Insuportável



CAPÍTULO XIX. INSUPORTÁVEL

Já fazia quase uma hora que ela estava trancada naquele quarto gélido. Os comensais tinham tirado toda a sua roupa e a jogado violentamente lá dentro. Assim que eles fecharam a porta, a temperatura começou a baixar rapidamente.

Amélia estava encolhida no canto, desamparada. A pele dela estava mais pálida do que nunca. As pontas dos dedos, assim como os seus lábios, estavam roxas. Ela batia o queixo incansavelmente, e tentava, com os braços, segurar um pouco de calor em seu corpo.

A porta se abriu. Voldemort e mais três comensais entraram. O mentor se aproximou dela. Tirou a sua capa e a estendeu.

- Viu como eu posso ser gentil?

Amélia aceitou a cortesia do homem e se envolveu no veludo pesado. O seu corpo agradeceu pelo agasalho.

- As pessoas falam demais de mim, Assassina... Mas eu não sou tão mal. Ninguém pode ser tão mal. Eu só luto pelo que eu acredito.

- Sim, certo... Você já ouviu falar em Adolf Hitler?

- Jamais me compare com um trouxa.

O lorde das trevas usou o cetro que carregava em suas mão para surrar o rosto de Amélia. Uma pedra em sua ponta abriu um profundo corte.

- Já quer morrer, Amélia?

- Você ainda vai ter que gastar muito tempo comigo para me fazer pedir.

O homem abriu um sorriso medonho.

- Eu não tenho pressa.

- Deixa eu te dar uma dica: Perder o teu tempo comigo vai apenas te atrasar na guerra.

- Trabalhe para mim.

- Nem que a minha vida dependesse disso.

- Ela depende. CRUCIO!

XxXxXxX

Os dias foram se passando lentamente e, aos poucos, a mente de Amélia começava a se fechar.

Ela quase não se lembrava mais dos ensinamentos... Chegou até a dar um grito certa vez... Amaldiçoou-se depois pela sua fraqueza. Ela queria pedir para morrer... Como ela queria! Mas a imagem do ex-quase-noivo ficava martelando na sua cabeça, dizendo que ela não poderia, jamais, pedir para morrer.

Mas ela já não agüentava mais... Era tanta dor! Ela nunca pensou poder sentir isso... Há dois dias ela não comia nada... Não falava nada...

Estava beirando a loucura.

A sua insanidade estava tirando o sono de Snape. Ele já não sabia o que fazer... Queria muito que ela ficasse viva... Com ele. Mas tudo parecia estar caminhando para a inevitável morte prematura da jovem.

Ele já não conseguia olhar para o rosto dela sem mostrar tristeza...

Ela parecia sempre tão frágil quando estava com ele, na sua casa... Quando ele cuidava dela... E ela delirava com as febres e dores... Mas no dia, quando estava frente-a-frente com o Lorde das Trevas, ela se tornava uma leoa... Parecia que algo crescia nela.

Como agora.

Ela estava ajoelhada há horas. Joelhos esfolados. Feridas abertas. Hematomas espalhados por cada parte visível da sua pele. Um olho inchado... E, mesmo assim, uma expressão corajosa no rosto.

- O que você sabe sobre a profecia!

- Eu já disse que não sei porra nenhuma sobre essa maldita profecia, caralho!

- Espanquem.

Amélia sentiu vários chutes machucarem ainda mais a sua pele. Sentiu gosto do seu sangue na boca. Gemeu. Alguém gritou “crucio”. A dor se multiplicou. Quando tudo parou, ela estava ofegante.

Os comensais se afastaram e a deixaram largada no chão, como um cão sarnento. O Lorde das trevas se aproximou e a segurou pelos cabelos. A dor que a tração nos fios causava a fez se erguer, até ficar de joelhos, novamente.

Voldemort gesticulou para um comensal – Severo –, e este trouxe uma espécie de bacia, cheia de água.

- Diga...a...profecia.

- Eu... não... sei...

Ele enfiou a cabeça de Amélia na água e a segurou lá por um tempo. O ar, aos poucos, deixava o seu pulmão.

Ela começou a se debater em agonia, tentando a qualquer custo respirar.

Quando já estava perto de perder a consciência, Sentiu um puxão nos seus cabelos a tirar da água. Ela puxou a maior quantidade de ar que seus pulmões poderiam suportar.

- DIGA!

E... Mais uma vez, a sua cabeça foi enfiada na água e ela voltou a travar uma luta que pareceu ser eterna com as mãos que teimavam em segurá-la dentro da água.

Sem mais agüentar segurar o fôlego, Amélia respirou um pouco de água. Começou a expelir o resto de ar que por ventura tivera.

Voldemort, vendo que ela começara a tossir, puxou seus cabelos novamente, e a jogou no chão – Uma pedra pontuda cortou a sua pena.

Ela se encolheu em posição fetal e tossiu muito. Sentiu uma mão acariciar seu ombro. Não precisou nem abrir os olhos para saber quem era... Ela sabia que era Severo. Ela sabia que quando ele fazia isso, era porque tinha acabado.

O seu coração se acalmou e ela conseguiu suspirar aliviada, com a antecipação da misericórdia.

- Ainda não, Severo.

O comensal olhou para o seu mestre, como se implorasse por misericórdia. Amélia abriu os olhos cansados e tristes e o olhou demoradamente. Ele colocou os olhos nela. Levantou-se e a deixou na sarjeta.

- Severo, traga o veritasserum.

Amélia arregalou os olhos. Teria força para resistir a tal prova?


Acorrentada na cadeira, ela vê o seu namorado se transformar num verdadeiro monstro... Mas é necessário, ela sabe.

- Lição três sobre a poção da verdade: omitir não é mentir. Uma vez que você controla a sua consciência mesmo sob efeito da poção, você já pode saber o que pode ser falado ou não. Dúvida?

Amélia assente, pedindo permissão para falar.

- Como eu posso omitir? Não seria a mesma coisa de simplesmente não falar?

Os olhos de Brian brilham sagazmente.

- Não. A omissão consiste me falar meias-verdades que levarão o inimigo a crer numa inverdade.

- Exemplo...?

- Digamos: o inimigo lhe pergunta se você teve relações sexuais ultimamente. – Amélia sorri. – Você responderia que não.

- Mas isso seria uma mentira deslavada. Você sabe disso! Isso é impossível.

- Na verdade, Tudo é uma questão de reinterpretação, Lair. Você interpretaria o “ultimamente” como se ele quisesse dizer “ontem”. E, eu espero que esteja certo, você não dormiu com ninguém ontem!

- Milorde, ela não está em condições...

- Calado, Snape. Eu mando aqui, lembre-se disso. Essa vagabunda tem que falar o que sabe! Traga a poção.

- Sim, Milorde.

Snape pegou, debaixo da sua capa, um pequeno frasco que continha um líquido transparente, tal qual água. Voldemort olhou para um outro comensal, que levantou Amélia até que seus joelhos em carne viva tocassem o chão novamente.

Voldemort foi até ela e a fez engolir o líquido. Uma sensação de leveza tomou conta da mente de Amélia. Ela não se sentia tão bem fazia uma eternidade. A dor sumiu quase que completamente. Bem longe, escutou uma voz doce e macia, que gentilmente perguntava.

- Qual o seu nome?

Ela gostou da voz. Não dava vontade de mentir para ela... Era uma voz tão sincera que ela não poderia mentir nem se quisesse. Ela simplesmente respondeu.

- Amélia Beatrice Lair.

- Muito bom. Agora,... Alguém quer fazer uma pergunta?

Mais uma voz distante disse:

- SIM! Quantas vezes o Snape já te fodeu?

E, mais uma vez, estava se sentindo bem demais para mentir.

- Muitas. Eu não sei exatamente o número.

Risadas ecoaram a sua mente, mas não embaraçaram Amélia... Aliás, no estado em que se encontrava, sequer conseguiu distinguir qualquer traço de escárnio que pudesse haver nas risadas.

Uma outra voz macia perguntou.

- Na bundinha?

- Também.

Mais risadas. As risadas estavam fazendo Amélia ficar feliz... Ela estava se sentindo alegre, como há muito tempo não se sentia. Tinha vontade de rir, de cantar, de dizer como era bom estar viva, mas algo a impedia... Ela simplesmente não conseguia se expressar.

Agora, uma voz feminina muito bonita perguntou:

- Você ama Snape?

- Amo.

Foi como se tivesse recebido uma marretada na cabeça. Ela tinha acabado de expor para o mundo um sentimento que ela sequer sabia existir. Não tiveram risadas dessa vez. Um silêncio mortal tomou conta do lugar.

Talvez esse silêncio tenha a ajudado a se dar conta do que estava acontecendo: Aquela sensação, as revelações... Ela estava sob efeito da poção da verdade. Ela começou a ofegar. De repente, a dor começou a voltar. Em cada mínimo pedaço do seu corpo. Ela tentou se manter inexpressiva... Era boa nisso.

A voz de Voldemort ecoou.

- O que você sabe da profecia?

Ela se calou, tentando pensar no que dizer.

O que eu sei sobre a profecia de Nostradamus?’

- Nada.

Uma voz grossa, distante.

- Ela mente!

E a voz de voldemort.

- O que você sabe sobre a profecia para o fim dessa guerra, sobre um bebê?

Não tinha como mudar a interpretação dessa...

Mas ela não contaria o pouco que sabia... mesmo sabendo que ele, provavelmente, também tinha conhecimento.

As palavras não ditas pareceram sufocá-la. O pulmão começou a queimar, gritando por ar. Ela abriu os olhos e começou a olhar para o céu, numa tentativa vã de acabar com o efeito nocivo daquilo que não foi pronunciado.

A sua temperatura corporal começou a subir e ela começou a convulsionar. Bem distante, ouviu a voz de Snape dizer.

- Agora já chega. E tudo apagou. ...

XxXxXxX

Ela abriu os olhos.

A luz vinha apenas da lua cheia. Olhou para os braços fracamente iluminados. Viu as manchas da violência. Gemeu baixinho. Sentiu o colchão se mexer. Olhou para o lado.

Dividindo a cama com ela, estava Severo Snape, que dormia profundamente.

Ela sentiu uma tristeza profunda ao olhá-lo.

Com cuidado, se levantou da cama. O curativo que tinha nos joelhos roçou a carne. Ela suspirou pesadamente.

Saiu do quarto.

Começou a caminhar pelo apartamento vazio. O tapete da sala acariciava seus pés...

Ela poderia fugir... Não... Ele não permitiria... Com certeza a acharia e a levaria de volta para o seu mestre.

Ela sentiu o tão conhecido nó na garganta, mas, mais uma vez, não conseguiu chorar.

Olhou a porta da cozinha aberta. Uma fraca luz de uma vela perecia a convidar. E ela aceitou o convite.

A chama da vela estava bem ao lado de uma faca... Uma faca que parecia olhá-la, convidando-a maravilhosamente à viagem final: a morte.

XxXxXxX

Reviews, por favor.

Compartilhe!

anúncio

Comentários (0)

Não há comentários. Seja o primeiro!
Você precisa estar logado para comentar. Faça Login.