O Dragão Hainault
Assim que Mary pisou no Três Vassouras, a primeira visão que teve foi Doumajyd sentado em uma mesa cercado por duas bruxas bonitas e bem vestidas, que riam e bebiam alegremente. Aquela cena a fez congelar, e ela tentou decidir rapidamente quem mataria primeiro: Doumajyd ou as duas bruxas. Porém, seu fio de pensamento assassino foi cortado assim que o líder dos Dragões a avistou, estática na porta:
- Você é muito lerda, Weed!
Furiosa, ela avançou até eles, sentindo que seria capaz de expelir fogo assim que abrisse a boca.
- Essa é a sua namorada? – perguntou em tom de deboche uma das bruxas a olhando dos pés a cabeça.
- Você está brincando, não? – perguntou a outra rindo – O que viu nela?!
- Ela não tem nada de bonita ou interessante! – gargalhou a outra.
- CALEM A BOCA, SUAS VELHAS! ISSO NÃO TEM NADA A VER COM VOCÊS! E O QUE ESTÃO FAZENDO COM ELE?! CAIAM FORA AGORA MESMO!
As duas a fitaram extremamente ofendidas, especialmente com o ‘velhas’, e exigiram uma retificação de Doumajyd. Este quase rolava de rir no seu lugar e apenas disse para elas:
- A Weed está certa! Não é da conta de vocês! Se mandem, suas horrorosas!
Dessa vez, indignadas, as duas levantaram e saíram, tendo todo o cuidado possível para esbarrarem em Mary no caminho:
- Idiota! – murmurou uma.
- O QU – Mary estava prestes a pular no pescoço dela, mas o seu corpo foi instantaneamente paralisado.
- Weed! – disse Doumajyd com um aceno de varinha, retirando o feitiço de congelamento que havia acabado de jogar nela – Não gaste seu tempo com elas e senta aí.
Mary respirou fundo, contando até dez e forçando a sua cabeça a imaginar o quão triste sua família ficaria caso ela fizesse o que tinha pensado em fazer com o dragão. Então mais calma, ela perguntou para ele:
- Sobre aquela mobília cara, pode devolver?
- Como devolver? – perguntou ele confuso, como se fosse um absurdo devolver algo que comprara.
Mary revirou os olhos e lembrando que ‘devolução de mercadoria’ não devia fazer parte da vida de Doumajyd. Se ele não gostasse de algo que comprara, simplesmente o descartava.
- Problemas de novo? – perguntou Nissenson aparecendo na mesa, abraçado com uma bruxa que Mary já vira atendendo na Dedosdemel.
- Nada. – respondeu Doumajyd – Só a Mary com uma idéia estranha sobre devolver as coisas que eu comprei para ela.
Nissenson riu, achando uma graça imensa nisso:
- Cogumelos não sabem aproveitar a sorte que têm!
Mary virou-se de frente para ele, para dar uma resposta bem dada, mas nada saiu da sua boca. Seus olhos pararam na cena que viu se desenrolar atrás de Nissenson, em uma das últimas mesas do bar.
Lá estava Ryan Hainault, totalmente aos beijos com uma moça que Mary nunca vira na vida.
- Mary? – ela ouviu a voz de Nissenson soar distante.
Então pestanejando, ela sacudiu a cabeça para voltar a si e gaguejou:
- E-eu te-tenho que voltar! Te-tenho trabalho de... Tchau!
E saiu correndo do bar, nem ao menos escutando os chamados imperativos de Doumajyd. Tudo o que ela sabia era que, se não corresse o mais rápido que podia daquele lugar, poderia desmaiar.
***
Mesmo depois de ter perdido uma noite de sono pensando no que vira, Mary não chegara a uma resposta adequada sobre tudo o que acontecera no dia anterior. Aquele era mesmo o Ryan Hainault? O mesmo que ela conhecia e gostava tanto? Ela esperava aquele comportamento de MacGilleain ou de Nissenson, mas com certeza não do Dragão da Grifinória. Será que ele havia mudado tanto quanto o seu visual? O que realmente acontecera na França?...
Ela andava sem uma direção certa pelos corredores de Hogwarts, trombando uma vez ou outra com um aluno tão distraído quanto ela, e segurando firmemente o lenço de Hainault no bolso do casaco. Foi então que seus pés pararam em algum lugar e ela se deu conta, olhando em volta, de que havia ido para a sua Torre do Desabafo.
Fazia um tempo razoável que ela não vinha ali. Antes de ela receber a Tarja Vermelha, suas visitas a torre eram constantes, assim como as suas idas as estufas da professora Karoline. Mas nos últimos tempos, ela tinha tido um problema atrás do outro e não lhe restava nem mesmo um tempo para gritar para o nada e chutar as paredes da torre.
- Inacreditável... – suspirou ela indo até a janela e se escorando na parede fria – Hainault nunca faria esse tipo de coisa... Definitivamente inacreditável...
Ela cruzou os braços na janela e apoiou o seu rosto neles, passando a observar a paisagem, que estava querendo começar a mostrar os primeiros ares de primavera.
- Bom dia!
Mary deixou a cabeça escorregar com o susto e a bateu na lateral da janela, na pressa de ver com seus próprios olhos o dono da voz conhecida. E lá estava ele mesmo, Ryan Hainault, com seu novo cabelo vermelho espetado e os mesmos olhos azuis que ela conhecia.
- ...Oi. – disse ela quase sem voz.
- Eu tinha saudades desse lugar. – disse ele ficando ao lado dela e também apoiando os braços na janela. – Eu pensei que não voltaria mais a vir aqui.
Mary o encarava sem saber o que dizer, até que uma idéia lhe veio à cabeça:
- Aqui. – ela tirou o lenço do bolso e lhe entregou.
- Hum?... Isso é daquela vez?
- Desculpe por demorar a devolver.
Ele sorriu e perguntou:
- Você o guardou esse tempo todo?... Não precisa se desculpar.
- Vo-você parece ter mudado. – disse ela cautelosamente.
- É mesmo? – ele perguntou rindo – Meus pais também tiveram essa impressão... Mas acho que só a cor do cabelo já foi uma grande mudança para eles...
- Na França... – Mary Reuniu toda a sua coragem e perguntou de uma vez – aconteceu alguma coisa entre você e a Sharon para você ter voltado assim de repente? Você não...
- Mary? – ele a cortou.
- Hum? – perguntou ela ainda com o pensamento concentrado em formular estrategicamente as perguntas que faria para ele.
- Você sairia comigo?
- Claro... O quê?! – ela se assustou, tanto com a pergunta quanto com a sua resposta espontânea.
***
- Espero que você tenha uma boa desculpa para ter me desobedecido! – declarou a senhora Doumajyd assim que seu filho entrou na sala de Hogwarts reservada para assuntos particulares
- Tem noção de que me tirou do meio de uma aula? – perguntou Doumajyd se fazendo de bom aluno.
- A desculpa! – exigiu ela, sem ouvir as reclamações dele.
Ele riu, colocando as mãos nos bolsos do casaco e se jogando no sofá ao lado dela:
- Então há momentos nos quais você consegue colocar de lado o seu trabalho e se preocupar com o seu filho?
- Felizmente, – ela sorriu de uma maneira nada carinhosa – não é com você que estou preocupada. Eu estaria definhando no St. Mungus se me preocupasse com todas as suas bobagens. É com a nossa reputação que eu me preocupo! Com o nosso nome!
Doumajyd se encolheu no sofá, e perguntou de mau humor:
- E se eu estiver mesmo gostando da Weed, hein? Isso não atrapalha na reputação da nossa família!
- Sua visão é tão limitada quanto a sua inteligência, Christopher! Não percebe que essa menina é uma sangue-ruim e pobre?! Você é o herdeiro da poderosa família Doumajyd! Trate de agir como tal!... – ela respirou para não acabar perdendo a calma e continuou, mais compassadamente – Se você estiver apenas brincando com ela eu não me importo.
Doumajyd a encarou, como se ela tivesse falado um absurdo e respondeu no mesmo tom:
- Eu gosto dela, mãe! NÃO ESTOU BRINCADO!
A senhora Doumajyd lhe lançou um olhar mortal e ele retribuiu com um equivalente.
- Já é muito tarde para tentar se intrometer na minha vida! – disse ele em tom de ponto final e saiu da sala, batendo a porta atrás de si.
***
- Está mesmo namorando o Chris, Mary? – perguntou Hainault para tentar tirar a garota do seu estado de choque com a pergunta anterior.
- Não! – ela apressou-se em responder – Quer dizer... Na verdade foi uma coisa que ele decidiu sem me consultar!
- É mesmo?... O Chris costuma fazer isso.
Os dois ficaram calados, Mary ainda se recuperando do susto que levara e tentando entender o que fora aquela pergunta.
- Sabe, Mary... Desde a primeira vez que eu a vi berrando nessa torre eu percebi que você não era igual a essas outras alunas de Hogwarts.
Mary permaneceu calada, não fazendo idéia de onde ele queria chegar.
- Eu não sou bom para você?
Essa a pegou totalmente despreparada. Ou ele estava com algum problema em se comunicar e fazer-se entender devido à estadia fora do país, ou ela estava sobre um encanto de confusão que não lhe permitia o entender claramente:
- Não... quer dizer, eu...
- Esqueça o Chris. – disse ele sorrindo calmamente para ela – Fique comigo.
Mary congelou. O que ele estava fazendo?! Primeiro se agarrando com aquela moça no bar, no meio de um monte de gente e agora isso?
Diante do silêncio e da total expressão de confusão dela, ele começou a rir:
- Estou brincando!
Mary o encarou boquiaberta. Ele era realmente muito bom em fazer as pessoas acreditarem no que ele falava.
- O Chris é meu amigo. – continue ele – Seria algo horrível de se fazer da minha parte... Você parecia ter acreditado. – ele riu mais ainda.
Mary tentou reordenar os pensamentos: 1) fora uma brincadeira; 2) Hainault fizera uma piada, coisa extremamente estranha vindo dele; 3) ela, boba, praticamente acreditara; 4) ela queria se jogar da torre e se enterrar no centro da Terra de tanta vergonha.
Ele percebeu a reação dela e perguntou:
- Não me diga que está disposta?
- Não! Não estou! – respondeu ela furiosa.
- Então... – ele se aproximou bem dela e sussurrou – Que tal namorarmos secretamente?
Aquilo passara dos limites. O que estava acontecendo com o seu Cavalheiro dos Olhos Frios? Ele estava sobre alguma maldição de controle ou a tinta do cabelo começara a se infiltrar no seu cérebro?
- Ahaha, que engraçado... – disse ela cruzando os braços e mostrando não ter gostado da piada – De qualquer forma, eu devolvi o seu lenço, e era isso que eu tinha para lhe falar. – ela deu meia volta e saiu.
- Sabe... – disse ele ainda rindo – Você está, de alguma forma, mais bonita do que antes, Mary.
Ela ouviu, mas fez de tudo para fingir não ter ouvido, enquanto se apressava em sair o mais rápido possível daquela torre.
***
Mary quase se jogou escadaria abaixo para poder chegar ao Salão Principal, o lugar mais afastado possível da torre.
Simplesmente não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Que praga haviam lhe lançado para a sua vida tender a virar de pernas para o ar esse ano?! Tudo sempre voltava a ser um desastre quando parecia finalmente estar resolvido. Ela mal havia se recuperado da confusão que Sarah havia lhe causado e Ryan Hainault voltava agindo de uma forma totalmente anormal.
- Mary!
Ela praguejou contra quem a havia lhe chamado antes mesmo de virar para ver quem era. Mas não se arrependeu depois de ver Sarah correndo em sua direção, lhe acenando e pedindo que a esperasse.
- Eu preciso falar com você. – anunciou a garota ofegando.
- Acho que não temos mais nada para nos falar, Sarah. – respondeu ela um tanto grossa.
- E-eu apenas queria agradecer por ontem. – disse Sarah em um fiapo de voz, voltando a ser a coelhinha assustada que Mary pensava ser sua amiga – Eu fui tão má e ainda assim você me ajudou, Mary! Não sabe como isso foi importante para mim. Eu fiquei tão feliz! Desde que eu me mudei para essa escola, você sempre esteve comigo. Tudo bem que sua força de pobre, sua bravura e determinação, me faziam sentir complexada, mas...
- Vá direto ao assunto, Sarah! Não quero perder mais do meu tempo com você!
- É isso! Eu não quero perder!
- O quê? – perguntou Mary sem entender.
- Você me ensinou que se somos fortes podemos conseguir o que queremos! – ela lhe deu um sorriso radiante e continuou empolgada – Por isso eu não vou desistir do Chris!
Mary ficou sem palavras diante daquilo. Lá estava Sarah Swan, a garota que chegara ao extremo para se vingar, agindo como uma menininha feliz, praticamente dando pulos de excitação com a decisão que tomara.
- Ele é meu ídolo desde a minha infância! – continuou ela sonhadoramente e Mary poderia jurar que seus olhos brilhavam – Veja, eu costumava ser feia no passado, mas agora sou tão linda quanto uma vella! Não há motivo para achar que sou pior que você, entende?
- ... – limitou-se Mary.
- Então, daqui por diante, somos rivais no amor, ok?
Ela pegou a mão de uma Mary estática e a apertou, como se firmassem um acordo. E então saiu toda feliz o sorridente.
- Ina... creditável... – Mary conseguiu murmurar pasma.
Então ela percebeu uma sensação de queimação no bolso do casaco e imediatamente lembrou da esfera de Doumajyd.
- Weed! – disse ele mal a sua imagem tinha se formado por trás do vidro, e parecia extremamente irritado – Se algo estranho acontecer com você, me avise imediatamente!
- Como assim algo estranho? – perguntou ela assustada, contando mentalmente as várias coisas estranhas que havia lhe acontecido em menos de uma hora.
- Apenas me avise imediatamente que eu irei onde você esteja! – e a imagem dele desapareceu.
Mary guardou a esfera no bolso e continuou seu caminho, furiosa, pensando seriamente em se trancar no seu quarto pelo resto do dia.
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