I - Sob um céu de estrelas
Capítulo um: Sob um céu de estrelas
- ...E não volte mais aqui!
- Ótimo! – A ruiva berrou. Olhava incrédula para a porta do orfanato. Estava caída no chão, sentada na neve. – ótimo! – repetiu, mas dessa vez mais baixo, enquanto se levantava e passava a mão nas vestes surradas e cinzentas que já estavam quase menores que o seu corpo, para tirar a neve.
Ela fitou durante alguns segundos o enorme casarão que serviu de orfanato a ela por dois longos anos. Havia passado muitas coisas lá. A maioria coisas ruins, de certo, mas de qualquer maneira, era melhor do que viver na rua, na penumbra das noites geladas, sob o céu de estrelas. Ela sabia que dali pra frente seria tudo muito difícil. Não tinha ninguém no mundo, não tinha como arranjar comida e o pior de tudo: não sabia nada sobre o seu passado, logo, não tinha a quem recorrer.
- Eu também não preciso de vocês! – Ela encheu a mão com a neve branquíssima que cobria o chão e jogou na porta, mas esta se fechou antes de ser atingida. – Velha desgraçada... – resmungava, furiosa.
Ela se virou, decidida a nunca mais por os pés naquele orfanato, onde a discriminaram muitas e muitas vezes, por ser diferente e fazer coisas... estranhas. Agora que completou 18 anos, simplesmente a expulsaram do único lugar que ela se lembrava de ter um dia chamado de lar.
- “E você achou que eu fosse te sustentar até quando, Gin?” – ela fazia uma imitação perfeita da voz rouca e arrastada da diretora do orfanato, Sr. Addler. – Ah, francamente! – Bufou e se pôs a caminhar. O abrigo onde morou até aquele dia ficava afastado da cidade. Na primavera, os campos que cercavam a propriedade ficavam cobertos de uma grama verde e fresca e as árvores sustentavam flores multicoloridas. Mas por hora, o lugar estava frio e triste, só se podia ver a neve que cobria tudo: o teto do casarão os galhos secos das arvores e os picos das montanhas ao longe, dificultando os passos da ruiva
- Talvez não seja tão ruim assim. Qual é, Gin, já ta na hora de encontrar seu passado, né? Você precisa saber quem é e de onde veio. É, isso. Eu vou encontrar meu passado. Não é possível que eu surgi da purpurina... – ela pensava alto, enquanto andava com dificuldade. Se lembrou de quando fora encontrada vagando sozinha. Não conseguia se lembrar de nada antes disso, por mais que se esforçasse. E a única pista que ela tinha, era um folheto de viagem. Um pedaço de papel com fotos do Museu do Louvre e do Arco do triunfo, em Paris, que estava nos bolsos das suas roupas quando chegou ao orfanato. – Paris que me aguarde! – Sorriu, mas um sorriso triste e descrente.
Ela caminhou. Caminhou por quilômetros, tentando vencer a raiva da velha Sra. Addler, que a tratava como um cachorro doente. Tentando vencer o frio; que o casaco, o gorro e as velhas luvas de lã não conseguiam manter longe de seu corpo frágil. Caminhou até chegar a uma fábrica de tecidos abandonada.
O lugar era sombrio, e varias placas contendo avisos de “Perigo” pendiam do portão cambeta. Aquilo era o suficiente para manter qualquer um afastado, mas a ruiva precisava de um lugar para passar a noite, que começava a cair. Empurrou o portão, fazendo-o ranger. O barulho fez os pêlos de sua nuca se arrepiarem.
Adentrou o enorme pátio da fabrica e se sentou em um banco, encostado no muro. Enquanto olhava as inúmeras janelas quebradas, tirou da mochila um sanduíche de queijo que roubou da cozinha do orfanato minutos antes de sair, desembrulhou-o e deu uma mordida faminta.
“Vai ficar tudo bem, você vai ver...” Ela tentava inutilmente se convencer. “Ah, a quem estou tentando enganar!?” Deixou escapar uma lágrima, seguida por outra, e outra... Como tudo ficaria bem, se ela não sabia o que seria do amanhã? Não sabia ao menos nem se o amanhã existiria! Tinha um destino: Paris. Mas como chegaria lá, sozinha? E ela nem ao menos sabia exatamente o que procurar...
Deitou-se no banco, sua visão embaçada por causa das lágrimas. Estava frio do lado de fora, mas o frio que ela sentia dentro da alma era o mais cortante. Tirou o folheto de viagem que levava consigo para qualquer lugar que fosse e seu olhar se perdeu naquelas imagens bonitas e coloridas. Fechou os olhos e ficou imaginando-se em frente aos enormes prédios, seu rosto banhado pelas luzes de Paris.
Ela agradecia silenciosamente por ter parado de nevar, pelo menos.
Nunca soube por quanto tempo ficou ali, deitada, pensando e se lamentando por tudo. Mas ela acabou adormecendo, abraçando o pedaço de papel que mudaria sua vida.
_________________________________________________
- Hei! – ela ouviu uma voz ao longe e estremeceu, mas não abriu os olhos. – HEI! – mas ele insistiu.
Gina abriu os olhos, mas não enxergou nitidamente. Sua visão estava turva, só conseguia distinguir a silhueta de alguém agachado ao seu lado. Ele parecia perturbado, sem saber o que fazer. A visão de Gina foi clareando aos poucos e seus olhos encontraram um par de olhos frios como mármore. Sua cabeça latejava e doía a ponto de ela não conseguir se lembrar onde estava e nem como fora parar ali. Quase desmaiou denovo, mas ele segurou o corpo dela e a colocou de pé.
“Me larga...” Ela não tinha forçar para falar. Ele carregou o corpo sem energia da ruiva, até que uma claridade insuportável invadiu seus olhos. Ela perdeu os sentidos outra vez.
Gina acordou exasperada. Suava frio, e sentia seu coração pulsar na garganta. Se sentou no banco onde passou a noite em um pulo, com a mão no peito, tentando acalmar seu coração desesperado.
- Foi só um sonho? Mas parecia tão real... – Parecia tão real que sua cabeça ainda latejava de dor. Esfregou a mão nos olhos e ficou pensando por uns instantes. O dia estava começando a nascer e o ar fresco da manhã entrava em seus pulmões, ajudando-a a se acalmar.
Seu olhar, até então perdido no nada, deteu-se na porta da fábrica. Para sua surpresa, havia movimento ali. Seus olhos cor-de-âmbar arregalaram-se quando avistou três pessoas vestidas de forma um tanto não convencional paradas na porta. Eles pareciam não ter notado a presença da menina até aquele momento. Um deles vestia uma calça com uma estampa de bolinhas, um moletom vermelho-berrante e uma cueca por cima da calça. “Cueca por cima da calça!?” A garota não pode conter um sorrisinho.
Os outros dois vestiam longas capas roxas. Um deles tinha uma espessa barba branca e carregava uma vassoura debaixo do braço direito.
A ruiva se encolheu, temendo ser vista. Não sabia que ainda funcionava alguma coisa naquele lugar, e sua surpresa foi maior ainda quando a porta foi aberta. Lá dentro transitava um grande numero de pessoas, todas usando roupas muito engraçadas na opinião da garota. E o mais estranho de tudo é que as pessoas não podiam ser vistas quando passavam em frente às janelas. Era como se elas fossem enfeitiçadas... Aquilo a assustou. Ela jogou a mochila velha nas costas e cruzou o portão da fabrica correndo.
“Quem são essas pessoas? Ah, deve ser alguma coisa ilegal, tenho certeza! Pra que iriam querer fazer uma reunião em uma fabrica abandonada!?”
Aquilo afastou o estranho sonho de sua cabeça. Enquanto corria, a distancia entre as arvores foi diminuindo, diminuindo... e quando ela percebeu, já estava dentro de uma floresta.
As árvores sem vida davam ao lugar um aspecto sombrio. Receosa em entrar muito na floresta, ela caminhava devagar. Cada galho que seus pés quebravam era motivo para seu corpo todo estremecer. Andou por uma meia hora, até que avistou uma clareira. “Ótimo, uma clareira!” Mas não era só uma clareira. Bom, era uma clareira. Uma bem grande por sinal. Muito grande. Era quase como uma fazenda no meio da floresta, uma enorme área desmatada.
Aparentemente, não havia nada ali, alem de neve espalhada no chão. Caminhava olhando atentamente em volta. “Isso é bem estranho... Ai!”
E Gina caiu para trás. Ela tinha batido com a cabeça com força em alguma coisa. Algo que ela não conseguia enxergar. Ficou no chão, com os olhos fechados lacrimejando, tentando fazer as bolinhas e estrelinhas ilusórias causadas pela dor latejante sumirem. Quando abriu os olhos, ainda meio tonta, seu coração disparou.
No lugar onde antes havia só neve e vazio, agora uma imponente casa se erguia. Ela havia caído sentada no chão de um jardim mal-cuidado, cheio de plantas mortas. Atrás da casa, ela conseguiu ver um riachinho congelado.
Olhou novamente para a casa de paredes de pedra, incrédula. Como alguém poderia morar ali? Aquela casa a lembrava uma mansão assombrada de um dos livros que leu no orfanato. Mas isso não era o pior. “Como tudo isso veio parar aqui de repente!?” Ela se levantou receosa e começou a caminhar em direção à escada de pedra que dava acesso as portas da casa. Tudo aquilo era tão irreal, tão improvável, que a simples garota órfã se sentiu dentro de um conto de magia.
_________________________________________________
n.a.: Ah, não sei se gostei muito desse capitulo. eu li e reli, escrevi e reescrevi, mas nunca saia do jeito que eu queria, então vai ficar assim mesmo. ù.ú ah, e nem reparem se a fic ficar meio viajada no começo. =x
Não sei se as ideias principais desse capítulo ficaram claras; se ficou alguma duvida, me perguntem.
Os proximos capitulos já estão quase prontos e eu garanto que vão ser melhores que esse. Mas mesmo assim, só posto com comentários! :*
Comentários (0)
Não há comentários. Seja o primeiro!