Wizengamot



Title: Cogitari Ancilla
Author name: Jesse Kimble
Author email: [email protected]
Category: Drama
Rating: PG-13
Spoilers: Todos os cinco livros, incluindo a Ordem da Fênix. Se você não leu o quinto livro, então desliga esse computador e vai ler agora mesmo!! E, obviamente, Departamento de Mistérios, que é a primeira parte dessa fic.
Shippers: Harry e Hermione, obviamente
Summary of the chapter: The time has arrived. Harry Potter vingou a morte do padrinho; não pensou nas conseqüências. Agora, é hora em que suas ações serão julgadas e cada atitude sua perante a Corte pode ser decisiva para a definição de sua inocência. Ou de sua culpa.
Disclaimer: Bom, já que a Jo disse… ESTA HIST"RIA É TOTALMENTE MINHA, E AI DE QUEM TENTAR COPIAR!!!
A/N: Wizengamot Suprema Corte Bruxa (fala sério, só eu que li OdF em inglês? o.o')
A/N 2: Quem não percebeu, o Harry passou em torno de seis meses preso (ninguém notou na parte que ele encontra a Dama, os "dias que logo perdeu a conta"?). Então essa é a realidade nesse capítulo: Hermione ficou seis meses morando com a McGonagall, Harry passou seis meses preso… e o que mais aconteceu nesses seis meses será explicado nesse capítulo.
A/N 3: Primeiro, quero dizer que esse capítulo é dedicado à minha betinha Ameria que fez eu escrevê-lo! (quem mandou exigir explicações sobre a "morte inútil de Bellatrix em Departamento de Mistérios"?) Espero que gostem.


Capítulo Quinze – Wizengamot

What I must do is all that concerns me, not what the people think. This rule, equally arduous in actual and intellectual life, may serve for the whole distinction between greatness and meanness. It is the harder, because you will always find those who think they know what is your duty better than you know it. It is easy in the world to live after the world's opinion; it is easy in solitude to live after our own; but the great person is one who in the midst of the crowd keeps with perfect sweetness the independence of solitude”

– Ralph Waldo Emerson





***

Hermione esperava não ter que ir ao julgamento, mas a Wizengamot não aceitara seu pedido para depor a portas fechadas. Por isso, ali estava ela, entrando no Átrio do Ministério da Magia e escapando do estafante calor que castigava a região central de Londres.

McGonagall, Snape e Dumbledore a acompanhavam desde que saíra da Escócia. Antes, os quatro reuniram-se com Lupin para discutir a defesa preparada. Hermione não acreditava realmente que Harry se redimisse por seus atos, mas isso não a fazia se importar menos. Mesmo que quisesse mantê-lo à distância, não desejava que ele ficasse preso, ou pior, que fosse jogado pelo véu.

Esse fora o motivo pelo qual ela aceitara testemunhar. Era verdade que a intimação da Wizengamot a obrigava a fazê-lo, mas nada a impedia de sentar no banco das testemunhas e se manter calada. Porém, ela não o faria, estava decidida; já ficara longe de Harry tempo suficiente para não guardar rancor algum do ex-noivo.

Com esta idéia em mente, Hermione acompanhou Snape até uma sala reservada às testemunhas, enquanto McGonagall dirigia-se, com Dumbledore, ao tribunal de número dez.

Dumbledore até se oferecera para conversar com Harry antes da audiência, mas Lupin lhe informara que o Ministério não permitiria que o preso encontrasse alguém além da sua Primeira Testemunha de defesa. Mesmo assim, nem mesmo Lupin conseguira falar com ele. Percorrera os corredores frios daquela prisão para vê-lo, mas Harry não estava consciente do que se passava ao seu redor e, desta vez, não percebeu que Lupin lhe visitara.

Harry entrou na Corte sendo conduzido por três guardas. Conhecia aquele tribunal; já estivera nele mais de uma vez, mesmo que, na maior parte das visitas, estivesse sonhando. No centro, estava uma cadeira com correntes de ferro em seus braços. Foi quase jogado sobre ela e mal teve tempo de sentar-se apropriadamente antes de sentir seus pulsos sendo retidos. Sua mente passou a trabalhar mais rápido que o normal, embora seu corpo permanecesse imóvel, preso pelas correntes.

A sua frente, existia uma espécie de bancada que escondia parcialmente as pessoas sentadas atrás dela. Apesar disso, Harry pôde reconhecer Amélia Bones e lembrou-se que Karkaroff comentara algo sobre o fato de ela ter assumido o lugar de Fudge, embora não pudesse identificar muito bem a ocasião em que o ex-comensal lhe passara tal informação.

Ao seu redor, posicionados no que parecia ser uma arquibancada de algum estádio, ele viu muitos bruxos e bruxas com vestes roxas o observando. Não pôde evitar o arrepio de horror que lhe percorreu a espinha; estava sentindo-se como se fosse um animal enjaulado, posto à exibição.

No alto da arquibancada, à direita, reconheceu sua ex-professora de Transfiguração conversando discretamente com Draco Malfoy. McGonagall sorriu para Harry, tentando assegurá-lo de que tudo terminaria bem, mas tudo o que o réu viu naquele sorriso foi um tom de escárnio dirigido diretamente a ele.

– Audiência do dia dezessete de setembro – madame Bones começou a ler um longo pergaminho depois de alguns minutos, sua voz se espalhando pelo lugar e cessando o burburinho que antes dominava a masmorra – para julgar a implicação de Harry James Potter na morte de Bellatrix Black Lestrange, ocorrida em nove de abril do ano que antecede ao corrente. Após análise dos argumentos da acusação e das alegações da defesa, o réu mencionado foi enquadrado sob o Artigo 5º, incisos I, XXXVIII, XXXIX, XLIII, LIV do Estatuto de Proteção aos Bruxos, de 1715. Esta Corte está composta com base nos Artigos 101 e 102, Inciso I, Subdivisão do Capítulo 3, Seção II do Código Internacional de Direito em Magia.

"Inquiridores: Amélia Susan Bones, Ministra da Magia; Emelina Vance, chefe do Departamento de Execução das Leis da Magia; Kingsley Shacklebolt, chefe-geral do Departamento de Aurores. Testemunhas de defesa: Remo John Lupin, Severo Snape, Hermione Jane Granger. Testemunhas de acusação: Lúcio Malfoy, Mark Nevin Evans. Escriba da Corte: Percy Inácio Weasley."

Harry levantou o rosto para observar melhor as pessoas sentadas junto à madame Bones. Emelina e Kingsley, ele os conhecia, eram ambos da Ordem da Fênix. Imaginara que Hermione seria intimada, mas não estava certo de que ela compareceria. Só restava esperar.

Não pôde se virar para ver a porta do tribunal sendo aberta e por ela entrando as duas Primeiras Testemunhas; Lupin e Malfoy. O defensor aproximou-se e sentou-se ao seu lado, em uma cadeira com um alto encosto, conjurada pela própria ministra. Lúcio Malfoy preferiu manter distância do réu e aproximar-se da bancada dos Inquiridores, sentando-se em uma cadeira conjurada pelo Escriba.

"A Corte convida o réu Harry James Potter a depor," finalizou a Ministra.

Harry observou Lupin e notou quão pelicular aquela situação era. Em um julgamento trouxa, ele deveria se levantar e ir até o banco das testemunhas, mas ali, ele estava preso em sua cadeira e sabia que a menção do "convite" que madame Bones lhe fizera não passava de uma mera formalidade, já que seria obrigado a depor de qualquer forma.

Tudo ali era contra a sua vontade; as testemunhas, o próprio julgamento. De que adiantava toda aquela gente fingindo estar em uma cerimônia oficial se ele já fora julgado por pessoas que o conheciam apenas por nome?

Temia o que Hermione poderia dizer ao ser interrogada, mas tentou deixar de lado esse pensamento para que pudesse concentrar-se nas perguntas que estavam prestes a serem feitas por Lupin, sua Primeira Testemunha de defesa.

– Harry, você sabe por que está aqui?

Ele não olhou para Lupin, recusando-se a levantar a cabeça e a encarar os olhares acusadores que as pessoas ali presentes lhe dirigiam. Em seus pulsos, mais um fato que contradizia a demagogia das palavras pronunciadas pelos membros da Corte. Lupin o inquiria como se houvesse a possibilidade de Harry estar em outro lugar se quisesse, quando a realidade o mantinha preso e o obrigava a responder ao interrogatório.

– Porque eu não posso simplesmente sair por aquela porta – a sentença de Harry foi sarcástica, no entanto sua voz mantinha-se quase apática.

Lupin respirou fundo, notando a reprovação nos olhares daqueles que o cercavam e percebendo que precisaria conduzir o questionamento de outra forma. Levantou-se e, pacientemente, começou a transitar entre o espaço que separava a tribuna dos Inquiridores da cadeira do réu.

– Você reconhece alguém entre as pessoas aqui presentes, Harry? – perguntou Lupin, abrindo um dos braços como se demonstrasse os bruxos que o cercavam.

– Conheço algumas pessoas que estão aqui. A quem você se refere?

A verdade era que o réu não poderia fazer perguntas durante seu depoimento, muito menos ao advogado de defesa; entretanto, ninguém objetou a esse fato, tão curiosos quanto Harry para saberem aonde Lupin pretendia chegar com essa linha de indagações.

– Refiro-me ao réu. Você o conhece?

– Eu não entendo o que você quer dizer, Lupin, o réu sou eu…

Lupin não respondeu; apenas contentou-se intimamente por Harry ter dito exatamente o que esperava que ele dissesse.

– E aquele bruxo? – Lupin apontou para Dumbledore. – Você o conhece?

Harry levantou os olhos para encontrar os de Dumbledore, seu olhar pedindo uma explicação, desejo que, segundo a expressão impassível demonstrada pelo diretor, não foi notado.

– Claro que conheço. Quem não sabe que ele é Alvo Dumbledore?

– Alvo Dumbledore – repetiu Lupin calmamente e Harry revirou os olhos. – Ele é seu parente?

– Não – respondeu Harry simplesmente.

– E esta bruxa? – Lupin indicou madame Bones. – Você tem alguma relação de sangue com ela?

– Não, não tenho nenhum parente nesse tribunal – Harry decidiu cortar o amigo.

– E no mundo bruxo? – Lupin perguntou imediatamente e Harry fez uma pausa antes de responder.

Por um momento, a imagem de Hermione voltou a sua mente. Os melhores dias, os melhores momentos… ele os relembrara muitas vezes durante o tempo em que estivera preso e por isso estava cada vez mais convencido que não passava de algo artificial. Nada de verdadeiro restara entre eles depois de meses de separação. Esforçando-se, afastou a memória e apertou os olhos, tentando ignorar o sangue que corria rápido em suas veias e a voz insegura que usou para pronunciar a palavra seguinte.

– Não.

– E você tem alguém que possa considerar como sua família?

– Não – Harry novamente negou, desejando que as perguntas tivessem parado antes mesmo de começar.

– E nunca teve?

A pergunta o atingiu como um feitiço faria se fosse lançado pelas suas costas. Dumbledore mexeu-se na cadeira, McGonagall limpou a garganta. Dezenas de olhos e ouvidos esperavam a reação do acusado.

– Houve uma pessoa que eu conheci suficientemente bem para que pudesse considerar assim.

– E onde está essa pessoa? Por que não o acompanha hoje, durante essa ocasião tão importante?

– Ele morreu.

– Morreu? – fingindo surpresa, Lupin olhou para os bruxos sentados atrás de Harry. – Como?

– Assassinado – Harry respondeu friamente.

– Nós o conhecemos, Harry?

– Você o conheceu bem, não, Lupin? – perguntou Harry retoricamente.

– Sim, eu o conheci. Porém, é possível que nem todos aqui saibam quem é. Você se importaria de pronunciar o nome dessa pessoa?

– Sirius Black – Harry respirou fundo, tentando ignorar os murmúrios que se espalharam pela sala.

– Silêncio! – pediu madame Bones, extinguindo imediatamente o barulho e dirigindo-se à Primeira Testemunha de Harry: – Prossiga.

– Então, para você, Sirius Black era como alguém da família? – reforçou Lupin.

– Ele era meu padrinho.

– E morreu? – Lupin repetiu, agora tão próximo de Harry que estava prestes a encostar-se na cadeira onde o réu estava sentado.

Lúcio Malfoy levantou-se imediatamente e, procurando impedir que Lupin continuasse tentando comover os juízes da Wizengamot, protestou:

– Meritíssima, o réu já respondeu a tal questionamento. A Primeira Testemunha está apenas especulando sobre a morte de um condenado que não tem relação alguma com o presente caso.

– Sr. Lupin, por favor, demonstre seu argumento – madame Bones disse, inclinada a concordar com Malfoy.

– Sirius Black foi absolvido por esta Corte, Sr. Malfoy. Portanto, sua inocência foi mais do que provada. Infelizmente, as provas só puderam ser apresentadas tarde demais – Lupin deixou escapar, baixando os olhos. – Na verdade, Meritíssima, o que procuro trazer à tona não é o julgamento, mas sim a morte ocorrida no Ministério da Magia há mais de oito anos. Fato este, que tem ligação direta com a acusação apresentada contra o réu, visto que ambos os casos envolvem a Sra. Lestrange.

Harry não gostou de ouvi-lo; sabia que Lupin não diria somente isso. Sabia que o amigo o faria relembrar a morte do padrinho e tinha uma noção perfeita de quanto Lupin deveria estar sofrendo com isso.

– Prossiga – permitiu madame Bones.

– Você viu Sirius Black morrer, Harry?

– Eu o vi ser assassinado.

Uma nova onda de murmúrios foi ouvida no tribunal; mas, desta vez, a Ministra não precisou pronunciar-se, já que o barulho acabou tão rápido quanto começou, no momento em que Lupin terminou de fazer sua pergunta.

– E como foi?

Harry fechou os olhos e, como tantas vezes, viu flashes daquela noite cruzarem sua mente. Mantivera as lembranças afastadas tempo demais, e agora, ao retornarem, tomavam seus pensamentos por completo, impedindo que desviasse sua atenção. À distância, algo lhe dizia que Lupin estava tentando justificá-lo, mas isso não importava agora que ele estava ofuscado por acontecimentos que tentara esquecer por muito tempo.

– Tudo bem, Harry. Não lhe obrigarei a falar sobre isso.

Quando Lupin lhe deu as costas, o réu esperava que ele novamente mudasse a direção das perguntas, mas ao invés disso, a Primeira Testemunha ergueu a voz e continuou falando.

– Para aqueles que não sabem, Sirius Black morreu lutando contra as forças das Trevas. Contra Comensais da Morte como… – sua atenção voltou-se totalmente para Lúcio Malfoy – como Bellatrix Lestrange.

– Esta acusação é infundada, Meritíssima! – objetou Malfoy. – E, por favor, não estamos aqui para discutir sobre o que a Sra. Lestrange acreditava.

– A senhora Lestrange – Harry interrompeu antes que a Ministra pudesse decidir se aceitava ou não a objeção de Malfoy – foi condenada e presa em Azkaban. Ela tinha a Marca Negra no antebraço, assim como v-

– SEU QUERIDO PADRINHO TAMBÉM ESTEVE EM AZKABAN – Malfoy perdeu a paciência e interrompeu Harry antes que o réu pudesse terminar a acusação que estava prestes a fazer. – E ACABEI DE OUVIR SUA PRIMEIRA TESTEMUNHA AFIRMAR A INOCÊNCIA DELE!

– ELE ERA INOCENTE! – Harry gritou, sua mágica descontrolando-se e soltando as correntes que prendiam seus pulsos, permitindo que ele se levantasse.

– É o suficiente, Sr. Malfoy – bradou madame Bones. – Sr. Potter, sente-se imediatamente. O réu não tem permissão para se pronunciar a não ser que lhe seja dito o contrário.

– Sente-se, Harry – reforçou Lupin.

Harry não se importou em ouvir o conselho do amigo, sua consciência subitamente se distanciando da realidade. Seus olhos concentraram-se nas labaredas que estavam presas no alto das paredes, iluminando a sala. A luz do fogo espalhou-se para além do seu campo de visão e ele teve a impressão de que tudo ficava branco. Sentiu o corpo enfraquecer e não pôde evitar quando começou a cair. Entretanto, antes de atingir o chão, sentiu longos braços o envolverem em uma tentativa de conforto.

– Harry, acorde – a Dama Branca o chamou, mas ele se recusou a abrir os olhos.

– Harry… Harry!

Lupin começou a se preocupar. Harry fechara os olhos e caíra sem sentidos sobre a cadeira. Dumbledore olhou cada um dos rostos ali presentes e percebeu que muitos não demonstravam fazer idéia do que estava acontecendo. Minerva lhe lançou um olhar muito preocupado, temendo que Voldemort estivesse novamente tentando possuir Harry Potter. O diretor estava incerto se realmente estava acontecendo aquilo que mais temiam durante o julgamento.

O réu permanecia desacordado, não apresentando o menor sinal de que estivesse voltando a si. Lupin – tentando parecer calmo – ainda o chamava, na esperança de trazê-lo de volta.

Harry sentiu algo gelado tocar a parte de trás de seu pescoço e a escuridão novamente começou a surgir. A voz doce da Dama Branca foi gradualmente substituída por outra que lhe era extremamente familiar. Ao abrir os olhos, viu o rosto de Lupin no mesmo nível do seu; o amigo estava ajoelhado a sua frente e mantinha a mão em sua nuca, tentando fazê-lo recobrar a consciência.

– Harry? – Lupin perguntou novamente, receoso.

O réu permaneceu observando-o, sua respiração voltando ao normal. Lupin pôde ver, ao encarar os olhos verdes, que Harry retornara à realidade e o fitava de volta, como se analisasse a situação. As correntes não prenderam novamente seus pulsos quando voltou a se sentar. Lupin fitou a Ministra de uma maneira inquisitorial e madame Bones decidiu se pronunciar.

– Se o réu está em condições, a Primeira Testemunha pode prosseguir o questionamento.

– É fato conhecido que, durante seu quarto ano em Hogwarts, o seu nome foi escolhido pelo Cálice de Fogo, Harry – Lupin continuou, andando em torno da cadeira onde o réu estava sentado. – Durante um ano, você realizou com sucesso as três tarefas do Torneio Tribruxo, do qual foi proclamado vencedor. Então, Harry, eu lhe pergunto: depois da vitória, quem o cumprimentou?

Após terminar de falar, Lupin parou em frente à Harry, esperando a resposta. Harry pensou por alguns instantes. Entendia a intenção que Lupin tinha em justificá-lo, mas não entendia em que o fato de ele ter vencido o Torneio Tribruxo ajudaria. Sim, de fato algumas pessoas o cumprimentaram por este acontecimento; ele até recebera o prêmio final do Torneio, mil galeões. Ele insistira que os Diggory ficassem com o prêmio; sabia que não era o verdadeiro campeão, mas os pais de Cedrico recusaram. Fudge o entregara na noite em que rompera com Dumbledore e negara o retorno de Voldemort.

– Ninguém me cumprimentou e nem teria por que fazê-lo.

Lupin surpreendeu-se e perguntou imediatamente:

– Não, Harry? Mas você era o vencedor do Torneio.

– Cedrico Diggory venceu o Torneio.

– Harry, o que você teria feito naquela noite se soubesse que a taça era uma chave-de-portal?

– Eu não teria dito para ele pegá-la.

– Mas por que não, Harry? Você não alega que ele era o verdadeiro vencedor? Por que ele não mereceria a taça?

Harry não respondeu e, antes que madame Bones pudesse ordenar que ele o fizesse, Lupin continuou, observando as pessoas ao seu redor.

– Você acha que ele não merecia encontrar Voldemort? Talvez não achasse que ele tivesse poderes e conhecimento suficientes para lutar contra o Lord das Trevas – Lupin pressionou e os espectadores começaram a murmurar agitadamente, mas não alto o suficiente para que madame Bones fosse obrigada a pedir silêncio. – Foi por isso, não, Harry? Ele não tinha poderes suficientes, ele não era o Menino-Que-Sobreviveu e, se não fosse por você, dificilmente teria chegado ao final do Torneio. Ele não tinha nem ao menos coragem para pronunciar o nome de Voldemort, quanto mais para lutar contra ele. Ele não era um grifinório, não era o protegido de Dumbledore, não é, Harry?

Harry balançava a cabeça veementemente, não confiando em sua voz para responder a alguma das acusações. O nó que sentia em sua garganta dificilmente o permitiria emitir algum som compreensível. Seus olhos ardiam e sentia o sangue subindo ao seu rosto, mas não conseguia expressar reação alguma além do movimento que fazia com a cabeça.

No momento em que terminou, Lupin lhe lançou um olhar de desculpas antes de virar-se para Malfoy e ver o sorriso que este exibia. Lúcio não acreditava na capacidade de Lupin para reverter o dano causado por aquelas perguntas e sabia que poderia vencer se as usasse em seu argumento.

Quando Harry cessou a negação, todos o observavam com expectativa, mas ele manteve-se em silêncio. Madame Bones não tinha certeza se deveria ordenar ao réu que respondesse às acusações feitas pela própria defesa ou se advertia Lupin por tais acusações. Dumbledore percebeu a necessidade de intervenção e levantou-se, chamando a atenção de todos para si.

– Acredito que o réu ainda não está em condições de responder aos questionamentos, Meritíssima. Talvez fosse melhor se continuássemos depois de um curto recesso.

A Ministra analisou Harry atentamente antes de se decidir.

– O Sr. Dumbledore tem razão. Aproveitaremos e adiantaremos a pausa para o almoço. Voltaremos em uma hora. Sessão suspensa – declarou ela.





***

Harry sentou-se não muito tempo depois de entrar na sala. Estava sozinho a princípio, mas logo Dumbledore veio lhe fazer companhia. O diretor sentou-se à mesa, do lado oposto a Harry, e ficou a observá-lo.

– Você foi bem lá dentro – declarou Dumbledore.

– Eu estraguei tudo – resmungou Harry.

– De fato – disse Dumbledore distraídamente, observando por cima do ombro de Harry. – Mas o julgamento ainda não terminou.

– Quem se importa? – Harry deu os ombros.

– Muita gente se importa.

– Ah, claro que sim. Imagina só a manchete do Profeta Diário: "Harry Potter condenado por ajudar Voldemort".

– Você está errado – declarou Dumbledore.

– Estou?

– Está. As pessoas que lhe vêem assim nunca pronunciariam o nome de Voldemort.

Harry teria rido se a situação fosse menos desesperadora. Ao invés disso, ele lançou ao diretor um olhar contrariado; Dumbledore não percebeu. Harry suspirou cansado; já tivera que falar muito por um dia, mas sentia que toda a discussão acontecida na Corte não servira apenas para obrigar os juízes da Wizengamot a ponderar os acontecimentos. Demorou alguns minutos até que ele decidisse quebrar o silêncio e falasse o que passava por sua mente.

– Talvez eles estejam certos, sabe – Harry falava, observando apenas a mesa a sua frente, sem, no entanto, vê-la realmente –, em querer me prender. Talvez eu seja mesmo um risco.

– Por que diz isso, Harry?

– Eu a matei, não? Eu sou o perigo. Eu ataquei Lupin…

– Foi você?

Harry demorou muito tempo para responder e, em nenhum momento, levantou os olhos, que continuaram a mirar a mesa vazia.

– Eu deveria saber utilizar a oclumência – ele declarou, quase em um murmúrio.

– Você sabe.

Harry soltou o ar que prendia em seus pulmões, frustrado. Dumbledore permanecia fitando-o atentamente, desejando que seu ex-aluno olhasse em seus olhos e demonstrasse o que estava pensando.

– Você não pode lutar contra Voldemort usando as armas dele, Harry.

– Claro que não – respondeu ele, irônico. – Tudo que preciso fazer é, na próxima vez que encontrá-lo, abraçá-lo e explicar o quanto eu o amo.

– Não foi isso que eu quis dizer.

– Eu sei.

Um momento sem palavras seguiu-se à resposta. Harry não teria muito tempo para conversar com Dumbledore e estava ciente de que esta era a melhor oportunidade para que ele buscasse o que queria: não a absolvição pela Wizengamot, mas o perdão daqueles a quem atingira direta e indiretamente.

– Foi aquela noite no Departamento de Mistérios – Harry mexeu-se desconfortavelmente. – Eu não sei, talvez tenha sido a poção… Voldemort tem ficado mais forte desde então.

– Ele teve força suficiente para deixar seu corpo quando percebeu que havia risco.

Harry assentiu.

– As coisas não têm sido as mesmas desde então. Sinto como se o poder dele dependesse do fato de ele não ter corpo.

– Interessante – pensou Dumbledore em voz alta. – Voldemort ficando cada vez mais poderoso por não ter um corpo…

– Porque ele usa o meu poder.

– Ele não pode fazê-lo, Harry, esse poder—

– Está fortalecendo Voldemort! – Harry interrompeu, explicando rapidamente. – Eu tento, mas não posso impedir. É diferente dessa vez, ele é poderoso.

– Harry…

– Eu não consigo impedir! É melhor que eu fique isolado, Dumbledore.

– É melhor que você saia e enfrente seus problemas.

– E como você espera que eu faça isso se vão me condenar nesse maldito tribunal?

– Eu espero que você se absolva.

– Estou tentando, Dumbledore. Juro que estou tentando com todas as minhas forças! – Harry disse quase gritando, sentindo a voz arranhar sua garganta.

– Você vai precisar de ajuda, Harry.

Ele respirou fundo antes de responder à sugestão óbvia que Dumbledore lhe dera.

– Eu sei, já estão me ajudando.

– Como assim?

– Não estou mais sozinho – disse Harry, baixando os olhos e deixando um pequeno sorriso formar no canto de sua boca.

– Mas você nunca esteve sozinho…

– Só que agora é diferente, eu posso sentir; fecho meus olhos e eu a vejo. Ouço a voz dela tão claramente quanto ouço a sua.

– Tão claramente quanto ouve a de Voldemort?

– Eu não ouvia a voz de Voldemort, eu simplesmente seguia suas ordens, como se fosse minha vontade, mas não era. Se eu ouço a Dama é porque quero, se estou sentado aqui conversando com você, é porque…

– Sim? – insistiu Dumbledore, quando Harry fez uma longa pausa e não demonstrou intenção alguma de continuar.

– Porque Voldemort pode ter me obrigado àquelas coisas horríveis, mas ainda tenho poder suficiente para decidir se continuo ou não com isso. Ele me usou, Dumbledore, mas não me tornou um dos seus… ele nunca vai me tornar um dos seus.

– Você deveria dizer isso para Hermione.

– Ela não se importa – resmungou Harry.

– No começo da nossa conversa, você disse o mesmo sobre os outros…

– Hermione não é igual aos outros.

– Então você se importa menos com ela do que com eles?

– Quem foi que colocou Hermione nessa conversa? – perguntou Harry, impaciente.

– Eu coloquei. Achei que ela gostaria de ouvir o que você me contou – Dumbledore suspirou. – Vocês não deveriam ter brigado, Harry.

– Nós não teríamos brigado se ela me poupasse o trabalho de dizer essas coisas, se ela ao menos percebesse o que acontece diante dos próprios olhos.

– Você também não percebeu muitas coisas, Harry.

– E daí? Já é tarde demais!

– Se fosse tarde demais, ela não estaria aqui.

– QUEM SE IMPORTA SE ELA ESTÁ AQUI? – Harry levantou-se irritado. – EU NÃO QUERO SABER! POR MIM, ELA PODERIA TER FICADO ESCONDIDA SABE MERLIN ONDE! AH, É, EU ESQUECI! VOCÊ SABE ONDE, NÃO É, DUMBLEDORE? VOCÊ SEMPRE SABE DE TUDO!
v– Sim, eu sei.

– E então? – Harry abriu os braços, esperando uma explicação.

– Bem, você deve entender que eu precisava esperar você fugir da prisão e ficar bem irritado como está agora, para que então pudesse lhe contar o lugar onde eu protejo Hermione desde a noite em que você me atacou.

A respiração de Harry tornou-se difícil, como se o ar o machucasse ao entrar em seus pulmões. Sentia como se estes estivessem muito cheios e que não pudesse mais inspirar. Precisava extravasar, gritar com alguém, explodir alguma coisa, o que fosse. Seus arredores se aproximavam e logo não mais havia espaço suficiente. Não se importou com Dumbledore; até mesmo ele, nesse momento, deixara de ser aquela pessoa em quem tanto confiara.

De fato, Harry não o culpava. Imaginava que, depois de tanta coisa, até mesmo o mais paciente de seus amigos chegaria a seu limite. Só desejava que não tivesse sido naquele momento. Queria, mais do que nunca, estar longe de tudo e de todos; sabia, por motivos que ultrapassavam o limite das palavras, que era essa situação que colocava os outros em risco.

Era tão difícil controlá-la sozinho, lembrou-se ele. Na verdade, era impossível. Mas não se enganou em pensar que o bruxo a sua frente ajudaria em alguma coisa. Sabia que não tinha o direito de exigir mais nada de Dumbledore.

A porta permaneceu fechada, por mais que desejasse que ela se abrisse. Olhou para ela, do outro lado da sala. Estava distante; mesmo que conseguisse fazer mágica sem varinha e destrancá-la, não acreditava que teria forças para dar ao menos um passo em direção à saída. Sentindo como se o lugar o comprimisse, Harry baixou a cabeça, tentando aliviar a pressão que a tão comum força da gravidade exercia sobre ela. Acreditava que, assim, não precisaria respirar tanto e seus pulmões não doeriam por receberem ar além da capacidade.

Nem ao menos se preocupou com o que acontecia ao seu redor. Que lhe importava se, lá fora, a audiência poderia ter recomeçado, se ele mal poderia andar para chegar até lá? Era melhor se concentrar no que acontecia, na sensação de encarceramento que lhe dominava. Durante os seis meses em que estivera preso, nunca sentira algo parecido.

Sua respiração estava cada vez mais esporádica e seus olhos mantinham-se fechados com força. A cada segundo, aumentava a necessidade que sentia de ir diminuindo até que conseguisse desaparecer. Deitado no chão e encolhido, envolveu as pernas com os braços, a cabeça encostando os joelhos. Sentia-se inexplicavelmente seguro agora.

Sorvia pequenas quantidades de ar em oportunidades raras, ato que se assemelhava a um soluço. Lágrimas quentes escorriam por seu rosto e ele nem conseguia explicar apropriadamente o porquê. Sentia o piso frio sob si e o ar gelado lhe causando arrepios de frio, apesar do suor que molhava sua testa. Estava sozinho e cada um de seus cinco sentidos comprovava isso.

Secretamente, esperava que a Dama Branca aparecesse e o ajudasse; que ela fizesse o mundo ao seu redor ser normal novamente. Ansiava pelo conforto que ela lhe oferecia, mas suas expectativas foram todas vãs. Sua mente concentrava-se apenas no que seus olhos viam e isso não era nada mais do que a escuridão.

No momento em que alguém virou seu corpo e o fez deitar de costas no chão, todo o ar que seus pulmões tanto desejavam pôde finalmente entrar por suas narinas. Uma mão forte segurava sua testa, impedindo-o de tentar levantar-se. Ficou contente pelo gesto, mesmo que não houvesse motivo algum para isso. O silêncio da sala ajudou-o a se acalmar e a purificar a mente, fazendo com que a consciência da realidade em que estava voltasse rapidamente.

– Nós não podíamos arriscar, Harry – continuou Dumbledore tranqüilamente, ao ver que o jovem sobre o qual se curvara abrira os olhos.

– Arriscar o quê, Dumbledore? – ele perguntou repentinamente, sentando-se no chão. – A vida de Hermione?

– Não, Harry.

Ele pareceu não ter ouvido a resposta do diretor. Apoiando-se na mão que Dumbledore lhe estendera, Harry voltou à cadeira que sentara anteriormente.

– Eu não a machucaria. Por mais irritado que estivesse, eu não ousaria machucá-la.

– Foi o que eu disse à Minerva, algum tempo atrás.

– Então ela estava pensando assim? Que eu atacaria Hermione?

– Que Hermione não estava em condições de encontrá-lo – explicou Dumbledore.

– E o que ela está fazendo aqui hoje?

– Se expondo. Por você.

– Por mim? Dumbledore, qualquer um sabe que eu não posso ficar trancado aqui. Eu sou o Menino-Que-Sobreviveu, aquele que deve derrotar Você-Sabe-Quem. Como posso fazer isso se estiver preso? A essa altura, qualquer um faria qualquer coisa para me libertar.

– E, de sua noiva, Hermione passou a ser qualquer uma para você? Ou será que sempre foi assim que você a considerou?

Harry deu os ombros. Que importava quem Hermione era? Na noite em que o deixara, ficara bem claro que ela não se importava, então por que ele deveria fazê-lo? Era verdade que não a esquecera totalmente, mas depois de tanto tempo longe, não tinha certeza se queria estar com ela novamente.

– Já disse que não a machucaria. Não é o bastante para você?

– É para você? – perguntou Dumbledore.

– Pelo modo como você fala, vejo que, mesmo sendo trancado aqui, eu a machuquei, não é?

– E pelo modo como você fala, vejo que não está tão desinteressado quanto tenta dar a impressão – replicou Dumbledore.

Talvez ele estivesse mesmo certo, mas Harry realmente não queria discutir isso agora. Por que Dumbledore trazia Hermione à tona quando havia um assunto mais importante a ser discutido? Desde que Lupin o surpreendera com aquelas perguntas sobre o Torneio Tribruxo, Harry não pôde pensar em outra coisa. Onde sua Primeira Testemunha estava querendo chegar, acusando-o daquele jeito? Estaria Snape certo ao dizer que a fama subira à cabeça de Harry? Sabia que precisaria examinar esses pensamentos logo e que, ao retornar à Corte, as perguntas ainda estariam o esperando.

Como se tivesse lido os pensamentos de Harry, Dumbledore falou:

– Não estávamos esperando aquele comentário de Remo, Harry.

– Tenho certeza que não. Mas agora ele já usou o argumento e a Corte já o ouviu me acusando…

– Ele deve tê-lo feito por algum motivo, Harry. Se eu tivesse falado com ele durante esse recesso, poderia lhe explicar por que, mas agora só nos resta esperar o decorrer do julgamento para ver por onde a defesa se encaminhará.

– Talvez você esteja certo – admitiu Harry –, só que…

– Ouça, Harry – disse Dumbledore, colocando a mão no ombro do réu –, eu sei que deve ter sido difícil ouvir palavras como aquelas vindas de Remo, mas ele está somente procurando justificativas para as dúvidas que passam pela cabeça dos membros da Corte que proclamarão o veredicto.

– Eu deveria estar preparado… só quero ver que perguntas virão de Malfoy se Lupin me faz esse tipo de questionamento…

– Como eu disse, é tudo uma questão de espera – e lançando um olhar cúmplice para Harry por cima de seus óculos de meia-lua, acrescentou: –… e de ficar calmo.

Dumbledore tinha razão. Ele precisava ficar calmo. Pensando bem, isso não parecia tão difícil agora que declarara o que o inquietava.

– Faz tempo que não vejo Hermione… Eu não sei, Dumbledore. Talvez eu me importe com ela, talvez seja pelo que a Dama disse…

– A Dama?

– A Dama Branca – explicou Harry.

– Ela quem estava falando com você?

– Ela sempre esteve, Dumbledore, mas Voldemort não me deixava ouvir. Voldemort não me deixava viver. Não estou falando apenas de quando estivemos presos naquela sala no Departamento de Mistérios e do que veio depois disso…

– Está dizendo que nunca pôde viver? – perguntou Dumbledore, com uma parte de sua mente achando aquela declaração absurda e outra parte não deixando de se preocupar com aquele rapaz que conhecia desde pequeno, como se essa preocupação compensasse quaisquer falhas que tivesse cometido.

– Sim, mas é como disse a Dama Branca: a partir de agora eu posso ter uma vida. Eu devo ter uma vida. Não apenas por mim, mas…

– Então você já sabe – disse Dumbledore, não sabendo se empregara o tom devidamente interrogativo à frase. – Você ficou muito tempo isolado, Harry.

– E ela…?

– Tempo demais, eu diria. Já está na hora de retomarmos a ordem natural das coisas.

– Está na hora de mostrar quem eu sou… – disse Harry, relembrando o que Dumbledore pedira no começo da conversa para que ele fizesse.

– E quem é você? – perguntou o diretor, ingenuamente.

– Uma pessoa que deveria pensar em destruir Voldemort, não a vida das pessoas que ama.

Os olhos de Dumbledore brilharam com satisfação. Ele se levantou e conduziu Harry de volta ao tribunal de número dez. Quando entraram, Harry percebeu que havia ainda mais olhares encarando-o do que quando entrara ali pela primeira vez naquele dia. Sentia-se mais confiante e sabia exatamente por que; talvez pelo simples fatos de que seus braços não estavam mais presos e que ele poderia se levantar se quisesse. Mais uma vez, Minerva McGonagall o observou sentada nas arquibancadas e sorriu ternamente. Desta vez, Harry reconheceu o sorriso como um gesto de apoio e estímulo, talvez até de conforto.

Madame Bones reabriu a sessão e pediu para que Percy Weasley relesse a última pergunta feita por Lupin antes do recesso. Após o escriba assim ter feito, a Ministra disse:

– Ainda deseja que o réu responda, Sr. Lupin?

– Sim, Meritíssima.

– Sr. Potter, o senhor acredita que "Cedrico Diggory não merecia a taça do Torneio anteriormente mencionado; que não merecia encontrar o Lord das Trevas? Acredita ser um bruxo mais poderoso do que Diggory e mais capacitado para a vitória do Torneio?" – Madame Bones perguntou, consultando o pergaminho que continha a transcrição da primeira parte do julgamento.

– Não – respondeu Harry, com calma –, eu não acho que Cedrico não merecesse a taça.

Durante a pausa em sua declaração, ele passou a encarar sua Primeira Testemunha.

"Ele só não merecia ser transportado para aquele cemitério onde acabou perdendo a vida."

– Então ele merecia vencer? – perguntou Lupin.

– Tanto quanto Viktor, Fleur e eu. Todos tinham condições de cumprir as três tarefas do Torneio e demos o melhor de nós mesmos para isso – Harry respirou fundo e continuou –, mas não, ele não merecia ter encontrado Voldemort. Não porque não era capaz de enfrentá-lo, ou porque não tinha coragem suficiente para isso…

– Por que então?

– Existe uma profecia que afirma que somente um bruxo pode derrotar Voldemort. Eu não escolhi ser este bruxo, mas a vida não é realmente uma questão de escolha – disse ele, com a voz constante e centrada. – Isso quer dizer que qualquer outra pessoa que cruzar o caminho de Voldemort e atrapalhar seus planos estará, invariavelmente, condenada à morte. Cedrico não merecia isso.

Dumbledore respirou fundo, surpreso. Aí estava. Todos conheciam a profecia agora; Harry revelara a informação que ele lutara tanto para ocultar de Voldemort. Se bem que, a esta altura, não deveria fazer muita diferença. Depois de tantos anos e tantas tentativas falhas, todos já deveriam ter percebido que Harry era o único capaz de lutar contra Voldemort – e vencer.

Murmúrios e até discursos inflamados foram ouvidos entre os presentes. Lupin e Dumbledore fitavam um Harry sereno, que parecia aliviado por admitir, enfim, toda a verdade. Próximo dali, sentado, Draco Malfoy observava o rosto emblemático do pai, que ganhara muitas rugas nos últimos dois minutos.

A coisa mais certa para se fazer era protestar contra tal declaração dada pelo réu, Lúcio Malfoy sabia disso. No entanto, acabara de descobrir aquilo que seu mestre mais queria saber; a informação pela qual o Lord das Trevas já amaldiçoara dezenas de servos – e até matara alguns deles.

– Então – a voz de Lupin sobrepujou as outras e obrigou todos a prestarem atenção nela –, quer dizer que você possui o poder de derrotar Voldemort?

– Protesto, Meritíssima! – Lúcio Malfoy se levantou, zangado por tal suposição. – A Primeira Testemunha baseia-se apenas em especulações feitas pelo réu!

– Meritíssima, como Harry disse, uma profecia foi feita. Uma profecia reconhecida pelo Ministério da Magia e por ele registrada. Estou apresentando os fatos que podem justificar a ação do réu.

– Protesto negado – declarou Bones.

– Justificar a ação do réu? Se for assim, Sr. Lupin, posso simplesmente lançar uma maldição Imperius e obrigar uma vidente qualquer a forjar uma profecia que justifique um crime que planejo cometer.

– Quero lembrá-lo, Sr. Malfoy, que, além de seu protesto ter sido negado, a maldição Imperius é proibida e passível de punição para quem a utilizar – manifestou-se Kingsley.

– Esta não é a questão, Vossa Excelência – Lupin decidiu responder. – O que o Sr. Malfoy esta sugerindo é que Harry Potter, antes mesmo de ter nascido, planejou todo o complô envolvendo a Profecia e a "falsa morte de Lord Voldemort", ocorrida há vinte e dois anos, para justificar uma morte que ele premeditou antes mesmo de saber o próprio nome.

– Harry pode ter forjado a queda de Voldemort – Dumbledore comentou com McGonagall e, devido ao silêncio que dominava o ambiente, foi ouvido por todos –, mas de certa forma isso foi bom… quantas vidas não foram poupadas nos anos em que Voldemort não tinha poderes suficientes nem para segurar uma varinha?

– Você não tem provas, Dumbledore! – Lúcio Malfoy permanecia de pé e agora estava virado para o diretor de Hogwarts. – Só porque nenhum corpo foi encontrado, não quer dizer que ninguém tenha morrido!

– Pois é, os aurores nunca conseguiram um mandado de busca para a mansão em Wiltshire – comentou Draco casualmente, seus olhos cinzentos traíndo a aparente tranqüilidade que sua voz demonstrava.

Uma nova onda de murmúrios espalhou-se entre os presentes. O rosto de Lúcio Malfoy contorceu-se com a raiva, enquanto Emelina Vance, sentada ao lado da Ministra, advertia:

– Devo lembrá-lo, Sr. Draco Malfoy, que isto é um julgamento no qual existem regras. Limite-se a se pronunciar somente quando a Corte assim solicitar. Agora, tenho certeza que todos ainda estão esperando a resposta do acusado. Sr. Potter – ela trocou um olhar com seus dois companheiros de bancada –, o senhor possui ou não possui poder para derrotar o Lord das Trevas?

– A profecia assim o diz, Vossa Excelência.

Antes que a Ministra permitisse que Lupin continuasse o interrogatório, Emelina fez mais uma pergunta:

– Acredita nesse poder, Sr. Potter?

– Acredito. Abri mão de muitas coisas na vida por causa disso – informou Harry.

– Abriu mão de muitas coisas, Potter? – ironizou Malfoy. – Vai nos dizer agora que permitiu a morte de seu querido padrinho porque conhecia o poder descrito na profecia?

– Já lhe advertimos antes, Sr. Malfoy, e o faremos pela última vez. Antes de se pronunciar, o senhor deve esperar que a Corte lhe conceda a palavra. Se este fato se repetir, não teremos outra alternativa senão tirar-lhe o direito de interrogar o réu – disse a Ministra. – Sr. Lupin, tens a palavra.

– Quero lembrá-los de que esse garoto está sendo acusado de compactuar com Voldemort, de participar de seus planos e de tirar a vida de uma de suas Comensais a seu pedido. Isso é verdade, Harry?

– Não – respondeu ele.

– Então você nega a acusação?

– Nego – ratificou Harry.

– Protesto! – interferiu Malfoy, mais uma vez. – O cruel assassinato de Bellatrix Lestrange foi assistido por, no mínimo, sete pessoas. É impossível que todas elas tenham sido acometidas por uma alucinação coletiva-

– Sente-se, senhor Malfoy! – ordenou a Ministra. – Quanto ao réu, gostaria de lembrá-lo, Sr. Potter, do contrato mágico estabelecido no momento em que o julgamento foi iniciado. O réu deve responder honestamente às interrogativas propostas nesta Corte ou manter silêncio. Está ciente disso, Sr. Potter?

– Sim, Meritíssima.

– Há alguma observação que queria fazer em relação às suas últimas afirmações?

– A Primeira Testemunha pode repetir a pergunta? – pediu Harry.

– Sr. Lupin, repita, por favor – ordenou madame Bones.

– Harry, você tirou a vida de uma Comensal de Voldemort a pedido do Lord das Trevas?

– Não – respondeu ele, decepcionando aqueles que esperavam uma nova resposta.

– E você nega que tenha matado Bellatrix Lestrange?

– Não.

Uma sonora expressão de surpresa foi emitida por alguns dos presentes. Harry praticamente confessara o crime e declarara o próprio veredicto.

– Entendo – Lupin disse, sem ter sido surpreendido; sabia que Harry admitiria a culpa, até mesmo com certo orgulho. – Você conhecia Bellatrix Lestrange, Harry?

– Já nos encontramos algumas vezes.

– E ela alguma vez lhe deu motivos que o fizessem odiá-la a ponto de premeditar a sua morte?

– Não premeditei a morte dela – defendeu-se Harry.

– O que fez com que você desejasse matá-la pela primeira vez?

– A primeira coisa que ela fez para que eu a odiasse foi ter torturado os Longbottom até a insanidade. Conheci Neville Longbottom, o filho de Frank e Alice Longbottom; ele foi meu colega em Hogwarts. Às vezes, acho que muitas pessoas não são capazes de imaginar o que é crescer sabendo que seus pais estão mortos. Tenho razão quando digo isso, até porque nem mesmo eu posso supor o que Neville deve passar cada vez que vai até o St. Mungus visitar os pais. Os próprios pais dele o olham como olhariam para o vazio… estão loucos, caso alguém aqui não saiba – e não me surpreenderia se fosse assim –; enlouqueceram devido à severa exposição à Maldição Cruciatus; maldição esta lançada várias vezes por Bellatrix Lestrange no casal. Foi a primeira vez que a odiei, quando vi o julgamento dela em uma penseira e soube que ela fora condenada por praticar atos dessa natureza – Harry declarou com os olhos fixos em Lupin durante todo o tempo.

"Durante um julgamento, nunca faça uma pergunta que já não conheça exatamente a resposta." Lupin conhecia essa regra muito bem e a aplicara em cada questionamento dirigido a Harry. Desta vez, porém, o réu não lhe respondera como esperava. Harry deveria ter mencionado a morte de Sirius e o que acontecera naquela noite no Departamento de Mistérios. No entanto, o garoto decidira falar a completa verdade e expor um sentimento antigo que mantinha guardado dentro de si: o inconformismo perante a maldade.

– Foi por causa dos Longbottom então?

– Depois que ela fugiu de Azkaban, tudo recomeçou – continuou Harry. – Mais pessoas foram torturadas, mais pessoas foram mortas. Bruxos inocentes sofreram porque o Ministério não teve capacidade suficiente para manter os dementadores sob controle.

– Protesto! Meritíssima, – Malfoy começou – devo lembrar que o réu não está aqui para fazer acusações contra o Ministério.

– O réu está apenas declarando um fato conhecido pela comunidade, protesto negado, Sr. Malfoy.

– Foi então que decidiu fazer justiça com as próprias mãos?

– Não. Bellatrix infiltrou-se entre os aurores do Ministério para levar informações sigilosas para seu mestre. Isso custou não só o fracasso de algumas ações importantes, como também a vida da auror Ninphadora Tonks que, caso não saibam, era sobrinha de Bellatrix.

– E depois? – perguntou Lupin.

– Eu descobri, com a ajuda de Severo Snape, que Bellatrix assumira a forma de Tonks usando a Poção Polissuco. Quando a desmascaramos, ela admitiu todos os crimes – Harry fez uma pausa para respirar. – Se saísse da casa naquele dia, Bellatrix levaria consigo informações que deixariam Voldemort com grande vantagem em relação aos seus adversários. Como já foi citado anteriormente, o Ministério não conseguiu manter o controle sobre os dementadores. Se, mesmo com os dementadores guardando Azkaban, ela conseguiu escapar, imagino quanto tempo demoraria até que algum simpatizante de sua causa a libertasse. Ainda assim, Bellatrix teve sucesso e guardou consigo um segredo. Não conseguimos descobrir o que ela fez com Tonks, embora suspeitemos que a tenha matado.

– Então não fez justiça com as próprias mãos, mas decidiu que era a coisa certa a se fazer? Interferir em uma investigação do Ministério?

Harry estava calmo e repetiu isso para si mesmo antes que desse uma resposta que se arrependesse depois.

– Não havia uma investigação do Ministério na época.

– Mas os aurores…

– Não passavam de meros fantoches nas mãos de Fudge! O Ministro os usava só para dar à população uma falsa impressão de segurança, mesmo que para isso prendesse pessoas inocentes.

– Como Sirius Black? – perguntou Lupin imediatamente.

– Como Sirius Black – confirmou Harry.

– Sem mais perguntas, Meritíssima – declarou Lupin, voltando a sentar-se ao lado de Harry.

– Sr. Malfoy? – chamou madame Bones, oferecendo-lhe a oportunidade de interrogar Harry.

Lúcio levantou-se e começou a andar de maneira tensa em frente aos lugares onde Harry e Lupin estavam sentados. A Primeira Testemunha de Defesa lançou a Harry um olhar seguro, mas Harry não pôde evitar temer o que estava por vir.

– Sr. Potter, o senhor realmente odiava Bellatrix Lestrange, não? – começou Malfoy.

– Objeção! – Lupin falou em voz alta, ainda sentado em seu lugar. – A Primeira Testemunha está tentando conduzir o depoimento do réu.

– Eu reformularei minha pergunta, Meritíssima – ofereceu Lúcio prontamente, sorrindo com desprezo para Lupin. – Que sentimentos nutria por Bellatrix Lestrange, Sr. Potter?

– Eu mantinha uma, hum, profunda aversão por ela.

– E, mesmo sem conhecê-la apropriadamente, desejava sua morte?

– Não acho que ninguém deva ser assassinado. – Harry tentou mudar o rumo das perguntas.

– E, no entanto, o senhor mesmo cometeu um assassinato! Ou por acaso vai negar agora que matou Bellatrix Lestrange?

– Posso tê-la matado, mas não a assassinei.

– E como isso seria possível? Pode me esclarecer, Sr. Potter? O senhor tirou a vida de outro ser humano, um ser humano pelo qual sentia profunda aversão, e o fez por causa desse sentimento. Isso é assassinato!

– Eu não planejei matá-la.

– Nunca?

Harry respirou fundo. Sabia que Lúcio Malfoy estava só esperando que ele se contradissesse; esperando que ele se irritasse e confessasse que planejara a vingança contra a pessoa que assassinara o padrinho. Precisava manter a calma se quisesse ser absolvido. Sem contar que não haveria vantagem alguma em perder o controle.

– Meritíssima, se o réu recusar-se a responder, vou solicitar que seja declarado como "testemunha hostil".

– O réu deve responder à pergunta – ordenou madame Bones.

– Não planejava matá-la se, por acaso, ela assumisse a identidade de uma auror e aparecesse na minha frente – respondeu Harry, notando que Malfoy tentava fazê-lo admitir a premeditação do crime.

– Entendo. Bem, como o meu caro colega fez questão de mencionar – Malfoy continuou, gesticulando discretamente em direção a Lupin –, há uma profecia que liga Harry Potter ao Lord das Trevas. Quando soube dessa profecia pela primeira vez, Sr. Potter?

– Quando eu estava prestes a terminar o quinto ano em Hogwarts.

– Acredito que alguém tenha lhe contado sobre ela. O Lord das Trevas, talvez?

– Não foi ele quem me contou sobre o conteúdo da Profecia – negou Harry, não querendo admitir que descobrira sobre a existência da Profecia ao invadir o Ministério da Magia.

– Algum professor lhe contou então? Algum Inominável?

– Eu vi em uma Penseira.

– Uma Penseira… quão conveniente, Sr. Potter. Aparentemente, a maior parte de suas opiniões e julgamentos vêm de uma Penseira – zombou Malfoy. – Podemos saber a quem pertence essa penseira? A Merlin, provavelmente…

– Alvo Dumbledore.

– Então o senhor confia completamente em Dumbledore?

– Confio.

– Então, por que o senhor o atacou na noite em que foi preso? Certamente não foi porque discordava dele?

– Meritíssima – levantou-se Lupin –, o Sr. Malfoy não pode fazer tal acusação sem fundamentos para sustentá-la!

– Se desejar, Sr. Lupin, posso trazer a medi-bruxa Darnisha Stowe e a curandeira Yanesh Shamee, que podem testemunhar os motivos da presença de Alvo Dumbledore no Hospital St. Mungus para Doenças e Acidentes Mágicos na noite de três de maio.

Lupin ficou pálido; Harry poderia colocar tudo a perder se, por acaso, contradisse o que já dissera e admitisse que não confiava totalmente em Dumbledore. Pôde perceber que Malfoy estava usando como vantagem as questões que ele mesmo fizera. Temeu ainda mais quando uma lembrança veio a sua mente. Ele mencionara a noite em que Sirius morrera e sabia muito bem que Malfoy poderia usar o ocorrido daquela noite para demonstrar os antecedentes de Harry.

A essa altura, os Comensais da Morte já deveriam saber que Harry lançara uma Maldição Imperdoável em Bellatrix Lestrange naquela noite. Porém, não era isso que realmente preocupava Lupin. Dumbledore uma vez lhe contara sobre a atitude que Harry tivera ao voltar para Hogwarts naquela madrugada. O próprio Dumbledore admitira que, depois daquilo, Harry provavelmente não confiaria mais nele e que, por isso, o diretor decidira revelar a Profecia. Seu ex-aluno destruíra o escritório do diretor, enfurecido e dominado pela mesma raiva que o possuíra ao atacar Dumbledore em Grimmauld Place.

Então, Lupin lembrou-se que, ao contrário do que acontecera com o último ataque, a possibilidade de Malfoy saber da reação de Harry era nula. Somente o garoto e Dumbledore estiveram presentes naquela noite e, decididamente, o diretor não teria contado a Lupin se não fosse extremamente necessário, embora confiasse totalmente no ex-professor.

– Sr. Lupin? – perguntou madame Bones, interrompendo seus pensamentos.

– Sim?

– Concorda que o Sr. Malfoy continue com a pergunta?

– Vá em frente – disse Lupin, distraído, tentando evitar que Malfoy trouxesse as testemunhas e complicasse ainda mais a situação.

– Por que atacou Alvo Dumbledore na noite em que foi preso, Sr. Potter?

– Eu não sei o que isso tem a ver com o julgamento, Sr. Malfoy – replicou Harry.

– Não sabe? O senhor afirmou que seu discernimento está baseado no que Alvo Dumbledore lhe contou; que seu conhecimento sobre a Profecia está baseado em que Alvo Dumbledore ouviu. Então, se confia tanto em Alvo Dumbledore, é apropriado perguntar por que o senhor o atacou na noite de três de maio!

– Só porque confio nele, isso não quer dizer que não posso contestar as coisas. Eu confio, mas só porque tenho razões para fazê-lo; Dumbledore me deu justificativas suficientes para que eu o fizesse.

– Mas não tem como o senhor saber se ele está certo, ou se é verdade o que Dumbledore lhe diz.

– É uma questão de fé, Sr. Malfoy, apesar de que, na maioria das vezes, sim, o julgamento de Dumbledore se provou verdadeiro.

– E na minoria, Sr. Potter? Duvido que, mesmo ele sendo Alvo Dumbledore, acerte cem por cento das vezes.

– Não, ele não acerta cem por cento das vezes e eu ainda não entendo por que isso é importante.

Não está respondendo a minha pergunta, Sr. Potter!

– Uma vez Dumbledore errou… eu descobri isso depois, mas uma vez ele errou e eu fiquei com muita raiva. Foi besteira minha, porque afinal de contas, ninguém é perfeito…

– O senhor normalmente ataca as pessoas quando elas não correspondem à expectativa? Quando elas erram?

– Meritíssima! – protestou Lupin, irritado. – O Sr. Malfoy está novamente conduzindo a testemunha!

– Perdoe-me, Sr. Lupin. Tentarei não fazê-lo novamente – Malfoy respondeu com o mesmo ar de desprezo de antes. – O que o senhor faz quando as pessoas não correspondem às suas expectativas, Sr. Potter?

– É algo frustrante descobrir que alguém não é como você idealizou.

– Certamente – concordou Lúcio, embora dificilmente o fizesse se estivessem mencionando Voldemort. – Essa frustração já o levou ao limite, Sr. Potter?

– Por causa disso, já fiz muitas coisas de que me arrependo.

– Como atacar Alvo Dumbledore? Ou quem sabe, Bellatrix Lestrange?

– O que o senhor insinua ao afirmar que ataquei Bellatrix por estar frustrado? – Harry perguntou, incerto se queria ouvir a resposta.

– A partir do momento em que a vítima cometeu um erro; a partir do momento em que ela entregou ao seu maior inimigo seus planos para assumir a posição dele, suponho que o senhor possa ter considerado isso como um erro da parte dela…

– Não fiz nenhum plano para me tornar o novo Lord das Trevas.

– E nega que tenha desejado isso em algum momento de sua vida?

– Nunca quis assumir o lugar de Voldemort. Ele é falso e desprezível, finge lutar para exterminar os que não são sangue-puro quando ele próprio é mestiço! Ele mata pessoas inocentes e as condena pela família em que nasceram, ninguém tem o direito de fazer isso!

Harry decidiu ir além, embora soubesse que seria arriscado atacar sangue-puros, já que havia muitos deles entre os membros da Wizengamot.

"Os Comensais da Morte dizem que alguém nascido trouxa não pode entender completamente o que é magia. Um sangue-puro," Harry observou Draco Malfoy atentamente "uma vez me disse que não conseguia imaginar alguém que nunca ouvira falar sobre Hogwarts e, de repente, ser admitido na escola. Se fosse assim, eu não deveria estar aqui, eu não deveria praticar magia, porque até o momento em que recebi a carta da escola, eu não sabia absolutamente nada sobre este mundo. Não sabia nem por que meus pais tinham morrido."

– Você morava com seus parentes trouxas, não? Eles que esconderam essa informação de você.

– Morava.

– Mais um erro de Dumbledore, suponho.

– Não foi um erro! – Harry quase gritou

– Não? – Lúcio pareceu surpreso. – Então você gostava de viver com a sua família…

– Não – negou Harry –, mas não foi um erro. Foi o necessário a ser feito.

– E por que seria isso?

– Dumbledore sabia, desde o princípio, que, apesar de Voldemort ter caído, os Comensais da Morte – Harry enfatizou, lançando a Malfoy um olhar fulminante, pronto para acusá-lo – continuavam torturando e matando. Seria uma questão de tempo até que eles viessem atrás daquele que fez seu mestre perder os poderes.

– Você… – concluiu a Primeira Testemunha de Acusação. – Mas, com certeza, uma família bruxa poderia protegê-lo adequadamente, não? Temos aqui o Sr. Lupin, que alega se importar com o senhor e acredita que o senhor mereça uma família. Não seria melhor se ele o tivesse adotado?

– Meritíssima, não acredito que seja apropriado discutirmos as proteções usadas na residência de Harry Potter. Devo lembrá-la de que o réu ainda está em risco?

Madame Bones pareceu indecisa e confabulou com Kingsley e Emelina.

– Sr. Potter, com quem morava antes de ser preso pelo Ministério? – Emelina pronunciou-se.

– Com a minha noiva – Harry respondeu. Isso era, de certa forma, verdade. Não queria contar o tempo que passara preso no Departamento de Mistérios e muito menos o fato de que passara alguns dias na sede da Ordem da Fênix. Não voltava aos Dursley há tanto tempo e não considerava aquela casa como sua; preferiu nem mencioná-la.

– Então acredito que, se revelarmos quaisquer proteções utilizadas para mantê-lo seguro na casa de seus parentes, não terá importância, já que o senhor não voltará para lá.

– Mas… – Harry mordeu os próprios lábios para impedi-los de anunciar o fato de que não estava mais com Hermione.

Ele olhou diretamente para Dumbledore, quase implorando por uma intervenção. Não queria, de forma alguma, revelar que provavelmente retornaria à Rua dos Alfeneiros se fosse inocentado. Era uma coisa que, de certa forma, ele não cogitara, mas que, ao pensar melhor, sabia ser a única alternativa. Bem, Grimmauld Place era uma opção, mas talvez não fosse uma boa escolha depois que todos os vínculos entre Sirius e ele estavam sendo revelados durante a audiência. Provavelmente, seria o primeiro lugar em que Voldemort o procuraria e, embora confiasse no poder de Dumbledore que mantinha os feitiços de proteção sobre o lugar, tinha certeza de que eles não eram tão eficazes quanto a proteção deixada pelo sangue de sua mãe.

Dumbledore falou alguma coisa com McGonagall e fitou Harry com uma expressão conformada. Não havia nada que ele pudesse fazer naquele momento, só esperar que Lupin possuísse argumentos suficientes para protestar e impedir que Harry continuasse sendo pressionado de tal maneira.

– O Sr. Malfoy pode continuar com o questionamento – decidiu Emelina

– Não acredita que uma família trouxa bruxa possa protegê-lo melhor do que aqueles trouxas, Sr. Potter?

– O senhor está implicando que os trouxas são inferiores a nós, Sr. Malfoy? – Harry, pela primeira vez, respondeu da forma como queria desde o início do interrogatório.

– Estou meramente discorrendo sobre o fato de que eles poderiam lhe fornecer uma educação mais apropriada, Sr. Potter. Ou nega que preferia, desde o início, saber o que aconteceu com seus pais?

– Prefiro ter vivido a minha infância sem saber a história dos meus pais do que nem a ter vivido.

– Mencionou que vivia com sua noiva, Sr. Potter. Pode dizer-nos o nome dela?

– Hermione Granger – Harry respondeu, sem saber qual a necessidade disso, já que era de conhecimento público que eles estavam juntos.

– A Srta. Granger morava em Hogsmeade?

Harry virou-se para Lupin e por pouco não perguntou a ele, aos sussurros, porque Malfoy usara o pretérito ao mencionar a moradia de Hermione.

– Que eu saiba, a Srta. Granger foi convocada como testemunha do julgamento e o Sr. Malfoy poderá muito bem perguntar isso a ela, Meritíssima – Lupin pronunciou-se.

– Eu sei muito bem disso, Sr. Lupin. Só queria demonstrar que claramente o relacionamento entre a Srta. Granger e o Sr. Potter aqui presente não é tão íntimo quanto se dá a entender – explicou Lúcio.

– Novamente não entendo o que esta pergunta tem a ver com o caso, Sr. Malfoy.

– Permitirei que o Sr. Malfoy prossiga contanto que demonstre seu argumento.

– Obrigado, Meritíssima – agradeceu Malfoy. – Eu gostaria de repetir a pergunta.

Madame Bones assentiu.

– A Srta. Granger morava em Hogsmeade, Sr. Potter?

– Morava.

– E não mora mais? – insistiu Malfoy.

A essa altura, Minerva McGonagall e Alvo Dumbledore já observavam Harry preocupados.

– Não sei.

– Mas ela é sua noiva, não?

– Não.

– Então o senhor mentiu ao afirmar que morava com a sua noiva antes de ser preso?

– Não, não menti.

– Poderia explicar-se, Sr. Potter?

– Até o dia em que morei com ela, éramos noivos. Rompemos no dia em que fui preso.

– Então a Srta. Granger também não quis ficar ao seu lado quando descobriu que o senhor estava estudando Artes das Trevas ?

– PROTESTO! – Lupin levantou-se, o rosto lívido e a voz impondo-se sobre o silêncio do tribunal. – O Sr. Malfoy não tem provas para fazer tal alegação!

– Contenha-se, Sr. Malfoy – aconselhou a Ministra, enquanto Lupin sentava-se.

– Então o réu nega que estava estudando Artes das Trevas?

– Não, claro que não. Como eu poderia lecionar Defesa Contra Artes das Trevas sem conhecer o assunto? Como eu poderia reconhecer os feitiços lançados contra mim por Voldemort se nunca tivesse lido sobre eles?

– Interessante, Sr. Potter. E, além de estudar, o senhor alguma vez já praticou algo relacionado com Artes das Trevas?

Harry parou, surpreso. Malfoy não lhe deixara nenhuma alternativa. Não podia mentir e negar que nunca usara esse tipo de magia; se ele o fizesse, Malfoy poderia citar a Maldição Cruciatus que ele lançara em Bellatrix e até em Dumbledore, ou poderia citar como a ofidioglossia era um dom das trevas. Se ele confirmasse, provavelmente muitos acreditariam nos boatos de que ele estava do lado de Voldemort.

– Sim.

– E o senhor já usou esse tipo de magia contra outra pessoa que não fosse o Lord das Trevas?

– Já – Harry confirmou, desconfortável. Os olhos de Dumbledore não deixavam de fitá-lo, mas em nenhum momento Harry viu reprovação naquele olhar.

– E quem foram suas vítimas?

Lupin desejou que pudesse protestar, mas sabia que não havia nada que sustentasse sua objeção. Harry teria que confessar os ataques feitos contra Bellatrix, Dumbledore e ele mesmo.

– Bellatrix Lestrange – respondeu Harry.

– Diga, Sr. Potter, já viu as Maldições Imperdoáveis serem lançadas?

– Claro que já. – Harry respondeu, impaciente.

– Quantas vezes?

– Não sei quantas vezes. Muitas.

– O senhor e o Lord das Trevas possuem uma ligação interessante feita através da sua cicatriz, não? – continuou Malfoy, aproximando-se bastante da cadeira de Harry e apontando diretamente para a testa do réu.

– Não a chamaria de interessante.

– Mas não nega que haja a ligação?

– Não – murmurou Harry.

– Através dessa ligação, Sr. Potter, o senhor clama ser testemunha de vários acontecimentos envolvendo o Lord das Trevas. O senhor estava presente em boa parte dos crimes cometidos por ele, não estava?

– Eu vi muito dos horrores cometidos por Voldemort, sim.

– O viu usar as Imperdoáveis?

– Sim.

– Então foi com ele que aprendeu a lançá-las?

– PROTESTO, Meretíssima! – Lupin interviu. – Até quando a Primeira Testemunha especulará sobre uma mentira como essa?

– Estou especulando sobre o caráter do réu e sobre sua vida pregressa, perguntas permitidas pelo artigo 211 do Código de Julgamento da Wizengamot, Sr. Lupin.

– Protesto negado. Continue, Sr. Malfoy.

– Disse, Sr. Potter, que Bellatrix Lestrange foi atingida por magia negra usada pela sua pessoa. Somente ela foi vítima sua?

– Até onde posso me lembrar, sim.

– Então, o senhor nega que tenha usado Magia Negra contra o diretor de Hogwarts, Alvo Dumbledore, e contra sua Primeira Testemunha, Remo Lupin?

– Eu não usei magia negra contra eles.

– Ah, sim, claro, Sr. Potter – continuou Malfoy, irônico. – Então eles simplesmente foram atingidos por uma força inexplicável que surgiu do nada?

– Se é assim que você define Voldemort…

– Está dizendo que o Lord das Trevas descobriu o esconderijo secreto da Ordem da Fênix e invadiu simplesmente para atacar Alvo Dumbledore? Ou que entrou em uma prisão de segurança máxima simplesmente para atacar um mestiço?

– Meritíssima, gostaria que o Sr. Malfoy explicasse o que seria a Ordem da Fênix – falou Lupin.

– Vamos lá, Lupin! – respondeu Lúcio, impaciente. – Não finja que desconhece o grupo organizado por Dumbledore para lutar contra o Lord das Trevas e interferir no Ministério quando você mesmo faz parte dela!

– Protesto! O Sr. Malfoy está me acusando de conspirar contra o Ministério.

– Não acho que a Ordem da Fênix seja o foco desse julgamento – declarou Kingsley. – Portanto, Sr. Malfoy, mantenha-se no seu argumento e não desvie o assunto. Protesto negado.

– Sr. Potter, vou repetir. O senhor afirma que o Lord das Trevas perseguiu Dumbledore para atacá-lo? Ou que invadiu a prisão em que o senhor estava somente para atacar o Sr. Lupin?

– Não necessariamente.

– Como não? Então pode finalmente nos esclarecer o quê atacou as pessoas citadas anteriormente?

– Eu já disse, foi Voldemort.

– Como exatamente?

– Nem sempre Voldemort precisou estar presente para fazer mal às pessoas, Sr. Malfoy.

– Obviamente – concordou Lúcio, com um sorriso presunçoso. – Vejo que você conhece muito bem as técnicas usadas pelo Lord das Trevas, não, Potter? Será que este, hum, estudo não foi feito com outros objetivos? Quem sabe os efeitos que este conhecimento pode ter trazido a sua pessoa?

– Eu deveria responder, Meritíssima? – perguntou Harry, apático.

– Não, Sr. Potter, não precisa responder – disse Lúcio. – Só estou comentando que é intrigante o fato de o réu e o Lord das Trevas possuírem tantas semelhanças. Ambos estudam Artes das Trevas; não me admiraria que o senhor as usasse com os mesmos propósitos que o Lord. Responda, Potter: já machucou alguém intencionalmente usando a Maldição Cruciatus?

– Sim.

– O senhor admite isso… então, qual o problema em parar de mentir perante esta Corte e admitir que lançou a Cruciatus em Alvo Dumbledore na noite de três de maio?

– JÁ DISSE QUE NÃO FUI EU! – Harry respondeu, irritado com as acusações de Malfoy.

– Hmm…

– FOI VOLDEMORT!

– Você estava com Dumbledore quando aconteceu?

– Estava.

– É de se questionar que tenha permitido que uma pessoa tão admirada pelo senhor fosse injuriada na sua presença, Sr. Potter, sem que o senhor tenha feito qualquer coisa para impedir.

– Eu não pude – murmurou Harry

– Desculpe, pode falar mais alto?

– EU NÃO PUDE FAZER NADA!

– Não pôde ou não quis?

– JÁ DISSE QUE NÃO PUDE!

– E o que estaria te impedindo de agir… Harry?

Harry levantou-se impetuosamente, cansado de tantas acusações. Não responderia mais. Não queria admitir, perante toda a Wizengamot, que fora fraco diante de Voldemort; que deixara o Lord das Trevas dominá-lo naquele dia, como tentava fazer agora.

– Protesto! – Lupin pronunciou-se, levantando-se também e dando um passo para se aproximar de Harry discretamente.

– Baseado em quê, Sr. Lupin? – inquiriu madame Bones

– Acho que as intenções do Sr. Malfoy estão sendo bastante claras, Meritíssima. Acredito que esta Corte não tem o direito de exigir que o Sr. Potter explique suas tentativas contra Voldemort.

– Acredito que posso muito bem determinar o que esta Corte tem ou não tem direito, Sr. Lupin – madame Bones respondeu asperamente – Protesto negado. O réu deve sentar-se e responder à pergunta.

– O que você quer, Malfoy? – perguntou Harry selvagemente, ainda em pé, a alguns metros de distância da Primeira Testemunha de Acusação. – Que eu admita que meus conhecimentos de Oclumência não foram suficientes para rivalizarem com os de seu mestre? Então eu admito. Feliz agora? Eu admito que, apesar das aulas que tive, as lições de Oclumência não foram suficientes no dia em que Voldemort me enganou e me fez acreditar que meu padrinho estava sendo torturado no Departamento de Mistérios. E todo o esforço depois disso que fiz para fechar minha mente contra a influência dele ainda não foi suficiente para que eu o impedisse de machucar Dumbledore.

– Então você se deixou dominar pela mente do Lord das Trevas ao atacar Dumbledore, Potter? – Lúcio sorriu – Não foi isso que aconteceu quando atacou sua Primeira Testemunha? Não foi isso que aconteceu quando matou Bellatrix Lestrange?

– Meritíssima… – Lupin virou-se para a Ministra, mas antes que pudesse falar mais alguma coisa, alguém o interrompeu.

– NÃO-FOI-CULPA-MINHA! – Harry gritou, extremamente irritado. – EU MATEI O CORPO DE VOLDEMORT, MAS NÃO É MINHA CULPA SE ELE CONTINUA SUFICIENTEMENTE PODEROSO PARA DOMINAR A MENTE DAS OUTRAS PESSOAS!

– Para dominar a sua mente, Potter? – Malfoy andava muito próximo ao lugar onde Harry e Lupin estavam parados, deixando o réu ainda mais nervoso.

– MERDA, MALFOY! – Harry gritou, sentindo a cabeça doer muito, principalmente por causa da cicatriz em sua testa.

– Sr. Potter! – a voz de Emelina tentou se fazer ouvir.

– POR QUE VOCÊ SE IMPORTA, MALFOY? – Harry a ignorou totalmente. – DEVERIA ESTAR FELIZ, NÃO? SEU GRANDE MESTRE CONTINUA ESTRAGANDO A VIDA DOS OUTROS!

– Isso é porque você não teve a capacidade de derrotá-lo! – Malfoy sorriu com satisfação, decidido a entrar no jogo do réu. – Porque toda essa história de Profecia é uma farsa! Tudo o que Dumbledore quer é que os outros o vejam como único salvador do Mundo Bruxo, Potter; para que assim você seja inocentado pelo assassinato que cometeu!

– ISSO NÃO TERIA ACONTECIDO SE VOCÊ NÃO TIVESSE INVADIDO O DEPARTAMENTO DE MISTÉRIOS EM VINTE DE ABRIL PARA LIBERTAR VOLDEMORT! EU CONSEGUI MANTÊ-LO PRESO POR UM ANO! SE NÃO FOSSEM OS COMENSAIS DA MORTE QUE ENTRARAM NAQUELA SALA, ELE NÃO ESTARIA NOVAMENTE FAZENDO TANTAS VÍTIMAS!

Malfoy virou-se para Lupin. Seu semblante estava sério; o sorriso desaparecera no momento em que Harry recomeçara a falar. Com uma voz que expressava uma falsa tranqüilidade, ele falou:

– Ainda podemos fazer um acordo se ele quiser declarar "insanidade", Lupin. – Então, depois de analisar atentamente o efeito dessas palavras na Primeira Testemunha de Defesa, ele dirigiu-se à Ministra: – Sem mais perguntas, Meritíssima.

Lupin fitou Harry, preocupado; seria difícil convencê-lo a sentar-se em silêncio para assistir aos outros interrogatórios. Podia ver, pela expressão de Harry, que o réu não dissera tudo que desejava e Lupin temia que pudesse fazê-lo em algum outro momento mais inapropriado; se é que houvesse algum momento apropriado.

– Meritíssima, gostaria de solicitar um recesso para conversar com o réu – ele solicitou, esperando que, com isso, Harry conseguisse se acalmar.

– Muito bem, Sr. Lupin – madame Bones concordou, nem um pouco disposta a entrar em uma discussão com Harry. – Esta sessão está suspensa por trinta minutos.

Dois guardas conduziram Harry à força para fora da masmorra. Lupin, antes de segui-lo, subiu os grandes degraus e se aproximou de Dumbledore.

– Quer vir comigo, Alvo? – convidou ele, a voz alta o suficiente apenas para que Dumbledore e McGonagall o ouvissem.

– Vá na frente, Remo.

– Malfoy está certo, Alvo. Dificilmente teremos chance se não alegarmos insanidade – Lupin continuou, nervoso. – Você viu o que Harry fez!

– Eu sei disso, Remo, mas não sou eu quem precisa ser convencido – Dumbledore olhou significantemente para Lupin ao dizer isso.

– Você vai falar com ela? – perguntou Lupin, mais calmo.

– Vá na frente, Remo – insistiu Dumbledore

Lupin saiu imediatamente, sob os olhares curiosos dos membros da Wizengamot. Passou pelo escuro corredor do décimo andar, trocou um olhar com os aurores que guardavam a porta e entrou na sala onde Harry estava.

Era o mesmo lugar para o qual fora conduzido durante o recesso anterior. Harry estava andando ao redor da mesa de madeira e virou-se imediatamente para a porta quando esta foi aberta.

– Vai fazer um acordo, Lupin?

– Vai se declarar culpado, Harry?

– O QUE VOCÊ QUER QUE EU DIGA? EU MATEI BELLATRIX E VOCÊ SABE MUITO BEM QUE EU FARIA DE NOVO!

– Se tivesse de novo os mesmos motivos, Harry. Você não percebe que é isso que estou tentando provar?

– ACONTECE QUE NÃO ESTÁ DANDO CERTO! – berrou Harry, socando a mesa.

– E o que sugere então, Harry Potter? – perguntou Lupin, irritado.

– Eu não sei, droga! Você que deveria saber isso, mas claramente não é assim!

– Eu sei o que precisamos fazer, mas qual a diferença se você não aceita?

– NÃO, NÃO – Harry negou veementemente. – NÃO VOU ADMITIR QUE SOU LOUCO!

– Não é isso, Harry.

– Então o que é?

– É a única forma de inocentá-lo.

– Eu prefiro ficar preso a admitir que fiquei louco. VOCÊ SABE QUE NÃO É VERDADE!

– Prove – disse Lupin, simplesmente.

– O quê?

– Prove que não está louco, Harry.

– EU NÃO ACREDITO QUE ESTOU OUVINDO ISSO DE VOCÊ! EU PENSEI QUE PELO MENOS VOCÊ ACREDITASSE!

– Você me atacou, Harry – Lupin disse calmamente. – Até que me prove o contrário, continuarei acreditando que você perdeu a sanidade.

– MAS VOCÊ SABE QUE FOI VOLDEMORT!

– E você está disposto a admitir isso lá dentro? Quer mesmo dizer para eles que Voldemort pode dominá-lo quando quiser e que, quando isso acontece, você é tão – ou até mais – poderoso do que ele?

– Não foi o que eu acabei de fazer?

– E você acha que alguém vai considerar alguma declaração onde você acusou a Primeira Testemunha?

Harry sorriu por alguns segundos, antes de acrescentar:

– Tem razão, Lupin. Por que o Ministério ouviria alguma acusação contra os Comensais da Morte quando ele tem Harry Potter preso por insanidade?

– Está admitindo insanidade, então?

Harry olhou para Lupin, incrédulo. Novamente queria sumir dali, usar magia sem varinha e desaparatar para bem longe daquela gente. Qual era a diferença ficar ali esperando a luta final contra Voldemort, se nenhuma daquelas pessoas merecia que ele cometesse mais um assassinato? Chegara a tal ponto em que não podia mais confiar em ninguém; até seus antigos amigos o abandonaram. Dumbledore nem ousara aparecer depois das prováveis mentiras que dissera na última vez que se encontraram.

– Faça o que está pensando, Harry – continuou Lupin. – Fuja daqui e não vai nem precisar do veredicto… faça isso e admita que é culpado…

– Ah, sim, e agora você também é legilimente? Ou só está usando seus sentidos de lobisomem para ler minha mente?

– Desde quando você se tornou frio desse jeito?

– QUAL A DIFERENÇA? VOCÊ É QUE NEM ELES, VOCÊ NÃO SE IMPORTA!

– Só estou vendo você se afundar na própria loucura, Harry.

– Estou mesmo – respondeu Harry, sarcástico. – Não viu como as dores na cicatriz afetaram meu cérebro?

– É o que estou dizendo desde que entrei aqui – falou Lupin tranqüilamente, ignorando o sarcasmo de Harry.

– Então você não precisa de uma declaração minha para argumentar, Lupin. SÓ PRECISA PEGAR UM DOS ARTIGOS QUE VOCÊ LEU DA RITA SKEETER!

– Agora você está entrando em contradição, Harry – continuou Lupin. – Acabei de te ouvir dizer que as dores na cicatriz tinham afetado seu cérebro…

– Quem está se contradizendo é você, Lupin, que só está me atacando quando deveria ser minha testemunha de defesa!

– O que eu posso fazer se você é culpado? Se matou Bellatrix, atacou Dumbledore e tentou lançar-me uma Imperdoável?

– Se acredita mesmo que sou culpado, então não deveria estar aqui.

– Então com licença! – pediu Lupin, muito sério, pronto para se retirar.

– Eu receio que você tenha que ficar, Remo – disse Dumbledore, que assistia parado à porta.

– Ah, que ótimo, tudo que eu queria: mais alguém pra me acusar! – exclamou Harry.

– É, vejo que não conseguiu convencê-lo, Remo – disse Dumbledore, nem um pouco surpreso com a reação de Harry.

– Onde está ela? – Lupin perguntou quando Dumbledore fechou a porta.

O diretor apenas balançou a cabeça.

– O que quer dizer com isso, Alvo? – Lupin perguntou muito nervoso, sob o olhar atento de Harry.

– Nós não a encontramos.

– De quem vocês estão falando? – intrometeu-se Harry.

– Tonks – Lupin respondeu imediatamente.

– Eu posso ver quando está mentindo, Lupin.

– Perdoe-me por esquecer esse superpoder da sua cicatriz.

Dumbledore interrompeu aquilo que seria um novo ataque de fúria segurando o antebraço esquerdo de Harry.

– Hermione desapareceu.

– Desapareceu de onde? – perguntou Harry, sem conseguir absorver direito a informação.

– Ela estava na sala das testemunhas – Lupin supôs e Dumbledore lhe confirmou com o olhar.

– Ninguém simplesmente desaparece do Ministério.

– Aparentemente alguém do Ministério está envolvido. Os aurores foram informados. Sofremos uma "colisão"; quer dizer que ninguém pode entrar ou sair do Ministério até segunda ordem – explicou Dumbledore. – Feitiços especiais impedem que as pessoas aparatem.

– Como se eu fosse a algum lugar mesmo…

– Você ouviu o que Dumbledore acabou de dizer, Harry?

– Que Hermione desapareceu? Vocês estão dizendo isso só para me fazerem mudar de assunto!

Dumbledore o observou atentamente, pensando em como explicaria para Harry a seriedade da situação. Foi quando o garoto levou a mão à cicatriz e percebeu o que Dumbledore queria explicar.

– Alvo! – Minerva McGonagall entrou na sala de repente. – Encontraram Peasegood morto perto do Átrio.

Harry apoiou-se na mesa com uma das mãos, enquanto a outra apertava com força a cicatriz. Ele tirou os óculos e deixou-os cair no chão. Lupin e Dumbledore entreolharam-se, preocupados, enquanto ele começava a murmurar, nervoso.

– Harry… – aproximou-se Minerva, pousando a mão em seu ombro.

– Ele… eu sei…

– Harry, sente-se – recomendou Dumbledore.

– Ele está com ela, Dumbledore… ele está com ela…

– Acalme-se, Harry.

– E eles… – Harry resvalou até a cadeira, apertando a testa com ainda mais força –… eles ainda estão aqui…

– Quem são eles, Harry?

– Comensais? – Lupin perguntou.

– VOLDEMORT! – Harry berrou.

– Ele está aqui? – apavorou-se Minerva.

Harry baixou a cabeça sobre a mesa e cobriu-a com as mãos, puxando os cabelos – molhados pelo suor – com força.

– Ele veio pessoalmente – com a voz abafada pela mesa, ele continuou, mais para si mesmo do que para os outros. – Ele está com a Mione… droga, porque ele está fazendo isso? Ele não mata mulheres assim, o que está tentando fazer?

– Você não está dizendo que ele… – Dumbledore engoliu a seco –… que ele não seqüestrou Hermione?

O bruxo apenas puxou os cabelos com mais força, respirando rápido, fazendo as costas erguerem-se e abaixarem-se como se ele estivesse fazendo algum outro movimento além da própria respiração.

– Harry? – McGonagall o chamou com a voz engasgada.

– EU NÃO SEI!

– Deixe-o, Minerva – disse Dumbledore.

Ainda sentado, Harry levantou a cabeça, respirou fundo e fechou os olhos. Deixou que suas mãos relaxassem sobre as próprias pernas, encostou-se na cadeira e sorveu uma grande quantidade de ar pela boca.

Em poucos segundos, sua cicatriz ficou mais visível do que jamais estivera. Seu coração acelerou e sua respiração voltou a se intensificar; os olhos, ainda fechados, se apertaram; as mãos agarraram o tecido das vestes; seu corpo todo suava.

Ande, vamos! Não tenho o dia inteiro para me divertir com os aurores! – todos ouviram a voz de Harry Potter pronunciar essas palavras, embora soubessem que não era ele quem as dizia.

– Harry? – McGonagall insistiu, colocando as mãos na testa de Harry e tentando obrigá-lo a olhar para ela.

Ande logo, sua sangue-ruim imprestável! Harry Potter não vai aparecer para salvar vocês!

– A pele dele está pegando fogo, Alvo! Temos que fazer alguma coisa.

Ande, Evans! E cuide dos aurores, eu tenho outras coisas com que me preocupar. É claro que ele virá atrás de nós, o que você acha que eu quero, Evans? Ele é um fraco desprezível. Wizengamot não o segurará enquanto eu tiver o que ele mais quer.

– Pare, Harry! Isso é muito perigoso. – Lupin olhou para Dumbledore, quase desesperado.

Divertindo-se, Harry Potter? Feliz em ver o que estou fazendo com a sangue-ruim? Achou que eu não fosse perceber sua tentativa de invadir minha mente?

– Harry, pare agora! – ordenou Dumbledore.

Harry despencou da cadeira e caiu com força no chão, o corpo tremendo como se entrasse em colapso.

– Para onde você a está levando? – ele perguntou, como se o fizesse para si mesmo.

Curioso, Harry Potter? Não é capaz de descobrir sozinho?

Harry pôde sentir a fraqueza que ameaçava dominá-lo; Voldemort, por algum motivo, estava descendo as escadas em direção ao décimo andar. Precisava impedi-lo, nem que fosse com sua mente; temia muito o quê aconteceria se Hermione ficasse entre Dumbledore e Voldemort durante um duelo e ali não havia a Fonte dos Irmãos Mágicos para protegê-la, sem contar que ele próprio poderia ser transformado em uma arma.

Podia ver as escadas, Voldemort empurrava alguém a sua frente. Hermione não passava de um borrão disforme, mas ele não precisava de nitidez para saber que ela estava apavorada. Enquanto descia, degrau por degrau, Voldemort penetrava cada vez mais na mente de Harry.

Em apuros no julgamento, Harry Potter? Se não pode enfrentar uma Corte de Bruxos, como ousa dizer que é o único capaz de me derrubar? – Voldemort perguntou rapidamente.

– Eu sou o único capaz de matá-lo, Voldemort, e você sabe disso, ou não me perseguiria tanto; não tentaria atingir as pessoas que eu amo!

Uma risada fria alcançou seus ouvidos, tão cortante quanto a dor que sentia na testa. Sua mente estava longe demais para perceber que a risada vinha de si; e cansada demais para cessá-la.

E, no entanto, você está trancado em uma sala enquanto estou aqui fora, com tudo que você tem de valioso, Harry Potter, ou será que não se importa se elas morrerem?

– Eu posso sair, posso acabar com você!

Você faria isso?

Dumbledore, Lupin e McGonagall observavam confusamente o bruxo que, caído no chão, despejava perguntas inteiras para depois respondê-las. Lupin perguntou-se, por um momento, qual seria o veredicto se a Wizengamot visse o que estava acontecendo naquele momento.

O diretor podia perceber, mesmo de longe, que Harry deveria estar chegando ao limite; tentara entrar na mente de Voldemort, mas agora era por ela dominado. O primeiro impulso de Dumbledore foi chamá-lo de volta, mas conteve-se; Harry nem o ouviria no estado em que estava. Percebeu então que, se não poderia trazer Harry de volta à consciência, deveria ao menos garantir uma redução de danos quando isso acontecesse.

Passou por trás de Minerva e, quando estava próximo à porta, trancou-a com um feitiço. Prometera aos aurores que o faria assim que entrasse na sala, para impedir o sucesso de qualquer tentativa de fuga empreendida por Harry, mas não acreditava que ele ousasse tal coisa; não em sua sã consciência.

– Eu não vou permitir que você mate minha família de novo! Não dessa vez.

É mesmo, Harry Potter?

– Vou destruir você antes disso!

Uma pena… deveria ter se apressado então…

Harry apertou ainda mais os olhos, viu Voldemort mirar o próprio braço que erguia a varinha e…

– NÃÃÃÃÃÃÃÃO!!! – Tudo ao seu redor ficou escuro, mas sabia que não estava diante do nada.

Mãos firmes ergueram seu tórax enquanto outras, mais gentis, afastaram de sua testa o cabelo molhado pelo suor. Podia sentir a preocupação existente nos murmúrios a sua volta, embora as palavras não fizessem nexo. Foi só quando conseguiu abrir os olhos que percebeu ter voltado à sala com Dumbledore, Lupin e McGonagall. Estava sentado próximo à mesa, suas mãos ainda tremiam. Ele ajeitou os óculos mal colocados no rosto e encarou cada um dos rostos a sua frente antes de dizer:

– Ele desaparatou.





***

P.S.: COOOOOOOOOMMMMMMEEEEENNNNNTTTTTEEEEEEMMMM!!! Não, não quero que puxem meu saco, só que digam que estão lendo, mesmo que achem uma merda esse capítulo (apesar de eu ter amado de paixão, mas é só porque estou aprendendo a amar Direito)

O que mais posso dizer? Ah, sim... batalha final, batalha final no próximo capítulo, que, já estou vendo, vai ficar gigantescamente enorme como esse aqui.

P.S. 2: Sim, a Tonks morreu, foi besteira minha não ter corrigido antes de publicar aqui como fiz nos outros -.- hoje de noite posto o último capítulo, se alguém estiver lendo isso aqui ainda... só não postei agora porque estou sendo expulsa do computador...

P.S. 3: Minha beta Billie insistiu que eu colocasse a tradução do trecho de inspiração do capítulo...

"O que eu tenho que fazer é tudo que me interessa, não o que as pessoas pensam. Essa regra, igualmente dura em vida real e intelectual, pode ser toda a diferença entre grandeza e maldade. É a mais dificil, porque você sempre achará aqueles que pensam que eles sabem qual é o seu dever melhor que você mesmo o sabe. É fácil viver, no mundo, com a opinião do mundo; é fácil viver, na solidão, com a nossa própria opinião; mas a grande pessoa é aquela que, no meio da multidão, mantém com perfeita doçura a independência da solidão."

– Ralph Waldo Emerson

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