Planos Perdidos



CAPÍTULO XVI. PLANOS PERDIDOS

O auror cambaleou e caiu de joelhos no chão. As cabeças dos pais de Amélia rolaram.

Ela fechou os olhos.

'Não chore! Chorar é para os fracos!'

Amélia respirou fundo e ignorou friamente a cabeça dos pais que rolavam pelo chão do ministério, vindo parar bem aos seus pés. Caminhou para perto do auror. Agachou-se na sua frente e perguntou, tentando manter a voz firme.

- O que aconteceu?

A cabeça dele pendeu. Amélia segurou os seus cabelos e o abrigou a olhá-la.

- Eu fiz uma pergunta.

Ele disse, com a voz fraca e entre lágrimas de pura dor.

- Não eram dez,... e sim dezenas de comensais. Eles nos arrasaram.

- Estão todos mortos?

- Não. Foram todos seqüestrados – tossiu sangue. – Você-sabe-quem mandou te entregar isso – ele estendeu um pedaço de pergaminho para Amélia – e as cabeças.

Ela pegou o pedaço de pergaminho. Levantou-se e leu em voz alta.

- “Fugir não adianta, Assassina. Você será morta. Quero que você esteja amanhã, ás oito da noite pontualmente, em frente à mansão Lestrange. Se você se entregar à morte pacificamente, devolveremos os aurores com vida”. Isso é tudo que diz.

'Não chore! Chorar é para os fracos!'

Ela amassou o papel e pegou a cabeça decepada dos pais. Eles tinham uma expressão de horror estampada no rosto. Foram mortos por um Avada, provavelmente.

Ela suspirou, sentindo o coração pesar. Sentindo-se angustiada... Sozinha. Mas não choraria... até porque ela simplesmente não conseguia.

Entregou a cabeça para o ministro e perguntou em voz alta.

- A quem Dumbledore avisou que eu voltaria hoje?

O ministro respondeu, sentindo-se mal por segurar cabeças decepadas.

- A mim, apenas.

- E você sabia?

O semblante se entristeceu.

- Não. Eu e Frederick.

Amélia sorriu amargamente. Disse, com a voz serena.

- Pronto, ministro. O seu protecionismo acabou de fazer mais duas vítimas. Não me importa que ele seja o seu afilhado. Eu vou matar aquele filho da mãe!

Ela se virou e saiu pelas escadas. Seus olhos brilhavam em ódio... Sequer respirar calmamente ela conseguia...

Apenas queria matá-lo.

XxXxXxX

Chegou à sala e encontrou Schwartz sentado na cadeira de tortura, esperando por ela.

Fechou a porta atrás de si, de modo a não ser perturbada.

- Bastardo.

Ele sorriu.

- Vejo que o plano do Mestre deu certo!

- Filho de uma puta!

- E agora, Amélia? – Ele se levantou e se aproximou. – Seus pais não estão mais aqui. Foram para o inferno. Eu mesmo decepei as cabeças. Eles pediram tanto... Como fracos. Como você vai implorar. Chore, Amélia! Chore por eles! Chore por você!

Ela apenas o escutou destilar o seu veneno.

O ódio aumentava de uma forma que ela pensava até que explodiria... Mas sabia que, quanto maior fosse o ódio, maior seriam as dores que ele sentiria quando morresse.

Viu, em sua mente, o rosto dos pais... mortos.

E, finalmente, esmurrou a boca do estômago dele. Ele se contorceu, cuspindo sangue. Ela ficou parada... Queria que ele reagisse... Apenas para que o seu ódio chegasse ao ápice.

E ele o fez: esfacelou o osso dela do rosto em um murro.

E a briga começou de verdade. A varinha dela foi jogada para longe: ela queria matá-lo com as próprias mãos. Chutou o joelho dele, deslocando-o. Ele caiu, com o outro joelho no chão. Ela deu uma joelhada no nariz dele. Ele esmurrou a perna dela, quebrando-a. Ela caiu por cima dele. Começou a sufocá-lo, sentindo a garganta dele fechar-se em suas mãos, sentindo a vida dele se extinguir aos poucos... Ouvindo os murmúrios agonizantes... Ele ficar vermelho, roxo... Vasos nos seus olhos se romper...

Mas, antes que o final chegasse, Dumbledore irrompeu na sala.

- Já chega, Amélia! Você vai ter que duelar comigo se quiser matar esse homem!

- Ele não é um homem! – apertou mais forte – Fique fora disso, Dumbledore! É pessoal!

Mas o velho não ficou fora. Com um aceno com a varinha, ele jogou Amélia para longe. Ela bateu na parede do outro lado da sala, enquanto Schwartz tragava uma imensa quantidade de ar, um verdadeiro sopro de vida.

Dois dementadores entraram na sala de interrogatório e levaram o prisioneiro. Agora Amélia estava com mais ódio ainda.

- VOCÊ NÃO TINHA ESSE DIREITO! ELE É UM TRAIDOR IMUNDO! ASSASSINOU MEUS PAIS! EU VOU MORRER AMANHÃ POR CULPA DELE! EU TINHA O DIREITO DE ME ENCONTRAR COM ELE NO INFERNO!

O olhar paternal e sereno apenas aumentou a raiva e a dor.

- E matá-lo faria você se sentir melhor?

- Muito melhor, Dumbledore! Justiça seria feita.

- Os seus dementadores farão justiça por você.

- Apenas, saia daqui. Eu não quero mais ver a sua cara enrugada!

O velho apenas se aproximou da mulher que, jogada no canto da sala com a perna sangrando, parecia tão frágil. Concertou o osso dela e ofereceu a sua mão para que ela se erguesse. E não hesitou em abraçá-la com um carinho que Amélia jamais iria poder sentir novamente... Um carinho que pai.

'Não chore! Você não é fraca! Não chore! Se você chorar, você vai estar aceitando a derrota! Não chore!'

- Chore minha filha... Extravase o que você está sentindo.

- Não...

Ela se libertou dos braços de dumbledore.

- É preciso mais para me derrubar. Eu não vou dar esse gostinho a ele. Licença.

Ela deixou a sala. Ministro a parou. Ela se virou e viu com raiva os olhares de pena que recebia de todos os aurores.

- Lair, eu direi à família dos dez aurores que eles não puderam ser salvos.

- Não, ministro! Eu não vou sacrificar dez aurores! Sempre disse que uma vida não era nada! Que mortes estratégicas eram inevitáveis! Pois bem! Eu sou o mais perfeito exemplo de morte estratégica! Não tem porque aplicar uma lei para todos e outra para mim! E PAREM DE TER PENA DE MIM! SEJAM HOMENS UMA VEZ NA VIDA!

Ela pegou o elevador para voltar a sua sala. O peito estava mais pesado ainda... O nó na garganta... Talvez, se apenas chorasse... Mas não conseguia.

Não queria morrer! Ela adorava viver! E tinha tantas coisas que não tinha experimentado ainda! E agora a morte era certa. E nem poderia chorar com a mãe! Nem poderia desabafar com o pai! Nunca mais!

E ainda não conseguiu chorar.

Ela massageou a têmpora assim que voltou para a sua sala. Com pouco tempo, Frank Longbotton entrou. Ela suspirou.

Tentou manter a voz calma, apesar do desespero.

- Foi uma passagem bem rápida, não acha?

- O que?

- A minha passagem pelo ministério. Foi relâmpago! Acho que não deu nem para fazer história.

- Pois eu acho que você será citada em todos os livros de história.

Ela riu.

O seu olhar ficou distante.

- Eu poderia ter estudado ciências políticas, como o meu pai queria. Então eu estaria casada com um político milionário, teria uns três ou quatro filhos, que passaria a infância inteira correndo nos jardins da mansão Lair, vendo o avô receber visitas ilustres e a avó cuidar das roseiras no jardim. Eles cresceriam e não iriam se sentir muito tristes quando meus pais morressem... de velhice. Eu, então, me mudaria para a mansão, onde teria lembranças boas deles pelo resto da minha vida. Eu passaria a cuidar dos jardins de mamãe... Meu marido receberia visitas ilustres... E meus filhos casariam com políticos milionários... E teriam três ou quatro filhos, que me visitariam todos os fins de semana... E ninguém ficaria muito triste quando eu eventualmente morresse de velhice, pois todos saberiam que eu tinha vivido uma longa e maravilhosa vida. Esse era plano. Eu estraguei tudo, não?

- Não, Amélia. Você só quis caminhar com as próprias pernas! Sem planos.

- Se eu soubesse que acabaria matando todos que importam para mim, eu ficaria com o plano.

Longbotton segurou a mão dela.

- E não seria você.

- Sabe, Frank, o que me magoa mais? A última vez que eu falei com ele foi quando eu vim trabalhar aqui. Ele me viu matando. Morreu pensando que eu sou um mostro.

- Ele jamais pensaria isso de você.

- Eu nunca fui a filha que eles queriam. Primeiro eu queria ser a estrela, depois passei a me importar mais com namorados que com a tão querida política. Eu sou politicamente incorreta... Eles desejavam um filho certinho. Eles teriam, se pudessem. Mas eu comecei a ser uma desgraça na gravidez: Minha mãe quase morreu para que eu nascesse e acabou estéril – mordeu o lábio inferior. – Eu devia ter amado-os mais... Mas agora eles estão mortos. E eu vou morrer!

Ele se levantou, levando a cadeira para o lado dela.

- Você tem escolha...

- Eu devia ter arriscado mais na minha vida! Eu queria ter dito a Brian que aceitava casar com ele! Eu queria mesmo! Eu queria ter engravidado também! De Severo, antes de deixar Hogwarts. E ter tido gêmeos, dois meninos, que se chamariam Phillipe e Edward. Queria ter pegado o meu afilhado mais vezes no colo... Ter saído mais com os amigos, só para beber e conversar besteira – a dor e o nó na garganta aumentaram. – Eu queria chorar! Chorar até minhas lágrimas secarem... Mas eu não consigo! Algo fica preso na minha garganta... As lágrimas não saem! Eu não as deixo sair!

- Mia... – Ele a abraçou.

- Eu passei anos tentando me dizer que não podia chorar. Que eu estaria dando a vitória se fizesse isso... E agora eu não consigo! Eu não consigo derramar uma lágrima por meus pais! Eu não consigo chorar pela minha vida, que mal começou já vai ser roubada. Eu não sou insensível, Frank! Eu estou dilacerada por dentro! – Ela sentiu a umidade das lágrimas dele atingir o seu rosto. Pelo menos alguém estava chorando. Levantou-se. – Desculpa. Eu realmente preciso beber algo hoje.

Deixou o auror e amigo na sala e foi pra a casa, aproveitar a última noite da sua vida.

XxXxXxX

Aparatou diretamente no seu quarto.

Uma pessoa a esperava. Era Brian.

O nó cresceu.

Correu para os braços deles, num longo abraço. Acariciou o seu rosto.

- Eu quero que você vá embora.

Ele se livrou dos braços dela.

- Como! Mas, Amélia, eu acabei de chegar.

- As coisas estão fedendo por aqui. Papai e mamãe foram mortos. Eu vou morrer amanhã.

Passou uma sombra pelos olhos dele.

- É estritamente necessário? O que está acontecendo?

Ela viu nos olhos do namorado aquilo que estava precisando: O seu general. Aquele que lembraria a ela que tinha que ser feito.

Acalmou-se.

- É, sim. Eu vou ser trocada por dez aurores.

- Esse Voldemort tem que ser muito imbecil para propor essa troca! Os dez valem muito mais que você! – segurou a mão dela. – Eu não queria que isso acontecesse.

- Mas é necessário. Uma vida...

- Não tem valor. Uma causa, sim.

Amélia sorriu, tristemente.

Beijou suavemente os lábios de Brian.

- No fundo, eu nunca pensei que fosse boa demais para isso acontecer.

- Eu jamais pensei que pudesse acontecer com você.

Ele a beijou, dessa vez.

- Agora vá. Eu não quero que você se envolva – ele pensou em pestanejar. – Você não é mais meu superior, Brian! Não tem a obrigação de cuidar de mim. Eu não quero que você se envolva.

Ele a olhou por um momento.

- Amélia... Eu te amo.

Mais um sorriso deprimido.

- Eu sei! E Merlin sabe como me arrependo de não ter dito sim para você enquanto tinha tempo. Agora vá, meu amor. Faça um memorial bonito para a Família Lair. Faça com que o país se lembre dos meus pais. Eles foram boas pessoas. Vá, por favor.

Ele ainda beijou os lábios e mãos de Amélia antes de desaparatar.

Ela se jogou no sofá, sentindo-se cada vez mais triste.

Levantou-se. Passou a mão pelos cabelos. Pegou um pedaço de pergaminho e uma pena.

Escreveu.

'Eu preciso de você essa noite.'

E foi até a sua coruja.

- Vá rápido. Entregue a Severo.

Abriu a janela e observou a ave voar até desaparecer.

XxXxXxX

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