Tempo de Mudanças
Ao entrar na empresa, Gina cumprimentou Dany e Mary despreocupadamente, e logo pegou o elevador. Chateados, os dois funcionários nada comentaram. Sabiam que a ruiva não era a mesma há algum tempo, mesmo que não soubessem por qual motivo, mas sentiam que era algo realmente difícil e parecia afetá-la muito.
A primeira coisa que a ruiva percebeu ao chegar no andar onde trabalhava foi que Draco ainda não havia chegado. Estava tudo muito silencioso e a porta de sua sala trancada, coisa que não era comum quando ele estava ali. Ela então resolveu iniciar logo suas tarefas, quanto antes começasse, antes acabaria e poderia ir para sua casa e se afastar do presidente da empresa e de sua presença tão forte. Não passou nem cinco minutos quando Draco saiu de dentro do elevador, na direção da mesa dela. Eles se encararam hesitantes e envergonhados. Gina, rapidamente, levou o olhar para sua mesa e Draco entrou em sua sala sem dizer nada. A mulher sentiu que não suportaria nem mais um minuto naquela situação tão constrangedora. Como poderiam trabalhar daquela forma? Levantou-se de sua cadeira e se dirigiu para a sala do chefe. Entrou sem bater na porta e se aproximou da mesa, onde ele acabara de se sentar.
- Draco, eu não quero mais que você diga aquelas coisas pra mim. Não quero mais que você se meta na minha vida e fique me confundindo! – dizia firme, de pé, quase furiosa com nem ela mesma sabia o que. Talvez consigo mesmo por sentir-se tão balançada e fraca perto dele.
O homem a mirou, muito sério, sem saber o que dizer. Não podia negar, estava decepcionado. Havia nele uma pequena esperança de que depois da noite anterior, Gina pudesse ceder. E novamente tinha se enganado. Mais uma vez deixou a esperança entrar em seu coração e ser arrancada com decepção. Sentiu-se tão estúpido como nunca antes.
- Gina, eu... – começou, mas não conseguiu dizer nem mais uma palavra. Nem se desculpar, nem contestar, nem concordar, nem brigar, nada. Nada saía de sua boca.
- Entenda de uma vez por todas que a única coisa que nos liga é Diana e mais nada! Não se intrometa na minha vida, por favor...
- Quer saber Gina?! – Após alguns segundos, Draco se levantou furioso, dominado por uma raiva repentina. Apoiou as mãos na mesa e encarou a mulher com o olhar duro. – Estou cansado de tentar falar com você! CANSADO! – Deu a volta na mesa e, aproximando-se, encurralou-a na parede. – Eu amo você! Amo você como ninguém, mas eu não vou ficar me rastejando inutilmente. Cansei! Você não quer ver a verdade, não quer ver que a gente pode tentar outra vez, sermos felizes juntos! Mas é você quem sabe. Não vou insistir, não vou falar mais nada. Eu estou farto de sua teimosia! Você que fique com quem você quiser, que viva da maneira que quiser, mas saiba de uma coisa: você jamais vai ser feliz com o Potter, jamais! Ele nunca vai te amar tanto quanto eu. – terminou e saiu da sala, deixando Gina paralisada, apoiada na parede.
Draco pegou o elevador sem saber ao certo o que estava fazendo. Só sabia que queria se afastar de Gina. Dela e de sua teimosia. Não entendia como ela conseguia ser daquele jeito. Socou o espelho do elevador ao fitar sua imagem. Era um estúpido por se comportar de maneira tão fraca perante ela, mal conseguia se reconhecer. Nunca foi assim. Sentiu certa falta de ar de estar ali, num local tão fechado, quando queria só respirar. Ao chegar no térreo, a porta se abriu. Viu a caótica movimentação de funcionários que andavam de um lado para outro entre vozes altas e baixas. De que adiantava ser dono daquela grande empresa se não podia ao menos ficar com sua mulher e sua filha em paz? Imaginou como estaria sua vida se estivesse no mundo bruxo. “Será que daria para ser pior?” indagou-se. De qualquer forma, era um tanto irônico que seu “refúgio” fosse logo o mundo trouxa, o mundo que ele sempre desprezara. Vendo que Miller se aproximava para, provavelmente falar algo do trabalho, não pensou duas vezes antes de entrar novamente no elevador e descer até o estacionamento. Ali, pelo menos, ficaria sozinho. Ia até o seu carro quando sentiu um tremor na perna. O celular.
- Alô... Susan? – estranhou. Era a última pessoa da qual esperava receber uma ligação naquele momento. –Ah, está bem. Te vejo daqui a uma hora no... Palace Pier? Ou tem outra preferência?... Perfeito então. Até mais.
Desligou um tanto confuso. Conhecia Susan e sabia que, se ela havia marcado um almoço com ele, era porque algo ela queria. Mas o que ao certo? Um novo envolvimento, talvez? Não lhe importava, afinal. Iria de qualquer forma. Precisava sair daquele ambiente e ver outras pessoas. Lembrou-se de que sua maleta estava na sua sala e que nem ao menos havia visto sua agenda com os compromissos do dia. Pensou se realmente deveria sair. Seria uma irresponsabilidade ignorar seus compromissos, mas também seria sufocante voltar para aquela sala, ficar tão perto de Gina e fingir que nada havia acontecido. Pôs as mãos nos bolsos da calça, a chave estava ali. Deu um pequeno sorriso para o carro à sua frente. Estava na hora de voltar a ser um pouco irresponsável, mesmo que por um dia, e, principalmente, estava na hora de colocar na cabeça que não existia apenas uma mulher no mundo.
Gina não sabia o que fazer. Queria fingir que aquilo tudo não a afetava, mas era mentira. Uma grande mentira. A cada palavra dele sentia-se ainda mais confusa. Não podia negar, ele parecia muito sincero. E se desse uma chance para ele? Se desse uma chance para ela mesma? Não sentia nada mais por Harry do que um grande carinho. Draco estava certo, ela não poderia ser feliz com ele daquela forma, precisava mais do que ser amada, precisava amar. E só poderia amar o homem que saíra dali furioso um pouco antes. Escutou o telefone tocar na sua mesa. Correu até lá.
- Sim?... Mas senhor Miller eu... eu sei, mas... não, eu não sei. É que... Está bem, eu vou ligar para ele.
Bateu o telefone com raiva. Queria descer e xingar o homem no meio de todo mundo. Por que ele estava gritando, se ela não havia feito nada? E não havia uma outra outra hora mais propícia para pedir que ela ligasse para Draco? Pegou o celular e, quando ia começar a discar, o telefone novamente tocou.
- MERDA! – gritou para si mesma e jogou o celular na mesa. O nervosismo começava a dominá-la. Pegou o fone, tentando controlar a raiva na voz. – DMG's Company, escritório do senhor Malfoy, pois não... Ah, senhor Lewis... – Riu sem graça, tentando parecer mais tranqüila. Era uma péssima hora para o representante da Seilansys ligar. Com certeza não seria bom. – Entendo. O senhor Malfoy teve alguns imprevistos, mas vou tentar entrar em contato com ele... Lógico, eu avisarei.
Pôs o fone no gancho e jogou-se na cadeira, rezando para que aquele maldito telefone parasse de tocar. Pegou a agenda de Draco e a abriu. Não havia compromisso naquele dia. Era uma boa oportunidade para marcar a reunião adiada no dia anterior. Mas não seria nada agradável ligar para ele justamente naquele momento, logo depois daquela discussão.
- Ah droga... – resmungou ao pegar o celular novamente, não vendo outra saída. Acima de tudo, era seu trabalho. Discou e esperou. Sentiu seu corpo tremer ao escutar a voz aborrecida dele ao atendê-la.
- O que quer, senhorita Weasley?! – Draco perguntou ao virar a esquina, aproximando-se do restaurante onde marcou de se encontrar com Susan. Quando pegou o aparelho e viu quem era, não conseguiu disfarçar um pequeno sorriso inconveniente, mesmo que tivesse que mostrar indiferença e impaciência na voz.
- Me desculpe, mas o senhor Miller está muito nervoso à sua procura e o representante da Seilansys acabou de ligar também, nada satisfeito. Ele quer que a reunião seja hoje e pediu que o senhor ligasse para ele pessoalmente.
- Mas hoje eu não posso. – continuou com o tom duro.
- Mas acabo de ver na sua agenda, não há nada marcado.
- Surgiu um compromisso e não poderei fazer nada hoje até o fim do dia.
- Mas...
- Qual é o seu problema, Ginevra?! Não consegue entender?! – gritou raivoso. Se tinha algo que o incomodava mais do que as brigas com ela, eram as discussões de trabalho, que pareciam tão superficiais quando eles tinham tantos problemas pessoais a serem resolvidos. – Estarei ocupado durante todo o dia. – terminou, desligando o telefone na cara dela.
Os olhos de Gina se encheram de lágrimas. Ele não precisava ser tão ignorante com ela por causa do que aconteceu naquela manhã. Ela só estava trabalhando, tentando não misturar sua vida pessoal com a profissional. Mas como agiria assim se Draco mesmo não o fazia? Havia dito aquilo para que ele se afastasse dela, mas não para que a odiasse, o que parecia estar começando a acontecer. Pelo menos para ela.
Draco estacionou próximo ao restaurante. Respirou fundo. Sentiu-se um tanto arrependido por ter sido tão grosso com Gina, mas não conseguia controlar. Estava com raiva , mais do que isso, estava magoado. Estava certo que ele havia errado com ela no passado, jamais negara isso, mas o que precisaria para que ela o perdoasse? Estava cansado. Cansado de tentar, de ter falsas esperanças, de se humilhar, de ser um homem que não queria ser.
Entrou no restaurante e escolheu uma mesa bem perto da entrada. Não demorou muito até que Susan chegasse. A mulher vestia um insinuante vestido vermelho, que dizia perfeitamente o que ela pretendia com aquele encontro.
- Olá Draco. – cumprimentou-o ao chegar perto da mesa. O tom de voz quase melodioso.
- Susan... – Levantou-se, como um cavalheiro, e ofereceu-lhe a cadeira. Sentou-se novamente ao se aproximar o garçom, que puxou a cadeira para que Susan sentasse. Encarou a mulher à sua frente. Ela estava muito bonita. Bonita e provocante.
- Você já escolheu restaurantes melhores. – disse sorrindo ao observar em volta. De fato, o local era muito bonito e elegante, mas não tanto quanto os que freqüentaram nos Estados Unidos.
- É que esse fica próximo do hotel em que estou hospedado. – falou com um sorriso no canto da boca. Tinha que confirmar se suas suspeitas estavam certas. Ela o fitou com um longo olhar malicioso.
- Ótima escolha... Mas seria melhor se isso fosse um jantar.
Draco riu por dentro. Não poderia ser diferente. Ela queria algo mais. Ele refletiu por alguns segundos, observando-a enquanto pedia o menu. Será que deveria cair no jogo dela?
Gina sentiu que seria capaz de se jogar da janela a qualquer momento, naquele maldito escritório. Senhor Lewis havia acabado de pedir para que ela voltasse a ligar para Draco. Não tinha como negar ou contestar. Pegou o celular novamente, muito hesitante. Apertou o botão e fechou os olhos. Preparou-se para uma outra grosseria.
- Senhorita Weasley, o que quer? Estou ocupado. – Dessa vez ele atendeu sem alterar o tom de voz. Não discutiria com Gina na frente de Susan. A ruiva estranhou.
- Acabo de falar com o senhor Lewis novamente. Ele falou com o presidente da Seilansys e ele está furioso, acha que você está fazendo pouco caso da reunião e da sociedade. Disse que se você não entrar em contato ainda hoje com eles, não precisará marcar nenhuma reunião pois vão cancelar a sociedade.
- Eu lamento, mas estou muito ocupado agora e não posso fazer nada. – Tentava parecer o mais calmo possível.
- Mas é muito importante para a empresa...
- Eu sou o presidente e eu digo o que é importante ou não. Estou muito ocupado agora. – Draco dizia mais sério, vendo Susan fitá-lo fixamente.
- Draco, esqueceu os bons modos? – Susan disse rindo e levou a mão até o aparelho. Draco tentou se esquivar, mas não conseguiu. A mulher pegou o telefone e o desligou, colocando-o sobre a mesa e encarando o homem à sua frente. Ele riu com a atitude dela, mas não pôde deixar de se perguntar se Gina havia escutado a voz de sua companhia.
Ela torceu para que o que tinha acabado de escutar não tivesse passado de sua imaginação e desconfiança, mas no fundo sabia que era verdade. A voz da mulher que estava com Draco era bem clara e audível. Então o tal compromisso que não estava marcado e que surgiu tão de repente era com uma mulher... A ruiva tentou não se abalar com aquilo. Começou a arrumar os papéis que estavam em sua mesa sem atenção nenhuma. Mal sabia o que estava fazendo. Não conseguiu se conter e começou a chorar. Não conseguia controlar aquela tristeza tão forte que estava dentro de si. Ele estava com uma mulher, logo após ter tido a coragem de dizer, naquele mesmo local, que a amava.
- Ainda bem que eu não acreditei em você... – gemeu com a cabeça deitada sobre a mesa, as lágrimas caindo sobre papéis quaisquer. Afirmara para si mesma aquilo, mas seria verdade? – Odeio você, Draco Malfoy...
Não queria sentir aquele ciúme, mas não tinha como se controlar. Amava Draco e imaginar ele com outra que não fosse ela fazia seu coração gritar de raiva, mesmo desejando antes que ele se afastasse. Arrependeu-se de ter aceitado trabalhar com ele. Como pôde acreditar que conseguiria manter uma relação estritamente de trabalho? Aquilo não era certo. Estava ali sofrendo por ele como se em algum momento tivesse tido chance de voltar a ficar com ele. Ela mesmo havia eliminado qualquer possibilidade de reconciliação. Mas então porque sofria tanto em pensar que ele havia dito que a amava como ninguém, e naquele momento estava com outra? Talvez, no fundo, havia acreditado que poderia voltar a ser feliz com ele. Olhou em volta. Não ficaria ali nem mais um minuto. Se o próprio Draco não levava seu trabalho a sério, ela também não levaria. Arrumou suas coisas rapidamente e pegou o elevador. Na recepção, passou por todos sem dizer nenhuma palavra, inclusive com Miller, que tentou correr atrás dela para pedir explicação do porque ela estava indo embora àquela hora.
Já haviam terminado o almoço, e Draco e Susan estavam no carro, indo para a agência onde a mulher tinha um trabalho a fazer.
- Mas você não me contou uma coisa, Draco. – Ela falou, inclinando o corpo um pouco mais para o lado, se aproximando do motorista, após um tempo em silêncio. – Por que sua filha não sabe que você é o pai dela?
- Bem... Eu estive muito tempo longe e a mãe dela acha que ainda não é o momento certo dela saber. – disse sem muitos detalhes. Não contaria toda a sua história para ela, não só por ser algo pessoal de mais, como também por ela ser uma trouxa. Como falaria da guerra? Totalmente fora de questão.
- É ali. –Apontou para um grande prédio mais à frente e pegou sua bolsa.
- Teatro, comercial, você faz de tudo, não é? –Parou o carro em frente ao local.
Ela aproximou seu rosto do dele, mirando-o com um olhar malicioso
- Você não faz idéia... – Sorriu e abriu a porta. – Espero te ver em breve.
- Você vai ver. – Afirmou com um meio sorriso e acenou ligeiramente para a mulher, que fechou a porta do quarto e lançou um beijo no ar.
Depois de deixar Susan, Draco foi para o hotel. O último lugar para o qual iria naquele momento era para a empresa. Lembrou-se do telefonema de Gina. Por um segundo pensou no aviso de Lewis, mas sua principal preocupação era com a secretária. Sabia que seria muito difícil ela não ter escutado a voz de Susan. Então um pensamento lhe veio em mente: talvez aquilo não fosse de fato ruim. Talvez fosse bom Gina saber que ele estava com uma mulher e, mais do que isso, seria bom ela saber que ele não estaria mais correndo atrás dela como antes, que ela não era a única mulher na vida dele. Após o banho, ele pegou um livro qualquer e foi para a cama. Abriu-o inutilmente e leu algumas frases que não pôde entender. Não estava concentrado. Lembrou-se dos recados que Gina havia passado. E se estivesse pondo o futuro da empresa em risco ao ignorá-los? Olhou para o relógio. Ainda era bem cedo. O que tinha que fazer era ligar para o presidente da Seilansys e dar uma desculpa qualquer. E então, se lembrou que, para isso, teria que falar com Gina. Mesmo se não o quisesse, todas as suas coisas estavam em sua sala, na empresa. Relutante, pegou o celular e ligou para a secretária.
Estava saindo do banho quando o celular de Gina tocou. Ela o encarou vibrando sobre a mesa. “Aparelho trouxa horrível!” resmungou para ela mesma antes de se aproximar e ver o nome que aparecia.
- Ah não... – gemeu. Aquilo parecia um martírio. Quando finalmente conseguia tirar um pouco aquele homem de sua cabeça, ele ligava. Pensou se deveria atender. Aproximou sua mão para pegar o aparelho, mas voltou-a para si. Não queria. – Mas se for importante?
De repente, ele parou. Gina agradeceu mentalmente por aquela música ridícula parar de se infiltrar em seus ouvidos. Puxou a cadeira da mesa da sala e se sentou. Fitava o aparelho quando ele voltou a tocar. Era Draco novamente. Gina jogou a cabeça para trás, soltando um longo suspiro de quem estava cansada. Indagou-se se deveria atender. Não via outra saída senão ver o que ele queria. Pôs o fone no ouvido, muito hesitante.
- Pois não...
- Eu preciso que você ligue para Lewis e marque a reunião o quanto antes. – Ele começou, sabendo que ela não se agradaria nada daquilo.
- O quê?! – Ela gritou sem se importar com o ar profissional que deveria usar. Só desejava ter ele ali, na sua frente, para poder lhe enfiar a mão na cara. – Deixe-me ver se eu entendi direito? O senhor ignorou todos os seus compromissos durante o dia inteiro, esquecendo-se de que é o PRESIDENTE daquela porcaria de empresa, e agora pede para que eu ligue para o senhor Lewis a essa hora, quando provavelmente ele já deve estar em casa com a família dele?! Pois peça para a mulher que estava com você ligar!!
Desligou o telefone, completamente enfurecida. Esqueceu-se de que era a secretária dele e disse tudo que queria dizer. Foi só então que se deu conta do que tinha feito. Havia gritado com ele e, mais do que aquilo, havia deixado claro que estava com ciúmes. Não acreditou na burrada que acabara de fazer. Como poderia ter se deixado se levar pela raiva daquela maneira? Com um terrível remorso a dominando, foi para o quarto, onde a filha já dormia. Não tinha o que fazer a não ser ir dormir e esperar pelo dia seguinte, que seria muito complicado.
No entanto, enquanto Gina se sentia quase estúpida, Draco não conseguia conter a satisfação. Ao desligar o telefone, tudo que ele conseguiu fazer foi sorrir; um sorriso muito contente. O que ele havia pretendido deu certo. Gina não só percebera que ele estava com outra, como estava com ciúmes. Não tinha como ter se saído melhor. Deixou o telefone de lado, junto com o livro que antes havia pegado e se deitou. Fitou o teto acima, tentando imaginar como Gina estaria naquele momento. Esperava que estivesse se corroendo de ciúmes. Em sua mente, era o que ela merecia por ser tão cabeça-dura.
No outro dia, Gina preferiu chegar mais tarde, mesmo que fosse escutar sermão de Miller. Não estava disposta a encarar Draco quando ele chegasse, seria melhor que ele já estivesse em sua sala, e assim foi. Foi só pôr a sua bolsa sobre a mesa para escutar movimentação vinda de dentro da sala. Respirou fundo. Enquanto se arrumava naquela manhã, decidiu que fingiria que nada havia acontecido no dia anterior. Nem a discussão, nem os telefonemas. A primeira coisa que fez foi pegar a agenda de compromissos do chefe e ligar para o senhor Lewis. Após muitos e muitos minutos de explicações quaisquer e pedidos de desculpas e compreensão, ela conseguiu convencer ao homem a marcar a reunião. Seria no dia seguinte. A última chance, segundo ele. Desligou o telefone, aliviada por conseguir reverter aquele problema, que surgiu justamente porque ela e Draco não conseguiam manter seus problemas pessoais fora do trabalho, e ela sabia que aquilo não estava nada certo. E, mais do que tudo, se quisesse melhorar suas condições e dar uma vida melhor para a filha, tinha que continuar ali. Mesmo que, no fundo, soubesse que jamais seria despedida, queria fazer por merecer. Pegando a agenda, levantou-se da cadeira e foi para a sala de Draco.
- Entre! – Ele mandou, ao escutar as batidas na porta, sabendo que só poderia ser Gina. Ao vê-la, lembrou-se do conturbado dia anterior. Uma parte ainda animada por saber que ela não era indiferente a ele, mas a outra desesperançosa por saber que, apesar de tudo, eles jamais parariam de brigar e ficariam juntos.
- Os compromissos para hoje, senhor. – disse, evitando encará-lo diretamente nos olhos. Aproximou-se da mesa e lhe entregou a agenda aberta naquele dia.
- Obrigado. – Ao pegar a agenda, encostou sem querer na mão de Gina, que tremeu ao sentir o toque e deu dois passos para trás. Ele percebeu seu constrangimento.
- E eu liguei para o senhor Lewis. Foi difícil, mas consegui convencê-lo a marcar uma outra reunião para amanhã. – Não disfarçou o tom orgulhoso por ter conseguido salvar um dos contratos mais importantes para aquela empresa, tentando deixar isso bem claro para o homem.
- Isso é muito bom...
- Só vê se não estraga tudo de novo... – Gina murmurou, olhando para o lado, em voz baixa, mas não o suficiente para que Draco não a escutasse.
- Está com a língua afiada desde ontem, não é, senhorita Weasley? – falou em tom provocativo, com um pequeno sorriso de deboche no rosto e uma sobrancelha arqueada.
Gina o encarou imóvel, muito sem jeito. Tinha que aprender não só a controlar a língua, mas também seu tom de voz. Sentiu seu rosto corar e suas mãos suarem, mas não se deixaria intimidar com aquilo.
- O que eu falo ou deixo de falar é somente de meu interesse. – Encarou-o pela primeira vez naquele dia. O olhar firme, não queria fraquejar.
- Não quando você faz comentários sobre a minha vida...
- Pois pouco me importa a sua vida! – Começou a se irritar ao ver que perdia o controle da situação.
- Então, por que está com ciúmes? – Draco não resistiu em perguntar, vendo que ela se alterava. Encarou-a, sem nem ao menos piscar. Precisava ver se o que escutaria seria sincero, e os olhos de Gina jamais mentiriam.
Ela não conseguiu dizer nada. Não poderia mentir, mas também não confessaria o que estava em seu coração. Não confessaria que estava morrendo de ciúmes e que só de pensar nele com outra mulher a fazia se sentir como se lhe arrancassem um pedaço do coração. Jamais diria aquilo. Abaixou o olhar para o chão e, segundos depois, voltou a fitá-lo, agora mais arduamente.
- Aqui é um ambiente de trabalho, senhor Malfoy, e não um lugar para discutir a sua vida.
Draco riu, mas de raiva. Não conseguia entender o por quê dela esconder tanto os seus sentimentos se tudo estava tão transparente, tão óbvio. Mas não se importaria. Tinha prometido a si mesmo que mudaria, que tentaria de todas as formas ser indiferente a ela.
- Eu acho isso muito bom. E, permitindo-me usar suas próprias palavras, a vida é minha e eu faço o que eu quiser, e ninguém tem nada a ver com isso. Muito menos você.
O peso das palavras usadas no local durante toda a conversa preenchia a sala, envolvia-os, sufocava-os. Gina continuou a encará-lo de forma séria, tentando aparentar que nada daquilo realmente lhe importava, mas sabia que, se permanecesse ali por mais um minuto, não conseguiria evitar com que lágrimas surgissem em seu olhar. Pegou a agenda que estava sobre a mesa.
- Qualquer coisa, estou na minha mesa. Com licença, senhor...
Mal esperou uma resposta e lhe deu as costas, desejando que toda aquela sala caísse sobre sua cabeça e ela tivesse um ótimo motivo para não voltar mais àquele lugar e muito menos ver a cara de Draco. Contudo, mesmo querendo ter em toda aquela história um álibi para afastá-lo por completo de sua vida e de sua filha, não conseguia odiá-lo. Muito pelo contrário, aquilo só lhe mostrava que o amava demais e jamais poderia esquecê-lo.
E os dias foram se passando lentamente, quase obscuros e desinteressantes. Talvez por, naquela época do ano, as árvores estarem tão sem vida e o céu sempre tão cinzento e nebuloso. Tudo estava muito frio e cinza, incluindo a vida de Gina e Draco. Os dois nunca estiveram tão indiferentes um com o outro como naquelas semanas. Quando não falavam sobre coisas exclusivamente relacionadas à empresa, falavam sobre Diana. Nada muito muito diferente. Draco apenas pedia para sair com a menina e Gina autorizava. Até mesmo nos momentos de levá-la para casa eles se cumprimentavam educadamente e nada mais. Talvez para Draco as coisas ainda estivessem um pouco melhores. Decidido a esquecer Gina, ele começou a sair com Susan. Conhecia-a muito bem e sabia que ela não era totalmente confiável, mas era de fato uma companhia agradável e divertida, sempre disposta a agradar Draco. Os jantares e almoços aumentaram aos poucos e, quando Draco deu por si, já estavam bem íntimos. Ele era um homem e precisava de certos tipos de distração. Mas o que realmente dava luz à sua vida era Diana. Saía freqüentemente com a filha para diversos lugares. Divertiam-se bastante. No entanto, por mais que aquilo lhe enchesse de alegria, não era o suficiente. Ansiava a cada dia mais poder dizer a verdade para a menina e poder escutar a palavra “pai” sair de sua boca. Não era pedir demais, era? Contudo, havia algo que realmente parecia lhe tirar todo o ânimo: Gina. Aquela situação com a mulher não o agradava em nada, mesmo que fosse aquilo que pretendia desde que começara a sair com Susan. Jamais imaginou que seria tão difícil agir daquela forma. Tentar ficar longe quando estava tão perto, ter que conviver com a presença, com a voz, com o cheiro dela e mal poder tocá-la ou mostrar o que desejava. Perguntava-se o que seria mais torturante: vê-la todas as manhãs sentada naquela mesa com os cabelos de fogo caindo sobre o rosto, ou a cada vez que se aproximava sentir o perfume inebriante dela, que parecia penetrar nas roupas dele.
Para Gina as coisas estavam um pouco mais difíceis de se levar. A começar pela pressão que Rony pôs para que ela contasse a verdade aos pais, até que ela cedeu. A mulher, sem coragem, e até mesmo paciência de contar tudo pessoalmente, escreveu uma carta explicando como Draco surgiu novamente em sua vida, as desculpas que ele havia dado e como ele estava se aproximando da filha. Gina não podia esperar outra reação deles senão a perplexidade e incredulidade. Era realmente inacreditável. Molly encheu-se de medo do que poderia acontecer com a filha e com a neta, tendo elas Draco Malfoy tão perto, mas temia principalmente pela neta. Não só ela, mas todos receavam que Diana pudesse se revoltar contra a família ao descobrir a verdade. Isso porque uma coisa era a menina gostar dele como amigo e outra bem diferente era aceitá-lo como pai, depois de tantos anos. Já Arthur preferira não opinar e nem criticar, como todos vinham fazendo desde que souberam. O senhor Weasley não sabia o que pensar na verdade. Para ele era difícil acreditar que Draco estava vivo quando o havia visto morto, na sua frente. Todos esperavam que ele compartilhasse da mesma raiva pelo rapaz que todos sentiram. Mas, surpreendentemente, decepcionaram-se ao ver que Arthur não culpava o ex-sonserino de nada. Ele simplesmente dizia: “Ele praticamente salvou minha vida. Acho que deveríamos pelos menos escutar o que ele tem a dizer.” Rony foi o que mais se revoltou com a posição passiva do pai, mas não podia culpá-lo; ele havia passado por muitas coisas. Em poucos dias a família foi se acalmando e deixando que Gina tomasse as decisões afinal, aquilo envolvia somente ela e sua filha. A ruiva agradeceu por não estar perto deles. Sabia que, se estivesse, as coisas seriam bem diferentes.
Sua relação com Harry parecia estar muito bem. Aquele namoro era o que tranqüilizava a família. Pensavam que, se a pequena Weasley estava com Harry, seria mais difícil de Draco Malfoy se aproximar. Mal sabiam que a cada dia que passava Gina se convencia mais de que não conseguiria amar Harry como ele merecia. Ela gostava da atenção dele, mas precisava de mais. O modo como as coisas andavam com Draco também a fazia sofrer, mas, pior do que aquilo, era saber que aquele homem realmente estava com outra pessoa. Sentia-se completamente deprimida a cada compromisso dele que não estava em sua agenda, a cada almoço que ele saía e pedia para não ser incomodado, a cada sinal de que ele estaria com ela. Nunca imaginou que pudesse sentir tanto ciúmes de alguém. Mal deitava na cama à noite e a imagem dele com a outra vinha em sua mente. Os dois se beijavam com paixão e algumas vezes até pareciam rir dela em seus pensamentos. Ela se perguntava se não estaria ficando louca.
Certa manhã, Draco acordou muito decidido. Passou a noite anterior pensando seriamente se já seria o momento certo; algo em seu interior dizia que sim. Tinha que falar com Gina. Como Susan mesmo aconselhara, pressionaria a mulher se fosse preciso. Já havia se passado muito tempo e ele tinha que assumir uma posição. Ao chegar em seu andar particular, Gina já estava em sua mesa ao telefone, muito centrada. Olhou para o relógio. Realmente estava um pouco atrasado. Passou mais tempo do que pretendia na frente do espelho ensaiando as palavras e as expressões que usaria ao falar com a ruiva.
- Bom dia. – Ele cumprimentou rapidamente e chegou mais perto.
- Bom dia, senhor. – disse ao pôr o telefone no gancho. – Deseja ver sua agenda? – indagou ao ver ele tão próximo. Naquelas semanas, ele só se aproximava de tal forma quando queria algo.
- Preciso falar com você. Venha até minha sala.
- Está bem. – concordou confusa, franzindo as sobrancelhas. Levantou-se, com a agenda em mãos para qualquer coisa, e seguiu-o até dentro da sala, em frente à mesa.
Ele se sentou em sua cadeira e fitou Gina. Ofereceu a cadeira para que ela se sentasse. Gina estranhou ainda mais, mas obedeceu. O que ele estaria pretendendo, era o que ela se perguntava. Pelo seu rosto, com certeza era algo mais sério e sem relação com a empresa.
Draco tentou fazer a expressão firme, dura e autoritária que ensaiou, pôs as primeiras palavras planejadas na boca, mas não conseguiu emitir nenhum som. Havia sido mais fácil na frente do espelho. Com Gina ali à sua frente seria bem mais difícil. E por que ela tinha que estar tão bonita naquele dia?
A mulher percebeu que ele não sabia por onde começar. Entrelaçou os dedos das mãos sobre as pernas. Começou a estalar um por um. Estava ficando tensa.
- Aconteceu algo? – Ela se apressou em perguntar, ficando preocupada com o que poderia ser o assunto daquela conversa.
- Sim... – disse distraidamente, enquanto viajava nos olhos castanhos dela. Tinha tanto tempo que não parava para fitá-los tão profundamente, que não conseguiu evitar. Foi somente quando ela abaixou o olhar, parecendo perceber a concentração do homem nela, que ele se deu conta do que estava fazendo. – Digo, não. Queria conversar com você sobre Diana. Eu tenho adorado ficar com ela, poder me aproximar, mas não aguento mais ser apenas um amigo para minha filha. Então, eu estava pensando... será que já não está na hora dela saber a verdade? – Draco se reprovou imediatamente. Onde estava o tom ríspido que havia planejado?
Gina parou pensativa ao escutá-lo. Estivera com a mente tão ocupada com seus ciúmes que acabou se esquecendo de que ainda tinha que contar a verdade sobre o pai para Diana. Como pôde ser tão egoísta? Estava indo contra seus próprios princípios. Sempre falava que Diana era sua única prioridade, mas aquilo não estava acontecendo de verdade. Sentiu-se uma péssima mãe. Fitou Draco, que parecia estar esperando ansiosamente por uma resposta. Talvez ele tivesse razão. Diana era apaixonada por ele e isso, por mais que fosse difícil para todos, principalmente para Rony e Harry, ninguém poderia negar. E, além do mais, a menina sempre demonstrou ser muito madura e compreensiva. Alguma hora teria que contar e não adiantaria adiar mais.
- Está bem... – concordou um tanto relutante.
- Gina, entenda.... – começou, já imaginando que ela discordaria, mas ao perceber o que ela havia dito, parou e a encarou, muito surpreso. – Sério?
- Sim. Também não quero mais ficar adiando esse momento.
Draco abriu um imenso e incontrolável sorriso. Quase não acreditava que realmente havia sido tão fácil. Finalmente assumiria seu lugar de pai na vida de Diana. Queria pular de alegria, correr até a menina naquele momento mesmo, e chamá-la de filha por diversas vezes. Mas, ao ver o olhar vermelho e perdido de Gina na direção da janela, seu entusiasmo foi morrendo aos poucos. Dava para ver que ela estava triste, ou, no mínimo assustada e temerosa. Não poderia acusá-la. Conseguia imaginar o quanto aquela decisão deveria ter sido difícil para ela. Viu pequenas lágrimas se formarem enquanto ela abaixava a cabeça e cruzava os braços sobre si, como se quisesse se proteger daquele receio. Cerrou os lábios. Sentiu desejo de se levantar dali e abraçá-la, dar-lhe consolo e dizer em seu ouvido que tudo ficaria bem. Queria, pelo menos, poder estar mais perto dela, mas não poderia. Infelizmente, não poderia. A situação entre eles estava bem clara. Tinham que permanecerem distantes um do outro.
- E o que vamos fazer? – A mulher perguntou, ao passar a mão rapidamente sobre o rosto, secá-lo e levantar o rosto para fitar Draco. – Como vamos falar com ela?
- Eu não sei. Vamos pensar com calma para que nada saia errado.
Ela simplesmente balançou a cabeça, concordando. Percebendo o profundo e incômodo silêncio que se formava ali, levantou-se, ainda um pouco desnorteada. Suas pernas tremiam, sem ela nem ao menos saber o por quê.
- Acho melhor eu voltar para minha mesa. – Gesticulava nervosamente. – Depois conversamos sobre isso.
- É melhor. – Olhava-a de forma indecifrável. Um olhar cheio de sentimentos tão confusos quanto os que habitavam o coração da ruiva.
Ela deu uns passos para trás e olhou para o que estava em suas mãos. Voltou-se para perto da mesa.
- Quer ver os compromissos para hoje? – indagou ao estender o objeto para ele, que o pegou de imediato.
- Eu vou dar uma olhada e depois levo para você. – Continuava a encará-la da mesma forma. Gina começou a se sentir incomodada.
- Está bem. – Apressou-se em concordar e rapidamente saiu da sala.
Ao fechar a porta, Gina se apoiou com as costas nela. Estava exausta. Sentia-se como se estivesse saindo de um campo de batalha, onde não havia vencedores. Suspirou ao relembrar o olhar de Draco. Como amava aqueles olhos, mas os odiava ao ver o efeito perturbador que tinham sobre ela. Olhou para o lado, na direção de sua mesa, onde havia o pequeno porta-retrato da filha. Perguntou-se qual seria a reação da menina ao saber que seu grande amigo, Draco Malfoy, era seu pai.
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!