. Tinha facilidade para memorizar nomes. Era confiável e eficiente.

- Tinha relacionamento pessoal com ela?

- Não.

- Sabia que ela morava no mesmo prédio de Frannie?

- Isso é contra a lei?

- Como veio a contratá-la?

- Ela se candidatou a uma vaga. Não foi Frannie quem a apresentou.

- Eu não disse que foi. — Hermione tirou uma fotografia da bolsa. — Já viu este homem aqui no Blackhawk's?

Harry olhou para a foto de ficha policial de um moreno de uns trinta anos.

- Não.

- Já o viu em algum outro lugar?

- Não. É Lyle?

- É. Por que está zangado comigo?

- Irritado — corrigiu Harry, gélido. — Não gosto de ser interrogado pela polícia.

- Sou detetive, Harry. Que fazer? — Ela guardou a foto na bolsa. — Esse é meu trabalho. Sei que estou tomando seu tempo, mas não há alternativa. Gostaria de entrevistar os outros agora.

Ele se levantou ao mesmo tempo que ela.

- Agradeceria se mandasse Will aqui para cima. E ficasse lá embaixo. Talvez precise falar com você novamente.

Harry contornou a escrivaninha, o olhar estreito emitindo uma advertência ao se aproximar dela. Agarrou-a pelas lapelas da jaqueta e puxou de encontro a si.

Mil desejos, todos impossíveis, o avassalaram.

— Você me irrita demais — rosnou. Soltou-a e foi para o elevador.

— Igualmente — murmurou Hermione, mas só quando ele não podia mais ouvir.


Frannie acendeu um cigarro e fitou Hermione em meio a baforada.

— Então, você é tira. Eu teria desconfiado, não fosse Harry cercando-a. Ele não gosta de tiras mais do que eu.

— Já havia percebido — retrucou Hermione. — Ouça, vamos facilitar as coisas para todo mundo, está bem? Já sabe que pegamos a quadrilha de ladrões, que o bar era usado, que Jan era integrante. Pode me dizer a quanto tempo a conhece?

— Há um ano e meio, mais ou menos. Nos conhecemos na lavanderia do prédio. Ela era garçonete, eu trabalhava num bar... — Frannie endireitou os ombros. Saímos juntas algumas vezes. Eu gostava dela. Quando Harry abriu uma vaga, ajudei-a a conseguir o emprego. Isso me torna cúmplice?

— Não. Jan tinha namorado?

— Ela gostava de homens e os homens gostavam ela.

Hermione mudou de posição, contendo a impaciência.

— Frannie, sei que não gosta de tiras, mas há um na UTI de um hospital neste momento que, por acaso, é meu amigo. Ainda não sabem se ele vai viver. É casado e tem dois filhos. Uma mulher morreu. Era amada, também. Se quiser me atacar a nível pessoal depois, vamos lá. Mas seria bom terminarmos isso antes.

Frannie deu de ombros.

— Ela me falou de um cara algumas vezes. Nunca disse o nome dele, gostava de fazer mistério. Insinuava que em breve não teria mais que carregar bandejas e viver de gorjetas.

Levantou-se e abriu o painel que ocultava o bar, informando Hermione de que conhecia bem o escritório do patrão. Escolheu um refrigerante e o abriu.

— Eu achava que era só papo-furado. Jan gosta de se gabar a respeito de seus homens. Conquista entende?

— Já viu este homem? — Hermione empurrou a foto sobre a escrivaninha.

Bebericando o refrigerante, Frannie analisou as feições.

— Pode ser. — Coçou o queixo. — Sim, eu os vi entrarem no prédio umas duas vezes. Não era o tipo dela, foi o que me passou pela cabeça. É meio baixo meio gordo. Classe média. Jan dava preferência a cara bem de vida, com cartões platinum, sabe? – Abandonando a pose, jogou-se numa cadeira e meneou a cabeça. — E duro acreditar. Eu gostava dela. É jovem, meio deslumbrada, mas não má.

— Não se esqueça de que ela usou você, Harry e o bar. Agora, ela alguma vez mencionou algum lugar que os dois costumavam freqüentar? Ou planos?

- Espere um pouco... Uma vez falou numa casa junto a um lago. Ai, eu não prestava muita atenção quando ela começava a se gabar. Parecia tudo invenção.

Hermione interrogou por mais quinze minutos, mas não conseguiu nenhuma informação substancial.

— Está bem, Frannie. Se recordar algum detalhe, por favor, telefone. — Levantando-se, entregou-lhe um cartão de visita.

—Claro. —A garçonete correu o olhar pelas letras impressas. — Detetive Granger.

— Pode pedir a Beth que suba, por favor?

— Ah, por que não a deixa em paz? Ela não sabe de nada.

— Só estou fazendo o meu trabalho. — Paciência esgotada, Hermione contornou a escrivaninha e sentou-se na beirada. — Muito bem, Frannie, desabafe.

— Não gosto da maneira como se infiltrou aqui, usando e espionando a gente. Sei como funciona, verificou os antecedentes de todos, xeretou nossas vidas. Imagino o quanto se decepcionou por ser Jan a olheira e não a ex-prostituta!

— Engano seu. Eu gostava de você.

Frannie expressou desdém e sentou-se novamente.

— Por que não gostar? — questionou Hermione. — Conseguiu escapar de uma espiral que só empurra para baixo. Hoje, tem um trabalho honesto e é eficiente. Minha única ressalva em relação a você é Harry.

Frannie estreitou o olhar.

— Harry?

— Você tem alguma coisa com ele. Eu também gosto dele. Isso torna você um problema pessoal meu.

Estupefata, Frannie acendeu outro cigarro.

— Não estou entendendo nada. Está apaixonada por Harry?

— Aparentemente, mas isso é problema meu. Como já disse, gosto de você, admiro o modo como deu uma virada em sua vida. Nunca passei por nada parecido em minha vida, nunca tive que fazer esse tipo de escolha, mas gosto de pensar que teria agido como você.

Frannie levantou-se e começou a andar em círculos.

- Para começar, não tenho nada com Harry. Nada como o que está pensando. Nunca tive. Ele nunca me comprou quando eu estava à venda, nem me tocou quando me libertei. Não que eu não tenha me oferecido.

Hermione disfarçou o alívio e seguiu objetiva:

- Será que é burro ou cego?

Frannie estacou e olhou-a com severidade.

-Não quero gostar de você, mas é difícil. Eu o amo. Há muito tempo. Crescemos juntos, por assim dizer. Conhecemo-nos desde a juventude, eu, Harry e Will.

- Entendo.

- Quando eu trabalhava nas esquinas, Harry às vezes aparecia e me pagava um café ou um sanduíche. Só isso. — Frannie parecia nostálgica. — Sempre foi assim.

- Estamos falando do mesmo homem?

- Com as pessoas de quem gosta, quero dizer. Ele levanta você, não importa quantas vezes caia. Morda-lhe a mão, mesmo assim ele vai erguer você. Não adianta resistir. Não se pode resistir por muito tempo. Eu com certeza não facilitei para ele.

Com um suspiro, Frannie sentou-se de novo e terminou o refrigerante.

- Há alguns anos, cheguei ao fundo do poço. Estava nas ruas desde os quinze anos. Aos vinte, vi-me um trapo sem esperança, resolvi acabar com tudo e comecei a cortar os pulsos. Parecia um fim dramático o bastante.

Estendeu o braço, exibindo a cicatriz no pulso esquerdo.

- Consegui cortar só um e foi um serviço bem porco.

— Quem a salvou?

— Primeiro? O sangue, quando o vi, mudei de idéia.— Frannie riu. — Então, sangrando naquele banheiro imundo, senti medo, muito medo. E chamei Harry. Não sei o que teria acontecido se não tivesse conseguido falar com ele, ou se ele não tivesse ido. Ele me levou para o hospital e, depois, para uma clínica de tratamento para dependentes de drogas.

Recostada, Frannie passava o dedo na cicatriz como se isso lhe reavivasse as lembranças.

— Aí, pela centésima vez, Harry me perguntou se eu queria mudar de vida. Eu disse sim e ele me ajudou. No processo, achei que lhe devia algo e ofereci aquilo que estava acostumada a dar aos homens em toca de dinheiro. Foi a única vez em que o vi realmente zangado. — Frannie sorriu. — Ele me considerava mais do que eu mesma. Nunca ninguém tinha considerado. Se eu soubesse mais alguma coisa sobre Jan ou o envolvimento dela com a quadrilha, já teria lhe contado, porque Harry apreciaria e não há nada que eu não faça por ele.

— Pelo que vejo, já se acertaram.

— Nunca um homem olhou para mim do jeito que ele olha para você.

— Você é que não presta atenção — replicou Hermione, simpática. — Repare em Will quando ele pedir o conhaque de encerramento dele.

— Will? Ora...

— Repare — aconselhou Hermione.

Frannie levantou-se.

- É tudo?

- Sim. Peça a Beth que suba, mas me dê cinco minutos para colocar o socador de metal.

Rindo, Frannie seguiu para o elevador. Enquanto aguardava, lembrou:

- Will sabe o que eu era.

- Sabe o que é, também.

Hermione encerrou as entrevistas por volta das sete horas, exercitou os ombros e imaginou se conseguiria comer algo num futuro próximo.

Pelo horário, já não devia estar trabalhando e decidiu deixar o relatório para o dia seguinte, já que as entrevistas não haviam rendido nenhuma informação que levasse à captura dos elementos foragidos.

Harry a encontrou sentada à escrivaninha dele quando chegou.

- Dietz, o colega baleado ontem, passou do estado crítico para grave — informou Hermione, conforme acabara de apurar pelo telefone. Apertou a mãos sobre as pálpebras fechadas. — Parece que ele vai conseguir.

- Folgo em saber.

Ela soltou os cabelos e correu os dedos entre os fios.

- Isso diminui muito a minha angústia. Obrigada por me emprestar sua sala. Por ora, nenhum dos demais funcionários da casa é suspeito.

- Por ora?

- É o que posso lhe dizer, Potter. As evidências são que Jan agia sozinha aqui dentro. Não posso afirmar mais nada.

Hermione atirou a presilha na mesa.

- Só mais uma coisa.

- O quê?

— Estou de folga. Não me oferece um drinque?

— Tenho um bar completo lá embaixo.

— Pensava num drinque particular. Do seu bar particular. — Hermione indicou o painel na parede. — Adoraria um cálice de vinho branco. Sei que tem uma garrafa de boa safra.

Harry abriu o painel e pegou a bebida em questão.

— Vai me acompanhar, não?

— Estou trabalhando. Nunca bebo em serviço.

— Já tinha reparado. Não bebe, não fuma, não bate nos clientes... quando está em serviço — provocou Hermione.

Ele se voltou com o cálice de vinho levemente dourado na mão.

Hermione despia a jaqueta.

— Espero que não se importe — comentou ela, desafivelando o coldre de ombro. — É desajeitado seduzir com a arma presa ao corpo.

Deixou o revólver na mesa e foi ao encontro de Harry.



Obs:Capitulo 7 postado!!!!Espero que tenham curtido!!!!!Quarta-feira tem mais atualização!!!!Logo logo terá fic nova no ar!!!!Bjux e tenham uma ótima semana!!!!

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