Pequenos Descuidos
CAPÍTULO VIII. PEQUENOS DESCUIDOS
Como uma pergunta tão simples podia causar tanta confusão na cabeça de uma pessoa?
Ao ouvir Snape perguntar se ela achava que ele era culpado, Amélia ficou sem palavras. A verdade é que ela mesma estava em dúvida. Como não pensar que a culpa recaía nele, quando todas as evidências diziam o contrário? Porém, como tirar do coração a certeza de que toda a história da morte de Dumbledore tinha sido muito mal contada?
- Severo...
Ele bufou e a perfurou com o seu olhar.
- Como você, logo você, pode ter pensado que mataria Alvo? Você sabe que eu devo muito a ele!
- Severo, já faz doze anos! Como você quer que eu ainda confie em você?
- Da mesma aneira que eu confio em você!
Ela prendeu a respiração por um momento, sentindo o coração, de repente, bater irregular.
Abriu e fechou a boca várias vezes, mas, mais uma vez naquela noite, ela estava sem palavras.
Respirou fundo.
- Como eu posso saber? Nós somos pessoas de guerra. Como eu posso saber que você está do lado de Dumbledore?
- Eu imaginei que a minha palavra bastaria para você. – Amélia abaixou a cabeça, sentindo um misto de culpa e tristeza. – Mas, felizmente, eu não esperava isso do resto do mundo, de forma que tenho como provar. Dumbledore sabia que eu seria incriminado, então deixou as provas para serem mostradas ao Ministério e a Ordem. São pensamentos, meus e dele, guardados em Hogwarts. – Amélia abriu a boca para perguntar onde, mas Snape, antecipando a pergunta, disse. – Não adianta procurar, você jamais acharia.
- E como você vai pegá-los?
Snape abriu o seu conhecido sorrido de deboche.
- Eu teria que entrar em Hogwarts para pegá-la! E adivinha quem vai me colocar lá dentro?
Amélia suspirou pesadamente.
- Severo, você matou Dumbledore?
- Sim.
- Então eu acho que essa conversa se encerra aqui! Eu não posso lhe deixar entrar em Hogwarts!
Ele balançou a cabeça, dando um sinal palpável de que a sua paciência já estava chegando ao limite.
- McGonagall pode! Fale com ela! Inocente até que se prove o contrário, certo?
- Mas o contrário foi provado, afinal, você matou...
- Eu sei, droga! – Ele suspirou, tentando controlar a voz que tinha saído bastante alterada. – Você acha que eu me esqueço disso por um segundo sequer? Você acha que o velho ia se enganar com alguém por tanto tempo? Acredite, minha querida, eu não sou tão convincente!
Amélia rolou os olhos e sorriu sarcasticamente.
- Mas é o suficiente para enganar você-sabe-quem?
- Ele não é tão sábio quanto pensa! Ele me vê como uma grande oportunidade, e aproveita! Ótimo! Eu sou o seu melhor servo! Mas você já devia saber disso!
- Eu devia saber? De novo, faz doze anos que agente nem se fala! Como eu posso ainda te conhecer?
- E por que você está aqui?
- Por tudo! Porque eu amei você, eu tenho carinho por você! Por causa dos nossos filh--
Ela se censurou, silenciando-se com uma expressão furiosa. Mas não tão furiosa quanto a que tomou o rosto de Snape.
- Eu quero que eles saibam que eu existo.
- Eu não vou apresentar meus filhos para um Comensal da Morte.
- Eu já disse---
- Se você tem uma marca negra no seu braço, você é um Comensal! Eu criei, eu eduquei! Eles têm o nome do meu marido! Não tem nada a ver com você!
Snape deu um sorriso infamemente sarcástico.
- Fora cinqüenta por cento do material genético, não?
Amélia bufou e recostou-se à cadeira.
- Nós não estamos parecendo um casalzinho feliz.
Ele assentiu.
- Não precisamos nos agarrar na frente de todos... a menos que você queira, claro.
Ela cruzou os braços, mal-humorada.
- Já posso ir embora?
O semblante dele, de repente, já não era mais tão aborrecido.
- Você se arrependeu de ter vindo?
- Não. Foi bom escutar que você pode não ser culpado...
- ...embora você não acredite.
- Duvide muito, na verdade.
Ele tomou um grande gole de vinho.
- Você vai fazer o que eu pedi? Vai falar com Minerva e me permitir entrar no castelo?
- Severo, eu vou tentar. Mas eu vou me assegurar que todos os membros da Ordem da Fênix estejam prontos para prender você, caso esteja mentindo.
- E quando eu provar que estou falando a verdade, você vai me ajudar a passar as informações que eu tenho para a Ordem?
Embora a sua cabeça gritasse para que ela recusasse esse pequeno pedido de Snape que significaria a sua entrada efetiva na guerra, ela não conseguiu controlar os lábios que se partiam e sonoramente disseram:
- Sim.
Ele a olhou, com um brilho que talvez apenas ela conhecesse. E disse.
- Você pode desaparatar do bar. Eu manterei contato. Espero que venha sempre que lhe chamar.
Segurou a mão dela e deu um longo beijo.
Amélia sentiu-se arrepiar, fechando os olhos e saboreando... quase se imaginando num passado longínquo.
E desaparatou.
XxXxXxX
O caminho de Hogsmeade para Hogwarts não era fácil... principalmente em tempos perigosos como aqueles.
O medo de ser atacada ou assaltada era constante, e, ainda que Amélia tenha conseguido percorrê-lo com certa tranqüilidade, simplesmente não conseguiu suprimir o suspiro aliviado assim que chegou ao salão principal de Hogwarts.
Olhou a hora. Duas da manhã.
‘Edward!’
Ela esquecera completamente que tinha que dar o remédio para o filho!
Com passos largos, ela se encaminhou rapidamente até a torre da Grifinória.
Assim que o quadro da mulher gorda abriu a passagem para o salão comunal, a surpresa: dezenas de alunos do primeiro ano e alguns mais velhos faziam um pequeno tumulto.
Boa parte se virou para olhar que entrava na torre tão tardiamente. E muitos deles fizeram uma inconfundível expressão de alívio quando viram que se tratava de Amélia.
Uma menina de cabelos acobreados de terceiro ano correu ao encontro da professora.
- Professora McRough! O Ed! Ele está se debatendo! Agente não sabe o que fazer!
‘Oh, Merlin!’
Amélia não precisou pedir para que os alunos saíssem no caminho e nem pedir ajuda para achar o dormitório do garoto.
Lá, inúmeros alunos situavam-se em torno do menino.
- Abram a porra do espaço!
E finalmente, Amélia pôde ter uma visão total do seu filho.
Deitado na cama de solteiro, Edward se debatia em violentas convulsões. O rosto demonstrava o desespero dos gritos contidos e os olhos liberavam lágrimas quase espontaneamente.
Amélia sentiu os próprios olhos lacrimejarem.
- Rápido! No malão dele! Uma poção amarelada!
Vários alunos começaram a revirar as malas do menino atrás da tal poção.
Amélia escalou na cama no garoto, prendendo rosto dele entre seus joelhos, para que não se machucasse mais.
- Calma, Ed... Mamãe chegou.
Ela tentou não se lembrar que a última vez que vira uma convulsão daquela tinha sido com a sua mãe, e Emiliana Lair quase morrera na ocasião.
Uma lágrima caiu.
- ACHEI!
Um menino loiro corpulento chegou com a poção.
Amélia colocou muito mais do que ele necessitava em sua boca.
Ele tossiu... mas engoliu um bocado.
Aos poucos, a convulsão parou.
Os gemidos de dor começaram.
Amélia se levantou, pegando-o nos braços.
- Obrigado pela ajuda. Eu vou levá-lo à enfermaria.
XxXxXxX
- Ele vai ficar bem, não vai?
Madame Pomfrey respirou fundo.
- Vai, Amélia. Mas você não pode se descuidar nunca mais!
Ela se sentiu angustiada – a maldita enfermeira estava pondo a culpa nela.
- Ele sempre toma a poção sozinho! Eu apenas vou conferir! Hoje estive ocupada...
- Não se ocupe mais. Ele podia ter morrido.
Amélia respirou fundo, colocando a sua máscara fria.
- Ele vai ficar bom?
- Vai
- Então boa noite.
Deixou a enfermaria, certa que voltar lá seria a primeira coisa que faria quando a manhã despontasse.
XxXxXxX
Ela só queria um bom descanso quando chegou ao seu quarto...
Mas Elizabeth estava lá.
‘Merda!’
A loira exibia um sorriso incontestavelmente cansado.
- Mia, eu estava preocupada! Onde você esteve?
Amélia suspirou, cansada.
- Cuidando do meu filho.
- Ele está doente?
- Sim. Quase morreu.
- E antes? Saiu? Eu não acredito que você arranjou um namorado e não me contou... mas você não era casada?
‘Merlin! Paciência!’
- Elizabeth, eu estou cansada. Meu filho quase morreu há pouco tempo... eu realmente não quero conversar sobre namorados inexistentes. Por favor, eu só quero dormir.
Sem esperar uma resposta, Amélia se virou e foi para o seu quarto.
Não viu que o sorriso de Elizabeth morreu, aos poucos sendo substituído por uma expressão do mais puro desprezo.
XxXxXxX
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