Simplicidade
Capítulo 8 – Simplicidade
8. Sejamos curtos e diretos. Vamos concordar que, dadas as suas limitações, não podemos exigir muito, não é? Então aqui vai mais uma dica importante: não tente demais. Seja natural (mas não tanto assim) e lembre-se sempre que as coisas mais simples costumam dar certo. Você não precisa de grandes gestos galantes para conquistar a simpatia dela, nem de longos e pensados discursos para convencê-la. Suas melhores chances estão nas pequenas situações e conversas do dia-a-dia. Dizer as palavras mais simples, mas da maneira certa, costuma ter o melhor dos efeitos.
Hermione sempre achou que estaria preparada. Não havia tido, afinal, uma vida tradicional como a maioria das garotas que conhecia. Desde encontros com trasgos nojentos até fugas de Comensais no meio do Ministério da Magia, o perigo sempre pareceu acompanhá-la como uma sombra. Sabia que muitas vezes ela mesma ia ao seu encontro – nunca pretendera reprimir sua vontade de lutar e a certeza de que era seu dever ajudar Harry rumo ao fim da guerra – e talvez exatamente por isso ela sempre tenha achado que estaria preparada para uma situação como aquela.
Mas após a sucessão de acontecimentos acelerados que seguiram a pronúncia do nome do Lorde das Trevas - que mais pareceram um relâmpago insano trazendo uma descarga de tragédia até eles - Hermione viu que jamais estaria preparada para nada daquilo. Que nunca esteve, e que havia sido incrivelmente ingênua em achar que poderia estar.
Era mais do que medo. Era algo próximo da certeza de que o fim estava mais perto do que nunca. Era como ter a confirmação, afinal, de que tudo acabaria. De que haviam falhado.
Uma espécie nova de pânico se alastrou por cada centímetro de seu corpo, trazendo uma aflição dolorida quase física, quando a voz de um dos Snatchers disse seu verdadeiro nome.
-“ ‘Ermione Granger, a sangue-ruim que acredita-se estar viajando com ‘Arry Potter.”
Hermione sentiu seu estômago despencar, e o braço de Ron amarrado ao seu lado deu estremeceu abruptamente. Ela sabia que seu rosto perdia toda e qualquer cor quando Fenrir Greyback se ajoelhou na sua frente, com uma edição amassada do Profeta Diário nas mãos.
- Sabe de uma coisa, garotinha? – o lobisomem apertou os olhos contra a escuridão, observando o papel. - Essa foto parece muito com você.
As batidas de seu coração pareciam querer destruir suas costelas. Greyback passou um dedo sujo por sua bochecha e ela pôde sentir sua unha afiada arranhar de leve seu rosto. Ron se mexeu violentamente ao seu lado, e o toque aquecido de seu braço pareceu limpar sua garganta para que ela pudesse gritar, numa voz fraca e assustada:
- Não sou eu! Não sou eu!
Greyback não pareceu nem um pouco convencido, e continuou a mirá-la com uma expressão da qual ela desviou o olhar assim que pôde. Seus olhos traziam um brilho doentio que beirava o desejo. Hermione mordeu os lábios para que as lágrimas que desciam pelo canto de seus olhos não ficassem mais fortes.
Ron continuava a se mexer levemente ao seu lado, e ela pôde ouvir sua respiração ofegante. Greyback se virou para Harry, demonstrando um interesse maior por sua cicatriz. Hermione sentiu sua própria respiração se acelerar. Se eles desconfiassem de Harry…
- Bem, isso muda as coisas, não? – a voz rouca e feroz do lobisomem, quase que como um rugido, soou irônica.
Hermione sentiu uma lágrima grossa escorrer por sua bochecha, mas ela tentou se mostrar o mais impassível que conseguiu. A força fez com que seu corpo tremesse da cabeça aos pés. Ao seu lado, o braço de Ron se mexeu.
- O que é isso na sua testa, Vernon?
- Não toque!
O grito aterrorizado de Harry foi como um balde de água fria; como a certeza que ela já antecipava sem saber como seria infinitamente pior realmente alcançá-la. Greyback soltou um ruído que lembrou uma risada e continuou:
- Eu pensei que você usasse óculos, Potter?
- Eu achei óculos! – gritou outro Snatcher. Hermione sentiu que seu corpo tremia ainda mais fortemente. Ron continuava a mexer seus braços na confusão apertada de mãos amarradas. – Havia óculos na barraca, Greyback, espere…
Em alguns segundo o mesmo Snatcher voltava com o par de óculos de Harry nas mãos. Greyback soltou uma exclamação entusiasmada que fez o estômago de Hermione embrulhar.
- É ele! Nós pegamos Potter!
Hermione não pôde mais controlar sua respiração – sentiu-se prestes a hiper ventilar. Seu corpo tremeu com intensidade e Ron fez um esforço maior ao seu lado, soltando um gemido de dor até ficar novamente quieto. Em meio ao aperto confuso de braços amarrados atrás de si, Hermione sentiu alguém apertar sua mão esquerda. Ela olhou para o lado e viu que o braço de Ron estava num ângulo estranho e ainda mais apertado, mas a mão dele continuava a segurar a dela firmemente.
Ron também virou o rosto e ela pôde vê-lo com o canto dos olhos. Ele a encarou ofegante, mas determinado. Hermione não desviou seu olhar – junto a seus dedos entrelaçados, Ron parecia irradiar um calor que acalmou seu peito e desacelerou sua respiração.
Greyback e os outros Snatchers continuavam a conversar, discutindo sobre seus destinos: eles queriam levá-los diretamente a Você-sabe-quem. A mão de Ron aumentou a força na de Hermione. As cordas os prendiam próximos, mas ela não conseguia se mexer para olhá-lo melhor.
- Eu digo que este é o Potter, e ele mais a varinha dele, o que já são duzentos mil galeões! Mas se vocês são covardes demais para vir junto, fica tudo para mim, e com um pouco de sorte eu consigo jogar a garota no acordo!
Antes mesmo que as palavras pudessem completar seu sentido para Hermione, o braço de Ron deu uma tremida repentina e ele fechou os olhos, desviando o rosto do dela e erguendo a cabeça, com a respiração ofegante. Ela apertou seus próprios olhos, lutando contra lágrimas que tentavam escorrer, e deixou sua cabeça cair para trás, encostando-se na de Ron, que tremia.
- Tudo bem! – disse um dos Snatchers. – Tudo bem, nós estamos dentro! E o resto deles, Greyback, o que a gente vai fazer com eles?
A cabeça de Ron se mexeu contra a sua e a respiração acelerada dele pareceu se aproximar, mas apesar do leve conforto que o calor lhe trouxe, Hermione ainda não conseguiu abrir os olhos.
- Melhor levar o bando todo – Greyback disse. - Nós temos dois sangues-ruim, já são mais dez galeões. Me dá a espada, também. Se forem rubis, é mais uma pequena fortuna.
Alguém ergueu todos eles com descuido, e Hermione se sentiu forçada de pé aos tropeços. A mão de Ron apertou a dela com força, para que não a perdesse. Na confusão da subida, Hermione sentiu a respiração de Ron aquecer seu ouvido, e voz dele deixou escapar, rouca e fracamente, um murmúrio:
- Não vou deixar nada acontecer com você.
Ela abriu os olhos e ainda sentiu os lábios de Ron roçarem seu ouvido por um instante, então um dos Snatchers se colocou entre eles, segurando o braço de Ron e erguendo a varinha. Suas mãos se soltaram, e Hermione sentiu Ron se debater, mas o bruxo o imobilizou.
- Segurem eles, e com força. Eu pego o Potter!
Greyback puxou os cabelos de Harry, e com a outra mão apertou o braço de Hermione. Ela podia sentir que suas unhas afiadas a arranhavam, e procurou a mão de Ron atrás de si, mas o emaranhado de dedos não permitiu que ela se mexesse.
- No três! Um… dois… três…
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- Os prisioneiros devem ser colocados no porão, enquanto eu penso no que fazer!
A cabeça de Ron girava com um zunido ensurdecedor e assustador. Ele tentava organizar as idéias em sua mente, achar saídas e soluções para a situação aterradora que acontecia na Mansão Malfoy. O braço de Hermione tremendo junto ao dele o lembrava de que precisava tirá-la dali imediatamente.
Eles estavam na casa dos Malfoy, cercados de Comensais da Morte e muito mais próximos de Você-sabe-quem do que jamais estiveram, ao menos Ron e Hermione. Ainda assim, o responsável pelo mal-estar constante que forçava o estômago de Ron para baixo ainda não era o Lorde das Trevas. A maneira com que Fenrir Greyback se aproximava e mirava Hermione deixava Ron próximo de vomitar. Ele não suportava o mais ínfimo pensamento do que poderia acontecer se o lobisomem conseguisse o que queria.
Precisava tirá-la de lá. O mais rápido possível.
- Essa é a minha casa, Bella, você não dá ordens na minha-
Ron tentava ignorar a discussão a sua frente, focar toda sua mente em maneiras de sair dali. Mas era impossível; os gritos de Bellatrix eram como lembranças certas de que tudo estava perto do fim. Ron respirou ofegante, tentando mexer seu braço para encontrar novamente a mão de Hermione atrás de si. Desde que eles haviam aparatado, as cordas pareciam ainda mais apertadas e fortes. A confusão de braços amarrados não deixava espaço para que ele chegasse até a garota.
Mas ele não podia deixá-la. Ela precisava saber que não estava sozinha.
Não de novo.
- Faça isso! Você não tem idéia do perigo em que estamos!
- Leve esses prisioneiros até o porão, Greyback.
A ordem de Narcissa trouxe um resquício ínfimo de esperança – pelo menos sozinhos no porão eles poderiam tentar descobrir uma maneira de saírem de lá juntos. E Ron poderia dizer novamente a Hermione que tudo ficaria bem. Ainda que ele mesmo não tivesse nenhuma certeza daquilo, talvez o braço dela tremesse um pouco menos.
- Espera. Todos menos… menos a sangue-ruim.
A voz de Bellatrix penetrou a mente de Ron como uma lâmina gelada, afiada e rápida, destruindo qualquer resto mísero de esperança e derrubando toda a razão que Ron tentava reunir. O movimento brusco e assustado que Hermione deu ao seu lado, junto à exclamação de prazer que Greyback soltou, cegaram-no para qualquer coisa que não fosse tirá-la de perto deles, sair dali imediatamente…
Ron se remexeu violentamente, numa tentativa irracional de se soltar, e gritou, com a voz mais repleta de pânico e pavor do que ele imaginava:
- Não! Você pode ficar comigo, leve a mim!
O tapa forçou Ron para baixo, o estalo ecoou em seus tímpanos. O movimento brusco fez sua mão se mexer e ele sentiu alguém apertando seus dedos. Ron se agarrou aos dedos gelados de Hermione e percebeu que ela tremia menos do que antes.
- Se ela morrer no interrogatório, eu te uso depois. Traidor do sangue ainda vem depois que sangue-ruim no meu livro.
Ron sentiu suas entranhas desaparecerem, seu estômago dar uma reviravolta que ele jamais havia experimentado. Um turbilhão de raiva, medo, pânico e pavor tomou conta de si e foi apenas a força com que Hermione segurava sua mão que o impediu de passar mal ali mesmo.
- Leve-os lá para baixo, Greyback, mas não faça mais nada com eles… ainda.
Bellatrix tirou uma pequena faca prateada e se forçou bruscamente entre Ron e Hermione, cortando as cordas que prendiam a garota ao resto do grupo. Ron tentou segurar firme, mas pôde sentir os dedos dela escorregarem de sua mão.
A Comensal puxou Hermione pelos cabelos e jogou-a no meio da sala, ao mesmo tempo em que Greyback os forçou na direção contrária. Ron fechou os olhos com força, na esperança de talvez ver tudo desaparecer diante de si, como se aquilo fosse apenas um sonho ruim. Sua garganta estava seca e parecia não ter força para ao menos respirar.
- Você acha que ela vai me deixar ter um pouco da garota quando tiver terminado com ela?
Ron apertou os dentes e tentou conter seu corpo, que tremia com violência. Respirou ofegante pelo nariz, quase que bufando.
- Eu diria que eu vou conseguir dar uma mordida ou outra. Você não daria, ruivo?
Um silêncio perturbado pairou em sua mente, quase que como um vácuo forçado. Ron sentia seu corpo ser empurrado escada abaixo como se não estivesse realmente lá. Deixava-se levar e sentia seus membros baterem contra as cordas apertadas sem força para movê-los.
A escuridão total a que eles foram levados pareceu completar o estado entorpecido que seu corpo havia tomado. Como se ele pudesse se refugiar em algum lugar fechado e isolado, protegendo-se do que poderia acontecer em seguida.
Longe da certeza de que ele havia falhado, novamente, com Hermione.
Então ele ouviu. Como um raio o atingindo com a realidade dura e cruel, trazendo-no de volta a si, assustado e impotente. O grito terrível de Hermione ecoou num volume máximo dentro de sua cabeça.
- HERMIONE!
Ron não mais se controlou, nem mediu seus movimentos. Debateu-se violentamente, sob os protestos de Harry ao seu lado, e berrou o nome da garota com toda a força que tinha.
Mas não conseguiu abafar os gritos aterrorizantes que penetravam em seus ouvidos como fogo, fazendo seu corpo doer fisicamente, mas muito menos que seu coração.
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Ela também achou que estaria preparada para a dor. Por muito tempo, Hermione tentou se convencer de que a tortura era um risco muito próximo, e que era quase uma questão de tempo até que ela se encontrasse em uma situação como aquela.
Mas Hermione viu logo que a dor era mais forte do que ela poderia imaginar. Era mais intensa do que tudo o que havia experimentado durante toda a sua vida. Era como se estivesse concentrada em um ponto, exceto que esse ponto se espalhava por cada centímetro de seu corpo. Seus gritos tentavam liberar a dor insuportável, mas o alívio era ínfimo. Ela nunca conseguiria continuar assim, não por mais tempo…
- Você não vai mesmo me dizer onde vocês encontraram a espada?
A calma na voz de Bellatrix aumentava a sensação de que aquilo não acabaria logo. Hermione encarou os olhos negros da Comensal – eles a miravam com uma combinação sinistra de desprezo e determinação.
- Eu não sei… - Hermione gaguejou, com a voz fraca. Bellatrix não esperou que ela continuasse e apertou a varinha contra o peito de Hermione, novamente.
Ela gritou, mas sua própria voz parecia estar a milhas de distância. A dor aguda e afiada a ensurdecia e cegava, impedia que ela prestasse atenção em qualquer outra coisa.
- Fale! Onde vocês conseguiram a espada? – Bellatrix gritou, mas Hermione ouvia apenas flashes da voz raivosa da Comensal.
A onda de dor a deixou novamente, e Hermione apertou o chão com as mãos, encostando a testa no solo gelado na esperança de que o frio talvez a distraísse da sensação dolorida que se mantinha em seu corpo mesmo após o término do feitiço. Ela pensou ouvir uma voz distante gritando seu nome.
- Eu vou perguntar mais uma vez! Onde vocês conseguiram a espada? – Bellatrix empurrou o ombro de Hermione com o pé, forçando-a a se deitar de barriga para cima. – Onde?
- Nós achamos, nós achamos, POR FAVOR! – Hermione gritou, num berro agudo e apavorado, e Belllatrix a ignorou, apontando a varinha novamente para seu peito.
- Diga a verdade! Crucio!
Ela não conseguia mais. Jamais agüentaria mais tempo daquilo, era insuportável, horroroso… Quando o feitiço acabou novamente, Hermione conseguiu sussurrar fracamente algumas palavras, ela própria sem saber onde a mentira dava lugar à verdade.
- Nós achamos…
- Você está mentindo, sua sangue-ruim imunda, e eu sei disso! Vocês entraram no meu cofre em Gringotes! Diga a verdade, diga a verdade!
Desta vez Bellatrix não empunhou a varinha, mas mexeu nas vestes e chutou Hermione com força abaixo das costelas. A garota gritou de dor, e quando a voz sumiu de sua garganta, sem fôlego, ela pôde distinguir perfeitamente seu nome rasgar o silêncio.
- HERMIONE!
Era a voz de Ron, angustiada e apavorada, vinda de algum lugar abaixo deles. Hermione apertou os olhos, enquanto se encolhia protegendo a barriga. Seu corpo foi envolvido por um calor fraco e conhecido.
Ele estava ali.
- O que mais vocês levaram? O que mais vocês tem? – Bellatrix se abaixou e segurou seus cabelos, puxando o rosto de Hermione até centímetros do seu. A Comensal segurou a mesma faca prateada com a qual havia cortado suas cordas na altura do rosto da garota, encostando a lâmina gelada em sua bochecha. - Me diga a verdade ou eu juro que vou te abrir com esta faca! – abaixando a voz para um sussurro ela adicionou, com um sorriso doentio. – Uma morte trouxa é o que merece uma sangue-ruim como você.
Hermione respirou fundo. O chamado de Ron voltou a ecoar em sua mente, trazendo consigo memórias de um passado distante, junto à lembrança de que havia mais do que aquilo, mais do que a dor.
“Você realmente disse a ele que eu sou a melhor do ano? Oh, Harry!”
“O que isso tem de tão impressionante? Você é a melhor do ano, eu teria dito isso a ele se ele tivesse me perguntado!”
Ela já havia chegado até ali. Deveria resistir.
Hermione abriu os olhos para encarar os orbes negros e sinistros da Comensal, que faiscavam em fúria. Ela conseguiu pronunciar um murmúrio baixo:
- Nada.
Bellatrix jogou Hermione violentamente contra o chão, e soltou um grito de raiva ao mesmo tempo em que apontava a varinha novamente para o peito da garota.
- O que mais vocês levaram, o que mais? ME RESPONDA! CRUCIO!
A onda de dor voltou, e Hermione deixou sua boca se abrir em um berro, tentando liberar ao menos um pouco da sensação insuportável que fazia arder seus ossos, arranhava sua pele, apertava seus músculos até o limite…
- HERMIONE!
Através da espécie de vácuo que a deixava ouvir apenas seus próprios gritos cheios de dor, Hermione pôde distinguir novamente seu nome.
“Hermione, você é honestamente a pessoa mais maravilhosa que eu já conheci. E seu eu for rude com você de novo…”
“Eu vou saber que você voltou ao normal.”
A voz de Ron conseguia penetrar o entorpecimento insuportavelmente dolorido que dominava seu corpo e arrancava memórias esquecidas de partes que nem mesmo ela lembrava existirem em meio à dor.
- HERMIONE!
Lembrava a ela que aquilo não era só o que existia. Aquele momento não duraria para sempre.
“Você não vai precisar fazer todo o trabalho dessa vez, Hermione. Eu vou ajudar!”
“Oh, Ron!”
Bellatrix havia parado o feitiço, deixando Hermione se encolher ofegante no chão. A Comensal apertou um dos ombros de Hermione contra o solo, forçando-a a encará-la.
- Como vocês entraram no meu cofre? Aquele duendezinho sujo no porão ajudou vocês?
Hermione respirou fundo. Lembrou-se repentinamente do momento em que ela, Ron e Harry ouviam o duende contar a história da espada falsa em Hogwarts, no que pareceu anos atrás. Ela tentou usar a voz mais alta e determinada que pôde, a qual passou por sua garganta seca machucando-a.
- Nós só o conhecemos hoje! Nós nunca estivemos no seu cofre… não é a verdadeira espada! É uma cópia, só uma cópia!
- Uma cópia? – Bellatrix demandou com desprezo, mas pareceu interessada. - Ah, uma história provável!
- Mas nós podemos descobrir facilmente! – foi a vez de Lucius Malfoy falar, e Hermione repentinamente se lembrou de todos os outros presentes na sala. Pela primeira vez ela pôde distinguir, entre os barulhos de passos e batidas abaixo de si, a respiração selvagem e ameaçadora de Fenrir Greyback. - Draco, pegue o duende, ele pode nos dizer se a espada é verdadeira ou não!
Ela sentiu os passos de Draco passarem ao seu lado, na direção em que Ron, Harry, Dean e o duende haviam sido levados anteriormente. Hermione temeu o relâmpago de calmaria que se instalou; Bellatrix se agachou e a mirou com desconfiança, a varinha empunhada firmemente na direção de seu rosto.
- É melhor você estar certa, sangue-ruim – a Comensal murmurou, num sussurro cruelmente calmo. - Ou vou fazer questão que sua morte seja ainda pior.
- Eu já posso pegá-la? – a voz ansiosa de Fenrir Greyback veio de alguns metros atrás. Bellatrix esboçou um sorriso no canto dos lábios, encarando Hermione com intensidade.
- Não, Greyback. Ainda não.
Draco voltou à sala com o duende, a passos apressados, largando-o perto do pai e se voltando rapidamente para a poltrona afastada em que estivera até o momento.
Bellatrix apontou a varinha para o duende e ele parou, impassível. Um corte profundo se abriu na bochecha dele, e o pequeno duende gritou de dor e segurou o rosto com as mãos. A Comensal se virou para Hermione, novamente.
- Você tem certeza do que está dizendo, garota?
- Sim – Hermione conseguiu murmurar, tentando não transparecer sua insegurança.
- Essa é sua última chance de dizer a verdade, sangue-ruim. Diga como vocês entraram no meu cofre!
- Nós não…
- CRUCIO!
A dor voltou, como um pesadelo que insiste em persistir, mesmo após acordar. Hermione percebeu que seu corpo estava ainda mais fraco – mal conseguiu se contorcer, apenas se virou de bruços e empurrou as mãos contra o chão frio, gritando contra o assoalho de madeira.
- O que foi isso? Vocês ouviram isso? O que foi esse barulho no porão?
A voz de Lucius Malfoy soou distante e irreal, e Hermione não conseguia mais manter sua mente atenta aos acontecimentos da sala. Pessoas se moveram como se em outra dimensão; os sons começaram a desaparecer e várias partes de seu corpo ainda ardiam de dor.
Ela não soube exatamente quanto tempo se passou, mas após o que pareceu um único instante ela acordou, novamente tomada pela dor insuportável invadindo cada pedaço de seu corpo. Bellatrix gritava algo, mas ela não conseguiu distinguir as palavras além de seus próprios gritos desesperados.
Hermione nem ao menos se mexeu, e sentiu seu corpo amolecer junto ao chão. Ela já não mais distinguia os barulhos ao seu redor, e seus olhos estavam longe de reunir força para se abrirem.
- NÃOOO!
Um grito conhecido foi a última coisa que ela ouviu antes que uma confusão de movimentos e sons se alastrasse ao seu redor, chegando até Hermione como que através de uma névoa grossa e etérea.
"Qualquer um que conhecesse Slughorn saberia que havia uma boa chance de ele guardar algo tão bom para ele próprio."
"Er-my-nee"
A voz de Ron balbuciando seu nome ecoou dentro de si, parecendo ainda mais real e próxima do que o turbilhão de barulhos e sensações que a envolviam.
Ela não conseguia identificar o que acontecia, até que uma dor aguda e realmente localizada machucou seu pescoço. A realidade pareceu se aproximar de Hermione vagarosamente – ela podia ouvir as vozes de Ron e Harry, distantes. Até que um estrondo ensurdecedor penetrou seus ouvidos e ela sentiu novamente a dor atingir várias partes de seu corpo.
Ela pôde sentir algo muito pesado empurrá-la para baixo, e engasgou com a poeira, incapaz de entender o que acontecia através do barulho alto.
Em alguns instantes, o peso foi retirado de cima de seu corpo e Hermione sentiu o ar encher seus pulmões com alívio.
- Ah, Hermione, não…
Uma mão acariciou sua testa com uma leveza de que ela não mais se lembrava, e um par de braços quentes a ergueu e a carregou, usando uma das mãos para apoiar sua cabeça num ombro macio.
- Vai ficar tudo bem.
Ela pôde ouvir um sussurro perto de seu ouvido, e por um instante achou que fosse mais uma lembrança distante e irreal a irromper em sua mente, até que ela sentiu um cheiro cítrico e familiar.
Ron.
Ela suspirou aliviada. Deixou que todo o barulho desaparecesse e sua mente descansasse finalmente.
“Mas eu estava ouvindo o rádio bem cedo na manhã de Natal e eu ouvi… eu ouvi você.”
“Você me ouviu no rádio?”
“Não, eu te ouvi saindo do meu bolso. Sua voz saiu disso.”
“E o que eu disse exatamente?”
“Meu nome.”
Estava tudo bem.
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N/A: Gente... desculpa a demora, mas é que essas últimas semanas foram bem apertadas na faculdade e infelizmente as próximas também serão... Eu vou tentar atualizar o mais rápido possível, mas não garanto nada. Sorry! Anyway, espero que as demoras valham a pena:
Cenas do próximo capítulo: A visão da garota de olhos fechados e boca entreaberta fez suas pernas tremerem. Já sem equilíbrio por causa da aparatagem, Ron caiu de joelhos na grama fofa.
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