O que pode tocar um coração
- Senhora Doumajyd? – disse Richardson da porta do escritório, pedindo permissão para entrar.
A senhora Doumajyd escrevia em um pergaminho e limitou-se a fazer um gesto para que ele prosseguisse.
- A senhorita Crowley ganhou o Totalmente Bruxa.
A bruxa parou de escrever e riu. Então encarou o secretário e disse:
- Era óbvio que ela ganharia.
***
No hall em frente ao salão onde havia sido realizada a competição, repórteres e pessoas da platéia faziam um alvoroço em volta de Karina Crowley, enquanto Mary saia sem problemas, sendo assediada somente pela sua pequena platéia.
- Bom trabalho, Cogumelo! – cumprimentou Nissenson.
- Você ganhou incrivelmente o segundo lugar! – disse MacGilleain.
- Parabéns! – falou Hainault da sua forma calma – Você fez o melhor que pôde e se superou.
- Pode sempre contar conosco para o que vier daqui em frente! – ajudou MacGilleain.
- O amanhã sopra o vento do amanhã. – recitou Nissenson.
Mary os encarou mais feliz do que nunca.
Por estar tão preocupada com o Totalmente Bruxa antes, ela não tinha percebido como agora era tão natural se considerar amiga deles. Não era a mesma coisa que a sua amizade de anos com Vicky, mas ela sentia que poderia dizer com toda a certeza de que Nissenson e MacGilleain, assim como Hainault, eram seus amigos. Aqueles odiáveis Dragões sinistros dos anos anteriores eram como sombras que ela apenas havia imaginado, e não refletiam o que ela via agora.
- Certo! – começou MacGilleain empolgado – Mary está de volta em Hogwarts! Vamos comemorar ao estilo D4!
Os outros dois concordaram, juntamente com Vicky e a professora Karoline que adoraram a idéia. Mas estava faltando uma coisa e Mary só esperava um espaço para poder perguntar.
- Onde está o Doumajyd? – ela não conseguiu se segurar mais, procurando por toda a sua volta.
- Ele não estava aqui? – perguntou Vicky surpresa olhando em volta.
- MARYYYY!
Seguida do grito do seu nome, Mary quase foi sufocada por vários braços que a apertaram em um abraço entusiasmado.
- Você foi a melhor! – quase chorou sua mãe.
- Nos deixou orgulhosos, filha! – disse seu pai.
- Deu uma lição nessas bruxas metidas! – cantou seu irmão.
Mesmo sendo apertada a ponto de ficar sem ar, Mary se sentia aliviada. As dividas da sua família poderiam ser pagas e uma parte do problema estava resolvida. Porém, não ganhar o primeiro lugar, significava não ser aprovada pela senhora Doumajyd e, portanto, continuaria sendo considerada uma inimiga. Sua família ainda poderia ser prejudicada de alguma forma...
***
Karina Crowley entrou educadamente no escritório da senhora Doumajyd, acompanhada por Richardson.
- Parabéns pela sua vitória! – cumprimentou a senhora Doumajyd levantando-se da sua mesa para abraçá-la.
- Muito obrigada. – agradeceu Karina com um sorriso.
- Espero que no futuro, quando for uma Doumajyd, demonstre os mesmos talentos que demonstrou hoje!
- Na verdade, – ela começou, procurando as palavras certas – eu precisava falar com a senhora a respeito disso, e foi por isso que eu vim aqui.
- O que foi? – perguntou a senhora Doumajyd preocupada.
- Esse casamento foi decidido através de um acordo realizado entre a senhora e meu pai quando Chris e eu ainda éramos pequenos. Eu cresci sabendo que um dia me casaria com ele, e por isso me preparei. Não estou reclamando! Eu gosto do Chris, sempre gostei! Porém... penso que se eu encontrasse alguém que fizesse meu coração bater mais forte, também lutaria para ficar ao lado dele. Mesmo que para isso eu tivesse que passar por cima da vontade do meu pai.
- O que está falando, menina?
- Talvez a senhorita Weed seja a melhor escolha para o Chris!
- Ah, não. – a bruxa revirou os olhos e voltou para a sua poltrona na escrivaninha – Até você está dizendo essas coisas!
Mas Karina não desistiu de falar tudo o que tinha planejado:
- Desde que fui estudar na França, quase não vi o Chris, e realmente não sei que tipo de pessoa ele se tornou. Mas hoje, vendo ele e a senhorita Weed, mesmo que por pouco tempo, pude notar como ele está diferente... Eu percebi que nessa competição eu já havia sido derrotada sem notar... Posso ter vencido o Totalmente Bruxa, mas ela ganhou o coração do Chris!
A senhora Doumajyd a encarou surpresa, mostrando que definitivamente não esperava ouvir aquilo dela. Vendo que tinha conseguido fazer a bruxa entender onde ela estava querendo chegar, Karina assumiu uma pose decidida e continuou:
- Por isso, senhora Doumajyd, eu, Karina Crowley, já maior de idade, cancelo o acordo feito pelo meu pai. Não vou me casar com seu filho. Pretendo continuar sendo amiga dele e conseqüentemente apoio o que ele sente pela Mary Ann Weed. Mesmo ela sendo desaprovada pela senhora por ser uma sangue-ruim. Era isso tudo o que eu tinha para dizer. Obrigada por me receber. – e saiu, deixando para trás uma senhora Doumajyd pasma.
- Quer... – começou Richardson cauteloso, não sabendo o que esperar daquela situação – que eu entre em contato com o senhor Crowley para falar a respeito disso, senhora?
A bruxa voltou a sua expressão fria e disse:
- Não será preciso, Richardson... Karina Crowley só estava no topo da lista de possíveis escolhas. E, mesmo assim, ela cumpriu seu papel e ganhou. Christopher terá que honrar a sua palavra.
***
Mary, novamente com o seu uniforme de Hogwarts, entrou no Salão Principal e foi recebida por uma chuva de papel picado colorido, fagulhas brilhantes e gritos de congratulações. Lá estavam não somente os dragões e Vicky, mas os poucos alunos que haviam apoiado indiretamente suas atitudes durante todo aquele ano, que estavam agradecidos por ela ter acabado com a tirania da Tarja Vermelha e felizes por ela estar de volta.
Depois de ser cumprimentada e de falar com várias pessoas, ela finalmente conseguiu chegar na ala do D4, onde os três Dragões estava reunidos juntamente com Vicky.
- E o Doumajyd? – perguntou Mary, mais uma vez procurando em volta.
- Ele disse que viria assim que resolvesse um negócio. – informou Hainault.
- Mas disse que era para você se divertir e comemorar! – acrescentou MacGilleain, lhe entregando uma taça repleta de cerveja amanteigada.
Mary aceitou sorrindo, mas mesmo assim não conseguindo esconder que seu ânimo havia caído, pois esperava encontrar o líder dos Dragões ali.
***
Christinne respirou fundo e entrou no escritório de sua mãe de cabeça erguida.
- Finalmente você veio... – murmurou a Senhora Doumajyd que jogava xadrez bruxo.
- Mãe...
- Promessa é promessa! – disse a senhora Doumajyd a encarando, antes que a filha pudesse vir com alguma estratégia para mudar as coisas.
- Não importa o sobrenome que eu tenho agora, sempre serei uma Doumajyd, e nós cumprimos nossas promessas! – rebateu Christinne orgulhosa – Eu também havia prometido para Mary que a ajudaria, e fiz o que pude por ela... Porém, eu percebi uma coisa que eu já deveria ter descoberto há muito tempo: somente um coração pode tocar um coração! Não é mesmo, mãe?
A senhora Doumajyd mudou sua posição na cadeira, visivelmente incomodada com o ataque.
- Ainda bem que o Chris conheceu a Mary a tempo de salvar o seu coração e não deixá-lo virar uma pedra como o seu... Meus cumprimentos, mãe. Você conseguiu o que queria! – e saiu, sem olhar para trás, sem ver a expressão furiosa da senhora Doumajyd diante daquelas palavras.
***
- Desculpa de verdade! – fungou Candalla entre suas comparsas, diante de uma Mary incrédula.
As três haviam chamado por Mary na entrada do Salão Principal, onde haviam sido barradas pelos outros alunos. Mary, de braços cruzados, perguntou usando um tom inquisidor:
- Então foram realmente vocês que acabaram com as minhas vestes no Totalmente Bruxa?!
- Mas você decididamente mereceu ganhar! – tentou consertar a de cabelos encaracolados, parecendo estar extremamente arrependida.
- Nós até choramos! – acrescentou a ruiva tentando ajudar.
Diante da expressão cabisbaixa das três, Mary só pôde suspirar, como se dissesse que não havia outra alternativa, e admitiu:
- Mas graças ao que fizeram, eu consegui passar na segunda fase.
Hainault, que observava tudo da ala do D4, riu e balançou a cabeça.
Diante daquela declaração de Mary, as três rapidamente voltaram às poses de convencidas e passaram por ela comentando:
- Verdade, não? – riu-se Candalla.
- Então temos o direito de entrar! – sibilou a ruiva.
- Podemos celebrar também! – informou a terceira mostrando a língua para os alunos que as haviam barrado.
Mary limitou-se rir. Para falar a verdade, até mesmo da implicância das três ela havia sentido falta naquele tempo em que esteve fora.
Entretanto, voltando aos seus pensamentos que haviam sido interrompidos, ela olhou esperançosa pela porta para o hall. Já estava tarde e mesmo assim, Doumajyd ainda não havia aparecido. Ela se perguntava o que o dragão estaria fazendo...
***
Enquanto isso, na ala do D4, Sarah Swan havia entrado sem cerimônias e narrava em detalhes como havia ajudado Mary com o discurso.
- Até a Sarah Sem Noção tem um lado bom. – admitiu MacGilleain – Conseguiu mudar a minha opinião.
- Então que tal sair comigo, Adam? – propôs ela toda sorridente, sem o mínimo sinal de timidez.
Todos a encaram surpresos, e Nissenson socorreu o amigo:
- Não, ele não pode! Ele tem a professora Karoline.
Sarah torceu o rosto em uma careta de desagrado e Vicky perguntou quase pulando:
- É sério?!
- Na verdade, – MacGilleain sorriu amarelo – a professora Karoline é casada.
- O QUÊ?! – perguntaram Nissenson e Vicky espantados.
- Não sabia disso?! – perguntou Nissenson para a garota, mais espantado ainda.
- Mas... eram só histórias! – defendeu-se a garota.
- Ela me contou que seu marido é um especialista em doces que viaja pelo mundo á procura de novidades para criar receitas novas. Parece que ela deixou de viajar com ele quando foi convidada para lecionar em Hogwarts. Mas hoje, depois de ver a determinação de uma certa sangue-ruim e seu dragão, parece que ela ficou com saudades dos velhos tempos e resolveu pedir umas férias.
- Ela foi embora? – perguntou Vicky preocupada.
- Não. Ela falou que ama dar aulas e que não vai abandonar seus alunos e nem seus doces. – tranqüilizou MacGilleain – Logo ela estará de volta, com um monte de histórias novas para contar!
- Então, isso quer dizer que você pode sair comigo? – perguntou Sarah não desistindo – Nós dois estamos livres!
- E quanto ao Chris? – perguntou Nissenson.
- A Karina ganhou o Totalmente Bruxa e eu sei que não posso com ela. Mas ainda não desisti! – acrescentou depressa, informando – Somente não quero desperdiçar minha juventude e beleza tentando fazer o cabeça dura do Christopher Doumajyd perceber como eu sou perfeita!
MacGilleain encarou a expressão decidida dela por um tempo e então declarou:
- Por que não? Que tal amanhã?
Sarah só faltou dar pulinhos de alegria ao dizer que sim e os dois combinarem um lugar para se encontrarem em Hogsmeade.
- Simon... – começou Vicky esperançosa – Você vai estar livre amanhã?
O dragão olhou em volta como se procurasse uma desculpa:
- Eu... anhm... na verdade, amanhã meu pai vai inaugurar uma loja nova em Londres e me convocou para demonstrar novos produtos. Estarei bem ocupado.
- Então quando você tiver um tempo livre me avisa? – perguntou ela quase implorando, agarrando a manga das vestes dele – Você vai ser formar esse ano e logo não poderemos mais nos ver!
- Certo. – concordou ele tentando desgrudá-la das suas vestes.
- DE VERDADE?! – perguntou ela não contendo a felicidade – Vai mesmo?!
- Já disse que vou, agora me solta!
- Você promete?!
- Ok, prometo, me solta!
Mais afastado da conversa, Hainault observava Mary na porta do salão, que esperava em vão pela vinda de Doumajyd.
***
Fechado em seu quarto na sua mansão, Doumajyd passara todo o tempo desde que saíra do Totalmente Bruxa montando o seu quebra-cabeça, sentando no chão frio.
Ele encaixou a última peça, e contemplou a imagem de um céu todo estrelado, que começara a brilhar como se fosse de verdade assim que fora completado.
O dragão sorriu, encarando pensativo as pequenas estrelas piscando. Então se jogou para trás, deitando no chão, e respirou fundo, como se finalmente tivesse chegado a uma decisão.
***
Escorada na parede da ala do D4, olhando pela janela distraída, foi com um susto que Mary percebeu que sua esfera tentava ser notada no seu bolso. Se atrapalhando e deixando a bolinha de vidro escorregar duas vezes, ela finalmente conseguiu ver quem era que a estava chamando.
- Oh. – cumprimentou Doumajyd sério.
- ... Oh. – respondeu ela no mesmo tom, o que fez o dragão sorrir.
Mary queria perguntar por que ele não estava ali, por que ele havia sumido daquele jeito antes e depois da competição, porque não tinha falado com ela antes. Mas não conseguiu fazer nenhuma dessas perguntas ao perceber que havia algo errado. Doumajyd não estava normal, se estivesse, teria dito algo como ‘Comemorando o segundo lugar, idiota?’. Mas ele não disse nada, e parecia estar fazendo um grande esforço para estar ali diante dela, mesmo que pela esfera.
- Escuta, – ela começou, como se pedisse desculpas – eu não ganhei.
- Eu vi.
- Você me ajudou tanto a me preparar e torceu tanto...
- Karina era uma grande adversária e você conseguiu empatar com ela, mesmo não ganhando o título. Não esperava menos da garota que eu coloque acima de todas as outras.
Ela sorriu, sentindo que preferia imensamente que ele estivesse ali de verdade falando isso para ela.
- Weed, eu tive que resolver algumas coisas e vou ficar na minha casa hoje. Então, amanhã, uma hora, Hogsmeade, praça do relógio! – ordenou ele – Encontro com o Ilustríssimo Eu!
- Certo. – concordou ela, batendo continência.
- E Mary...
- O quê?
- Você foi a melhor!
- ...Obrigada. – agradeceu ela feliz, finalmente recebendo o cumprimento que havia esperado desde o final da competição.
E sem dizer mais nada, a figura de Doumajyd desapareceu.
Mary guardou a esfera no bolso, muito mais animada, e voltou para onde estavam os outros, podendo finalmente comemorar.
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