Lar Doce Lar



CAPÍTULO XXIV. LAR DOCE LAR

Como um animal...

Era assim que ela estava, sabe-se lá há quanto tempo, jogada como um animal naquela cela fétida. Amélia sentava-se recostada à parede de pedra nua abraçando as suas pernas. Os seus olhos, que não se preocupavam em focalizar nada, apresentavam um avermelhado justificado pelas olheiras profundas de quem não dormira há algumas noites... De quem sequer tentara dormir.

Era basicamente assim que ela estava desde que chegara naquele lugar... Ela não chorou sequer uma vez... Não falou sequer uma vez... Mal se mexeu... Apenas fez o máximo para...

Ela estava fazendo o máximo para se concentrar apenas naquela sensação ruim... Naquele frio que insistia em congelar as suas entranhas... Nos gritos que povoavam a sua mente... Na dor que parecia deixar o seu coração cada vez menor... E na angústia de não poder fazer nada para... vingar-se.

Mas a vingança viria... Amélia sabia que daria o seu jeito de se vingar... De matar lenta e dolorosamente aqueles que tinham lhe feito mal... Ver a luz apagar-se daqueles três rostos: Elizabeth, Schwartz e Pettigrew.

Matar... Ela estava enlouquecendo, ou aquela doce mãe que ela vinha interpretando pelos últimos onze anos morrera junto com o seu filho? Talvez estivesse simplesmente perdendo a razão...

Passar um mês inteiro cercada apenas por insanas lamúrias daquilo que chamavam de pessoas era, no mínimo, angustiante...

Era tão enlouquecedor que ela sentiu-se bem ao ver o velho que ocupava a cela à sua frente morrer na madrugada anterior.

- ACORDEM, VAGABUNDOS! OU FICAM SEM COMIDA!

Amélia finalmente pareceu despertar do seu transe, erguendo o seu rosto para ver rapidamente os guardas robustos que vinham trazer aquilo que devia ser comida. Mais uma vez, ela não se importou: ultimamente só comia o suficiente para sobreviver. Voltou o seu olhar para algo muito mais interessante: o cadáver do velho.

Um dos guardas chegou à cela dela. Riu da expressão vazia no rosto magro de Amélia.

- O que está olhando, esquisitinha?

Com o queixo, Amélia sinalizou para a cela da frente.

O guarda guinchou de medo e surpresa.

- Ele está...?

Rapidamente, fez as grades sumirem com a sua varinha e entrou na cela, aproximando-se do velhinho e voltando-se para Amélia com uma expressão perplexa.

- Desde quando?

Ela, sem emoção, falou pela primeira vez desde que chegara.

- Ontem.

- Por que você não nos chamou?

- Não estava me incomodando.

Ele fez o sinal da cruz, enquanto os outros começavam a retirar o cadáver.

- Não me admira que você tenha matado o seu marido!

- Matei e mataria de novo!

Rispidamente, ele deixou a cela – o rosto quase furioso – e jogou o prato de comida na cela de Amélia.

Mais tarde naquele dia, uma mulher veio substituir a cela em que o velho morrera.

Ela era baixinha, morena e um tanto gordinha. O seu rosto era comum, deixando aquela mulher sem nenhum atrativo especial. Fora o sorriso que ela tinha no rosto quando foi jogada na cela em que há pouco guardava como prisioneiro um cadáver.

- Oi!

Amélia limitou-se a cumprimentá-la com um mero aceno com a cabeça.

- O que tu fez pra ganhar hospedagem nesse luxurioso hotel?

- Matei meu marido. E acho que eles desconfiam que eu usei algumas maldições imperdoáveis meio obscenas.

A mulher deu um sorriso.

- E nada de julgamento, né? É o que eu digo: a justiça só tem para os ricos, né?

- Acho que nem mais para os ricos, ultimamente.

Silêncio.

A mulher passou as mãos nos cabelos espessos e oleosos e perguntou:

- Não vai perguntar por que eu tô aqui?

Amélia apenas sinalizou com a cabeça que não, da sua forma fria e inexpressiva que tinha conseguido recuperar desde que entrara naquela cadeia.

- Eu vô dizer mesmo assim! O resto do povo aqui é tudo doido, você parece ser a única com o juízo quase perfeito! Eu fui roubar. Só isso! Só que o Ministério foi mais rápido que eu, sabe? Os Comensais tinham matado um monte de gente, ai quando eu entrei pra tirar meu sustento, me prenderam!

Amélia rolou os olhos.

- Você é bem esquisita, sabia? A propósito, eu sou Gabrielle.

- Amélia Lair.

- Amélia... Me diga, Amélia, você bebe? – Amélia assentiu. – Fuma? – Depois de considerar um tempo, assentiu. – Conhece a inspetora Petrawn?

- Não.

- Então, amiga, sorte sua que nos conhecemos.

De fato, foi uma sorte para Amélia conhecer a falante Gabrielle. Aos poucos ela foi conhecendo o passado da mulher: uma ex-menina de rua, que passara a vida aplicando golpes. Com a guerra, a situação dela melhorou bastantes, pois tinha mais lugares para saquear.

Com uma vida de golpes, além de ter cadeira cativa na prisão de Azkaban – sempre passando um mês ou outro por roubo –, ela passou a conhecer certas pessoas não muito honestas. Uma delas foi Alexandra Petrawn, uma mulher de meia-idade que era uma das figuras mais ambiciosas que ali trabalhavam.

Ela era inspetora há muito tempo e sempre dava certos privilégios para detentos que tivessem um pouco de dinheiro – ou lábia, como era o caso de Gabrielle.

Foi a inspetora Petrawn quem conseguira semanalmente caixas de cigarros que fizeram Amélia retomar o seu antigo vício. Foi ela quem conseguiu garrafas de absinto, que cada vez duravam menos. Foi ela que, como um favor, emprestou a varinha para que o louro do cabelo de Amélia desse lugar a um castanho escuro, fechado, fazendo sumir o último vestígio de mãe de família comportada.

Foi Petrawn que fez Amélia voltar a ser a Assassina, fria, calculista e completamente inescrupulosa, exatamente como no passado.

E assim, controlando a inspetora Petrawn através de Gabrielle, passaram-se mais três longos meses. E então oficiais de justiça apareceram naquela ala de Azkaban, invadindo a cela da ex-menina de rua.

- Gabrielle Anderson, você será transferida para uma nova cela.

Amélia se eriçou para observar melhor a cena.

- O que? Eu gosto daqui!

- Ordens do Ministro, não discuta!

E, agarrada pelos braços, Gabrielle foi arrastada pelos corredores... Não sem antes olhar para Amélia e dizer o quanto foi bom ter uma companhia mais ou menos equilibrada em Azkaban.

Pouco tempo depois, Rufo Scrimgeour apareceu no mesmo corredor, olhando para Amélia.

- Senhora Lair.

Amélia não tentou sorrir.

- Scrimgeour.

O seu ex-auror, agora Ministro da Magia, suspirou.

- Eu entendo que você esperasse um tratamento melhor.

- Eu lhe ensinei duas coisas: Nunca se deve favorecer os amigos e quanto mais você parece estar vencendo, mais vantagens você tem. Pedir-lhe por um tratamento melhor seria como desmentir tudo o que disse no passado – ela respondeu sem emoção.

- Mas acredite, eu estou fazendo o meu máximo para que você tenha um tratamento melhor. Esse lugar pode ser muito pior que isso.

Amélia rolou os olhos.

- Geralmente presos têm direito a ver seus familiares e a um julgamento. Eu não tive nenhum dos dois.

- Regime especial de guerra. Afinal, é fato que você matou um homem.

- Estado de necessidade.

- Que seja, será apurado depois. Vim lhe dar a notícia de que o seu filho está bem. Ele foi para os E0stados Unidos, está morando com a irmã do falecido. E vim ver se a cela está livre.

- Por que tirar a pobre Gabrielle daqui?

Rufo deu uma piscadela.

- Um presente meu para você.

E se retirou.

Pouco tempo depois, entrando acorrentado pelo corredor frio de pedra estava Severo Snape.

XxXxXxX

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