Enganos



Quem és? O que fazes?
Diz-me o que trazes,
O que te trouxe aqui
A um ponto do fim.

Deixas-te na ignorância.
Onde te levará essa ânsia?
Para fora da terra,
Para oceano, quem te dera…

Nada sei e tu perdida,
Alma delicada, indefinida,
Alma espontânea, bendita,
Que brota da flor infinita.

Tudo tu sabes, dizes-me,
Ou antes contradizes-me,
Enigma bucólico és tu,
Ao vento dançante do bambu.

Como é impróprio deixar este género de botão de transporte na mão de dois jovens e indecisos adolescentes! Não sabem o que querem para si nem para os outros… muito menos para onde desejam ir, sendo a sua mente um conjunto desconjuntado de uma massa disforme repleta de sonhos, muitos deles dentro da impossibilidade de se realizarem por falta de esforço e crença.

O rodopio típico do botão de transporte parou e Harry olhou em volta. Aquilo não parecia em nada ser a casa de Hermione, aquilo nem parecia uma casa, pareciam mais os verdes e amplos campos de Hogwarts que Harry tanto gostava de ver e percorrer sucessivamente nas visitas ao seu amigo Hagrid, um meio-gigante um pouco trapalhão, mas muito simpático.

- Harry, tu não estavas a pensar na Hermione, pois não? — Inquiriu Ron desconfiado.

- Por acaso não. — Respondeu Harry olhando para o céu, semi-corado. — Estava a pensar em Hogwarts.

- Ah, pois…

- O que estão aqui a fazer? — Perguntou uma voz forte.

Viraram-se os dois para trás e viram o guarda das chaves de Hogwarts, Rubeus Hagrid, a uns metros deles.

- Enganámo-nos no destino, mas estamos já de partida, não é Harry? — Perguntou Ron sorrindo-lhe.

- Exactamente, mas foi muito bom ver-te Hagrid. — Disse Harry, e desapareceram do nada, como se nem sequer estivessem estado naquele local tão seu conhecido.

Hagrid ficou parado, com um ar estupefacto a olhar para o local onde antes se encontravam Ron e Harry. Na sua mão pendiam duas cenouras gigantescas ainda repletas de terra, que balouçavam ao sabor da confusão que percorria Hagrid.

- Mas… o que se passou aqui? – perguntou-se, passando a mão pelos fios de barba desalinhados.

*
Voltaram a aparecer numa casa estranhíssima. Era pintada em tons de negro, não se percebia bem se seria a cor original, se sujidade. A luz era difusa, deixando visualizar o que parecia ser uma sala de alguém com um gosto soturno. Harry só se lembrava de uma pessoa que tivesse uma casa assim, pelo menos naquele momento.

- Potter! Weasley!! O que estão a fazer em minha casa?!?!

Era sem mais nem menos, por azar ou tão pouca sorte, o horrível e detestável professor de poções, Severus Snape.

- Harry... tira-nos daqui... por favor...— Murmurou Ron, com ar de quem estava prestes a ter um ataque de choro. – Sou novo demais para morrer!

Harry não hesitou, à primeira coisa que lhe passou pela cabeça desapareceu, enquanto Snape gritava:

- Voltem aqui seus fedelhos! Potter! Weasley! Vou vos dar o maior castigo possível! O vosso cérebrozinho pequeno nem imagina o que vos espera!

*
Reapareceram no que parecia ser um quarto. Era amplo, bem mobilado, mas com uma desarrumação indelicada (como se fosse possível uma desarrumação ser delicada). As cores verdes e prateadas que havia na roupa espalhada pela cama não lhes agradaram muito, tendo já um pressentimento parcialmente formado do local onde estariam: A mansão Malfoy.

Uma porta abriu-se e Harry e Ron ficaram a olhar para um rapaz pálido e de cabelos loiros, embrulhado numa toalha, que parecia ter acabado sair do banho.

- O que é que vocês fazem aqui?! — Gritou Malfoy estupefacto. — No meu quarto?!

- Descansa que não viemos para te ver tomar banho. — Respondeu Ron, olhando-o de cima a baixo. — E estávamos já de partida.

- Quando o meu pai souber disto...

- Nós não temos medo do teu paizinho. — Afirmou Harry friamente. — Nem dos seus amigos Devoradores da Morte e muito menos de ti.

- Desapareçam daqui! — Gritou-lhes um Malfoy vermelho de indignação.

- Com muito gosto — Respondeu Harry. — Então até para o mês que vem, e vê lá se não vais para a escola de toalha!

- Deixo-te uma prenda para demonstrar o quanto gosto de ti. — Disse-lhe Ron, e nesse momento desapareceram.

Malfoy olhou em volta… prenda? A que se referiria aquele Weasley nojento? O seu olhar foi cair sobre a cama onde se encontravam três pequenas bolinhas esverdeadas, que quase ficavam camufladas diante tantas peças de roupa nesse mesmo tom.

*
Apareceram em frente a Hermione.

- Que prenda era essa que deixas-te ao Malfoy? — Perguntou Harry sem dar conta que Hermione os observava.

- Três bombinhas de estrume! Ele vai adorar! — Riu-se Ron. – Foi o George que me ofereceu.

- Gostava mesmo de ver a cara dele. — Observou Harry, rindo-se também.

- Temos é que ter cuidado no comboio, ele pode tentar matar-nos. — Riu-se Ron.

- E com razão. — Observou Hermione reprovadoramente.

Olharam os dois para ela, pasmados.

- O que fazem aqui? — Quis saber a amiga, com os braços cruzados.

Harry observou-a atentamente. Parecia que tinha mudado do dia para a noite! Estava mais alta, o seu cabelo castanho emoldurava-lhe a face de uns olhos azuis de céu. Estava muito bonita…

- Viemos visitar-te. — Respondeu Ron. — E agora acertámos no alvo.

- Pois foi. — Concordou Harry saindo das suas divagações. — Devias ter visto o Malfoy em toalha de banho.

- Como é que vocês viram o Malfoy em toalha de banho? — Perguntou Hermione, não percebendo nada.

- Com o botão de transporte do Harry. — Respondeu Ron.

- Vocês tiveram intenção de ir ver o Malfoy? — Perguntou Hermione exasperada.

- Não, isto foi só um pequeno engano. — Respondeu Ron. — Para aqui chegar-mos, vimos o Hagrid, o Snape e claro, o Malfoy.

- Mas isso é perigoso! — Assustou-se Hermione. – Eu bem sabia que não te devia ter dado aquela Snitch…

- Snitch? Não… viemos com uma meia mal-cheirosa. Mas perigoso como? — Inquiriu Ron.

- Imaginem que em vez de virem ter aqui, iam parar a outro lugar qualquer? Poderiam andar às voltas durante tempos e tempos! Ou então até poderiam aparecer no local onde está o Quem Nós Sabemos! — Fez ver Hermione deixando-se cair em cima dum sofá em tons de azul.

Harry só agora reparara, que estavam numa sala, possivelmente da família Granger, de costas para uma TV que, antes de eles chegarem, Hermione se entretia a ver, enquanto lia um livro que repousava sobre o sofá.

- Hermione, íamos logo ter com o Voldemort? Não estás a exagerar um bocado? — Notou Harry.

- Não, não estou! — Teimou Hermione. — E o que vieram os dois aqui fazer? Esta casa nem é minha!

- Então é de quem? De um tio teu? — Quis saber Ron olhando à volta.

- Não, esta casa é dos pais do Victor. — Respondeu Hermione, corando, enquanto desviava o olhar.

- Qual Victor? — Perguntaram os dois em coro.

- O que vocês estão a imaginar. — Murmurou Hermione, Harry nunca a tinha visto tão embaraçada.

- Interferimos em alguma coisa? — Perguntou Ron sarcasticamente.

- Não sejas parvo. — Disse Hermione friamente.

- Claro! Eu agora é que sou parvo… tu enfias-te na casa de um tipo que mal conheces e eu é que sou parvo, não haja dúvida.... — Disse Ron.

- Vamos ao que interessa, Ron. — Pediu Harry rapidamente para que não houvesse ali uma discussão. — Viemos aqui informar a Madame de que o professor Remus Lupin vai voltar a dar aulas.

- Hoje não é um de Abril Harry. — Lembrou Hermione. – Ainda falta muito para o dia das mentiras. Por isso arranjem uma desculpa melhor para as vossas brincadeiras.

- Mas é verdade, o professor Lupin disse-lho pessoalmente! Ou será que agora o que interessa é só o que o Vicky diz? Os amigos ficam em segundo plano, não é? — Inquiriu Ron colericamente.

- Por favor Ron! Eu e o Victor somos só amigos! Oh… contigo não dá para falar… Mas fico muito contente por o professor Lupin estar de volta, vamos ter novamente um professor decente… — murmurou Hermione olhando para o chão, entristecia-a o facto de Ron não conseguir ultrapassar esta fase deprimente. — E é bom saber que o professor Lupin aceitou o trabalho, pois pelo que sei ninguém dá emprego a lobisomens.

- Isso é muito mau… — Disse Ron azedamente. – Mas há coisas piores…

- Preconceito, é o que é. — Disse Hermione. — Assim como os feiticeiros são injustos para com os elfos-domésticos. Só porque são diferentes, com um aspecto inferior…

- Lá vai ela começar com a história dela da BABE. — Murmurou Ron virando a cabeça de lado.

- Hermownninny, com quem estás a falarr? — Perguntou a voz de Victor Krum, o seeker da Bulgária, vinda de algures de dentro de casa.

- Com ninguém Victor, com ninguém. — Respondeu Hermione. — Agora é melhor vocês irem-se embora, e até para a semana.

- Ela está-nos a mandar embora, Harry, para ficar com o Vickyzinho — Observou Ron ultrajado.

- Sim, Adeus Hermione. — Despediu-se Harry revirando os olhos. Definitivamente Ron nunca mudaria.

- Dá cumprimentos ao Vicky. — Disse Ron num tom irónico.

- Ron! — Gritou Hermione em tom de advertência.

- Hermwon…

Mas não chegaram a ouvir Victor Krum acabar de chamar Hermione, pois nesse momento o botão de transporte levou-os para… algures.

Disto já cansei,
Nada sabes, isso sei…
Que alma abalada
És tu querida fada?

Nada oiço, o vazio é denso.
Cai livre e propenso,
Talvez a desleixar,
Aquele verso impresso a rimar.

Aterraram em pé (Harry começara a acostumar-se a estas súbitas viagens), mas onde? O local onde apareceram estava coberto de densa vegetação, parecia uma selva tropical, a amazónia talvez, o Congo… como poderiam saber?

- Harry! Que surpresa tão… agradável…

O rapaz que sobreviveu sentiu um arrepio que o percorreu dos pés à ponta dos cabelos desalinhados. Ele conhecia tão bem aquela voz, aquela gélida e cruel voz, provinda de um ser maleficamente pérfido.

- Harry…por favor… - murmurou Ron a tremer como varas verdes. Mesmo sem se virar para trás tinha compreendido quem lá estava, lembrava-se do aviso de Hermione, lembrava-se da pouca ou nenhuma atenção que lhe tinha dado.

Harry virou-se de frente para Voldemort, que lhe sorria palidamente de dentro de um capuz negro. Ao seu lado encontrava-se um homem baixo devido a uma imensa curvatura nas suas costas. Tinha um ar extremamente antigo e uma cicatriz ia-lhe da sobrancelha aos lábios, passando por uma órbita sem olho.

Ron continuava virado de costas, possivelmente à espera que lhe fizessem alguma coisa, que o acordassem deste pesadelo.

- Diz ao teu amigo que não precisa de ter medo. Não estou com intenção de perder tempo a matar-vos, por agora… - observou Voldemort com um olhar cruel. – O meu trabalho não vai ser em vão por me aparecerem agora à frente. Voltem para onde vieram, e para a próxima… tenham mais cuidado, podem não me encontrar a mim, a caridosa alma que um dia vos acolherá na morte.

Harry não respondeu ao sarcasmo de Voldemort e deitou um último olhar ao velho que se encontrava na sua companhia. Era assustador…

Pegou na mão de um Ron impávido que colocou sobre o botão de transporte e desapareceram sobre o olhar demoníaco de Voldemort.

E tu não compreendes
O bailar que sentes…
Continua então a bailar
No sentido embalar.

Só tu no tempo,
Em vidas remexendo.
És universo delirante,
Ó cavaleiro andante!

Sorri-nos a silhueta
Não a cores, branca e preta,
Em rajadas fustigantes…
Só nas brumas distantes.

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