Diferente?
Capítulo 4 – Diferente?
Só ele sabia o quanto odiava contar sua própria história. Mas aqueles olhos tristes e acabados em uma moça tão jovem o forçavam a isso, assim como a enorme simpatia que sentira por ela desde o primeiro momento. Tinha certeza de que poderia ajudá-la a passar por o que quer estivesse acontecendo em sua vida, se ela visse que ele também passara por várias dificuldades.
Se bem que, analisando sua vida no momento, sozinho e sem sequer conhecer a filha, ele não parecia estar indo muito bem.
- Eu nasci em Londres, muito longe do centro movimentado de lá, quase fora da cidade. Era uma área rural e meus pais eram pessoas simples, muito inteligentes e bastante trabalhadores. Meu pai tinha negócios com um homem chamado Fenrir Greyback. Assuntos que tinham sido decididos antes mesmo de eu nascer; pelo que sei, meu pai pedira algum dinheiro emprestado para começar um negócio que acabou não dando certo. O que ele ganhava como vendedor era mais que o suficiente para que vivêssemos bem, mas não tínhamos o bastante para pagar tudo o que Fenrir queria. Cobrava com juros altíssimos, mais que o dobro do que emprestara ao meu pai, que tentava lhe devolver o dinheiro em pequenas prestações. Um dia, ele se cansou disso.
“Ele foi à nossa casa quando eu tinha sete anos, pude vê-lo chegar enquanto brincava no pátio, junto com alguns amigos. Era um homem alto, barbudo, com olhar desconfiado. Foi até a porta sem olhar para mim, e bateu com força; gritou com minha mãe quando ela veio atender. Lembro que fiquei surpreso por ela não o convidar para entrar, porque ela costumava ser muito simpática com todo mundo. Ao invés disso, ela foi até a sala e voltou, segundos depois, com meu pai”.
Sylvie imaginou onde aquilo ia acabar. Conhecia o nome de Greyback de livros e das historias sobre o período das trevas em que Voldemort estava no comando, embora fosse muito nova na época. Olhou para o pai fixamente, enquanto ele encarava os cadarços, pesando as palavras, e sem coragem de erguer o rosto. Ela conhecia bem aquela sensação, fora exatamente assim que se portara ao falar com Dean sobre seu pequeno problema com a lua. Entristeceu-a pensar no garoto que Remus fora, e pela primeira vez pareceu lhe ocorrer que ele também sofrera, assim como ela durante toda sua vida.
Ele também era vítima, e não o vilão, como ela o imaginara por tanto tempo.
“Minha mãe me chamou para dentro, parecia muito preocupada. Claro que não entendi direito, pois era muito pequeno, mas dava para ver que Fenrir Greyback ali, em nossa casa, a deixara assustada. Mandou que eu ficasse em meu quarto e só me chamou horas depois, para jantar. Até hoje ela não sabe que eu podia ouvir os gritos que vinham do jardim”.
- Gritos?
- Ameaças – Remus olhou-a de relance antes de se voltar outra vez para o chão – Ele disse a meu pai que ia se vingar, que tomaria o que era dele de direito, de um jeito ou de outro. Meu pai foi corajoso, falou que não tinha medo dele, e que ele não poderia fazer nada, afinal nós não tínhamos o dinheiro. E Greyback disse que podia cobrar de outra forma. Isso assustou meu pai.
- Qualquer um ficaria assustado.
Lupin realmente ergueu a cabeça dessa vez. Em uma semana, era a primeira vez que ouvia um tom de bondade em sua voz, e aquilo o surpreendeu. Não que achasse que ela era uma má garota, apenas ficou feliz ao vê-la expressar algum sentimento positivo. Sorriu para ela, que, vendo o quanto cedera, voltou a fechar o rosto e tomou mais um gole de chocolate quente.
- Sim, é verdade – afirmou – Ele conversou com minha mãe a respeito de mudar para a cidade grande, mas ela se recusou, por que toda a nossa vida era ali. Falou com tanta veemência que ele não conseguiu discutir e acabou se convencendo de que não havia perigo em ficarmos.
“Não sei se ele sabia que Fenrir Greyback era um lobisomem. Imagino que não. De qualquer modo, passou-se quase um ano sem que tivéssemos notícias dele, não acreditávamos que ele podia voltar. Eu tinha há recém feito oito anos, quando saí de casa ao entardecer... ia comprar alguma coisa para minha mãe em um mercado ali perto. Farinha ou algo assim, para que ela fizesse bolo de chocolate, meu preferido. Estava voltando quando vi a lua cheia no céu. Parei para admirá-la, por que sempre a achara tão linda... e a próxima coisa que vi foi a pequena sacola de compras voar das minhas mãos e um lobo enorme à minha frente. Congelei”.
Remus tinha a voz fraca agora, como se vivesse novamente o momento de terror. Sylvie ouviu o próprio ofegar, envolvida que estava na história, talvez por sentir as mesmas coisas que ele sentia, por saber exatamente como era passar por isso, como e era perder a infância tão cedo. Sentiu o impulso de ir até ele e tomar sua mão, tentar consolá-lo, do mesmo modo que ele fizera com ela, de um passado que os atormentava.
- E então ele...
- Ele mordeu você – terminou ela, uma vez que o pai parecia incapaz disso. Ele assentiu rapidamente, o olhar fixo nas tábuas do piso, sem parecer que realmente as visse.
- Eu senti muita raiva dele, mas fiquei ainda mais triste pelos meus pais. Eles se culpavam muito, e eu acabei culpando a mim mesmo pela infelicidade deles. Não era nada fácil ter um filho lobisomem.
“Achei que ia causar menos problemas me afastando. Ia pouco para casa depois de terminar o colégio, e nunca perto da lua cheia. Também não falava sobre isso com eles, nem com ninguém a não ser três amigos que fizera em Hogwarts. Já deve ter ouvido falar de todos eles, cada um é famoso com sua própria história. Eu, por outro lado, preferi ficar quieto, longe de qualquer um que pudesse machucar. Pensei assim por muitos anos, sofri muito por não poder ficar perto de quem amava, e tive uma vida muito difícil. Vivia de pequenos bicos aqui e ali, por que ninguém queria empregar alguém que teria de faltar longos períodos a cada mês. Não tinha relacionamentos por que não me achava digno de ninguém, e temia contar a verdade e não ser compreendido. Mas conheci Ninfadora...”
Remus parou abruptamente, e Sylvie arregalou os olhos. Não sabia se conseguiria lidar com isso, ouvir o romance dos pais assim, e não se denunciar. Teve o cuidado de manter a expressão impassível, mas um sorriso suave e impossível de se conter surgiu de repente nos lábios de Lupin. Ele parecia perdido em lembranças, e ela, temerosa, mas inegavelmente ávida por mais, acabou insistindo.
- É a mulher das fotos? – ele afirmou, sem prestar muita atenção – Como se conheceram? – perguntou com a voz um pouco mais alta, fazendo-o voltar a terra.
- Na Ordem da Fênix – ele disse, voltando o olhar para Sylvie. Só agora percebia algumas semelhanças entre ela e Tonks. Teria sido essa a razão do seu afeto pela menina? – Na Ordem da Fênix... – murmurou novamente, meio aéreo, enquanto observava mais e mais um rosto muito parecido com de sua querida Dora.
- Como ela era?
- Ela era muito mais nova que eu, mas sabia que eu era lobisomem desde o início e nunca me tratou de nenhum modo especial. Era metamorfomaga, então podia mudar de forma a vontade... aparecia com cabelos diferentes a cada dia, e sempre tentava nos animar com brincadeiras bobas com o nariz ou as orelhas – ele soltou um riso fungado, triste, e Sylvie teve medo de que ele começasse a chorar – Tinha um gosto musical duvidoso, talvez por ser mais jovem que eu, mas gostava daquelas bandas barulhentas, sabe? Um terror para os ouvidos, mas vá entender... ela adorava! Ficava batucando com os dedos na mesa durante as reuniões muito chatas, cantarolando ou assoviando, não importava qual o assunto em pauta.
Sylvie achou que ele descrevera a mãe de forma um pouco irresponsável, e comentou isso em voz alta. Ele sorriu mais uma vez, parecendo saudoso, e ela não conseguiu fingir que não vira seus olhos marejarem.
“Ah, não. Ela era uma auror incrível, muito forte, muito valente. Lutou contra muitos Comensais da Morte, inclusive a própria tia, Bellatrix Lestrange. Ficou muito tempo no hospital depois disso, atingida por um feitiço poderoso de magia negra, mas se recuperou. Ela era invencível. Eu tinha medo de machucá-la, mas ainda assim, havia uma convicção inabalável em mim de que ela estaria sempre lá, sorrindo e fazendo piadas, não importando o quanto o mundo estivesse com problemas. Quando me dei conta, estava apaixonado por ela. Amava-a tanto, Sofia, e a fiz sofrer por tanto tempo...”
Ela não agüentou ver o pai baixar a cabeça e apoiá-la nas mãos, com lágrimas escorrendo lentamente pelo rosto, pingando e deixando manchas nas calças velhas e desbotadas que usava. Ele pareceu tão perdido e ela se sentiu tão tocada que, quando se deu conta, tinha pulado da poltrona e sentava-se ao seu lado no sofá, dando tapinhas desajeitados em seu ombro. Sentiu-se mal vendo-o sofrer assim, e sabendo que ela também o faria sofrer quando revelasse que Sofia Mack não passara de uma mentira. Ele estava abrindo seu coração para ela, um coração velho e cansado, e ela iria arrancá-lo e parti-lo em pedacinhos, não importava a atitude que tomasse.
- Eu não deixei que ela se aproximasse de mim – gaguejou ele, ainda abalado – Disse que não a queria, para que ela fosse embora.
- Ela foi?
- Não. Não, era teimosa como um hipogrifo, essa mulher – ele riu, trêmulo, e secou o rosto com as costas da mão, parecendo um pouco embaraçado – Ia atrás de mim sempre que me via, dizia que não se importava com a maldição, não desistia nunca. Tudo o que eu queria era esquecer os problemas e ficar com ela, mas sabia que não daria certo. Falei isso a ela, mas Tonks – esse era seu nome, Ninfadora Tonks – disse que eu estava com medo. Acho que realmente estava.
“Depois de um ano eu acabei me convencendo de que não tínhamos muito tempo. Ela armou um escândalo no momento mais inapropriado possível, mas serviu para me abrir os olhos. Estávamos em plena guerra, não sabíamos quem estaria vivo no dia seguinte, e tudo já era tão difícil sem que eu tentasse colocar mais obstáculos... eu resolvi tentar, ia recuperar o tempo perdido, fazê-la tão feliz que ela sequer se lembraria do quanto sofrera antes por minha causa. Pedi-a em casamento. Lembro-me até hoje do seu sorriso quando lhe mostrei a aliança que tinha comprado”.
- Era bonita?
- Não muito, na verdade. Era bem simples. Eu não tinha muito dinheiro para gastar em jóias, e ainda queria dar a ela uma festa. Mas gastei tudo o que pude no anel e deixei-o escondido dentro do açucareiro.
- Dentro do açucareiro? – ela estranhou.
- Foi. E quando fomos preparar o café da manhã, fiz de tudo para que ela o derrubasse. Não precisei me esforçar muito. Ela era um desastre – seus olhos se umedeceram novamente – Era uma desastrada, derrubava tudo o que lhe caía nas mãos. E quando viu a caixinha da aliança no meio de todo aquele açúcar... eu nunca vou esquecer o modo como ela olhou para mim, totalmente chocada... e então começou a sorrir e chorar ao mesmo tempo... me desculpe – murmurou ele, enxugando as lágrimas – Eu não penso... eu não falo sobre ela há muito tempo.
- Tudo bem – ela mesma sentia um nó na garganta. Aquele homem não era uma fera incontrolável, não era um monstro. Era um senhor bom e gentil, e que amara sua mãe como se fosse o tesouro mais precioso do mundo, e fizera tudo para fazê-la feliz. Não podia odiá-lo, se ele realmente amava Ninfadora tanto assim – Eu gosto de ouvi-lo.
Sylvie queria cuspir as palavras de uma vez. Eu sou sua filha! , queria gritar para ele, antes que voltasse atrás e desistisse por saber o quanto mais isso o machucaria. Mas antes, pensou, precisava ouvir o final da historia. Precisava saber o que ele achava dela, o que acontecera naquela noite fatídica há tantos anos. Tinha que saber, e aí, quem sabe, poderia partir no dia seguinte um pouco mais segura e com menos peso na consciência.
- Essa... Tonks? Ela parece uma pessoa maravilhosa. – nossa, pensou, como sentia saudade da mãe! – O que aconteceu com ela? Por que não mora aqui, com você?
Lupin quase desistiu. Sabia que ele mesmo dera início àquela história, mas fazia anos que não se abria assim e não tinha certeza de que conseguiria colocar para fora o pior de tudo. Era um segredo que jamais compartilhara com ninguém. Olhou para a moça a sua frente, com os cabelos castanho-escuros bagunçados e uma franja longa caindo sobre os olhos. Ela entenderia? Ela conseguiria compreender o que acontecera há doze anos, sem julgá-lo? Ele achava que não. Mas havia nela alguma coisa, ele não sabia o quê, mas algo que o fazia confiar nela assim como confiara em Ninfadora desde o dia em que a conhecera. Encarando por um momento a menina, ele achou que valia a pena tentar. Com um aperto no peito, começou a parte mais sombria de sua história.
- Nos casamos rapidamente, uma pequena cerimônia para os amigos mais íntimos. No mesmo ano, tivemos um bebê. Uma menina linda, uma combinação perfeita de nós dois. Seu nome era Sylvie. Compramos uma casa não muito grande, totalmente protegida contra ataques das trevas, e decoramos nós mesmos. Pintamos paredes, reformamos alguns móveis antigos que tínhamos. Ganhamos algumas coisas, como presente de casamento, mas a maior parte da mobília já era usada. De qualquer forma, achamos que estava lindo.
Sylvie se sentiu estranha ouvindo o nome sendo dito pela boca do pai, sem ele ter a mínima idéia de que ela era a filhinha perfeita de quem ele falava. Ao mesmo tempo, lembrava-se da casa, os móveis pintados de várias cores – obra da mãe – e as inúmeras estantes cheias de livros – contribuições do pai. Além de tudo o mais que fora reaproveitado de duas casas diferentes, formando um lar. Mesmo anos depois, a maior parte de tudo aquilo continuava igual.
-Vivemos muito felizes por alguns anos. Sylvie era a menina mais linda do mundo, e muito inteligente e doce. Eu a amava muito, Sofia, quero que saiba disso antes que eu continue. Eu amei minha filha mais do que qualquer coisa e ainda a amo.
- Sei disso – ela teve que fazer força para engolir o choro. Como era possível, por Merlin, como ele podia amá-la assim? Nem a conhecia! E, pior, iria odiá-la, desapontar-se com ela, quando ela finalmente revelasse seu segredo. Aquilo fez seu coração doer – Não se preocupe, pode continuar. O que houve com ela?
- Eu a mordi.
---
Não havia poção o suficiente na despensa. Tonks esquecera-se completamente de preparar mais, ocupada que estava cuidando de Sylvie e com o trabalho como Chefe dos Aurores. Olhou para a garrafa que cheia até a metade de um líquido fumegante e achou que aquilo talvez bastasse para uma noite. Despejou o conteúdo em um copo e foi até a cozinha, onde o marido esperava sentado, lendo alguns pergaminhos. Ele ergueu os olhos quando ela entrou.
- Tudo bem, Dora?
- A poção está acabando – ela levantou o copo, e viu os olhos de Remus estamparem medo no mesmo instante, compreendendo o problema. Aquilo sempre a magoava, saber que não havia mais nada que pudesse fazer para aliviar sua dor – Não se preocupe, deverá ser suficiente para esta noite.
- Não – balbuciou ele – Não, eu sairei de casa esta noite. Não haverá nenhum problema para você ou Sylvie – ele já estava de pé, pensando em onde poderia ficar. Com certeza não ali. Não se houvesse qualquer possibilidade de machucá-las. Estava indo em direção à porta quando ouviu o suspiro de Tonks.
- O que foi?
- Você não precisa sair, Remus. Sério. Colocaremos um feitiço no escritório, se você se sentir mais seguro assim. Além do mais há poção o bastante para hoje, e posso preparar mais para amanhã.
- E se não der certo? Sylvie pode ouvir algo e ficar assustada.
- Deixaremos tudo à prova de som. Fique aqui, por favor. Não quero que tenha que sair de casa quando coisas assim acontecem – ela o abraçou nessa hora, e sentiu-o tenso. Beijou seu rosto e pescoço, acariciando seus cabelos lentamente, para acalmá-lo – Vai dar tudo certo, meu amor.
Ele acreditou. E deixou-se encarregado de preparar o cômodo ele mesmo. Por precaução, resolveu guardar qualquer objeto que ele pudesse quebrar, e, com um aceno de varinha e algumas palavras mágicas fez com que se tornasse impossível abrir a portai pelo lado de dentro, sem desfazer o feitiço. Um lobisomem nunca conseguiria escapar usando apenas a força. Também impediu que qualquer som saísse do escritório para o resto da casa.
Uma hora antes do anoitecer, tomou a poção. Era pouco mais da metade do que estava acostumado a beber, mas provavelmente o deixaria mais controlado. Com um pouco de sorte, nem haveria diferença.
- Pai?
Ele se virou para a menina pequena na porta. Tinha bochechas rosadas e olhos grandes, e os cabelos presos em marias-chiquinhas. Usava uma calça jeans minúscula que comprara alguns dias antes com Ninfadora.
- O que foi, lindinha? – ele se abaixou para ficar da sua altura. Ela andou até ele, sem pressa, e, quando seu nariz estava a centímetros do dele, cruzou os braços e fez beicinho.
- Já está na hora de ir dormir?
Ela sabia. Como lhe doía saber que ela entendia tudo o que acontecia na lua cheia, e que isso a preocupava. Pegou-a no colo e embalou-a, enquanto ela encostava seu rosto no seu, sentindo a pele áspera e marcada do pai contra a sua, suave.
- Ainda não. Ainda posso brincar mais um pouco com você.
A idéia era tentadora. Ela colocou as mãozinhas pequenas no rosto dele e fitou-o com um interesse quase constrangedor. Franziu as sobrancelhas, como se ponderasse algo muito importante. O pai parecia cansado. Não queria que ele ficasse pior por brincar com ela.
- Não quero brincar – mentiu – Quero que me conte uma história.
Remus contou a ela duas histórias, feliz ao se distrair um pouco e em ver a filha se divertir. Mesmo assim, via a atenção dela se dispersar às vezes, e sabia que ela preferia estar correndo pela casa ou aprendendo a jogar quadribol.
Quando o sol começou a se pôr, ele improvisou um final para o conto sobre gnomos e fadas mordentes que havia inventado e foi até o escritório. Sylvie, cuidadosa, espiou para dentro. Espantou-se ao ver que muitos dos móveis haviam sido afastados, e ainda mais ver o pai murmurando palavras com a varinha na mão.
- Você vai dormir aqui hoje – ela disse. Não havia entonação de pergunta, mas ele respondeu mesmo assim.
- Sim, eu vou.
- Você nunca coloca feitiços, pai.
- Hoje será uma noite meio... diferente, Sylvie.
Aquilo ficou em sua cabeça. Hoje será uma noite meio diferente. O que queria dizer? Ela pensou nisso enquanto tomava banho, e enquanto a mãe lhe colocava o pijama. Continuou pensando nisso enquanto jantava e na hora de dormir. A mãe parecia preocupada e com a cabeça em outro lugar, como sempre. Isso não estava diferente. E também não vira mais o pai depois que ele entrara no escritório, o que era o normal. O que mudara?
Ficou sozinha em seu quarto, no escuro, tentando adivinhar. A curiosidade que herdara da mãe a consumia, imaginava possibilidades absolutamente plausíveis à mente de uma criança, desejava o melhor para o pai.
Seu relógio tocou uma canção animada quando marcou onze horas. Puxa, ela não conseguia dormir. Queria muito saber.
Desceu da cama com cuidado e calçou as pantufas de unicórnio muito fofas que deixara perto da porta. Devia chamar a mãe? Descartou a idéia. A mãe podia estar dormindo e ela sabia o quanto isso era difícil naqueles dias em que o pai não estava; não queria incomodá-la. E, afinal, de contas, só iria dar uma espiada.
Degrau por degrau, Sylvie chegou à sala de estar. Estava tudo tão escuro! Ela não gostava da escuridão, mas também não tinha como acender a luz. Com passos curtos e hesitantes, parou à porta do escritório. Tudo estava em silêncio. Ela abriu a porta e espiou para dentro.
Podia ver os contornos dos móveis afastados e do sofá coberto de almofadas velhas e fofas. O pai devia estar dormindo ali, mas ela não podia ver mais que um vulto grande, subindo e descendo ao ritmo da respiração.
Diferente? Tudo lhe pareceu absolutamente normal. Pronta para voltar para o quarto e dormir até de manhã, ela voltou para a sala.
E esqueceu de fechar a porta.
N/A: Capítulo meio chatinho, mas tinha que acontecer. Desculpem ter demorado tanto, mas com a volta às aulas ficou meio difícil e depois meu computador quebrou =/
Mais ação no próximo capítulo, prometo!
Beijos
Drusilla Tonks
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!