Capítulo I
Draco Malfoy entrou no alojamento irritado! Havia errado em boa parte do treinamento daquela tarde. E como se não bastasse ficar detido no fim de semana, ainda ganharia uma supervisora.
- Tudo o que eu precisava: uma supervisora sangue-ruim! – resmungou jogando-se na cama de armar.
Como ele tinha ido parar naquele lugar? Como a vida dele mudara tanto em tão pouco tempo, colocando abaixo todas as bases e princípios que sua família tanto defendeu por séculos?
Entrelaçou as mãos atrás da cabeça e se permitiu lembrar de todos os acontecimentos dos últimos cinco anos. E, assim que fechou os olhos para se concentrar, ouviu sua própria voz dizendo claramente:
- Venha comigo, mamãe! Vamos ficar num lugar seguro agora!
A chuva caía torrencialmente e encharcava as capas de Draco e sua mãe. Os dois andavam em silêncio pensando que agora só tinham um ao outro. Narcisa tremia lembrando da horrível morte do marido, dias antes. Draco seguia imerso em seus pensamentos, lembrando de tudo que o fizera chegar até ali.
Lucius Malfoy foi torturado e virado do avesso diante de todos os comensais para servir de exemplo a qualquer um que se mostrasse fraco ou ameaçasse debandar. Ele foi pego tentando fugir da Fortaleza. A queda de Voldemort era iminente e ele queria abandonar o barco antes que ele afundasse, do mesmo modo como fez da primeira vez em que Voldemort caiu.
Acusado de traição, Lucius não teve nem direito a defesa e sua sentença foi executada sem rodeios, diante do olhar doentio de Voldemort.
Narcisa passou mal ao assistir à execução e Draco teve permissão de levá-la para a enfermaria. Ela precisou de uma boa poção calmante e ficou em estado de choque durante várias horas.
Quando saiu da enfermaria, Draco foi abordado por Snape, seu antigo professor de poções, que agora fora rebaixado e obrigado a cuidar dos feridos nas batalhas. Mas, ao contrário de uma abordagem direta, Snape invadiu a mente de Draco e lhe falou em pensamentos, para que ninguém ouvisse.
- Já se decidiu? Não há mais muito tempo!
- Não tenho outra alternativa, não é?
- Não mesmo!
- Então faça...
Ele não sabia exatamente o que Snape faria, mas o que quer que fosse, seria a única chance de escapar daquela fortaleza com vida.
Naquela noite chuvosa, o Lorde das Trevas deixou a Fortaleza. Queria resolver um assunto pessoalmente, algo que ele não confiaria nem mesmo a Bellatrix Lestrange. Foi a oportunidade que Snape precisava. Depois de uma grande confusão, envolvendo o assassinato de dois comensais, Draco conseguiu fugir levando sua mãe.
Agora os dois estavam ali, no beco indicado pelo pedaço de pergaminho velho que o ex-professor de poções lhe entregou. Esperaram ainda uns 20 minutos debaixo de uma marquise que mal cobria os dois.
Um estampido seco os sobressaltou. Um bruxo havia aparatado ali perto. Se era comensal ou não, eles não saberiam dizer. Draco ergueu a varinha e se preparou para o ataque, até que divisou um rosto fino, emoldurado por belos cabelos cor de rosa.
- Ninfadora! – disse Narcisa, suspirando aliviada.
A mãe de Draco nunca ficara tão feliz em ver a sobrinha. Ela era uma auror e com certeza estaria a serviço dos “amigos de Severo”.
- Oi, tia, beleza? – falou Tonks num pequeno esforço para pronunciar o tratamento à irmã que nunca gostou de sua própria mãe – Vocês vêm comigo agora!
Tonks segurou as mãos dos dois e aparatou em um ponto distante, numa casa cheia de móveis remendados e com marcas de destruição nas paredes.
- Desculpa, mas não posso levá-los para a Sede da Ordem. Por enquanto vocês ficam aqui e assim que der, alguém da Ordem vem conversar com vocês. Ali no armário tem comida e no quarto aqui ao lado tem cobertores e roupas secas.
Ela se despediu e os dois Malfoys olharam desolados para os aposentos destruídos da Casa dos Gritos. Pelo menos a comida que havia era boa e as roupas estavam secas e limpas.
Narcisa ainda continuava muito nervosa e Draco precisou fazê-la dormir. Quando a viu deitada e ressonando na cama de dossel, foi até a janela. Levantou o braço direito, apoiou na parede e encostou a testa no vidro para ficar observando a chuva cair.
- Então é assim? – disse para si mesmo – É assim que termina a honra dos Malfoy? Humilhados, banidos, torturados pelo Lorde que tanto defendemos? Um belo pagamento por uma vida inteira de devoção!
Draco sempre foi instigado a odiar. Seu pai dizia que o coração de um verdadeiro comensal é regado de ódio e desprezo. E desde pequeno ele aprendeu a odiar e desprezar qualquer pessoa que não considerasse digno.
Odiava Harry Potter e sua turminha de salvadores do mundo. Odiava aquela estúpida escola e os professores que não ensinavam nada de útil. Odiava! No passado.
Agora seu ódio se concentrava numa única pessoa: Voldemort. E acompanhando uma gota de chuva que escorria pela janela, ele jurou pela memória do pai que faria cair todos aqueles que o traíram. Inclusive sua tia Bellatrix. Especialmente sua tia Bellatrix.
Da Casa dos Gritos Draco foi para Hogwarts, onde se uniu a todos os outros que fariam frente a Voldemort. Não, ele não tinha se esquecido do fato de que era um Malfoy. Era a lembrança que mais martelava em sua cabeça. Ele era um Malfoy. O último Malfoy! E faria de tudo para que se lembrassem dele.
A luta contra Voldemort foi de longe muito mais difícil do que ele imaginou. E no final, quando o Lorde das Trevas finalmente caiu, a comunidade bruxa não teve tanto o que comemorar.
O saldo final da batalha foi lamentável, e nomes como Minerva McGonagal, Kingsley Shackelbolt e até mesmo o Ministro da Magia, Rufus Screamgeour, foram levados pelos comensais. Harry Potter, o famoso ”menino que sobreviveu”, saiu gravemente machucado e ficou quase seis meses no St. Mungus até receber alta.
E ele, Draco Malfoy, foi saudado e aclamado. Pela primeira em sua vida, ele foi o centro das atenções. Lutou com uma fúria que poucos entenderiam e exterminou boa parte dos antigos amigos de seu pai, que foram os responsáveis por delatá-lo ao Lorde das Trevas.
Além de se destacar tanto em batalha, foi ele quem correu em direção a Voldemort lançando todos os tipos de feitiço que conhecia, dando tempo a Harry de lançar a maldição final que acabaria de vez com o bruxo. E foi ele quem carregou Harry, desmaiado, depois que tudo terminou.
Quando ele pôde voltar para a escola e terminar os estudos, já tinha discutido com a mãe sobre seu futuro. Seria auror. Uma profissão bastante peculiar para um Malfoy, mas ele não conseguia pensar em outra coisa que quisesse fazer além de caçar os últimos comensais que ainda sobravam no mundo. Era sua vingança pessoal, sua rixa de sangue.
Ingressou no curso e para seu total desagrado, se viu convivendo com Hermione Granger. Todos os dias, todas as aulas e no fim do primeiro dia de aula descobriu que também conviveria com ela todas as noites. Os dois dividiriam o mesmo alojamento, junto com outros dois alunos do curso.
Os aurores eram instruídos a não se deixar levar pela divisão Homens x Mulheres. Compartilhavam o mesmo alojamento, o mesmo uniforme, a mesma ala hospitalar. Tudo isso porque precisavam aprender a conviver o máximo de tempo possível, deixando as convenções sociais de lado.
Assim, aos poucos Draco deixou de chamá-la de sangue-ruim e em raras ocasiões, eles saíam juntos nos fins-de-semana em que estavam de folga. Iam para um bar que muito se parecia com o Três Vassouras e passavam horas implicando um com o outro, enquanto tomavam cerveja amanteigada.
Mas naquela noite em específico, a raiva de Malfoy era toda direcionada à garota. Ele se distraiu por culpa dela. E agora passaria o fim de semana detido.
Estavam num exercício de resistência e observação. O menor sinal de movimentação estranha deveria ser combatido com um feitiço estuporante. E Hermione estava ali ao lado dele.
Eles passaram a tarde inteira correndo na chuva, enfrentando um lamaçal e depois de um dia inteiro de atividades a jovem estava tentando prender os cabelos com uma fita. Reuniu todo o cabelo rebelde num único punhado, conjurou uma fita e o amarrou.
Estava com o rosto respingado de lama, suada e, mesmo assim, tinha um sorriso estampado não nos lábios, como a maioria das pessoas. Ela sorria com o olhar. E Malfoy não pôde deixar de perceber que, apesar de toda a atividade física intensa, ainda havia um cheiro doce que se desprendia da pele de Hermione.
Em Hogwarts ele sempre imaginou que Hermione deveria cheirar a tinta e pergaminho, ou mesmo poeira de livros. O mesmo cheiro de coisa guardada que Madame Pince exalava. Mas ali, no campo de treinamento, ele se descobriu enganado. Hermione emanava um cheiro doce. Uma mistura de flores e frutas maduras que o deixavam levemente tonteado.
Foi nesse momento, em que se perguntava como o cheiro dela podia ser tão suave e agradável, que aconteceu o pior. Dois vultos apareceram e apenas Hermione reagiu. Ela foi estuporada e Malfoy foi repreendido por não proteger a companheira.
- Maldita Granger! – murmurava ele.
- Não jogue a culpa em mim! Não mandei você se distrair com qualquer bobagem! – respondeu Hermione, que agora era uma mulher ainda mais irritante e decidida que antes, entrando no alojamento.
Se soubesse com qual bobagem eu me distraí, sua sangue-ruim...- pensou o rapaz, lançando a Hermione um olhar de desprezo.
Só então ele reparou que ela já havia tomado banho. Os cabelos molhados ficavam menos rebeldes e até atraentes. E o cheiro que ele sentira antes estava ainda mais forte. Irritado com isso, ele se sentou na cama e pegou um livro que deveria terminar de ler para a próxima aula.
Enquanto isso, Hermione preparava uma mala um pouco maior que costumava fazer quando ia passar os fins de semana com os pais.
- Vai me deixar em paz e mudar de alojamento finalmente? – indagou Malfoy com um humor arrogante e rude.
- E perder a chance de irritar você todos os dias pelos próximos dois anos? Nunca! – revidou Hermione que já havia aprendido a lidar com o rapaz – Só que desta vez eu não vou ver meus pais.
- Não? – ele não conseguiu conter a curiosidade.
- Não! Vou para a Toca! – respondeu animada e Malfoy notou o quanto ela ficou vermelha com a idéia de ir para a casa dos Weasley.
- Ah! – resmungou – Algum motivo especial ou só saudade do namoradinho?
- As duas coisas! Faz quase três meses que eu não vejo o Rony e amanhã vamos comemorar. Ele foi escalado para representar a Inglaterra nas eliminatórias para a Copa Mundial de Quadribol!
Malfoy parecia que tinha levado um soco no estômago. Nunca dera nada pelo colega e agora ele conseguia não só jogar na liga nacional, como ia representar o país em uma competição internacional. E ele ainda tinha Hermione, embora Draco não quisesse admitir que isso o incomodava.
- Bom para ele! – respondeu, enfiando a cabeça no travesseiro e a cara no livro, claros sinais de que encerravam por ali a conversa.
Hermione não voltou no domingo, como de costume. Chegou apenas na hora da aula na segunda-feira. Passou rapidamente pelo alojamento, jogou a bolsa sobre a cama e correu para a sala de aula.
Chegou ofegante e se largou na cadeira ao lado de Malfoy de um jeito pouco convencional. Faltava apenas alguns minutos para a aula começar e ela ainda precisava retomar o fôlego. Durante o dia Hermione continuou estabanada e errou diversos feitiços que normalmente ela poderia fazer até dormindo.
Quando Malfoy voltou para o alojamento é que descobriu a causa de tanto afobamento. Hermione estava sentada na cama, relendo um pequeno cartão. Lia e relia sem parar. E na mão direita da garota um enorme anel, com um brilhante, cintilava de forma indiscreta.
- Então, o fim de semana foi mais que uma simples comemoração – falou procurando deixar a voz ainda mais tediosa.
Hermione levantou a cabeça sorrindo feliz, se esquecendo que quem falava com ela era Draco Malfoy.
- Ficamos noivos! – respondeu ainda mais eufórica, como se dividir isso com alguém tornasse o fato ainda mais maravilhoso.
- Percebi – tornou Malfoy sem entusiasmo – Mas um tanto vulgar o tamanho do brilhante na aliança. É quase um holofote!
Hermione deu de ombros e voltou a ler seu cartão. Vez ou outra olhava para a própria mão e sentia o coração disparar.
O treinamento durante a semana foi o mais difícil para Malfoy. Além das atividades, ele tinha que fazer as aulas extras sob a supervisão de Hermione, que ficava balançando aquele anel enorme diante de sua cara.
Quando o fim de semana chegou novamente, Draco acreditou que teria um tempo para si, longe do campo e da “insuportável sangue-ruim e seu ainda mais insuportável anel de noivado”. Mas um alarme soou no alojamento no sábado logo pela manhã.
Ele saltou da cama olhando para Hermione, que também acordou com o barulho, e perguntou:
- O que é isso?
- Não faço a mínima idéia! Mas seja o que for, parece urgente!
Ela se trocou por trás do biombo e ia correr para fora quando sua instrutora entrou com um olhar muito preocupado:
- Missão especial! – falou Antonieta Crawlley – Os dois foram designados para uma missão especial e devem se apresentar em 5 minutos. Sem uniforme!
Ela saiu do alojamento, deixando uma Hermione boquiaberta e um Draco assustado. Sem nenhuma palavra, eles pegaram as capas, vassouras e varinhas e saíram. Foram até a sala de Crawlley e esperaram as orientações.
Hermione estava ansiosa e torcia as mãos sem parar. Draco olhava pela janela, os pensamentos vagando entre as inúmeras possibilidades de missão que eles poderiam enfrentar. Seu desejo era ser convocado desde o primeiro momento para acabar de caçar os últimos comensais que ainda resistiam, mesmo dois anos após a queda de Voldemort.
Crawlley saiu do escritório acompanhada de um bruxo muito gordo e estranho. A testa dele suava e as veias saltavam no pescoço, deixando claro o estado de nervosismo em que o homem se encontrava.
- Bom ver vocês já preparados! Acompanhem-me, por favor!
Os dois entraram no escritório e Crawlley foi direto ao assunto:
- Um objeto muito importante foi roubado a noite passada e vocês precisam recuperá-lo.
- Por que nós? – perguntou Draco – Não seria mais fácil mandar um auror já formado?
- Não! – tornou Crawlley ríspida e determinada – Os aurores formados já são bastante conhecidos e podem chamar a atenção. Vocês são os melhores alunos do curso e podem dar conta disso, com certeza. Aqui estão as orientações, com o local onde o objeto estava, a descrição dos ladrões e a lista de possíveis paradeiros dos mesmos.
- O que foi que roubaram, Crawlley? – perguntou Hermione.
- Roubaram o Espelho de Ojesed!
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