~ Passado Oculto



- Eu não sou deste mundo, Mione. Estava proibido em me envolver dessa maneira contigo – e ele tocou meu rosto, como se de alguma forma, me tivesse consigo para sempre – e eu me envolvi. Muito mais do que qualquer ser humano se envolveria. Fui expulso, Mi. Não serei mais anjo. E Amanhã à meia noite irei reencarnar bem distante daqui, e nunca mais iremos nos ver... E jamais estarei novamente ao seu lado... Te aconselhando, dizendo qual é o certo, abraçando você.

- Não quero isso! – dessa vez não conseguia mais segurar todas aquelas lágrimas trancadas por anos dentro de meu corpo. Eu começava a entender. Começava a compreender porque meu coração doía tanto, sangrava – Eu te amo muito, Harry! Compreendo tudo agora. Não era por Rony que eu me sentia feliz. Era por você! Você sempre esteve ao meu lado, sempre sentia amor quando perto de mim você se aproximava. Como fui tola... Agora eu te perdi. Perdi para a eternidade.

- Eu fracassei. É injusto o que eu fiz. Talvez o seu futuro esteja perdido. E por minha culpa... Tudo minha culpa.

- Perdido? Do que está falando, Harry?

- Amanhã vai ter um concurso musical no seu colégio, não é mesmo?

- Como você sabe disso... Eu, eu nunca comentei nada, eu... - gaguejei.

- Não é esse o caso, esquece! O problema é que eu devia ter te preparado muito antes para isso. Mas eu esquecia de tudo perto de você, até mesmo do seu próprio bem. Resolvi aparecer muito tarde e agora o tempo se foi.

- Se está pensando que eu vou subir num palco com inúmeras pessoas me olhando... Enganou-se, Harry! Tenho pavor disso. A música não veio para mim, não veio entende? Eu a amo, mas... É como se fosse amaldiçoada.

- Não culpe a música pelo o que houve com a sua mãe, Hermione. Ela não tinha como intervir no próprio destino.

- Destino? Ela morrer foi um mero destino?!

- Não foi isso que eu quis dizer!

- Ela tinha escolha, está bem? Mas ela escolheu cantar, nem que tivesse sido pela ultima vez, e isso ocasionou no meu sofrimento... Ela escolheu a música e não à mim! Você sabe a real historia do que aconteceu?

- Bem, eu...

- A doença já estava a deixando fraca. Você sabia que as cordas vocais estavam contaminadas, também. Câncer na garganta é algo sério, Harry. Mas ela amava a música, não é mesmo? E ela se deixou morrer com a música.

- A culpada aqui é a doença, Mione. Apenas a doença.

- Não, não é.

- Vem comigo, agora - era um Harry frio que falava.

- Ficou doido? Meu pai deve estar preocupado, ele...

- O tempo parou, não percebeu? – quando olhei a minha volta todo aquele silencio tomou conta do espaço, e finalmente eu percebi. Até as ondas que quebravam cessaram em meio ao seu percurso – Virá comigo, Hermione? Ou terei que leva-la a força?

- Você não iria me fazer mal... – e minha voz pareceu ser levada junto com uma forte brisa – iria, Harry?

- Se eu fizesse mal a você, estaria cometendo um pecado e atingiria a mim mesmo. Não machucaria uma parte do meu coração nem que me pagassem para isso. Agora... Vamos? – e num gesto temeroso ele me estendeu a mão – prometo que te ajudará a entender tudo.

Em seguida de um longo suspiro, respondi decidida:

- Vamos.

Segurei sua mão firme, tentando obter um jeito de ficaram coladas até tudo acabar e voltar a normal. Harry fechou os olhos, concentrando toda a sua força naquilo que desejava fazer. Uma ventania muito forte se propagou em torno de nós, e senti meus pés deixando o chão para ganhar os ares, e assim, começamos a levitar. Apertei meu corpo junto ao dele, temendo que de alguma maneira eu caísse daquela altura, e em poucos segundos, senti suas lágrimas, talvez de dor, deslizarem sobre meus ombros. Então, com um impulso forte fomos sugados novamente para baixo. E o silêncio e a calmaria tomaram conta daquele lugar.

- Harry. Você está bem?! – levantei num pulo e corri ao seu encontro, pois percebi que ele permaneceu deitado.

- Estou bem... Só um pouco exausto. É complicado mexer com o tempo, e proibido também.

- Ficou completamente louco?!

- Sem isso nunca iríamos conseguir. Às vezes, as regras tem que ser quebradas, Mione, e eu quebrei essa para o seu próprio bem – dando-me um sorriso maroto ele se levantou.

- Onde estamos? Acho que conheço esse lugar.

- Ali – apontando para uma parte do mar – será o cais daqui à uns dez anos.

- Não acredito! – pousei a mão sobre a boca, para tentar afagar a minha surpresa – Você... Você não fez o que estou pensando que fez, fez?

- Fiz.

- Harry. É incrível! Mas... Totalmente incorreto! Onde estava com a cabeça?! – dei-lhe uns tapas no braço como se fosse possível atingir seu cérebro.

- Calma. Calma! Ai! – segurando meus braços, encostou sua testa junto a minha. Olhando profundamente em meus olhos disse – Eu prometo que isso te ajudará, você irá ver o que aconteceu de uma forma inusitada e diferente. Peço que me acompanhe agora, por favor.

Confirmei com a cabeça, ainda um pouco nostalgiada pela aproximação repentina. Harry caminhou a minha frente, e seguimos para o que parecia ser a minha casa, um pouco mais nova.

- Eu irei vê-la? – minha voz saiu embargada, quase acompanhando um acúmulo súbito de lágrimas.

- Sim. Mas não se iluda, Mione – prosseguiu ao reparar num sorriso contagioso que estampou minha face – Isso é apenas o passado. Não podemos mudar o que ocorrerá no futuro, está bem? – levantou meu queixo para que eu o encarasse novamente – É triste, eu sei. Mas compreenda, por favor.

- Ok! É que por um momento pensei que seria possível abraça-la ou até mesmo conversar com ela.

- Eu entendo a sua vontade - dando um meio sorriso piedoso - Agora, vem comigo.

Segurei sua mão mais uma vez. E assim seguimos para a janela da minha sala. Ao ver a cena que ocorria lá dentro, meu coração sentiu a dor de muitos anos atrás. Ali estava ela, a minha heroína. Num sopro de vida e com o rosto expressando melancolia. Dei as costas para a janela, pois para mim seria impossível vê-la novamente naquele estado.

- Eu estou aqui com você – Harry segurou meus ombros e juntos, voltamos para o local e presenciamos o fato que ocorria naquele momento.

- Lili, querida – era meu pai mais jovem que desceu as escadas e ajoelhando-se ao chão, permaneceu na mesma altura na qual ela estava, sentada no sofá – Como está se sentindo? Eu posso preparar um chá, se quiser ou...

- Não. Eu estou bem, não se preocupe – sua voz era fraca. Era como se sussurrasse para se manter viva – Preciso te pedir algo, espero que compreenda.

- Não Lílian. Não posso deixar-te participar. É arriscado demais! Você sabe disso.

- Eu preciso cantar mais uma vez, entenda. Minha vida é a música, amor. Quero que esse seja meu ultimo desejo.

- Por favor... – e pela primeira vez vi meu pai chorando desesperado – não fale como se fosse me deixar a qualquer momento! Não será seu ultimo desejo... Eu irei buscar outro médico, outra solução!

- Não há volta. Quero que entenda isso – com as duas mãos ela segurou seu rosto – Meu sofrimento só virá se você sofrer. E nesse momento eu não estou angustiada ou com medo. Aceitei o meu destino, querido. E quero que você também o aceite junto comigo!

- É difícil acreditar que as minhas esperanças acabaram. E é mais difícil ainda pensar que talvez irão junto com a pessoa que mais amo nesse mundo! – e dessa vez, as lágrimas brotaram dos dois. Num abraço caloroso e eterno.

- Mamãe. Papai. Porque estão chorando?! – não conseguia acreditar. Era eu! Os mesmos cachinhos, o mesmo jeitinho de falar, os mesmos olhos castanhos.

- Não foi nada, Mione – meu pai enxugou os olhos, disfarçando o máximo possível.

- Venha aqui, princesinha – minha mãe sorriu e me tomou em seu colo – Eu irei com o papai até a lanchonete da Rosmerta, está bem? Mas eu vou voltar, querida. Irei voltar para te dar um beijinho de boa noite – e assim sorriu como uma mãe sorri para um filho pequeno. Pena eu não saber que aquele gesto seria o ultimo.

- Já é o necessário.

- Eu queria falar com ela.

- Acabamos de conversar sobre isso.

- Eu quero, Harry! – era como se outra pessoa usasse meu corpo naquele momento. Minha vontade era empurrar aquela porta e cair nos braços dela.

- Não posso te deixar, Hermione – num gesto rápido ele conseguiu me segurar. Mas eu lutava com todas as forças para libertar-me e viver no passado.

- Me solta! Me larga, Harry!

- Me perdoa.

E novamente a ventania começou. Tapei meu rosto para que a areia não cegasse meus olhos, e me vi sustentada no ar por uma força invisível. Harry ainda estava me abraçando como da última vez, e, sentindo seu toque no qual tanto desejei, descemos para o presente com um baque surdo.

Não percebi se ele estava junto comigo. Pois queria deixar tudo aquilo que me atormentava... O problema era que eu não fazia idéia do que estava causando esse mal. Corri em direção à minha casa, com lágrimas caindo delirantes. Precisava ver minha mãe, estava fora de mim. E tentava de todas as maneiras ignorar os gritos de Harry, que tentava me acompanhar logo atrás.

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