À noite - parte I



Quando Snape chegou aos arredores do Salgueiro Lutador, já esperava por alguma armadilha. Sabia que o quarteto inimigo o observava por trás das moitas. Não se intimidou. A curiosidade era maior, e por isso deteve-se a seguir as instruções cuidadosamente. Procurou pela vara longa, usou-a para apertar o nó no tronco da árvore. Ela instantaneamente parava de se mexer. Parecia mágica – ou talvez fosse?

Não se importou. Jogou a vara no chão e caminhou em direção à passagem escura embaixo do salgueiro – então, encontrou a armadilha.

Imprevista por todos.

— Severus! PARE!

O jovem sentiu uma mão segurar-lhe pelo ombro e puxa-lo para trás, girando-o em cento e oitenta graus. Deparou-se com a figura ofegante da irmã, tirando as madeixas negras da frente dos olhos.

— Aqui é perigoso — disse, fazendo força para respirar certo —, o que está fazendo?

Ele levantou uma das sobrancelhas.

— Achei que saberia — respondeu —, visto que está aqui também.

— Nós – eu – estava indo – saindo da festa quando —

— Que decepção — ele a interrompeu —. Você era melhor quando era minha irmã.

Era? Um dia fora e agora não mais..?

Suspirou. Respirou fundo para tentar se acalmar.

— Severus, esse não é o melhor momento para resolvermos nossos problemas familiares... Vamos sair daqui.

— O que aconteceu? Seu namoradinho ficou com medo e resolveu te chamar pra me fazer chantagem emocional?

Ela franziu a testa até o máximo. Algo estava lhe fugindo do conhecimento...

— Do que está falando..?

— A namorada sangue-ruim do Potter também voltou — ele apontou com a cabeça para Lily, que estava encolhida atrás da amiga —. Patético.

— O que a Lily tem a ver com isso..?

— Você realmente era melhor quando era minha irmã — ele voltou a repetir, friamente —. Era mais sincera comigo, e suas mentiras eram melhores...

— Severus, eu não sei do que está falando, eu só quero sair daqui antes que —

— Nossa, então Black te meteu nessa história toda sem nem ao menos lhe contar sobre seus planos..? — ele deu uma risada seca — Ha! Não creio que tenha me trocado por ele.

— Que planos ele — ?

— CUIDADO!





— Ah, não. Ah, não, não, não.

O coração de Sirius Black pulsava dolorosamente acelerado dentro de seu peito. Sophie Snape e Lily Evans tinham alcançado Snivellus. Ele não tinha entrado na passagem secreta. Não entraria. Agora estavam os três parados diante de um Salgueiro Lutador prestes a se mexer, conversando como se não houvesse nada de errado, como se ignorassem a presença relativamente próxima de um lobisomem abaixo de seus pés.

Severus e Lily realmente ignoravam. Mas Sophie sabia, e o desespero para tirar os outros dois dali era visível em seu rosto.

Se algo acontecesse... ah, se algo acontecesse a ela... seria tudo sua culpa.

— E agora? — ele perguntou, virando sua cabeça de James até Peter.

— Temos que tira-las de lá — James simplesmente respondeu, também tomado pelo desespero.

— Ótimo raciocínio — ele girou os olhos, impaciente —, consegue pensar como?

— Se eles nos virem, estamos ferrados — Peter tremeu.

— E nós somos animagos pra quê?

— Ah, é verdade. Então vá lá, senhor cervo, vá lá fazer a sua entrada triunfal galopando pra salvar as nossas donzelas indefesas...

— Desculpe se eu não tive a magnífica idéia de chamar o Snape pra ver o meu amigo transformado em lobisomem!

— Onde que está o Sirius legal agora, hein? Onde que está a magnífica idéia de animar os amigos numa noite triste?!

— Ssssh, por favor, falem baixo — Peter choramingou — eles vão nos ouvir, eles vão nos ver...

— Então vai lá, Wormtail — Sirius se virou para o amigo —, transforme-se em rato e aperte o nó no tronco.

— E-eu?! P-porque e-eu?!

— Porque quero discutir com James em paz. Vai lá, antes que a árvore se mexa! — ele empunhalou a varinha e, com um estalo, Peter Pettigrew assumia sua forma de rato e saía correndo guinchando entre as folhagens.

— Grande. Agora Snape entra embaixo do salgueiro e leva as nossas duas donzelas indefesas —James suspirou —. Outra magnífica idéia.

Sirius abriu a boca para logo retrucar, mas fechou-a em seguida.

Droga. Ele estava certo.

— Vou espanta-las — ele disse, olhando fixamente para os três personagens próximos à arvore —, se Lily correr e eu puder ficar no caminho de Snape, estará tudo certo.

— Sophie vai saber que é você.

— Prefiro ela brava comigo do que machucada — respondeu, e apontou a varinha para si mesmo.

Um enorme cão negro saiu bradando em direção dos três.






Quando Lily gritou e empunhalou sua varinha, já era tarde demais. A gigantesca figura negra que vinha correndo em sua direção revelou-se ser a de um cachorro, e pulou com todo o peso de suas quatro patas em cima das costas de Severus Snape, que caiu com um baque surdo no chão. Mas a bruxa não se deixou intimidar. Antes que o animal avançasse, ela lhe lançou um bem dado “Expelliarmus”.

O feitiço do desarmamento, visto que o oponente não tinha varinha, serviu para afastar o cão para longe – ele foi lançado a metros de distância, batendo com força numa árvore próxima ao salgueiro, desacordado.

— NÃO! — Sophie deixou escapar, ao ver Black caído no chão.

— Você está doida?! Aquele bicho atacou Severus! — Lily balançava a cabeça com descrença. Depois, abaixou a varinha e, ainda um pouco receosa, dirigiu-se até Snape.

— Você está bem? — ela tentou ajuda-lo a se levantar, mas ele se debateu.

— Não preciso que uma sangue-ruim se preocupe comigo — respondeu, ríspido —, ainda mais se ela for amiguinha de James Potter.

— Eu sou tão sangue-ruim quanto você, meio-sangue — ela devolveu, séria —, e não sou amiguinha de Potter. Somos mais iguais do que você poderia imaginar.

Ele não se deixou conquistar. Não avaliou as palavras. Levantou-se sozinho e pôs-se a limpar o rosto e as vestes com as mãos.

Lily sorriu fino. Não entendia a gravidade da situação – para ela, Severus Snape continuava sendo uma graça enquanto resmungava.

— Que planos de Black são esses que você dizia, Severus..? — Sophie falou vagamente, passando os olhos do irmão para a figura canina do namorado, caído no chão. Precisavam sair de lá logo, mas... antes de tudo, antes de qualquer coisa, queria entender o que estava acontecendo.

— Ele muito gentilmente me convidou a lhe fazer uma visita hoje à noite aqui na sua casa — disse cinicamente —. Acho que não estava muito disposto a dançar com você.

— Mas aqui não há nada, ele só estava lhe pregando uma peça...

— Pois hoje acabo de descobrir que Black não é tão burro assim. Tem uma passagem embaixo do Salgueiro Lutador — ele apontou.

Sophie sentiu o estômago gelar.

Não... Sirius não poderia ter revelado o segredo de Remus... nunca...
— É uma peça. Ele quer te fazer de idiota. Vamos — mas parou ao ser interrompida por uma voz.





Sirius nunca soube por quanto tempo ficara desacordado. Ao bater com a cabeça na árvore, viu o cenário preto-e-branco a sua volta escurecer até sumir, e voltar logo em seguida, instantes depois. Tudo estava embaralhado em sua mente canina; demorou até que se lembrasse que estava embaixo de uma árvore violenta prestes a se mexer.

Ainda meio tonto, levantou. Foi cruzando as patas novamente até as pessoas, devagar até retomar o equilíbrio.

Não percebera que deixara atrás de si um Peter Pettigrew em forma de rato, desmaiado ao ser atingido por seu corpo enorme de cão.






— Vocês estragaram tudo! —gritou um James Potter vindo correndo, de longe — Estava sendo realmente engraçado ver Snivellus fazendo caretas pra tentar fazer alguma coisa.

Ele chegou, sorrindo aquele seu mesmo sorriso galante e maroto.

Sophie pensou ter visto uma piscadela discreta de seus olhos enquanto ouvia Lily murmurar um “patético!” às suas costas.

— Ela falou algo útil — aparentemente Severus não tinha coragem de chamar-lhe de “sangue-ruim” depois daquela ríspida comparação com sua pessoa —. Você é patético, Potter.

— Não fui eu que vim tentar me meter com uma árvore maluca, fui? Haha, agora me dêem licença — ele se dirigiu à ruiva —, vamos ao baile, querida Lily?

Ele jamais perdia a oportunidade.

— Quantas vezes tenho que lhe dizer, Potter —

Ninguém ficaria sabendo quantas vezes teriam de ser ditas. A continuação da frase da bruxa fora substituída por um grito agudo de susto quando todos foram surpreendidos pelos grandes galhos do Salgueiro Lutador, furiosos e violentos.

No próximo segundo, Sophie não estava mais lá.

Num ímpeto, seu corpo fora atirado a metros de onde estava, se chocando com um estrondo contra o tronco avantajado de outra árvore da Floresta Proibida.






Ao ver a garota sendo arremessada de um ponto a outro da floresta, Sirius sentiu seu coração descer até o estômago. Seus pés se fixaram como raízes à terra, esperando uma resposta do cérebro para que pudessem se mexer – mas ele não o faria enquanto ela não acordasse. E não acordou. O garoto se manteve estático até enfim também ser atingido por um galho furioso, indo parar apenas alguns metros de Sophie Snape.

Porém, o impacto fora forte demais. O golpe tinha sido na altura na barriga, e por isso agora sentia como se todos os seus órgãos tivessem sido reduzidos a pó dentro de si.

Minha culpa... não protegi Remus, não protegi Sophie... tudo minha culpa...
Mais uma vez, sua visão monocromática começou a embaçar. Perdeu os sentidos.






James puxou Lily para o chão quando um galho da largura de uma jibóia veio chacoalhando em suas direções. A bruxa deixou-se cair de costas e, já com a varinha em punho, começou a tentar impedir os ataques que lhes vinham de múltiplos lados.

Mas a árvore era demasiada robusta e rápida para ser atingida propriamente. Os galhos menores eram ligeiros demais, e tinham farpas saltadas ao longo do corpo; passavam cortando e arranhando. Os maiores, apesar de mais vagarosos, eram mais violentos; seus golpes eram mais difíceis de desviar e tão mais fortes que seriam capazes de quebrar uma perna ou arremessar alguém longe – como Sophie.

— Impedimenta! Impedimenta! IMPEDIMENTA! — a bruxa gritava enquanto corria e se desviava, já sem fôlego. Um galho pequeno bateu em seu braço de raspão, cortando suas vestes e fazendo sangrar um pequeno machucado.

— Você está bem? — Potter saiu correndo para se aproximar.

— Temos que sair daqui!

— Não dá, os galhos estão fechando a passagem até o castelo! — ele conseguiu estuporar um galho que quase o atingira na cabeça — Só temos chance se apertarmos o nó no tronco!

— Quê?

— Só o assim a árvore pára de se mexer!

— Onde é?

— É ali — ele apontou para o corpo do grande Salgueiro Lutador, a tempo de ver a figura de um Severus Snape descendo buraco adentro.

Buraco este que o manteria seguro até que encontrasse um lobisomem adulto faminto por carne.

Droga.

Em qualquer outra ocasião, teria feito questão de deixá-lo partir livremente, quem sabe mesmo seguindo-o para ver sua cara de pavor. Não se importaria se ele levasse alguns arranhões ou mesmo uma mordida. No entanto, naquele instante em que se via sem seus amigos, sentia como se toda a responsabilidade caísse sobre seus ombros. Remus não queria que ninguém descobrisse seu segredo, e Sirius lhe prometera que nada daria errado – mas agora que ele estava deitado inconsciente do outro lado, James se via na obrigação de defender seus dois amigos e, mesmo contra sua vontade, seu inimigo.

Apertaria o nó no tronco do salgueiro e, assim que ele parasse, tiraria Lily de lá e pediria que ela fosse atrás de Dumbledore – sentia um aperto no estômago ao imaginar a decepção no rosto do diretor. Mas esse seria o preço a pagar por todo aquele tempo de diversão arriscada e irresponsável.

Virou-se para Lily para lhe contar — mas de repente ela não estava mais ao seu lado, e sim correndo ao encalce do Snape que acabava de descer além passagem.

— Lily, não — !

Mas já era tarde demais.

Teve de segui-la para baixo do Salgueiro Lutador.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.