Pergunta do Sapo Selvagem
Ao entrar nas masmorras para pegar o finalzinho da aula de poções, depois de ter ficado mais de uma hora se explicando para a diretora da sua casa, Mary encontrou a classe reunida na mais nova brincadeira: elaborar o fim mais trágico possível que o D4 poderia ter dado para a Mary Ann Weed.
- MERDA! AINDA ESTOU VIVA! – ela explodiu de novo, já tendo ultrapassado todos os limites suportáveis da sua paciência naquele dia – Algum problema com isso?!
- Realmente, não seria melhor você deixar a escola numa boa? – disse uma das alunas desdenhosa – Antes que alguém force você a sair?
Todos concordaram e saíram da sala, dando as costas para ela. Sarah passou correndo por ela, de cabeça baixa, e sumiu atrás dos colegas.
Como não tinha conseguido nem ao menos pegar o final da última aula do dia, só restava a Mary jantar no salão principal e se trancar na segurança do seu quarto na torre da Grifinória.
Agora, depois de ter passado por tudo isso, sentia uma fome imensa e estava tentando adivinhar o que seria servido àquela noite quando ouviu uma explosão de risos no Salão Principal e correu para lá tendo um mau pressentimento:
Assim que passou pela entrada, viu o motivo das risadas e confirmou que era algo contra ela. Pendurado na frente da mesa dos professores estava uma faixa mágica, que exibia várias frases que sumiam e desapareciam, cada vez com uma cor diferente. Todas as frases eram ofensas baixas contar ela, coisas como ‘sai com qualquer um por dinheiro para pagar seus livros de feitiços’ e ‘já fez cinco abortos’.
As mesmas garotas da Sonserina que lhe haviam jogado água no outro dia comentavam com suas vozes estridentes e risadas espalhafatosas:
- Que horror, não?
- Quem poderia imaginar uma aluna assim aqui em Hogwarts?
- Que vergonha para a instituição, não? Acho que o próprio Ministro deveria interferir! Essa gentalha sujando o nome da maior escola da Inglaterra...
Esquecendo de toda a fome, Mary saiu correndo. Gritar, chutar e socar ali não adiantaria nada. Ela precisava extravasar a sua fúria em outro lugar e por isso foi para o seu refúgio.
- INACREDITÁVEL!!! – berrou ela, parando deslizando na janela da Torre do Desabafo e por pouco não despencando de lá de cima na sua ânsia de tirar esse grito de dentro dela – MALDITOS IDIOTAS! ESTOU CHEIA DISSO! COMO EU PODERIA TER FEITO CINCO ABORTOS SE AINDA SOU VIRGEM?!
Gelando, ela lembrou subitamente que já não era mais seguro gritar aos quatro ventos as suas intimidades naquele lugar e olhou para o fundo da torre. Aliviada por não ter encontrado Ryan Hainault com seu livro na estátua de javali, voltou seu olhar para frente.
- Hum, verdade?
Mary sentiu que realmente queria ter desmaiado de susto e caído da torre quando ouviu a voz de Hainault vinda da entrada. Ela se sentiu a pessoa mais sem graça do mundo, enquanto ele andou tranqüilamente até o lado dela e ficou observando a floresta também.
- Não ria. – murmurou ela sem graça com a cabeça baixa, para esconder o vermelho do seu rosto.
Dessa vez, ele tinha uma revista na mão e não um livro como era típico. Mary estava tentando ver que revista era quando ele perguntou:
- Sabe quantas horas alguém leva para chegar em Hogwarts vinda da França, usando a rede de Flu internacional e depois pegando o trem em Londres?
- Eu... não sei. – o que era verdade, apesar de ela achar a pergunta totalmente sem sentido para aquele momento – Me desculpe.
Ele sorriu e se escorou na lateral da janela, folheando a revista. Ela retribuiu o sorriso, se sentindo melhor apesar de existir um Christopher Doumajyd no mundo e de todos os seus problemas com os outros alunos.
Por isso, ela não notou que as três alunas cruéis da Sonserina estavam os espiando.
***
- Nós levamos seis horas para chegar de trem até aqui. – disse Vicky – Mas quantas horas leva para vir da França até Londres pela rede de Flu eu não sei.
- Huum... – Mary já estava a um bom tempo na estufa, comendo mais um pote de doce natural vencido da professora Karoline, enquanto tentava procurar alguma referência em um livro que achara na biblioteca.
Vicky a observou por um tempo e comentou:
- Você parece estar feliz.
- Hum?
- Você está feliz com isso, não?... Mary, esse é um dos caras do D4! Ele é um dos que deram a Tarja Vermelha para você!
- A Tarja é provavelmente coisa daquele Doumajyd estúpido! Acho que o Hainault não gosta desse tipo de coisa...
- Mas ele não fez com que parassem, não? Então ele é culpado também.
- Eu não diria que ele é culpado. – disse Mary fechando o livro após encontrar o que procurava.
- Por que está defendendo ele com tanta convicção?
- Por nada... – ela enfiou mais uma colher cheia de doce na boca tentando, fracassadamente, não parecer suspeita.
Vicky percebeu imediatamente os motivos de Mary e deixou o que estava fazendo para tentar arrancar alguma informação a mais dela:
- Se você o conhece tão bem para firmar isso, que tipo de pessoa ele é?
- Bem... – Mary pensou, segurando outra colherada de doce parada no ar – Eu... na verdade, não dá para se ter certeza do que ele pensa. Ele parece ser frio, mas às vezes sorri de uma forma que anula totalmente essa característica... Ele tem aqueles cabelos dourados e os seus olhos são como brilhantes azuis... Eu acho que ele é muito mais simpático do que aparenta... Mas realmente é um pouco frio e indiferente...
- Quer dizer que ele é o seu Cavaleiro de Olhos Frios?! – perguntou Vicky de repente bem atrás de sua orelha.
Mary levou um susto. Estava tão concentrada pensando em Hainault para descrever como o via que não percebeu que a amiga estava tão perto.
- E você, Vicky?! – Mary tentou desviar o assunto – Aquele cara que lhe deu uma cantada?!
- Aaah... – Vicky saiu rodando de perto dela e voltou ao seu trabalho parecendo muito feliz.
- O que é essa cara?... Não me diga que...
- Eu fiz! – anunciou Vicky.
- AHAM?! – Mary e a professora Karoline exclamaram surpresas.
Mary quase caiu com o pote de doce quando viu que quem havia chegado sem ser percebida dessa vez fora a professora.
- Oh, não! – lamentou-se dramaticamente a professora – Eu escolhi somente ajudantes puras para a minha estufa!
- ...O que você quer dizer com puras? – perguntou Mary revirando os olhos.
- Foi um beijo, professora! – apressou-se em explicar Vicky – Só um beijo!
- Ah, era só isso... – Mary largou o pote de doce – ...Mas que inveja! Você é mais nova que eu!
- Vocês são bem atrasadinhas... – suspirou a professora indo verificar o seu estoque – É por isso que a gente não vende tantos doces.
- ...O que uma coisa tem a ver com a outra? – perguntou Vicky.
- Mas vamos parar de falar nisso! – anunciou a professora começando a separar os vasos com as plantas raras que iria usar para a próxima aula – Só tomem cuidado com esses caras que nunca beijaram antes!
- Anhm... – limitou-se Mary.
- Eu já disse sobre o homem que eu amava? – perguntou a professora sem prestar atenção que as duas balançavam a cabeça afirmativamente – Apesar de ser extremamente rico eu nunca sabia o que ele pensava. No final ele acabou matando uma pessoa e foi preso... culpada, sou eu também... – e saiu da estufa cantarolando.
- O que ela está dizendo? – perguntou Mary perplexa, voltando a comer o doce.
Vicky encolheu os ombros e continuou com o seu trabalho.
- Mary!
- Hum?
Vicky apontou para a entrada da estufa, onde Sarah as espiava timidamente.
***
Na ala separada do resto do salão principal para o D4, o lugar onde lhes eram servidas as refeições e onde os quatro se reuniam, Doumajyd estava jogando xadrez bruxo contra MacGilleain enquanto Nissenson o ajudava. E mesmo assim o líder estava perdendo.
- Não jogo mais essa droga! – exclamou Doumajyd tentando bater com raiva nas peças que fugiam dos seus ataques.
- É só um jogo, cara. – riu-se MacGilleain – Não precisa ficar nervoso assim. Um rei do império Doumajyd não deveria se comportar dessa maneira.
- Cala a boca. – alertou Doumajyd de uma forma não tão ameaçadora para o amigo.
- Não é nada com a sua sorte. – disse Nissenson terminado de reanalisar as jogadas que os dois tinham feito – Você não está concentrado... É por causa daquela garota, não?
- Cala boca e joga no meu lugar! – exigiu ele.
- Mas ela não parece afetada. – comentou MacGilleain – Já fizeram uma infinidade de maldades com ela e ela nem se importa.
- É mesmo... – ajudou Nissenson – Ela é agressiva e valente, nem dá vontade de judiar dela.
- Isso! Agressiva e valente! – MacGilleain pareceu ter feito a ligação de algo – Ela realmente se parece com a irmã do Chris!
- De fato! – Nissenson fechou o punho e fingiu que dava um soco no nariz do amigo, enquanto dizia – Não seja tão convencido, Chris!
- Dá para parar com isso?! – perguntou Doumajyd no limite da sua paciência – Termina logo esse jogo, Adam!
- Mas é a sua vez.
- Sei disso! – ele olhou para o tabuleiro e fez uma jogada qualquer.
- Apesar de tudo, você é muito transparente, Chris. – disse Nissenson dando um suspiro ao perceber o que causaria aquela jogada.
- Xeque-mate! – anunciou MacGilleain.
Doumajyd se levantou com raiva e jogou o tabuleiro e as peças no chão dizendo:
- Não jogo mais!
Ele pegou o seu casaco do uniforme, que havia deixado em cima de uma das confortáveis poltronas que estavam à disposição deles naquela ala, e saiu.
- Aonde você vai? – ainda perguntou MacGilleain antes dele descer para o salão principal.
- Pegar o Sapo Selvagem! – respondeu e sumiu de vista.
- ... Ele está falando do Ryan? – perguntou MacGilleain para Nissenson.
- Talvez.
- ... O Ryan é um sapo selvagem? – perguntou MacGilleain ainda sem entender.
- Talvez, para um líder, o mais quieto seja o mais difícil de se lidar.
- Ele deve estar perdido pelo castelo, ocupado demais pensando na volta da Sharon. – MacGilleain riu – Ultimamente ele não consegue nem se concentrar em seus livros...
***
- Me desculpa, Mary! – pediu Sarah quase chorando – Você me salvou, mas...
- Não se preocupe tanto assim.
As duas estavam andando pelo pátio de Hogwarts, um pouco mais afastadas das estufas. Mary olhava cautelosamente para todos os lados, verificando se alguém não as estava espiando, e disse:
- Olhe, se eles a virem aqui comigo, você estará com problemas.
- Mas...
- Você não precisa ficar se sacrificando para se mostrar minha amiga na escola. - Realmente, me desculpe...
Sarah amassou uma revista que tinha nas mãos, feliz por ser perdoada, e Mary percebeu que era a mesma revista que o Hainault estava lendo.
- Posso ver? – perguntou ela apontando para a revista.
- Claro! Tem uma reportagem especial sobre uma modelo famosa inglesa que está na França!
- Será que é... É ela mesma! – exclamou Mary contente – Foi por causa dela que eu continuei vindo para Hogwarts mesmo depois de ficar conhecendo como era aqui, sabia? Eu quero poder ser igual a ela!
- Uma modelo? – perguntou Sarah com um tom de descrença.
- Não! – Mary riu – Ela é representante do Ministério do exterior e atua em defesa da democratização dos direitos para todos os bruxos, não importando a sua origem. Não é um máximo?!
- É... – disse Sarah não querendo desapontar a amiga falando que não achava aquilo exatamente um máximo, mas então ela parou de repente e apontou para algo à frente – Ah! D4!
Mary instintivamente a puxou junto de si para trás de uma árvore e só então verificou.
- É o Hainault! – disse ela, tentando disfarçar a sua alegria em vê-lo. – Eu... eu já volto, espera aqui!
No meio do caminho até chegar ao garoto, Mary arrumou suas vestes e passou a mão pelos seus cabelos (que começara a deixar soltos depois do tratamento de cortesia que ele recebeu na mansão do Doumajyd).
- Olá! – disse ela parando em um pulo na frente dele – O que está fazendo aqui fora? Já está escurecendo.
Ele simplesmente sorriu.
- Viu... eu sei a resposta da sua pergunta. Leva cerca de uma hora para se chegar de Paris até Londres pela rede de Pó de Flu e mais seis horas para se chegar aqui. Ao todo são sete horas!
- Sete horas... – ele repetiu pensativo.
Mary percebeu que ele ainda segurava na mão a mesma revista que acabara de ver com a Sarah e achou um pretexto para continuar a conversa:
- Ah, você leu a reportagem sobre uma veterana nossa? Eu admiro ela, sabia? Além de bonita e inteligente ela já era famosa antes mesmo de se formar e logo que saiu daqui já conseguiu... conse...
Mary esqueceu tudo o que estava falando. Hainault se aproximava lentamente do seu rosto. Ela estava surpresa demais para ter qualquer outra reação além de permanecer estática encarando ele tão perto dela.
- Tem algo no seu rosto. – ele passou o dedo no queixo dela e mostra uma mancha roxa no dedo.
- Ah, – ela limpou o rosto com as mangas do casaco, envergonhada – É do doce que eu... Deixa para lá! Boa noite eu tenho que ir agora!
E mais envergonhada ainda ela saiu na direção de onde Sarah estava, atrás da árvore.
- Vamos. – ela disse para a amiga a agarrando pelo braço e quase a arrastando para dentro do castelo.
Em uma das janelas iluminadas, meio escondido, um garoto de cabelos castanhos encaracolados e bagunçados olhava toda a cena.
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