Os terrenos de Hogwarts
Mandrágoras gritavam de forma ensurdecedora do lado de fora do castelo, elas haviam acordado Hanna deixando-a aterrorizada. Olhou em volta e descobriu-se num aconchegante aposento com paredes de pedra. Num pulo, pôs-se de pé e foi até a porta, mas ao contrário do que pensava, não estava trancada. Somente então Hanna se lembrou do que acontecera. Como toda a propriedade de McNair estava enfeitiçada, ninguém poderia aparatar ou desaparatar, e ela teve que fugir a pé, preferindo permanecer na forma animal, já que como tal poderia sentir muito melhor a presença de alguém ou alguma coisa perigosa. Somente milhas colinas acima foi que Hanna pôde desaparatar, mas quase inconsciente de exaustão, aparatou nos terrenos de Hogwarts em meio à Floresta Proibida, o que lhe rendou alguns ferimentos inesperados nas mãos dos desconfiados centauros, que sentiam a presença do mal com muita facilidade. Foi salva pelas mãos do homem a quem pedira asilo, Alvo Dumbledore, que a acolheu sem nem mesmo questionar, levando-a diretamente a uma cama na enfermaria.
— Desculpe pelo inconveniente, não me lembrei que Pomona estaria transplantando mandrágoras. Mas ela já, já terminará!
— Ainda bem que o senhor me deixou ficar com isso - agradeceu Hanna, apertando o abafador sobre os ouvidos com a ajuda da varinha. Os dois sorriram e Dumbledore ficou ali com ela, em silêncio, até que terminasse de tomar o café da manhã que o elfo havia trazido. O que não levou muito tempo.
— Muito obrigada, senhor Dumbledore. Não sei como lhe agradecer...
— Precisamos conversar, a senhora sabe disso.
— Sei, mas primeiro gostaria de ver meu filho.
— Não sei se é uma boa idéia, talvez ele comente com os colegas...
—Não, não, o senhor não precisa trazê-lo aqui. Só quero vê-lo, de longe, para saber que realmente passa bem.
— Neste caso, me acompanhe.
Os dois saíram pelo corredor, subiram por uma pequena torre e se apoiaram no beiral, onde uma janela ovalada se abria para um extenso gramado verde. Dumbledore apontou para a esquerda, onde um grupo de alunos vinha carregando suas vassouras para mais uma aula de vôo.
— Claro que sim - murmurou ela para si mesma. - Ele está ótimo.
— Sim, Hanna, ele está. Mas não posso dizer o mesmo de você.
Ela baixou os olhos e se afastou da janela.
— Poderá ficar em Hogwarts até decidir para onde quer ir desde que se mantenha no anonimato.
— Mais uma vez, obrigada - respondeu apertando a mão dele com força. Um leve sorriso nos lábios dele a fizeram sorrir também.
— Ótimo. Vou deixá-la sozinha agora. Voltarei mais tarde para lhe trazer o jantar. Por favor, não saia do quarto.
Hanna confirmou que não iria sair e se despediram.
O ano letivo terminou dois dias depois e Hanna viu as crianças partirem pela janela minúscula de seu aposento confortável. Dumbledore deu a ela a certeza de que Leon seria muito bem cuidado, já que ficara sob os cuidados da professora Minerva McGonagall, ao que Hanna aceitou sem discutir. Confiava em Dumbledore.
A maior preocupação de Hanna, porém era com seu filho. E na primeira oportunidade que teve, perguntou sobre ele ao diretor da vazia Hogwarts.
— Não se preocupe, minha cara Hanna, Leon não está sendo ratado com diferença pelos professores. Mas não posso falar o mesmo dos colegas. - Dumbledore baixou os olhos. - Leon é um menino forte, sabe se defender e tem bons argumentos. Confesso que foi um grande choque quando recebi a notícia.
Hanna, desta vez, foi quem baixou os olhos.
— Foi Snape quem lhe trouxe a...
— Sim - respondeu ele ficando de pé e andando até a pequena janela. - Ele é um homem de boa fé, preocupa-se com você...
Hanna se afastou dele, indo sentar na beirada da cama.
— Não quero que meu filho se torne como o pai biológico.
— E não irá, Hanna, Leon é um menino perspicaz, muito inteligente...
— Ele é apenas uma criança, que pode se corromper a qualquer instante. Eu não tenho sido um bom exemplo e temo por ele.
— Seu filho é muito maduro... - Dumbledore, pela terceira vez, não conseguiu concluir a frase.
— E qual a explicação para as brincadeiras horríveis das quais ele participou no ano passado?
— Nunca aprontou nada grave quando criança, Hanna? - quis saber Dumbledore, fazendo-a se calar outra vez. - Tom Riddle foi rejeitado pelo pai e a mãe morreu cedo. A vida do garoto girava entorno de Hogwarts, nada mais que isso. E aqui, mesmo aqui, aconteceram situações que pioraram as condições mentais de Tom, principalmente porque ele sempre quis ser o melhor de todos, não importando como teria que ser ou agir para chegar lá.
Hanna balançou a cabeça, desacreditada.
— Seu filho está em boas mãos e enquanto tiver seu amor tudo ficará bem!
— Senhor Dumbledore! - chamou ela.
— Sim, Hanna.
— Os comensais... e Voldemort... eles planejam algo. Não sei o que é! - disse ela com insegurança. Dumbledore sorriu.
— Parece que você os assustou. Eles não se encontraram mais depois do dia em que você fugiu.
— Oh! Então... está bem! - Hanna desviou os olhos dele. Claro, Snape o ajudara, era seu serviço com a Ordem, avisar sobre os planos de Voldemort.
— Eu lhe manterei informada, não se preocupe.
Os dias se passaram e agosto chegou juntamente com o outono e seus frescos ventos. Os professores voltavam para Hogwarts com certo receio dos acontecimentos no mundo bruxo, mas com a certeza de que em Hogwarts, ao lado de Alvo Dumbledore, suas vidas jamais correriam risco.
Snape entrou no escritório de Dumbledore cabisbaixo. Havia tempos que não conseguia informações concisas, mas também, Voldemort estava mais precavido do que nunca.
— Ninguém sabe dela - Snape admitiu com certa decepção. - Voldemort está pensando em procurá-la através de feitiços...
— Sorte nossa ninguém poder mexer naqueles livros proibidos.
— Sorte nossa por Hanna tê-los enfeitiçado muito bem - rosnou Snape em contradição consigo mesmo, queria pegar os livros, mas também desejava que eles jamais existissem.
— Vá descansar, Severo. Tente dormir, você está com uma aparência horrível.
Dumbledore sorriu, apertando o ombro de Snape e subiu as escadas que levavam até seu dormitório.
Primeiro de setembro chegou com balburdia e alegria, que irradiava tanto mais ao longo que o salão principal ia se enchendo de crianças. Hanna podia ver a movimentação pela janela de seu quarto, pequenos pontinhos iluminados cruzavam por uma longa estradinha até sumirem atrás de um muro alto, provavelmente uma entrada secundária do castelo.
Por um tempo tudo ficou em silêncio, até que uma algazarra começava a descer pelo corredor que passava diante do quarto de Hanna. Ela se encostou de costas na porta e sorriu ao perceber que o som era feito por crianças. Queria espiar, talvez visse Leon, mas como explicaria a Dumbledore se fosse vista? Limitou-se a ouvir enquanto imaginava-se abraçando Leon.
O diretor de Hogwarts permaneceu de pé, no saguão, até que todos os alunos tivessem sido encaminhados a suas devidas casas. Snape parou ao lado dele, fitando o portal de entrada igualmente como Dumbledore.
— O senhor viu Hanna? - perguntou Snape com os braços cruzados e, num primeiro momento, encarando dentro dos olhos de Dumbledore, mas segundos depois, desviando-os para o chão. O diretor reconheceu nos olhos de Snape que havia outras intenções que não o medo ou a preocupação de que Voldemort atacasse.
— Não, Severo, não a vi.
Snape baixou a cabeça e suspirou fracamente.
— Ela deve estar bem, Severo. É uma mulher inteligente, sabe do que é capaz e conhece Voldemort muito bem a ponto de saber que sumir por uns tempos é o melhor a fazer.
— Sumir não é a solução. O senhor...
— Sim, sei disso. Fugir nunca é a solução. Mas deixar as coisas esfriarem sempre é bom.
Snape se calou, aceitando a resposta como se fosse absoluta, mas em sua mente tudo era díspar. Preocupava-se demais com Hanna e queria poder ajudá-la.
— A marca está queimando - murmurou Snape. - Desde cedo.
— Faça o que deve ser feito - Dumbledore disse com simplicidade
Snape deixou Dumbledore sozinho no saguão. O velho diretor esperou que o professor se afastasse e seguiu pelo mesmo caminho.
Era manhã de sábado. Hanna estava inquieta desde que acordara, mas ela se sentiu indisposta pouco depois do almoço. Tinha a certeza de que o problema não era a comida, a bebida ou ter que passar os dias presa no quarto. Não. Ela sabia que Voldemort estava se reunindo, sentia seu braço arder, porém, seria muito difícil ajudar Dumbledore agora que estava longe das Trevas e presa naquele quarto de masmorra.
Durante o jantar Dumbledore conversava com Minerva, a professora de Transfiguração, quando algo interessante lhe chamou a atenção do lado de fora do castelo. Uma raposa-vermelha felpuda corria pela orla da floresta com um fio dourado na boca. O fio se estendia até perder-se de vista, Dumbledore não podia enxergar, mas a raposa-vermelha havia dado a volta com o fio cor ouro por toda a propriedade do castelo, até unir as duas pontas. Assim que as pontas se tocaram, uma carreira de luzes douradas subiu por mais de um quilômetro céu adentro e clareou tudo por segundos, fazendo parecer dia. Quando os alunos e demais professores viram o clarão correram para as janelas, contudo já era tarde, ele havia sumido. A raposa-vermelha correu ziguezagueando pelo jardim sem ser vista e entrou numa pequena janela das masmorras.
Hanna fechou a janela minúscula de seu quarto e sentou na cama ofegando. Tudo estava silencioso, todos jantavam no salão principal, longe dali e ela havia deixado as luzes apagadas.
— Muito arriscado o que fez, Hanna - era a voz de Dumbledore vindo da porta. Ela se levantou num salto e acendeu a ponta da varinha. A claridade a denunciou ainda mais: suas bochechas estavam coradas e o vestido tinha rasgado até a altura da coxa.
— Senhor Dumbledore... eu não quis sair sem avisar... mas Voldemort está tramando algo!
— Eu sei, eu sei - afirmou Dumbledore. - Agradeço pelo ótimo feitiço de proteção, mas arriscou-se muito saindo assim.
— Perdoe-me.
— Então, uma raposa, hein? - disse Dumbledore sorrindo e agitando a varinha, arrumando o vestido dela.
Ela sorriu e baixou os olhos pouco depois.
— Voldemort está tentando encontrá-la.
— Eu sei. Vai fazer de tudo para me achar. E agradeço ao senhor por cuidar tão bem de meu filho, se não fosse isso, talvez Voldemort já tivesse o que...
— Não fiz mais do que deveria.
Os dois permaneceram calados, fitando-se, até Dumbledore quebrar o silêncio com uma frase pré-pensada, à qual Hanna esperava desde o primeiro dia em que chegara ao castelo.
— Você não pode permanecer aqui, Hanna.
— Sei disso, senhor. É perigoso para todos - murmurou. Dumbledore assentiu com a cabeça. - O senhor me faria uma concessão?
— Vou pedir a Leon que venha vê-la - confirmou o diretor sorrindo, mas com os olhos tristes por ter que deixar uma pessoa do bem mergulhar num mundo totalmente traiçoeiro sem poder ajudar de alguma forma. - Antes, gostaria de lhe perguntar... Voldemort conhece algum feitiço de busca? Keneth Pryme escreveu alguns deles em seus livros, suponho.
— Sim, escreveu. Mas tenho a certeza de que não se lembra. E Voldemort também não os conhece, caso contrário já os teria utilizado. Por acaso, eu conheço um feitiço, poderia lhe ensinar, se assim o senhor desejar.
— Gostaria muito - garantiu, mas ele ergueu as sobrancelhas assim que Hanna descreveu o principal ingrediente: sangue de unicórnio.
Balançando a cabeça, Dumbledore se despediu por aquela noite. Na manhã seguinte conversariam um pouco mais e à noite, antes de acompanhar Hanna até a saída da propriedade, Dumbledore aprenderia a executar o poderoso feitiço de busca, Exquirus Homo, com uma exceção, Voldemort não era mortal e talvez a execução do feitiço nem desse certo.
Não demorou nem quinze minutos e Leon apareceu eufórico e com uma pilha de livros nas mãos, queria mostrar à mãe tudo o que iria aprender naquele ano. Ficaram a tarde toda juntos dentro do quarto. Hanna deu toda sua atenção ao filho, sem se importar com o que aconteceria no dia seguinte. Assim que o céu começou a ficar rosado, ela ajudou o filho a recolher os livros. Estava na hora dele ir jantar e voltar para o dormitório. Contudo, antes de sair, Leon segurou a mão da mãe e puxando-a para perto de si, fez com que ela se ajoelhasse.
— Mãe, eu não quero que a senhora se machuque.
— Eu sei, querido, mas não posso permanecer à vista. Aquele homem é capaz do inimaginável para conseguir o que quer. E Dumbledore sabe disso.
— O que você vai fazer?
— Não faço idéia. Mas não se preocupe com isso, eu vou dar um jeito em tudo.
Leon estava apreensivo e Hanna percebeu.
— O professor Dumbledore me disse para vir me despedir rápido e para não comentar com ninguém...
— E ele está certo, querido, ninguém deve saber que estive aqui, senão pessoas inocentes irão pagar um preço caro por isso.
— Para onde a senhora vai? - Leon pediu com os olhos vermelhos, ele tinha vontade de chorar.
— Não sei, meu amor. E mesmo que soubesse não poderia lhe dizer - sussurrou com o coração partido.
— Não gosto disso! E quando voltaremos a nos ver?
— Em breve, eu espero, mas podemos nos corresponder - disse ela abraçando-o. - Com cuidado e atenção, sempre! - Leon balançou afirmativamente a cabeça e Hanna continuou: - Você será meu irmão caçula, que morava comigo na Finlândia, e me falará sobre você como se falasse de Hogwarts.
Leon sorriu, iluminando o rosto da mãe.
— Mas espere-me escrever primeiro, certo? Serei Helmi, de Vilhelmina. Você será Jaakko. Pesquisa na biblioteca sobre a Moldávia; um feitiço o ajudará a traduzir o texto para essa língua.
— Farei isso, mãe - falou o garoto abraçando-a.
Hanna estendeu o momento ao máximo, mas a noite já ia cair e sabia que os corredores seriam vigiados, pois todos os alunos deveriam estar no salão para o jantar.
— Eu amo você, mãe.
— Também te amo muito, meu anjo. Mantenha-me sempre em seu coração. Nunca se esqueça de que te amo - murmurou ela beijando-o na testa e empurrando-o para fora do quarto. Leon apertou uma última vez a mão da mãe, sorriu e tomou o caminho do dormitório para guardar seus pertences antes do jantar.
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