Hora do show
Capítulo 15 - Hora do show
Uma jaula vazia. Era tudo o que se via à frente de Gina Weasley, que apertava a varinha com firmeza na mão direita. Draco esticou o pescoço disfarçadamente, tentando esconder sua curiosidade pelo que havia (ou não) ali, embora fosse desnecessário, já que todos ao redor olhavam para o mesmo ponto que ele.
Quando já imaginava que talvez a impetuosa ruiva realmente não tivesse medo de nada e que por esse motivo o bicho-papão simplesmente se desintegrara, uma pequena caixa preta achatada flutuou no ar. Gina soltou um suspiro tenso, erguendo a cabeça e apertando ainda mais a varinha em sua mão, até os nós de seus dedos perderem a cor.
Inesperadamente, a caixa preta se partiu ao meio revelando folhas em branco, aparentemente muito velhas, e o formato excêntrico do bicho-papão acabou chamando a atenção de outros bruxos, que provavelmente acharam estranho uma garota ter como objeto de maior terror, um simples e inofensivo livro. Draco percebeu que se tratava de um diário. Não somente um diário. Mas o diário de Tom Servolo Riddle.
Draco franziu as sobrancelhas. Alguns flashes do segundo ano em Hogwarts passaram por sua cabeça: a reabertura da câmara secreta que abrigava um terrível basilisco, os alunos sangue-ruins sendo petrificados pelos corredores da escola... e a pequena Weasley que, induzida por Tom Riddle – que se tornara amigo de Gina através do diário, colocado por seu pai intencionalmente no caldeirão da garota durante um desentendimento com Arthur Weasley na Floreios e Borrões – abrira a câmara e escrevera com sangue nas paredes do castelo.
Não é como se estivesse se sentindo mal por seu pai ter sido o causador de tanto sofrimento na vida da caçula Weasley. Mas algo o deixou inquieto quando pensou nisso. Ela deveria odiá-lo com todas as forças. E qual o motivo de se sentir dessa maneira pelo simples fato de Gina odiá-lo?
As lembranças e pensamentos sumiram no instante em que ele observava a ruiva respirar forte pela boca e gritar um sonoro e ecoante “Riddikulus!”.
O diário de capa negra transformou-se em um cartaz roxo, parecido com os que o Ministério da Magia usava e em letras garrafais amarelas podia-se ler algo como “O APERTO VOCÊ-SABE-ONDE”, que fez uma onda de gargalhadas se propagar no ar. Draco não entendeu o que acontecia, sentindo-se estúpido por ser o único que parecia estar confuso, mas notou o alívio na voz da menina à sua frente ao ouví-la falar novamente.
- Vocês salvaram a minha vida, maninhos... - disse à Fred e Jorge, que tinham lágrimas nos olhos de tanto rir. Jorge suspirou e sorriu, afagando os cabelos de fogo da irmã com carinho.
- Fico feliz que nossas idiotices tenham te ajudado de alguma forma, Gininha.
- Não são idiotices... - Gina riu, em seguida fazendo uma falsa cara de zangada. - “Gininha” é a única coisa idiota vinda de vocês dois. Bom, gostaria muito de ficar e presenciar os fiascos, mas acho melhor esperar do outro lado! - disse, antes de se virar e atravessar o portão ao lado da jaula.
A jaula. Por um momento, Draco tinha se esquecido do maldito bicho-papão.
- Anda logo, não é bom deixá-la sozinha! - Fred ralhou com ele, empurrando-o para frente.
- É... ela pode machucar alguém. - acrescentou Jorge, sorrindo. Draco concordava com ele de certa forma, apesar de não simpatizar nem um pouco com o fato de que a pequena Gina era muito mais hábil com feitiços do que aparentava ser.
Um último vislumbre do cartaz e com um rodopio ele se transformou em... si mesmo. Draco arqueou as sobrancelhas, intrigado com a sua imagem refletida em um bicho-papão. Não havia nada de anormal ali, era apenas uma cópia sua, os mesmos olhos frios da cor de uma tempestade, o queixo pontudo e o nariz afilado que emolduravam o rosto pálido adornado pelos originais fios de cabelo platinados, quase brancos.
Não havia nada que pudesse indicar algum sofrimento, algum machucado, algum indício de insanidade. Era apenas e somente ele. Ainda confuso, o novo ruivo apontou a varinha para sua figura, sem saber ao certo o que fazer. Era ridículo. Como Draco poderia fazer sua própria imagem parecer tola e engraçada na frente de tantas pessoas? E com mil diabos, porque ele haveria de temer a si mesmo? Não fazia sentido algum.
Procurou pensar em coisas alegres, depois se preocuparia com a forma que havia tomado seu bicho-papão. Deixando o rosto chocado de Harry Potter invadir sua mente, no momento em que ele lhe contara sobre o peculiar beijo entre Lílian Evans e Severo Snape na época de escola, Draco estufou o peito, decidido a não demonstrar que a imagem de seu maior terror era um fato inesperado para ele e bradou “Riddikulus”, com uma voz isenta de emoção.
Os cabelos platinados do bicho-papão de Draco se tornaram escuros e rebeldes, revelando uma cicatriz em forma de raio acima das sobrancelhas e os olhos mudaram de um tom acinzentado para um profundo verde-esmeralda. A imagem de Harry Potter estava parada diante de si, presa em uma jaula, fitando-o com a mesma expressão de estupefação que lhe dirigira ao contar-lhe do incidente que presenciara na penseira de Snape.
Draco passou a mão pelos cabelos rubros, encantados por Jorge Weasley para que pudesse vir ao show, e virando-se abruptamente para trás lançou à Harry um olhar divertido.
- Certas recordações são impagáveis, Potter. - disse-lhe, sem um pingo de piedade na voz, tendo a certeza de que Harry entendera o recado ao notar as fagulhas de raiva saltarem de seus olhos verdes. Draco adiantou-se através do portão, deixando o restante da turma na fila.
Com os olhos semi-cerrados por causa da luz extremamente forte que vinha do palco, o ex-sonserino tateou o lado interno das vestes à procura da varinha. Murmurando um feitiço simples na retina de seus olhos que funcionava como um óculos escuro, Draco procurou pela caçula Weasley. Apenas porque não se sentiria bem estando sozinho num lugar abarrotado de pessoas de caráter duvidoso, que poderiam de alguma forma reconhecê-lo e entregá-lo ao Ministério da Magia ou até mesmo aos Comensais de Voldemort.
- Vejo que não teve problemas com o bicho-papão... - a voz firme da menina soou alta às suas costas e Draco não se virou para encará-la, estranhando a sensação de calma e satisfação que se apoderou dele.
- Um bicho-papão não é nada comparado ao que eu tenho passado nos últimos dias naquele chiqueiro que vocês insistem em chamar de casa. - Draco se viu dizendo, antes que pudesse pensar no que realmente queria dizer. Estava tão acostumado à se referir maldosamente à falta de dinheiro dos Weasley que as ofensas saíam de sua boca sem que ele se desse conta.
- Também vejo que não tem problema nenhum em formular uma ofensa contra um de nós mesmo que não estejamos sendo ignorantes com você. - a ruiva tinha um leve tom de decepção na voz, como se esperasse que Draco pudesse ao menos uma vez ser gentil com ela. “E porque diabos ela esperaria que eu lhe fosse gentil?”
- Escute, Weasley, eu apenas... não sei agir de outra maneira. - a voz de Draco soou estranhamente sincera quando se virou para encará-la e ele se perguntou o porquê de estar tentando se justificar com a garota. Os olhos de Gina refletiam sua surpresa com a resposta de Draco, deixando-o constrangido por alguns instantes. “Que ótimo momento para se mostrar patético, Draco...” ralhou consigo mesmo.
A voz entusiasmada de Fred interrompeu-os, chamando a atenção de Gina que, parecendo um pouco desconsertada, foi ao encontro do irmão, deixando Draco reprimir a repentina vontade de lançar um Cruciatus com a varinha apontada para seu próprio peito.
Alguns minutos mais tarde, o grupo todo estava reunido do lado de dentro, esperando ansiosamente pelo início do show. De repente e sem aviso algum, três disparos foram ouvidos e no instante seguinte, haviam três corpos voando da multidão para o palco, sendo acompanhados por canhões de luz.
Avada Lee, Mya Cruciatus e Lara Imperius aterrissaram graciosamente no palco, diante de gritos histéricos da platéia, que delirava com as travessuras das garotas. Lee brandiu sua varinha e pesadas vestimentas negras cobriram-nas rapidamente e as três puxaram juntas seus respectivos capuzes. O público ficou em um silêncio mortal.
- Ah, não... elas não vão fazer isso! - berrou um Jorge histérico, beirando à felicidade suprema.
- Ah, sim... elas vão! - gritou Fred para o irmão, transbordando de alegria.
- Vai nessa, Lee!!! - berraram os dois em uníssono, puxando coros da multidão que agora gritava a plenos pulmões.
Lee, Mya e Lara conjuraram cópias fieis das máscaras usadas pelos Comensais da morte e como num movimento ensaiado, levaram juntas ao rosto.
“Sou um Comensal sentimental
Me apego facilmente ao que desperta o meu desejo...”
E enfim, o show havia de fato começado. A platéia estava dividida entre abismada e encantada com a letra que zombava claramente os seguidores de Lord Voldemort.
“Esqueci meu equilíbrio cortejando a insanidade,
A guerra está perdida mas existem possibilidades...”
O som era pesado e Avada Lee arrepiava a multidão com o tom agudo de sua guitarra. Draco havia se esquecido completamente de seus inúmeros problemas, de toda a humilhação pela qual estava passando e se deixou levar pela letra zombeteira da música, imaginando que os Comensais não ficariam nem um pouco satisfeitos quando descobrissem que haviam virado motivo de piada.
As melodias seguintes, Draco conhecia bem. Acompanhou as músicas cantando baixinho, tomando o cuidado de não ser pego se divertindo por um dos Weasley, afinal, nada seria mais óbvio que um deles se incomodasse com isso e tentasse impedí-lo de se divertir.
Draco reparou – mesmo que evitasse ao máximo notar a presença do ruivo – que Rony estava visitando com muita frequência a banca de bebidas. E à cada chegada do fiel escudeiro de Harry Potter, sua carranca ficava mais evidente e vermelha.
E assim, as horas passaram como um relâmpago. A banda se despediu da platéia, que gritava coros pedindo bis e após mais uma melodia, deram o adeus definitivo, fazendo um fã desesperado por atenção – que havia subido ao palco num momento de total descontrole – se diluir até virar uma poça d'água.
Quando já estavam de volta ao local em que pegaram a chave de portal, um Rony cambaleante soluçou às suas costas. Draco ouviu Hermione – já de volta à personalidade irritantemente sensata – chamar o amigo, parecendo tentar impedí-lo de fazer algo. Mas ele não lhe deu ouvidos.
- Você deveria fazer parte do grupo também, Malfoy. – Rony sorriu para Draco, que o olhava desconfiado. Rony somente lhe dirigia a palavra se fosse para ofender ou algo do tipo. Sem perder tempo, o ruivo continuou. – Você é uma maldição, assim como elas. E ainda mais imperdoável, se é que me entende.
- O que você quer dizer com isso, fuinha? – sibilou. Gina se aproximou, segurando o braço de Rony e tentava trazê-lo de volta a razão, alegando que o irmão havia bebido além da conta, mas ele não pareceu se importar e continuou encarando Draco.
- Quero dizer que você é um Imperdoável. Que você não vale o chão que pisa. – deu alguns passos na direção do outro, se soltando do aperto de Gina. – Que você é um idiota que... – Gina segurou mais uma vez no braço de Rony, mas ele se soltou bruscamente, empurrando a irmã sem perceber. – QUE VOCÊ É UM MALDITO IDIOTA QUE COLOCOU COMENSAIS NA PRÓPRIA ESCOLA EM TROCA DE PODER! – Rony gritou, completamente alterado pelo uísque de fogo, despejando toda a sua ira.
- Eu não tive escolha! – Draco levantou a voz, pela primeira vez não se incomodando com o fato de estar em desvantagem, cercado por várias cabeças vermelhas. Mas ninguém fez menção de interromper a discussão, apenas Mione e Gina que tentavam inutilmente se fazer ouvir. – EU NÃO TIVE ESCOLHA! – gritou mais alto, como se com isso ganhasse alguma credibilidade.
Rony deu uma risada seca. Hermione agarrou a manga de seu casaco e o sacudiu, tentando fazê-lo perceber que essa não era uma boa hora para se dirigir à Draco, porém já era tarde. O ruivo havia sufocado o ódio que sentia de do ex-sonserino por pedido de sua mãe, mas a situação entre os dois piorava a cada dia. Como poderia conviver amigavelmente com o responsável pelas cicatrizes que seu irmão carregaria por toda a vida?
- Você acha que me engana com todo esse papo? – Rony apontou para os outros que assistiam a cena sem saber o que fazer. – Eles podem ser idiotas, mas eu não sou! Eu não acredito em você! E mesmo que fosse verdade, você deveria ter morrido ao invés de fazer tudo o que fez!
- E você? Teria feito diferente? – Draco tinha um brilho insano no olhar, e quase cuspia as palavras ao desafiar Rony.
- Claro que sim! – ele respondeu sem pestanejar, como se isso fosse óbvio. – Eu jamais viveria em paz se algo acontecesse aos meus colegas por causa da minha covardia!
- EU NÃO SOU COVARDE! – fulminou-o com o olhar, sentindo uma onda de revolta corroê-lo por dentro.
- Claro que não, você é só um almofadinha arrogante que acha que tem o rei na barriga! Um projeto de comensal que não deu certo e que finalmente está pagando por ter sido tão imbecil à ponto de acreditar em um Lord que não dá a mínima para os seus seguidores idiotas! – Draco fez menção de interrompê-lo, mas Rony continuou despejando sua revolta. - Acha que foi difícil para ele acabar com a sua mãe? Aposto como ele deve ter se divertido à valer enquanto a torturava!
Foi como se o ruivo tivesse acabado de lançar-lhe um crucio. Hermione tapou a boca com as mãos e tinha os olhos marejados. Parecia estar chocada com o comportamento do amigo.
- Já chega, Rony, você está ultrapassando todos os limites! - gritou Gina, alterada, sacudindo nervosamente o irmão.
- Deixe-o falar, Weasley. - Draco não se virou para encarar a ruiva, apenas continuava a fitar Rony, um brilho melancólico e raivoso nos olhos acinzentados. - Você só diz isso porque não estava no meu lugar... – a voz de Draco não passava de um sibilo, ele deu um passo à frente e ficou cara-a-cara com o ex-grifinório. – Se estivesse, teria feito a mesma coisa que eu fiz.
- Que parte do “eu jamais viveria em paz se meus colegas fossem mortos pela minha covardia” você não entendeu, Malfoy? – Rony riu com escárnio, parecendo uma versão ainda mais rubra de Draco. – Quer que eu desenhe para que você possa assimilar?
Estava cansado. Estava definitivamente cansado de ser tratado como se fosse um retardado. Draco passou as mãos pelo cabelo, irritado por sentir um amontoado de palha vermelha sobre sua cabeça e murmurou um feitiço pra trazer seu cabelo se volta. Não deixaria mais que zombassem dele como estavam fazendo. Esse poderia ser o primeiro indício de coragem partindo do loiro e ele faria de tudo para mantê-lo presente dali para frente. Deu um passo para trás, afastando-se de Rony apenas o suficiente para que os outros não perdessem nenhum detalhe do que iria dizer.
- Você teria morrido como um herói se fosse para salvar os babacas dos seus amigos, mas eu aposto que se fosse para salvar minha mãe, meu pai ou até mesmo a Pansy você jamais teria dado sua vida! E quanto à Crabbe? Ou Goyle? Ou qualquer outro sonserino que você tanto despreza? – Rony, que estava escarlate, foi perdendo gradativamente a cor do rosto, ficando branco como papel.
- Eu... não me diga o que eu faria, Malfoy! Você não sabe de nada! – cuspiu, sem saber direito o que estava dizendo.
- Estou certo, não é fuinha? Vamos, admita! – Draco sabia que todos estavam olhando para ele, então continuou, apreciando o momento de atenção que recebera do grupo. – Você sabe que qualquer um que fosse importante para mim não seria importante o suficiente para que você se sacrificasse, não é mesmo? Então me diga porque eu deveria escolher seus amigos à minha família?
Draco poderia sorrir diante da perplexidade do ruivo, mas a sua vontade nesse momento não era essa. A idéia de que alguém, que morreria pelos alunos idiotas de Hogwarts, não faria o mesmo por seus pais de certa forma o machucava. Era como se de repente eles não valessem mais do que alguns míseros nuques.
O ar parecia ter se acabado, pois era visível que todos tinham dificuldades em respirar ali. A palidez de Rony foi dando lugar à uma coloração avermelhada novamente. Mas não de raiva e sim de vergonha. Alguns segundos ficaram suspensos no ar, segundos esses que pareceram durar uma eternidade.
- Sim, você está certo. – respondeu Rony gaguejando um pouco e com visível embaraço, parecendo não saber exatamente para onde olhar enquanto falava. Suas orelhas estavam vermelhas como um par de pimentões pendurados ao lado da cabeça. – Eu... eu acho que não faria isso por eles.
- E porque você acha que comigo teria que ser diferente? – perguntou, sem esconder o rancor. Draco não esperou pela resposta e deixando Harry, Hermione e a massa ruiva boquiabertos, aparatou.
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N/A: E enfim, o show acontece! O da banda e o de Draco, que deixou todos sem fala, até mesmo Rony, que sempre tem alguma asneira na ponta da língua para soltar.
Sei que ficou muito idiota aqueles trechinhos que eu descaradamente alterei da música “Sereníssima” do Legião Urbana, mas é que outro dia estava escutando e esse negócio do “Comensal sentimental” me passou pela cabeça e me provocou um ridículo ataque de risos.
Quanto aos bichos-papões, me desculpem pelo clichê. Sei que muitas fics usam o Tom Riddle como o maior pesadelo de Gina, mas eu não acredito que ela tema muitas outras coisas além dele.
Espero que estejam gostando, muito obrigada a quem está acompanhando a fic e desculpem pela demora nas atualizações. O que eu posso dizer em minha defesa? Bem, nada. Mas garanto que não irei abandoná-la!
Com carinho,
Mila Fawkes.
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