~ Amor, música e lágrima



- Volta aqui! Por favor, Mione deixe eu te ajudar. Estava ciente de que isso poderia confundir mais você... Só que era necessário, droga!

- Vá embora – não aceitava que ele me visse naquele estado. Como uma criança boba que acabou de se machucar.

Entrei na sala totalmente confusa. Porque foi aí que eu percebi a realidade: a gente realmente não poderia mudar o nosso presente. E eu jamais a teria novamente no meu futuro.

- Hermione, céus! O que aconteceu?! Aquele Jhony fez algum mal para você?! – meu pai levantou atordoado do sofá, e seguiu na minha direção.

- Não foi nada – enxuguei as lágrimas para disfarçar a dor que sentia naquele momento – Apenas percebi que ele era um completo idiota – Fingi que falava de Rony para ele não fazer mais perguntas.

- Você quer um copo de água ou... Comer alguma coisa?

- Não, pai. Apenas quero ficar sozinha, está bem?

Como um pai atencioso ele atendeu o meu desejo. E segui de cabeça baixa até o meu quarto, batendo a porta em seguida.

- Nós precisamos conversar.

- Não quero falar contigo agora, Harry. Apenas quero ficar sozinha. Por favor, atenda ao meu pedido - estava com a voz pesada.

- Não vou te deixar de novo. Agora você precisa me ouvir, e eu estou falando sério.

- Você prometeu que isso ajudaria! E agora eu estou com cara de quem acabou de ser ajudada?!

- O seu interior respira por alívio. Mas a sua mente parece não querer acreditar no que acabou de ver – ele se afastou e parou na sacada. Os olhos perdidos no horizonte das águas e a cabeça trabalhando em alguma forma de tentar me explicar de novo e de novo; até que eu pudesse compreender como ele compreendia.

- Foi como se eu tivesse a perdido... Que nem aconteceu no passado – apoiei minhas mãos na madeira que cercava a sacada, e abaixando a cabeça senti e vi as lágrimas escorrerem uma após a outra e tocarem o chão.

- Agora você entende, não é mesmo? Ela morreu feliz, Mione. Feliz por cantar mesmo quando não podia e ainda mais feliz por ter abraçado a filha uma última vez.

- Você tem razão, Harry. Eu só estou dando trabalho para você – e sorri amarelo, sem jeito de encará-lo novamente - Às vezes me comporto como se tivesse cinco anos de idade; eu mesma não reconheço que sou velha demais para isso.

- Até os mais sábios choram. Mesmo e principalmente quando não acham a razão para tudo nessa vida – e aproximando-se de mim, me abraçou pelos ombros.

- É incrível, não é? Quando nós menos esperamos, alguma coisa acontece. Ela foi embora e fim... Tão frio e tão simples – o olhei como se procurasse a verdade por trás de seus olhos, e percebi que aquela íris nunca me pareceu tão verde – O mesmo também está acontecendo contigo.

- Nunca irei te deixar completamente – beijou minha testa, deixando escapar algumas gotas no silêncio da noite – Nós iremos contemplar o mesmo céu então, isso não pode ser tão longe, pode? – e juntos, sorrimos.

- Harry?

- O que foi?

- Eu amo você. Amo de uma maneira tão simples e ao mesmo tempo tão bonita. E quase não me importo se você for embora, porque a verdade é que nunca irá me deixar em pensamento, não é mesmo?

- Também jamais irei te deixar em coração.

O pouco que nos separava tornou-se inexistente, pois já sentia a sua respiração rápida e eufórica bater junto ao meu rosto. Conseguia enxergar uma mínima gota em suas pestanas e assim seu corpo veio por completo para perto do meu, e, nossos lábios se uniram tornando-se um só. Uma sensação totalmente diferente passou por meu pé até atingir um fio de cabelo; aquilo era mágico. Estávamos traçando nosso próprio caminho, nos embrenhando na selva do destino, e num momento eu parei e pensei: eu acreditava em puro destino e não só no que os livros me proporcionavam.

Enquanto ele tocava meu rosto gentilmente e eu bagunçava ainda mais seus cabelos, Harry me apertou ainda mais junto de seu corpo e um calor humano espalhou-se tornando real aquilo que nós dois sentíamos um pelo outro.

- Promete que sempre vai pensar em mim? – sua voz saiu fraca, enquanto a testa estava encostada na minha. Olhando o mais profundo em meus olhos.

- Prometo, Harry. Eu prometo.

- Então eu acho que já podemos dormir em paz, já que amanhã você precisa estar com a voz em dia – sorrindo ele me acompanhou até a cama.

- Não posso cantar! - e por um momento me vi desesperada - Não tenho nenhuma música pronta!

- Eu cuido disso pra você. Agora durma... Porque nos sonhos tudo pode ser real, e até a sua mãe poderá estar com você, não é mesmo?

- Sim.

E após beijar-me com carinho, pulou a janela e seguiu sem rumo sob um céu estrelado.

#

- Bom-dia! – a costumeira voz de meu pai despertou os meus sonhos. – Trouxe seu café, querida – e após depositar uma bandeja sobre minha cama, sentou-se ao meu lado.

- Obrigada, pai – sorri em agradecimento e beijei-lhe a testa já meio calva – Que horas são?

- Ainda são seis da manhã. Quis acordar você mais cedo para fazer uma surpresa, então pensei em trazer o café na cama hoje – ponderou se deveria ou não tocar no assunto, optou pelo sim – Está melhor? Ontem me parecia um tanto... Triste?

- Melhor.

- Filha... Bem, gostaria de saber o que houve contigo. Realmente estou preocupado e se não estivesse, sabe que nem estaria tocando nesse assunto novamente.

Desviei meu olhar do dele. Simplesmente não conseguia mentir para o meu pai. Então respirei fundo, coloquei uma mecha para trás da orelha e o encarei. Certa do que deveria fazer naquele momento um tanto inoportuno.

- Eu o odeio.

- É um bom começo porque não fui com a cara dele – nós dois sorrimos – Mas... Isso é tudo, Hermione?

- Não. É que... Não sei como te dizer isso.

- Agora estou seriamente preocupado. Ele, hum... Tentou fazer algo com você?! – silêncio. – Céus! Que pai horrível eu sou. Como não percebi que havia algo errado com aquele moleque?!

- Não, papai! – respondi depressa – Eu te amo e o que está falando é uma tremenda mentira. Onde já se viu um pai horrível trazer café para a filha logo cedo? – toquei sua face e ele me retribuiu com um sorriso sincero.

- Você me lembra muito a sua mãe. – era a segunda vez que me dizia algo tão doce em relação a ela – O mesmo jeito de acalmar esse prepotente, aqui – o senti um tanto encabulado – Sua mãe, a Lílian, não teria perdido a calma se soubesse o que aquele marginalzinho tentou fazer contigo.

- Sente muita falta dela, não é?

- Demasiado muito. Nunca irei encontrar novamente uma mulher que chegue aos seus pés. A não ser é claro, você!

- Mulher? – agora estava rindo gostosamente.

- É sério o que estou falando – junto comigo, ele também sorriu – Não percebeu filha? O quanto adulta você já é?

- Bem... - perdi a fala.

- Então. É justamente disso que eu estou comentando... Acabou o tempo em que se deixava abalar por qualquer besteira! Ou pensou que eu não escutasse o seu choro abafado tantas vezes no travesseiro? – como sempre, me senti vermelha e tinha absoluta certeza que minha pele adotara um tom escarlate – Era por aquele marginal que chorava, não?

- Sim. Não faz idéia do quanto era difícil! E eu ainda dizia que não ligava para coisas banais. Pois é, papai... Os tempos mudaram e eu mudei junto.

- Para mim será sempre a Hermione meiga e dedicada – os olhos dele marejaram – Aquela garotinha que virá correndo a meus braços contando as novidades e se despedirá de mim com um beijo carinhoso nessa testa quase careca!

- Pai! Quantas vezes tenho que lhe dizer que isso ainda está longe de ocorrer?!

- Como você mesma disse, querida. Os tempos mudam... E eu estou envelhecendo com ele!

- Seu bobo – o abracei rindo.

- Então, hoje é o grande dia, não é?

- Grande dia?! – como ele sabia disso eu não fazia a mínima idéia.

- Qual música irá cantar?

Mas que coisa! Será possível que todo mundo revista o lixo da cozinha antes de jogá-lo para fora? Deveria ter queimado aquele panfleto idiota.

- Não sei... – meus ombros penderam – Ainda vou ver qual será melhor para apresentar. Se é que terei coragem para tanto.

- Mas não diga isso! Esqueceu que herdou o talento de uma grande mulher e que está morando junto com o marido da mesma? – e, como uma surpresa, meu pai retirou do bolso uma folha de aparência antiga. – Caso não haja alguma canção... – e entregando-me, era como se sentisse realizado por seu ato.

Passei meus olhos de relance sobre a letra. Era realmente muito linda. Tenho que admitir, e digo isso sem nenhuma inveja: minha mãe realmente tinha o dom para a coisa. Agora percebo o quanto foi bom ter cantado uma ultima vez.

- É... Perfeita! – algumas lágrimas caíram de meus olhos.

- Pensei que fosse gostar. Esta aí foi a ultima que ela apresentou. Estava linda! Vestido lilás de uma malha muito fina, no qual comprara com o dinheiro que sempre ganhava nos inúmeros concertos. Você sabe, seu pai aqui nunca ganhou muito.

- Imagino-a cantando - e meus pensamentos se perderam no nada - Continuarei isso para ela! – falei decidida e ao mesmo tempo aliviada. Jamais imaginei em fazer algo tão bonito em memória de minha mãe. E por um momento; um real e único momento, percebi que de nada valia a minha insegurança. Eu podia fazer tudo... Até voar se assim desejasse.

- Sinto orgulho de tê-la como filha! É a mesma coisa do que ter Lílian novamente. Com mais vida... Mas esbanjando o mesmo sorrisinho doce. – Nos abraçamos forte, deixando que as lágrimas rolassem livremente. Como rios contornando sinuosas curvas. – Céus! Olha a hora! Irá se atrasar. Coma logo e se vista, pois uma platéia a aguarda!

Um frio assustador tentou ter posse sobre mim, mas estava decidida a deixar o medo em casa, pelo menos hoje. Porém, vou confessar: a saudade do Harry contribuiu bastante para isso!



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